17 coisas que aprendemos sobre inovação e sobre como o mundo pode ser melhor nos três dias do “Summit at Sea”

Barbara Soalheiro, Carol Althaller, Mariane Maciel e Gabi Agustini - 4 dez 2015
Barbara Soalheiro, Carol Althaller, Mari Maciel e Gabi Agustini ao desembarcarem da conferência que mais as impressionou no ano.
Barbara Soalheiro, Carol Althaller, Mariane Maciel e Gabi Agustini - 4 dez 2015
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Por Gabi Agustini, Mariane Maciel, Barbara Soalheiro e Carol Althaller

O Summit Series é um projeto lançado em 2008 como um evento para jovens empreendedores. Na primeira edição, 19 convidados se encontraram num resort de ski em Park City, Utah (EUA), para trocar conselhos, aprender uns com os outros e conhecer gente nova. Depois disso, o Summit já foi parar na Casa Branca e num cruzeiro para mil pessoas e, mais recentemente, voltou ao Powder Mountain, o headquarter oficial da conferência desde 2013.

Este ano, os organizadores decidiram repetir a edição num cruzeiro, realizando o Summit at Sea (aqui tem fotos incríveis do evento), entre 13 e 16 do mês passado. Decidiram também investir em uma comunidade mais internacional e, assim, convidaram empreendedores e pensadores de outros lugares do mundo para subirem a bordo. A conferência de inovação colocou 3 000 influenciadores – entre eles Eric Schmidt, do Google, Garret Camp, do Uber, a ativista Ambassador Shabazz (filha de Malcolm X) e músicos como John Legend – num barco em alto-mar por três dias.

Entre os convidados, estava um grupo de brasileiros do qual nós quatro fazíamos parte. A gente acabou escrevendo um resumo com os nossos aprendizados e íamos publicar nas nossas redes, mas achamos que o Draft seria o lugar ideal. Adoramos a experiência e, abaixo, cada uma de nós reuniu o que viu de mais marcante e transformador.

 

Visão da Gabi:

1. Nem Google, nem Uber, a verdadeira guru dos inovadores norte-americanos é uma terapeuta sexual
A maior celebridade do Summit foi Esther Perel, que fez cinco palestras lotadas e muito concorridas. Sua apresentação no sábado à noite foi um frisson muito surpreendente, colocando a belga como a verdadeira pop star do evento com direito a gritinhos histéricos, selfies, palmas prolongadas, espera nas filas. Suas falas passaram por conselhos libertadores sobre relações, tirando expectativas de controle sobre a vida do outro e toda a idealização que ronda os casais.

 

2. O diálogo com as políticas públicas é fundamental
Uma das coisas mais impressionantes do Summit é como eles trouxeram temas centrais da agenda política norte-americana e global. Da abertura do evento com o Edward Snowden por teleconferência até as mesas sobre a guerra contra as drogas, passando por conteúdos sobre questões raciais, população carcerária e preservação de oceanos, o evento soube cruzar com maestria temas macro com experiências inovadoras estimulando questionamentos sobre como a inovação pode transformar o mundo em um lugar mais justo e humano.

 

3. Engenharia genética é polêmica mesmo entre os inovadores
A possibilidade de “reviver” animais selvagens a partir da engenharia genética para lutar contra a mudança climática apresentada por Ryan Phelan e Stewart Brand foi uma ideia que fez um tanto da plateia torcer o nariz. Os pesquisadores comandam o Instituto Revive & Restore que tem a missão de preservar a biodiversidade a partir de resgate genético de espécies ameaçadas e extintas, e alertaram para a gravidade dos problemas ambientes em curso. Segundo eles, toda técnica deve ser válida no intuito de conseguir manter a nossa sobrevivência na Terra.

 

4. O Brasil pode ensinar sobre empatia e colaboração
Dentre as centenas de palestrantes havia apenas uma brasileira: Juliana Luna, da plataforma global Project Tribe. A carioca de Duque de Caxias deu um show de carisma ao misturar sua emocionante história de vida com a transmissão de conhecimentos práticos em seus workshops de como fazer turbante afro ou aula de dança. Longe do senso comum, Luna soube impressionar pela sua forma de trabalhar o empoderamento feminino a partir do estilo, da ancestralidade e da colaboração.

 

5. A dieta do Paleo é a moda da vez
Outra palestra muito concorrida foi a do Mark Sisson, o pai da dieta paleo, prática crescente nos Estados Unidos. A dieta defende que deveríamos nos alimentar como nossos antepassados (do Paleolítico, ou Idade da Pedra Lascada) que viveram antes da descoberta da agricultura, deixando de fora açúcares, cereais e alguns legumes. Com a sala cheia e uma plateia super participante, o autor de The Primal Blueprint e do Marks Daily Apple, blog mais visitado sobre o assunto, tirou dúvidas da plateia que parecia entender bem sobre as dificuldades e benefícios de incorporar o novo hábito alimentar.

 

6. Tecnologias que resolvem grandes problemas do mundo são mais do que bem-vindas
Iniciativas que tentam resolver problemas a partir de novas tecnologias não são novas, mas têm mostrado cada vez mais sua potência. Os empreendimentos sociais tiveram grande destaque na programação, entre eles: o Uncharted Play da Jessica O. Mattews, que criou uma tecnologia que gera energia por meio do movimento elevando assim acesso à energia; o Scoutbots do Cesar Harada, barcos open-source autônomos e de baixo custo que podem limpar manchas de óleo, coletar dados para cientistas ou transportar mercadorias; e o Planet Labs do Will Marshall, que tem como missão prover acesso universal em uma base de dados abertos coletados por satélites ao redor da Terra ajudando o trabalho de novos negócios e de organizações humanitárias.

 

Visão da Mariane:

7. Negócio com impacto é um ótimo negócio
Blake Mycoskie, fundador da Toms, era uma das grandes celebridades do evento e falou no teatro principal para centenas de empreendedores, investidores e curiosos. Para quem não conhece a história, toda vez que um produto Toms é comprado (alem das alpargatas que deram origem à empresa, hoje eles vendem bolsas, óculos e até café), alguém é beneficiado em comunidades pobres pelo mundo. Se no campo dos projetos sociais há polêmicas sobre o impacto das ações, no mundo dos negócios parece não haver nenhuma dúvida de que Blake é um gênio e reconfigurou o que é cool nos EUA. Sua nova paixão é a realidade virtual (e em uma sala paralela era possível viajar ao Peru e conhecer um vilarejo apoiado pela Toms) como forma de levar as pessoas até o fim do processo da empresa. Além de inspirar os consumidores, Blake quer influenciar outros empreendedores e por isso resolveu investir metade do que recebeu pela venda de 50% das ações (algo em torno de 150 milhões de dólares) em novos negócios sociais. O Art Lifting, por exemplo, é uma plataforma de venda de arte feita por moradores de rua que recebe dinheiro e mentoria de Blake. Alem da Toms, valeu conhecer a história da Warby Parker (super bem sucedida marca de óculos que trouxe uma alternativa barata para o mercado e também doa um óculos a cada comprado) e saber que até a Martha Stewart está interessada em impulsionar talentos locais com seu projeto chamado American Made. It gotta mean something!

 

8. Black lives matter
Em um momento em que a discussão sobre o racismo no Brasil ganha espaço e urgência, foi muito especial ver a quantidade de negros nos lugares de fala e como parte da comunidade do Summit, interrompendo a narrativa que o racismo está superado. Violência policial, assassinato e encarceramento em massa de jovens negros, naturalização de privilégios brancos, representação na mídia, participação no mundo corporativo, feminismo negro, conteúdo dos livros escolares, engajamento e mobilização nas redes sociais, ocupação de espaços públicos e protestos, cultura como “o” território de engajamento para causa… Tópicos que se entrelaçavam e costuravam uma teia de reflexão sobre o momento atual. Nomes como John Legend, Harry Bellafonte, Ambassador Shabbaz (filha do lendário Malcom X) e representantes de organizações ativistas como Color of Change, Black Lives Matter, Gathering for Justice trouxeram atenção para alarmantes dados atuais — por exemplo: um em cada três bebês negros do sexo masculino nascidos nos EUA tem chances de parar na cadeia se tudo continuar como está — e compartilharam estratégias de organização e luta que podem inspirar movimentos negros ou outros ativismos no Brasil. O #blacklivesmatter, por exemplo, começou como uma hashtag em 2012 em resposta ao assassinato do jovem de 17 anos Trayvon Martin e rapidamente se tornou um dos mais fortes movimentos com mobilização física em 26 estados e com impacto na corrida eleitoral para presidência, como traz essa reportagem de capa recente do NYTimes.

 

Visão da Bárbara:

9. O futuro do trabalho é distribuído. E cheio de mórmons
E de mulheres. E de negros. E de muçulmanos… Mas deixa eu começar do começo. Minha palestra favorita durante o Summit foi a do Matt Mullenberg, o cara que criou o WordPress (uma das mais populares plataformas de publicação para blogs e sites). A empresa tem hoje uma força de trabalho completamente distribuída: são centenas de funcionários em 43 países. E não estamos falando de entregar parte do trabalho para profissionais em países em que a mão de obra é barata. Estamos falando de uma empresa que entende que talento existe em qualquer lugar (“Você nunca diria: eu só contrato mulheres. Ou eu só contrato católicos. Porque isso seria burrice. Afinal, talento existe em qualquer gênero e qualquer religião. Mas as pessoas se sentem à vontade em dizer: eu só contrato americanos”, disse.) Uma vez por ano, o time todo se encontra em alguma parte do mundo. Na primeira vez que o encontro rolou, “tudo o que fizemos foi encher a cara e jogar pingue-pongue”, contou Matt. Mas o funcionário número 15 da WordPress era um mórmon e, por isso, não dava mais para fazer um encontro anual que fosse sobre encher a cara. “Aquilo nos obrigou a entender o que de fato é nossa cultura. O que queremos celebrar quando estamos juntos”, contou. Sem querer, Matt me deu a melhor explicação que já ouvi sobre por que diversidade importa: quanto mais diferenças ao seu redor, mais rápido você vai enxergar o que de fato está construindo para o mundo. As conversas e motivações de sua empresa serão mais sobre o que importa e menos sobre o que te importa.

 

10. Pare de tentar simplificar. Comece a complicar
Alfred Z. Spector era, até o começo deste ano, VP de Pesquisa no Google. Em outras palavras, é o cara que criou o jeito como eu e você e o resto do mundo pesquisamos hoje.  Ele é, obviamente, apaixonado por data (armazenamento de dados), um dos caras que mais entende do assunto no mundo e um entusiasta do assunto. Mas sua fala focou muito na complexidade de usar data de forma eficiente. A interpretação de qualquer dado é tão dependente de uma análise humana – e uma análise humana é sempre tão absurdamente biased (distorcida) – que é quase impossível encontrarmos causas objetivas quando olhamos para data. “O que conseguimos encontrar é correlação”, disse. Para mim, escutar Alfred foi mais uma prova de que o mundo vai ficar um lugar cada vez mais complexo. E se você é do tipo que prefere afirmações categóricas e sem nuances, que não lida bem com o fato de que nada é tão preto no branco, então vai passar a errar cada vez em suas hipóteses.

 

11. Medite
Se a maior parte daquelas 3 000 pessoas tem tempo para isso, você também tem.

 

12. Frustração é uma parte muito importante do trabalho
Numa conversa sobre Flow – um conceito originalmente usado para atletas, mas que cada vez mais é usado para definir qualquer estado mental em que uma pessoa está tão concentrada que consegue atingir níveis altíssimos de performance – Steven Kotler, co-fundador do Flow Research Collective, explicou que o primeiro passo para chegar lá é a frustração. “Você só vai atingir o flow se, antes, passar por uma fase em que está tão imerso em informações e pensamentos e preocupações que isso te gera uma frustração. Mas é essa quantidade absurda de informação que seu cérebro vai processar mais adiante para te colocar num lugar de alta performance”, disse. E lembrou também que ninguém entra em flow diversas vezes seguidas sem passar por uma fase de recuperação: “O pior erro é achar que você pode repetir imediatamente algo extraordinário que acabou de fazer. Dê tempo ao seu cérebro para que ele se recupere”.

 

13. Nova tendência: poesia.
IN-Q, o poeta oficial do Summit, aposta que poesia vai se tornar cada vez maior. Ao transformar seus poemas em uma performance, ele foi capaz de fazer a plateia se emocionar mais do que com muito músico e cantor.

 

14. O Highline Park em NY é uma combinação entre infraestrutura e programa
Eu já tinha aprendido essa com a Gabi Agustini, do Olabi Makerspace, que conheci justamente por causa do Summit e é uma das pessoas melhor pensando tecnologia no Brasil hoje. Aprendi com ela que, quando falamos de makerspaces, máquinas e ferramentas são uma parte pequena da história. O que importa mesmo é construir uma rede: “Quando você precisar de uma máquina ultra avançada, esta máquina vai aparecer, pode ter certeza”. Essa mesma clareza apareceu na fala do arquiteto dinamarquês Bjarke Ingels ao falar sobre o Highline Park (uma linha de trem suspensa, desativada, que hoje é um parque em Nova York). Quando transformamos um pedaço da cidade, não é apenas a estrutura que devemos criar, mas também o programa (as oportunidades de interação) que a acompanham. E você só vai conseguir fazer isso se construir a estrutura junto com as pessoas: a rede.

 

Visão da Carol Althaller:

15. Faça amigos, não faça contatos (a serindipidade de encontrar exatamente quem você precisa conhecer)
Como a Bárbara disse acima, o Summit em si é sobre a importância de termos uma rede forte e diversa de amigos e como essas relações impactam no sucesso dos nossos negócios. Com as nossas vidas e interesses cada vez mais interconectados, a singularidade social talvez seja a coisa mais importante para se prestar atenção nesse momento. Devido à nossa interconectividade, cada vez mais vamos conhecer pessoas surpreendentes. Estamos aumentando o número de pessoas inacreditáveis que encontramos e quanto mais as pessoas dizem que você precisa conhecer alguém, como num passe de mágica você acaba se conectando com aquela pessoa. Assim, o efeito de rede de comunidade é realmente acelerar nossa capacidade de se conectar com o outro, fazer amizades, construir projetos juntos, e ele vai ter um impacto exponencial sobre o trabalho que vamos fazer juntos como geração. O ponto principal para crescermos é empoderar a rede e ajudá-la a se sustentar de maneira cada vez mais poderosa. Encontre alguém para dividir a mesa em alguma refeição e conheça novas startups, troque impressões com seus colegas desconhecidos de quarto (foi assim que me conectei e descobri muitas coisas em comum com minhas colegas de quarto, uma estilista de Nova York, uma doutora em nanotecnologia da Nova Zelândia que está mudando a forma como as crianças se conectam com as ciências e uma engenheira francesa do Uber baseada em São Francisco), ou faça aula de dança com alguém que vai te dar uma ideia para seu próximo negócio.

 

16. Otimismo (e outras virtudes) como superpoder
Bert e John Jacobs, criadores da Life is Good, uma marca que oferece mais de 900 produtos com a missão de espalhar o otimismo pelo mundo, acreditam que cada um de nós tem uma escolha: concentrar nossa energia nos obstáculos ou nas oportunidades, ou seja, concentrá-la em nossos problemas ou nas soluções. Com a estratégia de focar em superpoderes como gratidão, criatividade, coragem, simplicidade, compaixão, humor, amor, autenticidade, entre outros, Bert e John dão a seu negócio um propósito maior: o de transformar o mundo a partir da nossa energia. E esse é um dos princípios norteadores do Summit, que mistura conteúdo inspirador com sessões de meditação e yoga para alinhar corpo e mente. Parece que o segredo dos empreendedores e inovadores está em saber viver esse equilíbrio entre o racional e o emocional.

 

17. Deixe sua herança falar mais alto
Ambassador Shabazz, a filha mais velha de Malcolm X, é a prova viva de que entender melhor o significado da sua própria jornada, o mundo à sua volta e o seu lugar nele faz com que seu caminho flua melhor. Inspirada por seus pais, os pais deles e os anteriores a eles, Ambassador nos questionou sobre o quanto respeitamos nossas tradições culturais, a diversidade dos nossos caminhos e o que nossa história representa para estarmos onde estamos. A grande pergunta é: o que você traz no seu caminho até aqui? Para onde pretende seguir? E o que deixa para o mundo? Tudo isso é possível responder quando resgatamos os valores da nossa ancestralidade e percebemos o quão especial nossa história nos torna.

 

 

Gabriela Agustini, 31, é fundadora do Olabi Makerspace, espaço dedicado à inovação social e à aprendizagem de novas tecnologias. É professora de cultura e tecnologia da Universidade Candido Mendes e da FGV-Rio e co-organizadora da coletânea De Baixo para Cima, sobre economia colaborativa e cultura de periferia.

Mariane Maciel, 38, é publicitária freelancer e dedica metade do seu tempo a projetos sociais. É consultora da Gastromotiva e cofundadora do Vamos Falar sobre o Luto?. Trabalhou na AlmapBBDO, CO.R, NBS e WMcCann com dirigindo grandes contas como Volkswagen, Ambev, Coca-Cola e TIM.

Bárbara Soalheiro, 35, é fundadora da Mesa&Cadeira. Foi eleita uma das 10 profissionais mais inovadoras do mercado pela ProXXIma. Jornalista, foi editora da Superinteressante, diretora da Capricho e editora-chefe da Colors. É autora do livro Como Fazíamos Sem… adotado no Programa Nacional do Livro do Governo Federal.

Carol Althaller, 27, é analista cultural, pesquisadora de tendências, consultora para marcas e projetos e escritora freelancer. Foi editora da WGSN e participa das redes de institutos como Futures Company, Mindshare e Future Laboratory como antena local no Brasil. Hoje é Concept na FLAGCX Rio, professora no IED Rio e em cursos livres.

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