Eles não inventaram a roda, não inventaram o sorvete. Mas a ideia de fazerem um sorvete artesanal (todos os ingredientes estão no mercado mais próximo de você), com uma casquinha igualmente bem cuidada, e de estarem em uma esquina agradável, com bancos de madeira na sombra das árvores, bem, isso fez da Frida & Mina um sucesso e uma inspiração.
A história é inspiradora porque eles ganharam o prêmio Comer & Beber de melhor sorvete da cidade, oferecido pela revista Veja São Paulo, aos dois meses de vida, sem jamais terem se preocupado com isso. Houve, sim, muito planejamento, mas voltado a resolver uma equação tão difícil quanto comum. Como ser feliz no trabalho e viver uma vida legal?
Thomas Zander, 35, e Fernanda Bastos, 36, estão juntos há 11 anos, são casados há nove e não estudaram para serem administradores de empresas nem sorveteiros. Ela fez Relações Públicas, ele Design Gráfico. Ela trabalhou na área social (em ONGs como o Aprendiz) e ele em agências de publicidade. Aqui e ali, os dois procuravam mas não encontravam um sentido maior no que estavam fazendo. Fernanda se frustrava com a burocracia e o distanciamento com os beneficiários dos programas sociais, Thomas ia se cansando de criar conceitos que acabavam virando obra de ninguém.
“Você já não acredita muito naquele trabalho, e ele ainda te exige uma dedicação de tempo absurda. Então, se é assim, vou trabalhar esse tanto, mas para um negócio meu”
“Fui subindo na carreira de publicitário, mas olhava para o que estava à minha frente e não me via naquelas posições. Falava pra mim mesmo que quando tivesse 35 anos esperava não estar fazendo mais aquilo. Na internet nada é palpável, e eu queria fazer algo manual”, diz ele. A vontade de mudar de carreira existia, mas o modelo de trabalho também o empurrava para isso. “Você já não acredita muito naquele trabalho, e ele ainda te exige uma dedicação de tempo absurda. Então, se é assim, vou trabalhar esse tanto, mas para um negócio meu.”
A trinca tédio-trabalho-vazio levou os dois a experimentarem a vida fora do país. Fizeram as contas, e as malas para Paris. Thomas tem passaporte alemão e pôde trabalhar (com publicidade digital), o que os permitiu esticar a estadia, de 2007 a 2009. Nesse período, Fernanda fez frilas para o Brasil. Mas o trabalho, mesmo em Paris, ainda carecia de sentido. “Voltamos também porque a vida de imigrante uma hora cansa”, conta ela.
Thomas e Fernanda brincam que a Frida & Mina não é o primeiro grande projeto deles, pois mais ou menos a cada dois anos, algo intenso acontece. Depois de Paris, a aventura seguinte foi o nascimento de Leila, em 2010. “Nessa hora você já não pensa só em você. Aí decidi que largaria mesmo a publicidade, e teria um negócio próprio”, diz Thomas. A filha pequena também despertou neles a preocupação com alimentação e saúde, em saber de onde vem o que estão comendo.
Thomas, chegou a pensar em uma franquia de comida natural, mas Fernanda não embarcou. E se fosse sorvete? “Nessa época começamos a perceber o surgimento de umas sorveterias bacanas nos Estados Unidos, que pensavam de um jeito que a gente se identificava”, diz ela. A Bi-Rite, de São Francisco, dá preferência a fornecedores locais, ou a Jeni’s, de Ohio, resgata o jeito artesanal de fabricar a massa.
FAZER O QUE SE ACREDITA, MESMO SE FOR MAIS DIFÍCIL
Enquanto Fernanda define o conceito, Thomas enumera as vantagens práticas: sorvete requer uma cozinha menor e mais fácil de administrar, dá para ser criativo nos sabores, e dá para ser rentável. A pesquisa prosseguiu e eles adoraram a filosofia da Van Leeuwen, de Nova York. Fernanda enviou um email e, bingo!, Ben Van Leeuwen não apenas respondeu, mas topou dar uma consultoria para eles, por 1 000 dólares. “Eles são referência para nós em termos de valores, do cuidado com os ingredientes, e também nos explicaram as muitas maneiras de fazer o sorvete”, conta Thomas.
É possível fazer sorvete desde comprando tudo pronto e apenas misturando, até não comprando nada pronto. Entre os dois métodos há muitas maneiras cuidadosas de se fabricar a sobremesa, mas a Frida & Mina está mesmo em um extremo, pois não usa nem sequer a chamada base neutra. “Foi uma escolha: já que vamos fazer, queremos fazer tudo”, diz Thomas.
Para colocar o negócio em pé, o casal investiu cerca de 450 000 reais, valor de um apartamento vendido, mais um empréstimo na Caixa Econômica Federal. Gastaram boa parte na reforma do imóvel alugado e quase metade em equipamentos — os principais são um pasteurizador, uma produtora de sorvete (a máquina que congela e incorpora ar na massa ao mesmo tempo), um freezer, uma vitrine e um fogão com forno industrial (para cozinhar os morangos, preparar o crocante da macadâmia, derreter o chocolate da Amma, bater as claras em neve para a casquinha…)
Entre definir que teriam uma sorveteria, num lugar agradável e na rua, onde produziriam o sorvete desde o princípio, com ingredientes orgânicos e comprados o mais localmente possível, e abrir, dois anos se passaram. Em 2011, eles começaram a testar sabores com uma produtora de sorvete caseira (faz 1,5 litro por vez, contra 15 da profissional). Thomas diz que aprendeu tanto no Google quanto em livros de receita e cursos — em um deles, no Senai, conheceria Silvio Silva, que viria a ser o braço direito na cozinha da sorveteria. A mão boa para a cozinha ajudou, e amigos cobaias trataram de elogiar, criticar e lamber os beiços.
“Apesar de ser muito intimidador, a gente nunca teve dúvida de que era capaz de aprender a administrar o negócio. Foi um processo, e continua sendo”
Além de criar sabores — além dos tradicionais, eles fazem Erva Cidreira, Chá Preto, Caramelo com Flor de Sal, Cerveja com Chocolate, entre outros — e achar o ponto do sorvete, o casal teve de se preparar para a burocracia do negócio. “Apesar de ser muito intimidador, a gente nunca teve dúvida de que era capaz de aprender a administrar. Foi um processo, e continua sendo”, diz Thomas.
Em agosto de 2012, ele enfim deixou o emprego de publicitário. Planejava inaugurar a sorveteria seis meses depois, mas levou o dobro disso. Tudo atrasou: a obra, o alvará, a Eletropaulo… Eles foram resolvendo um problema por vez, até o início de agosto passado. “A certa altura, estava tudo certo e só faltava um atendente. Já tínhamos entrevistado muita gente, mas elas vêm sempre tão armadas que não dá para saber quem são. Aí apareceu o Antonio, desarmado, doce. Era o que faltava, e abrimos as portas três dias depois”, conta Fernanda.
A clientela inicial veio dos amigos, do bom ponto — em Pinheiros, a esquina da Artur de Azevedo com a Joaquim Antunes é próxima de uma escola e de pequenos comércios e escritórios — do cheiro de baunilha que se espalha quando estão fazendo as casquinhas e, obviamente, do boca a boca de quem se arriscava a experimentar aqueles sorvetes com nomes em português (lá não tem cioccolato) e aspecto meio rústico (sem corantes, nada ali é over amarelo, verde ou rosa).
SUCESSO IMEDIATO NEM SEMPRE É UM BOM NEGÓCIO
Dois meses depois, o susto. Frida & Mina vence o prêmio Comer & Beber, da revista Veja São Paulo. A fila, que existia mas era administrável aos sábados, explode de gente querendo provar o melhor sorvete da cidade. “Antes de abrirmos, meu medo era não ter como atrair as pessoas, depois disso, era saber como a gente ia fazer para conseguir atender toda aquela gente”, diz Fernanda. Madrugadas trabalhando, domingos (dia sagrado para os dois ficarem, juntos, com a Leila) trabalhando, amigos chamados para ajudar na cozinha e no balcão. Perder sorvete porque acabou a energia elétrica. Perder sorvete porque a máquina quebrou. Acabar o sorvete no meio do sábado. Imagine o inferno que não pode ser quando o sucesso chega cedo demais.
“Sofremos com a imprensa, que não conseguíamos atender direito. Sofremos com críticas, foodies que vieram para cá e falaram mal. Poxa, você acabou de abrir a sorveteria, vêm críticas de coisas que não tinha dado tempo de arrumar. Foi duro, mas a gente entendeu que fazia parte”, diz ela. Os dois enfrentariam outro bom tanto de perrengues. Um dos saldos do primeiro semestre de atividades: Thomas, que já é magrão, perdeu nove quilos. “Não dava tempo de almoçar, nunca.”
O outro saldo é que, ufa, a experiência vem. Aos poucos, eles foram pegando o traquejo. Hoje, fazem em algumas horas o que antes levava um dia inteiro. Em fevereiro, os dois comemoravam uma inédita e relativa tranquilidade — quando veio a crise dos ovos. “A gente não sabia, mas as galinhas dão menos ovos por causa do calor. O nosso fornecedor, que é orgânico, não tinha o que vender. Os outros já tinham a produção comprometida. Me restou ir para os supermercados naturais e comprar a prateleira toda. Cheguei a sair com 60 caixas”, conta Fernanda, aos risos. Agora, eles têm três fornecedores diferentes.
Preparados para o próximo fevereiro, eles falam sobre como é trabalhar com a esposa, o marido. “Temos perfis diferentes e complementares. Isso é uma força e também um desafio. Ele é pragmático, eu sou mais etérea”, ela diz. “Se eu fosse abrir uma sorveteria sozinho, não seria assim”, diz ele. O interruptor de luz possivelmente seria de plástico, e o telhado da velha casa não teria sido reformado — discussões reais, em que o toque de beleza de Fernanda prevaleceu. “E eu jamais conseguiria abrir uma empresa sem alguém para planejar, cuidar do fluxo de caixa!”
Aos sábados, a Frida & Mina — o nome da avó dele, Frida Mina Ingeborg Zander, foi escolhido pela sonoridade, e por carinho — vende em média 900 sorvetes. O recorde foram 1 100 pedidos. Uma bola custa 7 reais, duas, 10. Na casquinha ou no copinho. E ainda há café coado, da Martins Café, e brownie com sorvete nos dias frios.
“As pessoas saem daqui felizes. Todo mundo fica um pouco criança na frente do sorvete. É muito legal ver a cara de um senhor, quando completa o cartão fidelidade e ganha o sorvete”, diz a empreendedora, que considera seu trabalho em 90% do tempo “muito gostoso”. Nos outros 10, pode ser apenas comum, ou até mesmo chato, mas a conta fecha. Para ambos.
Ele também não sente saudades de quando era outra coisa que não o Thomas, sorveteiro. “Antes, eu ia a uma reunião em que eu representava a agência, o cara na minha frente representava o banco. Nada ali era verdadeiramente de ninguém. Aqui é o contrário. Vendo o sorvete que acabei de fazer, o cara toma na minha frente, o feedback é na hora.”
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