Ela tem 33 anos e mudou a própria vida antes de abrir a UDT, que trabalha com transformação

Giovanna Riato - 11 fev 2016Patricia Cotton, líder da UDT, viajou o mundo e ressignificou a própria vida antes de criar o negócio.
Patricia Cotton, fundadora da UDT, viajou o mundo e ressignificou a própria vida antes de criar o negócio.
Giovanna Riato - 11 fev 2016
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Para quem está próximo, é sempre difícil enxergar o quadro mais amplo. De perto, só dá para ver os pixels. É para resolver essa dificuldade que surgiu a Upside Down Thinking (UDT), consultoria especializada em processos de transformação que propõe, como o próprio nome diz, a inversão de pensamentos e de hábitos arraigados. É pensar de ponta-cabeça para arejar as ideias.

A profissional que conduz estas mudanças é a carioca de 32 anos Patricia Cotton, especialista em inovação e liderança criativa. Patricia formou-se em comunicação social e jornalismo pela PUC-RJ, com MBA em marketing pela ESPM-RJ e, mais recentemente, MBA executivo global pela Berlin School of Creative Leadership, mas valoriza mais a experiência que teve com a mudança de sua própria vida do que o que viveu nas cadeiras universitárias.

Com mentorias, palestras e workshops, ela propaga a necessidade de reordenar o raciocínio para alcançar mudanças. Ela descobriu até uma palavra para classificar o que faz: deflexão. O termo descreve o ato de tirar algo ou alguém de sua posição natural, justamente a provocação que Patricia propõe aos seus clientes. “Ajudo organizações e líderes a sair da posição deles pra olhar o quadro todo. Ir para longe revela o que está perto. Fazer o inusitado permite que a gente acesse uma serie de possibilidades que não vemos de dentro da situação”, conta. O diagnóstico de Patricia do mundo corporativo indica que, em geral, a mudança é vista de forma superficial nas empresas:

“As pessoas dizem que querem mudar algo, mas não investigam a fundo, com cuidado. Aí, nada acontece”

A gama de serviços da UDT para reverter este problema inclui, por exemplo, o Retiro de Negócios (Business Retreat). O programa propõe tirar líderes da bolha corporativa e levá-los para um lugar fora da caixa, distante de qualquer hábito. Vale fazer a empresária que não desce do salto ficar alguns dias andando descalça em Búzios ou juntar quatro empreendedores belgas e um pônei em uma chácara na Alemanha — como aconteceu no primeiro retiro da UDT.

Nesse afastamento, Patricia pede que os clientes desliguem o celular e não pensem em nada urgente. O plano é passar alguns dias debatendo ideias, buscando referências no passado e projetando o futuro. “Não tem receita de bolo. É preciso ter sensibilidade para entender o que é deflexão em cada caso”, diz.

O Business Retreat dura de dois a três dias “intensíssimos”, ela diz, e o preparo para ele demora semanas, já que pressupõe um diagnóstico com entrevistas com equipe, clientes e demais stakeholders da companhia, além de muita pesquisa e observação do ecossistema no qual a empresa está inserida. E ela conta que o efeito do Business Retreat também costuma ser de longa duração, já que influencia tomadas de decisão estratégicas, que muitas vezes só acontecem meses depois, e após a “digestão” do que foi observado, discutido e revelado no retiro corporativo.

Patricia durante um workshop de Liderança Criativa na Team Academy, na Finlândia.

Patricia conduz um workshop de Liderança Criativa na Team Academy, na Finlândia.

Os métodos, considerados surpreendentes, pretendem destravar a criatividade que, para Patricia, é o ativo mais importante e estratégico das empresas hoje. Segundo ela, o mundo passou por grandes ondas evolutivas até chegar na era da internet, na qual a informação é abundante e, portanto, já não representa mais o grande diferencial. “O que vale é a conexão criativa, os vínculos que os profissionais criam com estas informações. A autenticidade é o grande diferencial competitivo. Ninguém pode copiar quem você é”, diz.

MUDAR É UM PROCESSO LENTO E SOMBRIO

Patrícia afirma que, depois de as empresas moldarem e formatarem profissionais aos seus processos, é possível perceber sinais de que o jogo virou. Mas ela admite que mudar de filosofia não é fácil — nem para empresas nem para pessoas. “A transformação é um processo sombrio porque envolve insegurança e desconhecimento sobre como será do outro lado, além da necessidade de desapegar do que já foi construído. É muito distante do que vemos nos filmes em que a pessoa acorda, decide mudar e já coloca em prática como algo heroico.” Patricia acredita que a evolução é homeopática e raramente linear:

“Mudar é algo crescente, que começa com um desconforto ou frustração, um incômodo que te mobiliza a fazer algo”

Ela fala com conhecimento de causa, pois experimentou a transformação na própria vida e fez dela seu primeiro laboratório para entender e conhecer o processo. Por 10 anos, ela trabalhou na área de marketing de grandes empresas, como Globosat, na marca de cosméticos Beleza Natural e na PDG, que atua no mercado imobiliário. Mergulhada nos compromissos profissionais desde muito jovem, ela perdeu carnavais e festas de família por causa de trabalho.

Em 2010, após o fim de um relacionamento, decidiu passar as férias em Berlim, na Alemanha, e se apaixonou pela cidade. O que na época parecia apenas um passeio acertado, hoje ela percebe como o começo de seu processo de transformação. “Foi arrebatador o que eu senti ali. Berlim é uma cidade fênix que ao longo de seus 700 anos de história foi destruída, reconstruída e resignificada algumas vezes”, conta.

Patricia em Xangai, na China, para um dos módulos de seu MBA.

Patricia em Xangai, na China, para um dos módulos de seu MBA.

A inspiração que Patricia encontrou por lá ficou adormecida por algum tempo. Ela voltou ao Brasil e retomou a rotina pesada de trabalho. No ano seguinte, a inquietação a fez buscar uma especialização fora do Brasil. Foi aí que ela topou com o MBA da Berlin School of Creative Leadership, um curso global com módulos na China, Japão e nos Estados Unidos, além da Alemanha. Pronto, foi a guinada que ela precisava.

“Quando cheguei lá as coisas fizeram sentido. Eu estava em uma época infeliz, queria mudar a minha vida”, lembra. Por um ano e meio ela coordenou o estudo com a rotina de trabalho, tirando algumas semanas para acompanhar os módulos internacionais, mas mantendo as responsabilidades no Brasil. Enquanto isso, o processo de transformação ganhava força dentro dela.

No fim do MBA, Patricia tinha passado de líder centralizadora na empresa em que trabalhava para alguém que não via mais sentido em manter aquela rotina. Ela precisava preparar um trabalho de conclusão de curso e, no anseio de entregar o melhor que podia, decidiu pedir demissão para se dedicar somente a isso. Quebrou o cofrinho e colocou a mão em todas as suas economias para rodar o mundo por três meses entrevistando pessoalmente CEOs de várias companhias sobre a forma como eles encaravam processos de mudança.

QUANDO SUA HISTÓRIA PESSOAL O HABILITA A AJUDAR OS OUTROS

Conversou com profissionais do companhias nacionais, de empresas do Vale do Silício, da Europa e da Ásia. Mergulhou nas mais diversas referências sobre processos de transformação, desde a tradição chinesa do I-Ching, o livro das mutações, até o programa de 12 passos dos Alcoólicos Anônimos, que apoia a recuperação de dependentes químicos em vários países.

Terminou o processo cheia de inspiração, escreveu um artigo para a revista Forbes sobre a sua tese (de como sistematizar mudanças audaciosas) e começou a oferecer palestras e workshops. Daí foi um pulo para que o conhecimento de Patricia pudesse se transformar em um negócio. Em pouco tempo ela estava oferecendo consultorias e a Upside Down Thinking ganhou forma. “Não aconteceu de forma planejada, mas da uma necessidade transbordante minha de passar para frente o que tinha aprendido. O investimento inicial foi o meu capital intelectual”, conta.

Desde a fundação, em 2013, até hoje, a consultoria UDT já trabalhou com clientes de peso, como Vale, HSM e Escola São Paulo. A empresa atua entre Rio de Janeiro, São Paulo e Berlim. Patricia firma parcerias — entre elas, com a Escola São Paulo, a Laje, e a Beta House (em Berlim) — para tocar os projetos e prefere manter seu negócio livre, sem endereço físico ou ativos fixos. “Não posso me viciar numa forma única de trabalhar, senão vou me contradizer”, afirma.

Ela conta que como o trabalho do UDT é fluido, dinâmico, criativo e provoca inversões do fluxo de pensamento nas pessoas e organizações, não há um padrão nos serviços oferecidos. Com isso, o formato e o preço das consultorias dependem muito do cliente e do caso. “No momento, por exemplo, estamos trabalhando num processo de reinvenção organizacional bastante profundo que deverá levar meses ou anos, pois o cliente é do setor de óleo e gás e está passando por uma revisão generalizada no Brasil e no mundo”, diz.

A UDT atende cerca de quatro clientes por ano para o Business Retreat, outros quatro por ano para mentoria e por volta de cinco clientes ao ano para talks e workshops. Ela não abre os dados de faturamento da empresa, reconhece que a renda caiu bastante, o que exigiu um esforço de adaptação que a fez perceber que a conta bancária está longe de ser seu foco:

“Na minha equação, tempo vale muito mais do que dinheiro. Tempo todo mundo tem, mas ninguém consegue acumular para gastar depois. Faço o melhor que posso com o meu”

Para 2016, o plano é, além de seguir com o trabalho da UDT, investir em publicações. Patricia tem três livros no forno, ainda sem data para a publicação: um é a sua tese de conclusão do MBA, o segundo sobre mentoria deflexiva e o terceiro sobre liderança criativa. “Quero ajudar a colocar o Brasil no mapa da inovação”, diz, e conta que pretende trazer para cá alguns dos profissionais que conheceu no exterior, para colocá-los em contato com a “criatividade brasileira”, que em sua visão se destaca da “excelência e precisão” que encontrou nos profissionais alemães.

Patricia ainda é a única funcionária de sua empresa. “Tomei a decisão de não escalar o negócio em termos de volume. Pretendo manter como algo relevante, de alta importância e valor, mas não quero trabalhar com todo mundo porque ser popular exige uma série de concessões”, diz.

Ao abrir mão da posição de executiva de marketing em grandes corporações, e de todos os benefícios que isso traz, para se transformar numa profissional independente, Patricia passou a enfrentar mensalmente a oscilação das receitas. “Não é fácil, mas vale cada incerteza”, diz. O fluxo irregular, tanto financeiro quanto de trabalho, permite que ela reserve tempo para fazer pesquisa e refrescar o próprio olhar, reproduzindo ela mesma os retiros e a experiência deflexiva que propõe aos clientes. De ponta cabeça, sem tirar os pés do chão.

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Upside Down Thinking - UDT
  • O que faz: Consultoria especializada em mudança, faz mentoria deflexiva, retiro de negócios, palestras e workshops
  • Sócio(s): Patricia Cotton
  • Funcionários: 1 (apenas Patricia)
  • Sede: Rio de Janeiro
  • Início das atividades: 2013
  • Contato: info@upsidedownthinking.com.br
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