Três amigos, muitos sonhos e uma vontade em comum: transformar tudo isso em uma única empresa. Foi mais ou menos assim que surgiu a Origem, marca de gastronomia saudável de Florianópolis. Com alguns conceitos simples, como o uso de potes de vidro retornáveis para incentivar a sustentabilidade, o modelo one for one (ainda não totalmente implementado) para causas sociais e — possivelmente a maior ousadia da empresa — uma estratégia de vendas baseada na confiança, em que o cliente é que diz quais produtos consumiu e paga depois, os três jovens deixaram para trás suas carreiras para se aventurar no universo do empreendedorismo. Ao que tudo indica, é uma viagem sem volta.
Tudo começou em 2014. Joana Wosgrau Câmara, 27, havia recém se formado em Geografia e estava insatisfeita com as perspectivas de trabalho. “Escolhi o curso para mudar o mundo e de repente percebi que não estava nem mudando a realidade à minha volta”, conta. Em São Paulo, Alexandra Lemos, 28, experimentava as mesmas sensações. Formada em Engenharia Ambiental, sentia falta de participar de projetos que refletissem seus valores.
As duas, que se conheceram durante um intercâmbio e mantiveram a amizade mesmo à distância, conversavam constantemente sobre as insatisfações. Juntas, fizeram o Imersão – Consultoria e Empreendedorismo, programa da Fundação Estudar que dá a jovens recém formados a chance de explorar diferentes áreas de trabalho e as possibilidades de trabalho em cada uma. E aí Alexandra teve uma ideia.
Estudando sobre finanças pessoais por conta própria para poder organizar melhor o orçamento, a paulistana percebeu que a educação escolar tradicional não a preparou para lidar com problemas do cotidiano e da vida real. “Liguei para a Joana e falei: Jô, a gente precisa abrir uma escola”, lembra. “E a Joana topou, ela é dessas que abraça as ideias”, completa. A vontade era criar uma escola que unisse o conteúdo curricular a atividades práticas e maior consciência humana, com assuntos como política e Direito.
No ano seguinte, ainda decidida a criar algo com Joana, Alexandra passou as férias em Florianópolis. Mas as duas haviam perdido o compasso. Enquanto Alexandra queria seguir na linha da educação, Joana, que havia começado a cursar Farmácia, pensava em fazer algo com gestão de pérfuro-cortantes para juntar dinheiro e criar a escola. “Aquilo me pareceu muito distante do que eu desejava, voltei para São Paulo decepcionada”, lembra.
QUANDO SEU SONHO DE NEGÓCIO PODE SER… OUTRA COISA
Poucos meses depois, porém, Joana fez outro curso da Fundação Estudar, esse voltado para a formação de lideranças de jovens que querem colocar ideias em prática. Nele, a ideia da escola entrou num potinho e virou… Salada! Joana captou uma moda gastronômica da época, a de saladas no pote, e inseriu nela alguns dos conceitos de educação que gostaria de trabalhar: sustentabilidade, solidariedade e saúde. Em um mês, como parte do desafio do curso, montou um plano de negócio com o objetivo de vender 50 saladas. Nisso, entrou em cena o publicitário Arthur Ferreira dos Santos, 27, namorado de Joana. “Eu queria ajudar, então disse a ela que a parte de imagem e nome podia deixar comigo”, conta ele.
Joana não só completou o desafio, como de fato passou a comercializar as saladas. Arthur, por sua vez, testava as receitas, ajudando a adaptá-las para quem não está muito acostumado à alimentação saudável. Com 135 quilos, colesterol “no talo” e triglicerídeos “prestes a explodir”, ele se identificava como o público menos provável a aderir às refeições sem farinha, sem açúcar refinado e sem conservantes propostas pela Origem – além das saladas, Joana passou a elaborar brownies, biscoitos, tortas, salgados e sopas. As saladas da Origem custam em média 16 reais e têm ingredientes como batata doce, cebola caramelizada, molho barbecue e mix de folhas. Também há sobremesas (brownie a 7 reais, ganache de chocolate a 12,90). Também é possível encomendar o “Pacote Detox”: um menu semanal com cinco refeições, duas sobremesas e dois snacks por 118,90 reais.
Arthur também ajudava a entregar os pedidos, recebidos via Facebook, Instagram ou WhatsApp (até hoje a empresa não tem um site, é tudo feito via redes sociais e telefone). Ele conta que neste ponto eles perceberam o tamanho da demanda. “No início, saía para entregar pelas 11 horas da manhã e meio dia havia terminado tudo. Aí começou a ir até 12h30, 13h”, diz:
“Aos poucos percebemos que o mercado já existia e que só era preciso validar o que já estávamos fazendo e transformar em uma empresa”
Com o negócio a mil, eles precisavam de braços. Alexandra acompanhava tudo à distância e, admite, meio chateada pelo péssimo timing. “Se a Joana tivesse me proposto fazer algo como a Origem quando eu fui a Florianópolis meses antes, teria largado tudo na hora”, diz. Joana, por sua vez, não sabia como propor à amiga que largasse tudo para acompanhá-los. “Eu pensava que não podia dizer para a menina abandonar tudo e vir fazer salada na minha casa”, conta, rindo.
Mas o convite finalmente veio, e Alexandra topou. Deixou o emprego, o bom salário para uma recém formada, o plano de saúde, o vale alimentação e se mudou de mala e cuia para o Sul do país. Em outubro de 2016, surgiu a Origem, e com ela dezenas de desafios tão difíceis quanto escolher uma ideia para empreender.
O principal deles era sair da cozinha da casa de Joana. Mas os três nem sequer tinham ideia do tamanho do espaço que precisavam, quanto menos do que caberia no orçamento. Sem perspectiva do tamanho do negócio, era difícil inclusive definir o orçamento.
Para esse início, cada um desembolsou 10 mil reais, usados principalmente para necessidades mais urgentes: compra de potes de vidro, ingredientes, pagamento de contas. Diante das incertezas, mudaram primeiro para o apartamento de Arthur, onde teriam mais espaço próprio. “De repente, passei a morar na empresa”, brinca.
E, DE REPENTE, APARECE A GRANDE SACADA
Até então, as vendas continuavam só por encomenda, até que Arthur teve uma ideia para alavancá-las: comprar um frigobar e deixá-lo em uma empresa para que os funcionários pegassem o produto, anotassem o que pegaram e, no fim do mês, acertassem a conta com a Origem. “Eu tinha lido sobre um experimento em que deixavam docinhos em uma mesa, as pessoas podiam pegar e pagar por conta própria, e ele teve 98% de assertividade”, conta. “Nós achamos que ele estava completamente louco”, diz Joana. Mas resolveram experimentar mesmo assim.
A empresa escolhida foi a Resultados Digitais, startup de marketing digital. E deu certo: eles estimam que 30% do faturamento da empresa, hoje em torno de 6.500 reais mensais, venha das vendas na RD. Um bom retorno para um investimento de cerca de 3 mil reais no frigobar.
O único problema que achavam que teriam, a possível falta de honestidade dos clientes, nunca aconteceu. O mais difícil foi estabelecer a forma de cobrança. “Começamos literalmente com uma prancheta na qual os clientes anotavam o nome, o que consumiram e o telefone, e precisávamos cobrar um a um”, conta Alexandra, responsável por gerenciar o frigobar da RD. Agora, optaram por instalar uma maquininha de cartão, ainda em fase de testes. Se der certo, pretendem replicar a experiência em mais 30 pontos de venda, meta para o próximo ano. Arthur fala a respeito:
“Confiança é parte da nossa missão. Muitos dizem que o brasileiro não é honesto, mas quem dá oportunidade para ele mostrar que é honesto?”
Ele prossegue: “Acreditamos que podemos ser a origem, daí o nosso nome, de mudanças em geral, desde a alimentação até a forma de convivermos em sociedade”. Vale dizer: desde que ele tornou-se sócio da Origem, já emagreceu 20 quilos.
Com uma noção mais clara do faturamento, e um investimento adicional de 20 mil reais para cada sócio, os três conseguiram alugar, reformar e montar uma cozinha industrial para abrir uma loja própria no Santa Mônica, bairro comercial e residencial na região central da Ilha. A expectativa é inaugurá-la oficialmente em meados de agosto e, assim, cumprir o objetivo de três frentes de venda da marca: por encomendas, frigobares e na loja.
O desafio, agora, é saber equilibrar tantos sonhos com a demanda do mercado. A solução encontrada foi estabelecer um mix em que 50% dos produtos são algo que o público conhece (a moda da alimentação saudável) e os outros 50% são novidades, como a ausência de farinha ou de açúcar, que pode causar estranhamento, e os potes retornáveis, que funcionam quase como um cartão fidelidade: a cada pote devolvido, o cliente recebe um desconto de um real. Além disso, os sócios querem implantar o modelo one for one, no qual a cada salada vendida, outra é doada (ou algum valor a ser definido) para uma instituição social da cidade.
Mas, se depender dos três, não vão parar por aí. “Nós ainda não trabalhamos 100% com orgânicos, ainda fazemos as entregas com carro, acho que temos como reduzir o lixo que produzimos…”, elenca Alexandra. “A gente está aqui embaixo, mas sabemos aonde queremos chegar.” A expectativa dos sócios (que agora contam com a ajuda de duas consultoras financeiras para colocar ordem na casa) é de que até o fim do ano o faturamento seja o suficiente para obterem pró labore. Para retirada de lucros, porém, eles nem têm previsão. Com tantos sonhos juntos, o lucro passa a ser torná-los realidade.
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