Desistir de um sonho não significa deixar de sonhar: o que aprendi ao deixar a presidência de uma empresa

Mauricio Patrocinio - 14 out 2016Mauricio Patrocinio tornou-se administrador por "fraqueza", por ser o caminho mais fácil. Levou 20 anos para descobrir que aquilo não fazia sentido e que seu propósito era outro. Ele conta o que aprendeu.
Mauricio Patrocinio tornou-se administrador por "fraqueza", por ser o caminho mais fácil. Levou 20 anos para descobrir que aquilo não fazia sentido e que seu propósito era outro. Ele conta o que aprendeu.
Mauricio Patrocinio - 14 out 2016
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por Mauricio Patrocinio

Desisti do meu sonho! É verdade! Pode até parecer negativo, fraco, estranho. Pode até me diminuir por dizer publicamente que desisti do meu sonho. Mas, ao contrário, isso me fortalece, me motiva e é para compartilhar o que aprendi nesse processo que escrevo este artigo.

Desde pequeno, sempre sonhei grande. Quando via o padre da igreja que eu frequentava, na zona sul de São Paulo, falando coisas positivas, motivando a comunidade, compartilhando o bem, eu me instigava e sonhei ser padre. Mais à frente, meus sonhos foram mudando. Ao brincar com a maquete da casa que o pai de um amigo estava construindo, sonhei atuar na área de construção, pois queria construir coisas, transformar lugares.

Anos depois, ao ver meu pai chegando em casa em seu Sedan de luxo, de terno e gravata, como executivo de uma grande multinacional, comecei a sonhar em ser administrador de empresas. Talvez por fraqueza, foi o caminho que segui.

Fraqueza porque, de fato, escolhi ser administrador porque parecia ser o caminho mais fácil. Meu pai deixou a multinacional que trabalhava e abriu um escritório próprio. Para mim, era mais fácil e garantido ir por esse caminho do que tentar trilhar sozinho outros que, até, poderiam me fazer mais feliz.

Algo que desenvolvi intuitivamente foi um processo para tomar decisões importantes na vida. de modo que fossem mais assertivas e com menos riscos. Prefiro demorar para tomar uma decisão e arriscar perder uma oportunidade a tomar decisões precipitadas e me arrepender depois.

Quando decidi ser administrador de empresas, escolhi também sonhar em ser presidente. Queria ir ao topo, atingir o posto máximo

Por conta disso, fui me especializando em cada área e dando meu melhor. Comecei por TI, depois Operações, Finanças e, então, Vendas. De repente, me dei conta que estava ficando pronto para assumir a responsabilidade máxima de uma empresa.

Naquele exato momento, parei e comecei a refletir sobre minha vida. Eu tinha sonhado muitos sonhos estava realizando boa parte deles. Tinha sonhado em casar, ter filhos, ter um lar gostoso, ter um carro bacana, viajar para vários lugares do Brasil e do mundo… Tudo isso estava acontecendo e o grande sonho de me tornar presidente de uma empresa estava prestes a se realizar.

Lembro como se fosse hoje de uma noite em que, em meio às insônias frequentes causadas pela pressão e stress, me sentei no terraço de casa e comecei a pensar. Me fiz uma série de perguntas: E aí?

A presidência está chegando. Quando chegar, o que será da minha vida?

Será que terei que ser presidente de uma empresa maior, depois de outra maior? Será que terei que fazer as empresas crescerem mais e mais e mais? Terei que dominar o mundo? Aquilo me parecia vazio. Ser grande por ser grande? De repente, aquilo tudo me pareceu limitador, algo muito mundano, que ia contra as regras naturais da existência. A regra natural é a regra do infinito e crescer apenas no material me parece obviamente finito.

Nesse dia, comecei a pensar no meu propósito de vida, o porquê de eu existir. Isso faz 13 anos. Olhei para mim mesmo e percebi: não é possível que minha vida seja delegada a um cargo. Tampouco a algo material. Pensei no que as pessoas falariam de mim no meu velório. Como eu queria ser lembrado? Que legado eu iria deixar?

Nesse dia, lembrei de uma indagação que eu fazia para minha mãe ao ver tanta gente reclamando da vida, tanta gente irritada no trânsito, nos relacionamentos, gente reclamando do trabalho, dos chefes, dos problemas financeiros, das relações, gente sem sorrir. Eu perguntava para ela: “Mãe, por que as pessoas não são felizes?”. Ao me lembrar daquela pergunta, imediatamente e intuitivamente defini meu propósito de vida: quero inspirar o maior número de pessoas a serem felizes.

Lembro claramente daquele dia. Foi libertador. Me deu uma energia totalmente diferente e um peso menor para todas as cobranças e medos que eu tinha. A mudança, claro, não aconteceu de um dia para o outro, e me exigiu muita disciplina e discernimento. Mas, conforme eu me organizava nesse sentido, o medo de ser mandado embora ia diminuindo pouco a pouco (obviamente, com espasmos de desespero momentâneos).

Aos poucos, a pressão de “parecer” algo para a sociedade foi perdendo força. Passei a ser “mais eu” e “melhor eu” todos os dias

Não fiz nada precipitado, pois, como disse, prefiro demorar a tomar uma decisão a me precipitar. Mas comecei a aplicar o propósito que eu havia descoberto no meu trabalho, no meu cotidiano. Comecei a estudar, refletir, escrever e gravar falas sobre Felicidade enquanto continuava fazendo o que tinha me proposto até aquele momento.

A presidência chegou, por duas vezes. Uma no Chile, quando eu tinha 27 anos, outra vez no Brasil, e exerci o cargo por oito anos. Fui evoluindo em meu propósito enquanto me realizava mais e mais pessoal e profissionalmente. Fui me preparando e, em 2015, quando a empresa em que eu estava foi vendida, tomei a decisão de pedir as contas do cargo que tinha sonhado tanto.

Desisti do meu sonho. Mas eu estava tão conectado a mim mesmo que o que era meu maior medo, perder o emprego, passou a ser minha vontade

Algo muito louco! Nunca imaginaria, no passado, ter a coragem para fazer aquilo.

Durante o processo pós-identificação do meu propósito, passei a sonhar outros sonhos, como o de escrever um livro, o de dar palestras para multidões — não mais pelas empresas em que eu atuava, mas pelo meu projeto que nomeei de “Discutindo a Felicidade”. Sonhei, também, em vez de ser presidente, ser sócio de uma empresa de vendas diretas, um mercado em que sempre atuei.

Hoje, tenho meu primeiro livro lançado com justamente a pergunta que eu fazia para minha mãe: “Por que as pessoas não são felizes?”. Já vendi milhares de cópias, tenho feito palestras para milhares de pessoas em eventos empresariais e organizações. Este ano, comecei a fazer o Stand Up Reflexivo FELICIDADE, com um teatro lotado já na estreia (a próxima edição acontece dia 24, em São Paulo). Estou me preparando para lançar um segundo livro, ainda este ano.

Em paralelo, me tornei sócio de uma empresa de vendas diretas e realizei outro grande sonho, além de atuar como conselheiro no instituto Aliança para o Futuro da Criança e ser Vice-Presidente do conselho de ética da Associação Brasileira de Empresas de Vendas diretas.

Minha vida mudou completamente. As preocupações e medos existem, e são muitos, mas são diferentes e me impulsionam a ser melhor

Deixar de “estar” presidente, não me fez a menor falta, já que há algum tempo eu havia percebido que eu tinha que “ser” o Mauricio enquanto eu “estava” presidente. Meu estilo de vida mudou completamente e, sinceramente, os luxos do cargo que eu ocupava (passagens de primeira classe, hotéis de luxo, a massagem constante ao ego inerente à posição etc) não fazem a menor falta. Até porque, o preço que eu pagava por eles era muito alto: a minha vida!

O que aprendi com isso tudo? Aqui vai:

1) Desistir de um sonho não é necessariamente deixar de sonhar;

2) Estamos em constante evolução. Nunca podemos dizer “pronto, chega”, pois nesse dia morreremos;

3) Precisamos nos conectar com nossa essência continuamente. Identificar onde estamos e para onde queremos ir;

4) A vida é feita das decisões que tomamos e, por isso mesmo, temos que desenvolver uma habilidade grande para este processo;

5) Quanto mais convictos de quem somos e do que queremos, menos nos importaremos com “o que os outros vão pensar”. Com isso, somos mais e melhores nós mesmos, e mais felizes;

6) Não há sonho certo ou errado. Há o seu sonho. Quanto mais legítimo, mais ele impulsionará a sua felicidade;

7) Não devemos pensar em ter ou não ter desafios, mas sim em como lidar com eles. Se estivermos conectados, eles nos farão melhores;

8) Por último, aprendi que deveria deixar de sobreviver e passar a viver a vida. Passar a ser eu mesmo e ser o melhor de mim mesmo. Quando deixamos de viver para os outros e nos tornamos responsáveis por nós mesmos, as pessoas param de nos julgar e começam a nos incentivar.

 

Mauricio Patrocinio, 39, foi executivo por mais de 20 anos chegando à presidência de duas empresas, até pedir demissão. Hoje, é escritor e palestrante pelo projeto Discutindo a Felicidade, autor do livro Por que as pessoas não são felizes?, vice-presidente do Conselho da Associação Brasileira das Empresas de Vendas Diretas e conselheiro do Aliança para o Futuro da Criança.

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