“O que fiz em 2015. Como vejo 2016” Nossa conversa de fim de ano com Roberto Martini, da FlagCX

Isabela Mena - 29 dez 2015Roberto Martini, da Flag: "Este é o momento das principais oportunidades, de mudança"
Roberto Martini, da Flag: "Este é o momento das principais oportunidades, de mudança"
Isabela Mena - 29 dez 2015
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Passar a régua neste ano de 2015 significa falar de crise e retração na economia. Este ano a inflação atingiu 10,9%, o PIB caiu 3,6% (Banco Central) e o dólar já passa nos 4 reais (ante 2,80 de janeiro, quem se lembra?). A crise econômica pegou em cheio os negócios dos pequenos e médios empresários — 77% dos entrevistados de uma pesquisa encomendada pelo Sindicato da Micro e Pequena Indústria de São Paulo ao Datafolha dizem que temem ter de fechar seus negócios. Mas riscos sempre estiveram no cardápio do empreendedor. E nem só números se fazem os balanços do ano.

Por isso, estamos publicando uma série de conversas com empreendedores, makers, inovadores e criativos para saber como os negócios disruptivos se comportaram em 2015. Com as mesmas 10 perguntas para todos, queremos saber que transformações ocorreram, que aprendizados é possível tirar do ano, que estratégias foram criadas e usadas para superar dificuldades. É hora, sobretudo, de olhar adiante.

Seguimos a série com Roberto Martini, fundador da agência CuboCC e fundador CEO da FlagCX, holding de mais de 20 empresas que inovam em publicidade, tecnologia e marketing no mercado global. Martini foi eleito pela GQ Magazine um dos CEO’s brasileiros mais inspiradores e uma das pessoas mais inovadoras em business pela ProXXIma. 

Se você tivesse que escrever um verbete sobre a atual crise brasileira, como você a descreveria?
A crise brasileira é uma crise de identidade em função de transformações para nos entendermos como povo, entendermos qual é nossa essência, como as coisas vão seguir depois de toda essa turbulência. Mas sinto que não é só uma crise brasileira, é muito maior. É claro que é muito difícil passar por tudo isso mas, de certa forma, é o momento em que as coisas se realinham, se equilibram de volta. Tenho uma visão muito positiva em relação a isso, acho que transformações são aceleradas por esses momentos caóticos e levam a caminhos e lugares que fazem mais sentido.

Como foi 2015 no seu quintal? Como a crise está afetando o seu negócio?
Já desde a Cubo, que deu origem à Flag, e gente desenhou nossos business em cima de variáveis que a gente acreditava serem de crescimento óbvio no futuro. E, quando as crises rolam, nossos modelos aceleram porque as pessoas acabam antecipando essa transição. Quando você tem menos recursos, precisa decidir melhor onde vai investir seu dinheiro. A Flag continua crescendo justamente por causa dessa estratégia de portfólio de negócios mais avançado em relação a pensamentos e modelo de negócios. Este foi um ano em que ganhamos muitos clientes estratégicos, o que significa um ano de consolidação do modelo, e termina com o lançamento oficial da primeira empresa que criamos, a Cubo. Nenhuma das nossas empresas tinha ido para o mercado, elas operam dentro do nosso ecossistema, numa estrutura que se autossustenta. Mas, 12 anos depois de inventada e sendo uma das maiores agências do país, que trabalha com alguns dos principais clientes que existem, a Cubo sai do beta. Isso porque sentimos que o que aconteceu com o mercado este ano acelerou o lugar para onde a Cubo está direcionada e agora o mercado está mais maduro e entende o que ela faz. Dá para dizer que foi um ano bastante interessante para a gente.

Com que cenário você está trabalhando para 2016? Que medidas você tomou diante da crise?
Temos planos de expansão global. Hoje estamos mais fortes no mercado americano, ainda aceleramos o investimento nesse mercado e vamos também para outros mercados, já que a nossa marca começa a ter relevância global. Já ganhamos algumas contas globais e estamos operando através da estrutura dos Estados Unidos. As medidas que tomamos em relação à crise foram acelerar algumas decisões do nosso modelo de negócio, que é muito focado na horizontalização versus verticalização, e fazer os negócios diminuírem em vez de crescerem e se fragmentarem em novos negócios. A Flag acelera em sua essência, no lugar que tinha desenhado para estar.

Crise traz mesmo oportunidades ou se trata apenas de uma ameaça?
Depende da crise. A que estamos passando tem diversos fatores, não é só por decisões políticas ou econômicas erradas, mas o mundo todo está passando por uma expansão muito rápida que, para mim, tem muito a ver com uma linha de pensamento que sigo: a ubiquidade da conectividade, ou seja, no momento em que o mundo começa a se conectar de alguma forma a consciência se expande e então muita luz, muito rapidamente, acaba entrando. E aí o primeiro momento é de medo, que gera o caos, mas logo depois a gente começa a compreender o que esse é o novo normal e quais são as novas variáveis. Mas isso está acontecendo de uma forma muito acelerada e é impossível que seja mais devagar porque quanto mais conexões, mais rápido passa o tempo e mais rápida é a transformação.

É muito difícil para as pessoas da nossa geração e da geração anterior, que foram educadas sob um pensamento mais linear, acompanhar todas as transformações que estão acontecendo. É isso que causa essa sensação de crise

Ao mesmo tempo em que isso acontece, muitas outras oportunidades são geradas porque crise é uma constante oportunidade de reinvenção. Mas a essência da discussão está justamente nessa pergunta, que não vai ser mais feita, já que esse tipo de situação vai ser meio que o novo normal.

Se você tivesse amanhã 1 milhão de reais para investir, o que faria com esse dinheiro?
Compraria um terreno no Second Life. Faz quatro anos que trabalhamos com realidade virtual, temos uma exposição dentro da Flag sobre isso, temos também uma palestra junto com a Marina Abramovic sobre esse assunto. O próprio Kurzweil, o fundador da Singularity University (eu e minha mulher, a Luisa, fazemos parte do board de investimento da Singularity), é entusiasta desse assunto. A Luisa esteve há cerca de um mês num jantar de fim de ano promovido pela Wired de Londres com 20 pensadores convidados para falar sobre as próximas grandes ondas de crescimento. Cruzando isso com o que a gente conhece, por ter proximidade com dois dos maiores players desse mercado, que são Samsung e Facebook, acredito que a realidade virtual é a próxima grande coisa, uma das próximas grandes tecnologias que vão influenciar muitas transformações culturais. Por esse motivo, estudamos isso há bastante tempo e desenvolvemos projetos.

Boa parte da população vai acabar vivendo em uma realidade que hoje chamamos de virtual, mas que pode ser uma realidade alternativa logo ali na frente

Os novos espaços, os novos mundo e as novas tecnologias para isso estão sendo criados agora. Quando digo comprar no Second Life, pode ser algo que de fato vá fazer sentido e vá dar muito dinheiro ali na frente, mas também pode ser uma analogia para ambientes virtuais, para investir ali e entrar em espaços que a princípio simulam o espaço em que vivemos hoje. A virtualização das experiências reais, para mim, é uma das grandes ondas de oportunidade então qualquer dinheiro extra iria para isso.

Se assumisse a presidência do Brasil em janeiro, no lugar da Dilma, o que faria no seu mandato até 2018?
Putz, não tenho a mínima capacidade para assumir essa posição, nem sei se algum dia vou ter. Ainda tenho que estudar muito para chegar aí, não tenho ideia do que fazer nesse lugar.

O que você faz para se manter motivado em tempos como esses?
Eu trabalho com o que amo, vivo rodeado de pessoas que amo e admiro, não paro de estudar. Faço várias coisas e tudo está voltado para redesenhar e repensar estruturas, desenhar o pensamento novo, modelos de negócio alternativo, hackear coisas o tempo inteiro, sejam estruturas, processos, ideias… Então não preciso de dose extra de motivação, por enquanto minha vida tem entregue isso por sorte também. Me manter motivado hoje é fazer mais ainda do que eu já estou fazendo.

O que você faz para motivar quem trabalha com você?
Acho que o que mais motiva as pessoas é fazer coisas incríveis no dia a dia, fazer com que todos sintam que estão fazendo coisas realmente novas, desafiadoras e sintam que as pessoas que estão liderando o processo estão colocando o coração e a alma também na história. Quando isso acontece, a energia potencial é natural e as pessoas se motivam.

Quais são os três pontos que mais lhe incomodam no ambiente de negócios brasileiro?
Aprendi, estudando no Japão, com um professor que liderava a indústria criativa lá, que a crise de inovação que aquele país vive hoje acontece justamente pelo pensamento muito tradicional, por não conseguir agir na velocidade do mundo, já que os japoneses respeitam muito as tradições e os laços que já foram criados. não dando espaço para novos laços serem desenvolvidos. No Sul do Brasil, de onde eu sou, existe muito esse pensamento e acaba atrasando o desenvolvimento porque não se dá espaço para questionar as verdades existentes e criar relações novas, mas não é só lá. Esse seria o primeiro ponto.

O segundo ponto é um problema mas também um espaço de oportunidade, que é a burocracia. Em um ambiente que precisa criar novos mecanismos o tempo inteiro é muito difícil. Estamos em um grupo de capital aberto, que é muito burocrático, e para conseguirmos acelerar nosso negócio dentro desse grupo tivemos que hackear vários sistemas, pensar maneiras de desenvolver estruturas tradicionais em outros formatos. Obviamente que quando estamos trabalhando em uma empresa privada, e criamos outro formato, há uma restrição inicial mas, depois que provamos que esse formato é melhor, as pessoas se movem. Porém, isso não acontece nas estruturas convencionais, governamentais, que são muito atrasadas, muito retrógradas, e muito do novo não pode ser implementado em função da burocracia.

O terceiro ponto é a ausência de ecossistema para viabilizar os novos modelos. Nos Estados Unidos existe todo um ecossistema que fomenta o pensamento do novo, a criação, as empresas, os parceiros, as estruturas para que o novo seja continuamente testado e provado. No Brasil, toda aposta parece que tem que ser muito certeira, existem poucos parceiros profissionais com experiência para fazer as coisas acontecerem e você precisa desenvolver todos os aspectos e criar seu próprio ecossistema.

O que você diria para quem está nos lendo agora e pensando em abrir a sua startup ano que vem?
Deveria fazer agora, deveria abrir 28 startups ano que vem, não uma só.

Este é o momento das principais oportunidades, de mudança

Se a pessoa tem o pensamento lógico apurado, sensibilidade grande e está sentindo isso tudo o que está acontecendo, sente que é o momento certo. É a hora do contrário do que é recomendado. Na crise, nosso corpo para e observa porque sente um pouco de perigo, mas para os empreendedores é o momento de pular, não de parar e observar. Então minha recomendação é que qualquer plano que esteja para sair, que saia logo porque esse novo momento é de transformação constante e se não sair de você vai sair de alguém porque é o que todo mundo está sentindo também.

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