O Razões para Acreditar fala dos prós e contras de ter se aproximado de empresas para conseguir se bancar

João Prata - 14 ago 2017Vicente, fundador do Razões para Acreditar, conseguiu há apenas 2 anos tornar seu projeto financeiramente sustentável.
Vicente, fundador do Razões para Acreditar, conseguiu há apenas 2 anos tornar seu projeto financeiramente sustentável.
João Prata - 14 ago 2017
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Quem diria que quase três anos após Vicente Carvalho conversar com o Projeto Draft, o dono da padaria onde foi realizada a entrevista se tornaria seu sócio do Razões para Acreditar, um site que só mostra notícias inspiradoras e que se tornou sustentável após começar a oferecer às empresas seu know-how de contar boas histórias.

O início, bem início mesmo dessa improvável parceria, se deu quando uma embolia pulmonar, uma trombose e uma parada cardíaca provaram por A + B + C que o empresário Marcelo Martins não estava no caminho certo. No final de 2013, após receber alta, ele abandonou a promissora carreira na indústria de perfumaria para abrir a Alegria Padaria Brasileira, no bairro do Paraíso, em São Paulo, com a proposta de comercializar produtos artesanais em um ambiente informal.

A história do Razões para Acreditar saiu no Draft pela primeira vez em 2014 (clique na foto para ler a reportagem).

A história do Razões para Acreditar saiu no Draft pela primeira vez em 2014 (clique na foto para ler a reportagem).

Nesta época, o designer Vicente Carvalho estava a todo vapor com o blog Razões para Acreditar, criado em agosto de 2012. Na busca por novas pautas, descobriu o empreendimento de Marcelo e conseguiu marcar a entrevista. Conheceu a padaria, adorou o local, publicou a reportagem com a história do futuro sócio em fevereiro de 2014 e virou cliente assíduo.

Tanto que sugeriu que a entrevista sobre seu blog para o Draft, em novembro de 2014, acontecesse em meio aos pães artesanais produzidos pelo antigo empresário dos perfumes e agora já era seu amigo. Vicente, na época, cuidava sozinho da publicação e estava começando a notar que sua ideia de divulgar notícias positivas poderia dar futuro, mas ainda não sabia como.

Ao Draft, contou naquela época que começara a fazer publieditoriais, mas estava preocupado em não perder a essência de conteúdo independente. Ainda foi todo mistério ao comentar os próximos passos, uma parceria com um publicitário carioca para produzir marketing social. O site tinha 400 mil visitantes únicos por mês e estava longe de garantir o sustento do então designer – sua renda era complementada com frilas de conteúdo para o Hypeness e produção gráfica para o Sebrae de Rondônia, onde vive a maior parte de sua família.

O criador do Razões para Acreditar é maranhense, mas a família foi para Rondônia logo em seus primeiros anos de vida. A mudança para São Paulo aconteceu há 15 anos, quando Vicente recebeu o convite para fazer pós-graduação no Instituto Europeo di Design. Mas não seguiu a carreira. Cansado das tragédias que estampavam as manchetes de jornais paulistas, teve a ideia de criar um espaço onde só fosse propagado notícias positivas.

O MARKETING SOCIAL ATÉ QUE PARECE, MAS NÃO É UM CAMINHO FÁCIL

O blog cresceu rapidamente, mas deu uma empacada justamente quando Vicente pretendia dar o primeiro salto, na parceria de marketing social. “Aquela história não foi para frente. Em 2014, quando a gente conversou, não considerava o Razões uma empresa. Era um site que estava começando a se conhecer enquanto negócio”, conta ao relembrar sua história.

Agora o Razões para Acreditar tem um novo logotipo, um novo sócio novos planos de negócio.

Agora o Razões para Acreditar tem um novo logotipo, um novo sócio, novos serviços — muitos planos.

Frustrado, alguns meses após a entrevista ao Draft, Vicente partiu para esfriar a cabeça em Londres, onde permaneceu por três meses. Quando voltou para São Paulo, soube que Marcelo estava insatisfeito com a padaria. O local dava os mesmos problemas dos tempos da perfumaria, vivia estressado com os funcionários, pensou na embolia, na trombose e na parada cardíaca… Decidiu vender o negócio e voltou a morar com os pais em Salvador, onde nasceu. “Fiquei dois meses lá. E todas as ideias que tinha estavam conectadas de alguma maneira com o Razões”, conta Marcelo.

O Razões ainda não era um negócio consolidado, mas já tinha um público cativo. Os dois mantinham contato, faziam projetos, vislumbravam possibilidades e procuravam uma maneira de ganhar dinheiro. Foi então, em abril de 2015, que Vicente convidou o amigo a voltar para São Paulo e se tornar sócio do site. Criaram uma nova marca para o Razões, agora representado por um beija-flor, e passaram a tentar posicionar a empresa no mercado. “Existe um dito popular oriental que se aparece o beija-flor na janela é que notícias boas estão vindo”, diz Vicente.

Marcelo não precisou investir, mas passou os primeiros meses sem ganhar um centavo. Tornou-se responsável pela parte comercial, enquanto Vicente se dedicava ao conteúdo do Razões e também à produção de textos para o 99Jobs, empresa que passou a colaborar assim que voltou de Londres.

COMO TORNAR O SONHO SUSTENTÁVEL?

Eles sabiam que os publieditoriais do site e as propagandas exibidas em banners não seriam suficientes para sustentá-los. Por isso, passaram a prospectar empresas e a oferecer criação de conteúdo que ajudasse humanizar a marca, o marketing de causa. O primeiro indício de que estavam no caminho certo veio uns meses depois. Em agosto de 2015, venderam um projeto de conteúdo audiovisual para a Johnson & Johnson, destinado ao Dia dos Pais. A ideia era ensinar pais a fazerem penteados para suas filhas. “Foi uma loucura. A Johnson aceitou o projeto a uma semana da data de publicação. Saímos enlouquecidos. Gravamos em uma sexta-feira, editamos no sábado e foi ao ar no domingo. A Johnson precisou aprovar sem ver. Eles viram o roteiro e só. Mas amaram. Foi o primeiro grande case”, conta Vicente.

Marcelo Martins teve a história de vida contada no Razões antes de tornar-se amigo e sócio de Vicente.

Marcelo Martins teve a história de vida contada no Razões antes de tornar-se amigo e sócio de Vicente.

Na época, cobraram 25 mil reais para a produção do conteúdo, que também incluía texto e posts nas redes sociais. Foi também quando a luz se acendeu de que havia uma maneira de conseguir sobreviver apenas do seu sonho. Meses depois, criaram novo projeto para a multinacional, desta vez com o tema voltado para o Dia das Crianças. Conseguiram fechar 2015 com um faturamento de 152 mil reais e assim, finalmente, Vicente conseguiu dispensar os outros trabalhos e se dedicar exclusivamente ao Razões.

Em 2016, o negócio deslanchou e dobrou o valor arrecadado. Conquistaram novos clientes, como Jequiti Cosméticos, Reserva, Instituto Ayrton Senna, entre outros. O site também seguia firme e forte, mas agora havia uma maneira de viabilizá-lo financeiramente. A meta deste ano é triplicar o que conquistaram no ano inicial da nova sociedade. E, claro, sin perder la ternura jamás. “Todos os projetos têm a ideia de inspirar as pessoas de alguma forma. Nossos projetos para empresas não mostram necessariamente o produto que a marca vende. A assinatura da empresa aparece só no final. É legal porque é uma forma de aumentar a visibilidade da marca sem fazer propaganda”, diz Vicente, e destaca onde está, a seu ver, o ponto de equilíbrio:

“Entramos nesse universo de contar histórias inspiradoras para nós e para a marca. Se for algo que a gente não acredita, não rola”

Já aconteceu de a dupla recusar trabalho. Vicente lembra de um projeto oferecido a um cliente sobre Dia dos Namorados. O roteiro e o casting foram aprovados, o material foi produzido, mas quando chegou na hora de publicar, o CEO da empresa pediu que editassem o material. Os dois sócios do Razões entenderam que o corte tiraria o significado da proposta e optaram por romper com o cliente. Para não ficar no prejuízo, fizeram um crowndfounding, e publicaram o vídeo de maneira independente. Sem assinatura no fim.

O CAMINHO CERTO TAMBÉM TEM OBSTÁCULOS

“Em dez dias, arrecadamos 8 mil reais e pagamos os custos do projeto. A gente não se curvou, sabe? A gente prefere fazer isso do que depois não conseguir dormir. Nós somos flexíveis com todos os clientes. Se falassem antes, tudo bem, a gente até poderia ver uma maneira de adaptar. Mas depois… Achamos que seria uma falta de consideração com as pessoas, e também ia contra o que a gente acredita”, conta Vicente.

O Razões, portanto, hoje funciona em duas frentes. O site tem seu conteúdo atualizado diariamente e corresponde a 10% do faturamento da empresa. E há o que Marcelo e Vicente chamam de Agência: o marketing de causa para outras empresas. O site tem uma média de oito reportagens inéditas por dia e uma audiência que bate quatro milhões de páginas visualizadas por mês, com uma média de um milhão de visitantes únicos no mesmo período. “Duas vezes por semana fazemos reportagens especiais, com entrevistas exclusivas”, diz Marcelo.

A novidade mais recente da página é a parceria de conteúdo com o Terra, que tem três meses. O portal chama as matérias do Razões na home do portal e ajuda a divulgar nas redes sociais. Em relação ao conteúdo, o Razões passou faz alguns meses a produzir vídeos exclusivos. Vai ao ar uma vez por semana, tem a duração média de dois minutos e a mesma proposta de ser inspirador.

Os planos não param por aí. O site está para colocar no ar um e-commerce com parceiros e também com finalidade social. Marcelo fala da estratégia, que está sendo implementada sem pressa:

“A ideia é que o e-commerce venda produtos e destine parte da renda para alguma instituição ou causa”

Atualmente, o modelo de negócio é bastante enxuto. O Razões para Acreditar não tem sede fixa e os funcionários são terceirizados. O número de pessoas trabalhando varia de projeto para projeto. No site, dois estagiários caçam possíveis conteúdos pela internet e Vicente faz a edição. As reportagens especiais são feitas por jornalistas freelancers.

Há também outras ideias, ainda no papel, em contato com outros parceiros, que devem sair nos próximos meses. “Queremos oferecer cursos. Cursos de temas inspiradores. Dos mais variados. Nosso conceito é muito abrangente, dá para crescer para todos os lados. Por isso que ainda não posso dizer que encontramos nosso modelo de negócio. Acho que vamos estar sempre em busca de um novo modelo”, afirma Vicente.

Marcelo concorda. Hoje com 40 anos recém-completados, diz que sua saúde vai bem melhor, pois conseguiu viver daquilo que gosta. Como o conteúdo é digital, voltou a morar na Bahia, em Lauro de Freitas, e vem a São Paulo uma vez por mês. Vicente tem 32 anos, vive em Santa Cecília, em São Paulo, e não para de criar. Nas poucas horas de entrevista, a dupla teve algumas novas ideias de possíveis novas frentes para o Razões — que nunca deixou de acreditar.

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