Com autoconhecimento para funcionários, a Gamaro propõe uma nova onda no mercado de incorporadoras

Giovanna Riato - 17 maio 2017Administrador, surfista e iogue, o diretor de incorporação da Gamaro, Vinicius Amato, defende um ritmo mais lento e mais humano de trabalho.
Administrador, surfista e iogue, o diretor de incorporação da Gamaro, Vinicius Amato, defende um ritmo mais lento e mais humano de trabalho.
Giovanna Riato - 17 maio 2017
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Quando alguém menciona mais um lançamento imobiliário em São Paulo o normal é o ouvinte pensar em mais um prédio com muros altos, sem integração com a rua, provavelmente com arquitetura neoclássica e a famigerada sacada gourmet, certo? Pois isso é tudo que a Gamaro Incorporadora não quer fazer. A empresa, que constrói e vende apartamentos residenciais em São Paulo, é relativamente nova neste mercado, foi estabelecida em 2014, num grupo com um currículo extenso na construção e administração de prédios comerciais.

A condição de “novata” lhe permitiu a ousadia, digamos, de entrar em um segmento altamente impactado pela recessão sem replicar condutas consagradas no mercado, como a de fazer projetos quase iguais. Vinicius Amato, 42, diretor de incorporação da empresa, fala sobre esta condição:

“Como não viemos deste mercado, não carregamos os vícios e conseguimos parar e pensar no que vale ser feito como sempre foi e no que devemos mudar”

Ele se descreve como um apaixonado pelo trabalho. “Vim do mercado financeiro, que é muito maduro. O segmento imobiliário é diferente, tem um potencial enorme de profissionalização”, diz. Formado em administração, a visão de mundo dele é apurada não só pela vivência profissional. Com jeitão calmo e pele bronzeada, ele conta: “Surfo desde a adolescência e pratico yoga há quase 20 anos”. Por praticar yoga entenda-se: ter formação profissional, pós-graduação em anatomia pela Universidade Paulista e dar aulas voluntariamente duas vezes por semana — uma delas, para os próprios funcionários da Gamaro. “Yoga é presença e disciplina. É o tempo todo, no trabalho ou durante a prática efetivamente”, conta.

Na empresa, o executivo combina este ponto de vista com outros olhares na liderança. O investimento para colocar a Gamaro em pé, conta, veio de Gabriel Mario Rodrigues, fundador da Universidade Anhembi Morumbi e do Grupo Anhanguera de educação. A presidente da companhia é a arquiteta Angela Freitas, filha de Gabriel. Além de Vinícius, a diretoria é formada por engenheiros e gente que atuou em telecomunicações. “Com esta estrutura, conseguimos manter a cabeça aberta em um mercado pasteurizado. Dá para fazer diferente”, diz, citando o conceito de Inteligência Coletiva do filósofo francês Pierre Lévy. “Ninguém tem a resposta toda. Cada um, com sua experiência e bagagem, dá a sua contribuição.”

RITMO PRÓPRIO PARA TRABALHAR EM UM MERCADO ACELERADO

A Gamaro tem estrutura enxuta, com apenas 60 funcionários. O ritmo de lançamentos é bem inferior ao de outras incorporadoras: apenas dois a três empreendimentos por ano. “Se passar disso não conseguimos manter a qualidade”, admite. Os imóveis têm preços que vão de 400 mil a 1 milhão de reais por unidade e o público-alvo são famílias das classes B e C. “São pessoas que já estudaram, têm carro e sonham em viajar e em ter a casa própria. Tentamos reunir isso nos nossos produtos”, afirma.

A Gamaro lança apenas três prédios por ano, cheios de verde, como este, no Brás.

A Gamaro lança apenas três prédios por ano, com muito mais áreas verdes que a média do mercado, como este, no Brás.

Segundo Vinicius, o esforço é para fugir da balela comum do mercado de “prometer condomínio-clube” e entregar prédios com áreas comuns espartanas. Na prática isso se reflete em dar mais atenção, e espaço, às áreas verdes. O paisagismo dos prédios da Gamaro é feito por Ricardo Cardim, botânico especialista em resgate da vegetação da Mata Atlântica. “Queremos que as pessoas comam frutas do pé como os pais e avós delas”, diz. A empresa lançou este mês um empreendimento no Brás, bairro da zona leste de São Paulo, chamado Piscine Station Resort (pelo visto, não deu para escapar do anglicismo dos nomes). Vinicius conta o estande de vendas tem 2,5 mil árvores, que serão replantadas no condomínio, totalizando 3 mil árvores em 3 mil metros quadrados. “É mais que a média de um bairro inteiro da cidade. O projeto prevê ainda muita água, com praia artificial. Vai ser um oásis.”

A empresa trabalha em um ritmo próprio. Muito mais lento que os concorrentes. “Levamos até dois anos para concluir um projeto, não seis meses como acontece em muitas incorporadoras”, conta Vinicius. Ao comprar um terreno, eles pesquisam a arquitetura da região da cidade, conversam com vizinhos e se apresentam para a comunidade. “Nos vemos como protagonistas da transformação urbana. Precisamos agir de forma responsável, olhar o entorno.”

O projeto do Brás, por exemplo, foi inspirado nos galpões tradicionais do bairro e vai ter fachada feita com os familiares tijolos. Internamente, o espaço gourmet ficará em um vagão de trem, resgatando o transporte tão tradicional por ali. Vinicius diz que intenção é nunca fazer o empreendimento impor um visual — a não ser pela área verde. Neste sentido, o Seed Residence, condomínio que está em construção na Vila Olímpia, zona sul da cidade, prevê recuo na calçada para que quem passa na rua tenha contado com o verde lá de dentro. O que a Gamaro chama de “gentileza urbana” inclui, ainda, o investimento em canteiros e espaços verdes nos bairros e em galeria de arte a céu aberto, algo que fizeram no Brás com a devida aprovação da vizinhança.

GENTILEZA GERA GENTILEZA – E ALGO MAIS

Com o olhar de quem chegou no marcado há pouco tempo, a liderança da Gamaro sentiu a necessidade de repensar a relação com o time de vendas, que é tradicionalmente terceirizado. “Em um lançamento, estes profissionais trabalham de 60 a 90 dias sem qualquer remuneração, apenas apostando no resultado do negócio”, conta. Normalmente, diz, as incorporadoras dão bônus por resultado e é comum é oferecer “experiências” (como pilotar um carro no autódromo ou viajar de balão) em vez de grana, algo que ele, a Gamaro, acham estranho. “As pessoas precisam suprir suas necessidades básicas, não voar num balão.”

Com isso em mente, a Gamaro fez uma série de pesquisas e desenvolveu abordagem nova. Em vez de oferecer benefícios por resultados, passou a premiar a dedicação. “Temos uma plataforma para monitorar isso. Em resumo, se o profissional trabalha, ele ganha”, diz Vinicius. Os bônus focam em suprir necessidades de quem, muitas vezes, precisa rebolar para pagar as contas: há opções de resgate na farmácia ou em créditos para o celular, por exemplo. Outra gentileza (dessa vez para os vendedores) é que a empresa construiu um refeitório no estande de vendas, no empreendimento do Brás, para que o time economize com alimentação e tenha energia para correr atrás de fechar os negócios, rompendo o tradicional esquema do “cada um por si”. Ele fala a respeito:

“É o mínimo que estes profissionais merecem. Ninguém faz nada sozinho, o trabalho e os resultados são coletivos”

É curioso listarmos esse tipo de coisa (bônus úteis, refeitório, remuneração pelo trabalho e não só por comissão) como inovação, mas elas são. Nessa mesma linha, em um passo ainda mais incomum, a Gamaro criou um programa de treinamento holístico para seu time de vendas. No ano passado nasceu o Super Poderes Gamaro, uma iniciativa realizada em conjunto com a Be Project que, no lugar de ensinar a receita para vender mais, treina o time para aptidões relacionadas ao autoconhecimento — e que não têm ligação direta, racional, com vendas. “Dessa forma o  vendedor se empodera de sua situação. Ele pode promover uma transformação pessoal e alcançar melhores resultados”, diz Vinicius.

TRANSCENDER PARA VIVER MELHOR… E VENDER

Além de encontros e dinâmicas, a ideia do programa de autoconhecimento da Gamaro é dar aos profissionais ferramentas para que eles se aperfeiçoem sozinhos, recorrendo à autodisciplina. Para isso, plataforma Super Poderes oferece, por exemplo, vídeos e podcasts sobre assuntos diversos, como ansiedade, produtividade e inovação. Vinicius afirma que esta aposta na visão mais humana do negócio foi um tiro certeiro. “Temos profissionais de seis empresas diferentes trabalhando nas nossas vendas e hoje eles se comportam como um coletivo, um só grupo”, diz. Nas contas dele, depois da iniciativa, as visitas de consumidores aos estandes de vendas aumentaram para número 2,5 vezes superior ao registrado pela concorrência.

Uma vez por semana, o diretor de incorporação da Gamaro, Vinicius Amato, dá de yoga para os funcionários da emrpesa.

Uma vez por semana o diretor de incorporação da Gamaro, Vinicius Amato, dá aula de yoga para os funcionários da empresa.

Ao chegar no mercado durante a crise, a Gamaro enfrenta desafio adicional. “Com as empresas queimando estoques de apartamentos e fazendo promoções, perdemos o apelo emocional para fechar a venda”, diz. Segundo ele, as emoções têm peso de 80% na decisão de compra. No momento de baixa na demanda, no entanto, os clientes estão sempre esperando uma condição melhor para fechar o negócio.

Para tentar trazer de volta este fator a empresa sorteou um apartamento no lançamento do Brás em que, para concorrer, bastava visitar o projeto e levar RG, CPF e comprovante de residência (não por acaso, justamente o necessário para fechar uma compra). “Desse jeito, atraímos ao lançamento mais consumidores com real capacidade de adquirir um imóvel e resgatamos o argumento emocional”, diz.

Com ações práticas, como esta, e com um time de vendedores mais conscientes (de si, de seu propósito ali), Vinicius conta que o resultado foi excepcional, com 80% das 250 unidades vendidas no lançamento. Ele afirma que este olhar atento para as pessoas é um dos ativos mais valiosos da Gamaro, algo que a empresa quer manter a todo custo. Para isso, a ideia é seguir lançando apenas dois a três empreendimentos por ano.

Na visão deste iogue-surfista-inovador corporativo, com ou sem recessão, há um forte potencial de crescimento do setor imobiliário no médio e longo prazos. Ele vê este mercado em processo de amadurecimento, que é quando mudanças de paradigma são mais que bem-vindas. “Hoje este é um segmento dominado por uma visão de engenharia, de corte de custo. Podemos acrescentar um novo olhar”, diz. Quem sabe, construir algo novo.

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