“Se a meta for dinheiro, você se perde pelo caminho, desiste na primeira dificuldade”

Giovanna Riato - 1 dez 2015
Tallis Gomes deixou o comando executivo da Easy Taxi para investir e ajudar a criar novas empresas. Ele conta o que aprendeu.
Giovanna Riato - 1 dez 2015
COMPARTILHE

É difícil acompanhar o raciocínio rápido de Tallis Gomes, que, aos 28 anos, já tem uma empresa que atua em 35 países, com 1,3 mil funcionários diretos e 18 milhões de usuários, a Easy Taxi. Ele é daquelas pessoas que parece falar na mesma velocidade com que pensa. Ouvi-lo contar seus planos e visão de negócios dá a sensação de que ele já tem um quebra-cabeças pronto em mente, que se torna mais real a cada empreendimento e iniciativa em que coloca as mãos.

A peça número um deste mural é a Easy Taxi, empresa criada em 2011 e o primeiro empreendimento de grande impacto do Tallis. Como contou em sua primeira entrevista para o Draft, o caminho para transformar a ideia no serviço de sucesso que existe hoje foi longo, mas trouxe o aprendizado que ele precisava. Com tudo nos trilhos, o negócio amadurecido e essa vitória no currículo, no fim do ano passado ele decidiu deixar o cargo de CEO da própria companhia, mantendo apenas a participação acionária e cadeira no conselho administrativo. Aos renunciar da função de gestor, ganhou espaço para dar mais atenção ao seu lado mais pulsante: o de empreendedor e visionário. É o Tallis hiperativo e sonhador colocando as coisas para acontecer.

A INOVAÇÃO NÃO FLORESCE ONDE NÃO HÁ PROPÓSITO

A gama de novas atividades de Tallis inclui a função de membro do conselho de administração do Hotel Urbano desde agosto deste ano, jovem empresa de 650 funcionários que segue em franca expansão. “Eles são muito bons. Serão o primeiro unicórnio brasileiro, a primeira startup que deve atingir valor de mercado de um bilhão. Tenho aprendido muito”, diz, empolgado com nova experiência depois de 13 anos na posição de empreendedor, fundando e desenvolvendo negócios. “Estou acostumado a fazer, mas no Hotel Urbano é só pensar e sugerir. A ação fica nas mãos do executivo.”

Tallis está acostumado a falar em eventos de inovação e também presta consultorias na área, para grandes empresas.

Tallis (acima, na Campus Party de 2013), está acostumado a falar em eventos de inovação mas também presta consultorias para grandes empresas nessa área: “O que falta é propósito”.

No fim das contas, ele aponta que tudo é uma grande troca de ideias. E de ideias valiosas, de CEO para conselheiros, todos navegando nas águas incertas das startups brasileiras. Tallis exercita a visão com grandes companhias também, para quem presta consultorias de inovação, serviço sobre o qual prefere não entrar em muitos detalhes, afinal, são os novos negócios e sua capacidade de transformação que fazem seus os olhos brilharem.

Como consultor, ele diz que o desafio é vencer a cultura que desestimula a busca pelo novo. Tallis acredita que a prática de cada funcionário defender seu cargo, com dirigentes punindo qualquer erro, faz com que ninguém tente nada além do usual.

É justamente desse ambiente tóxico que Tallis foge — e tenta arrastar quem está ao seu redor. Na visão dele, falta propósito para as empresas: “Em geral as companhias sabem o que fazem no mercado e sabem como fazer. A questão é que poucas entendem o porquê de fazerem o que fazem”.

Para ele, esta é a questão chave que qualquer empreendedor ou organização devem responder. “Todos os grandes começam o seu negócio com um propósito. Organizações exponenciais partem da vontade de resolver um problema”, diz.

SEU ATUAL NEGÓCIO, A SINGU, QUER SER O UBER DA BELEZA

Toda a bagagem da Easy Taxi e o conhecimento adquirido com outros negócios viram matéria-prima nas mãos de Tallis. Ele decidiu colocar esta energia na Singu, seu novo projeto, voltado ao mercado de beleza e bem estar. A função é simples: conectar profissionais destas áreas com os clientes. “É como se fosse um Uber da beleza”, compara. A plataforma opera desde julho deste ano em website. “Não quero cometer o mesmo erro que fiz com a Easy Taxi de lançar o aplicativo cedo demais e ter de substituir depois, perdendo as avaliações dos usuários”, diz Tallis. A ideia é amadurecer o negócio e, aí sim, criar um aplicativo definitivo até o fim deste ano.

Com a Singu, diz Tallis, uma médica que entra no plantão às sete da manhã, consegue fazer as unhas às seis da manhã, em casa. Para ele, todos que usam a ferramenta saem ganhando. A manicure passa a ter domínio sobre a sua maneira de ganhar dinheiro, deixando de depender de um empregador para ser a plataforma de seu trabalho. Já a cliente ganha comodidade. A gama de serviços, além de manicure e pedicure, inclui penteado, maquiagem e massagem. O plano é, em breve, investir no atendimento ao público masculino, que poderá fazer cabelo e barba em casa com a empresa. Tallis afirma que é “serviço de luxo com preço de salão de bairro”.

Para fazer pé e mão em casa com uma profissional da Singu, por exemplo, é necessário desembolsar 70 reais. Não é exatamente o preço mais amigo que as clientes vão encontrar, mas certamente mais acessível do que o mesmo serviço em um salão de luxo, onde Tallis estima que seja necessário desembolsar 120 reais. As profissionais de beleza e bem-estar – chamadas de “artistas” na empresa – passam por treinamento para que ofereçam atendimento singular, o “atendimento Singu”. Devagar, a empresa também quer se firmar no segmento B2B. Assim, os escritórios acostumados a receber manicures para fazer as unhas das funcionárias, poderão contratar a Singu. “Isso isenta a companhia de qualquer risco trabalhista”, diz.

Ele afirma que, assim como outras empresas da era Uber, a Singu tampouco tem qualquer vínculo trabalhista com as profissionais. Na prática é o oposto, é como se as manicures e cabeleireiras contratassem o serviço da companhia para divulgar seu trabalho e conquistar mais clientes. Elas pagam uma taxa de 30% do valor que ganham. Tallis assegura que parte deste porcentual as profissionais recuperam em treinamento, o que agrega valor ao trabalho oferecido por elas. “É bem mais justo do que o cobrado em salões, no qual elas ficam normalmente com 50%.”

Tallis conta que a Singu, por ora, opera apenas no desktop. A versão em aplicativo deverá ser lançada quando o serviço estiver mais amadurecido.

A Singu (do site acima) por ora opera apenas no desktop. Para evitar erros cometidos com a Easy Taxi, a versão em aplicativo só será lançada quando o serviço estiver bem amadurecido.

O empreendedor conta que os primeiros resultados são positivos. A Singu tem 12 funcionários e “algumas centenas” de profissionais cadastradas, número que deve crescer nos próximos meses. A vantagem é que, diferente do segmento de táxis, em que o cliente pede e o carro tem de chegar na hora, os serviços de beleza podem tranquilamente ser agendados para o dia seguinte. Dessa forma, mesmo sem base tão grande, dá para garantir eficiência. Para as profissionais, o agendamento é feito por geolocalização. Elas conseguem passar o dia em determinada região da cidade, sem grandes deslocamentos e com mais produtividade.

OUSADIA E PLANEJAMENTO PARA ENTRAR NUM NOVO MERCADO

Ao mergulhar na nova empreitada, Tallis pesquisou o segmento e buscou o que considera serem os parceiros certos: Marcela Gianella, 23, Alexandre Gareffa, 33, e Pedro Nunes, 27, compõe o time de sócios. Pedro é filho de Wanderley Nunes, o dono do Studio W, um dos salões mais conhecidos do Brasil, com uma longa lista de famosas entre as clientes. O mercado que Tallis vislumbrou movimenta 100 bilhões de reais por ano no Brasil, com 1,7 milhão de profissionais atuando nele. O CEO da Singu conta que o país é hoje o terceiro no mundo em consumo do setor de beleza.

A ambição de revolucionar um mercado desta proporção é ousada até mesmo para Tallis. “Sei que a Singu vai ser um dos negócios da minha vida. O potencial é muito grande, com capacidade de impacto mundial”, diz. De fato, o plano é internacionalizar a empresa, entre o fim de 2016 e o começo do ano seguinte. Tallis investiu do próprio bolso 1 milhão de reais na Singu. Ele estima que este é o valor necessário para custear os primeiros 10 meses de operação, período em que pretende ajustar o modelo de negócio e as ferramentas para, então, partir para a oferta em grande escala:

“Escalar não é difícil. O difícil é criar um negócio escalável”

Nesta primeira etapa, a atuação da Singu está restrita a São Paulo e ao Rio de Janeiro, e a expansão pelo país deve acontecer ao longo de 2016. O objetivo de Tallis é financiar esse processo com a rentabilidade da própria empresa, sem captar investimento. “Se não der certo vamos buscar, mas gostaríamos de manter assim, de conservar a participação de cada sócio”, afirma.

O NEGÓCIO É MELHORAR O MUNDO FAZENDO MAIS PESSOAS GANHAREM DINHEIRO

No quebra-cabeças de Tallis, a Singu é bem mais do que um simples negócio. É a chance de empoderar as pessoas financeiramente, de oferecer fonte de renda àquelas que perderam seus empregos. É esse, ele diz, o foco do mineiro natural do pequeno município de Carangola: criar negócios capazes de promover o bem-estar social. “Uma manicure que trabalha com a gente estava comemorando que, com a Singu, tinha conseguido ganhar 3,5 mil reais em um mês. Ela disse que não imaginava poder fazer esse valor com o trabalho dela até então”, conta.

Em visita à Samsung, na Coreia do Sul, onde viveu na época em que estava internacionalizando a Easy Taxi.

Em visita à Samsung, na Coreia do Sul, onde viveu na época em que estava internacionalizando a Easy Taxi.

“Se o foco for dinheiro, você desiste na primeira dificuldade. É preciso ter propósito. Quem tem propósito persegue essa lanterna indicando o objetivo lá na frente. Você vai atrás até dar certo”, diz ele. Se o exemplo for a trajetória empreendedora de Tallis, a dica parece mesmo funcionar. Ele conta que só foi ganhar dinheiro depois de muita labuta como empreendedor, apostando nas próprias ideias. “Sempre fui muito sonhador, dizia quando era mais novo na minha cidade, que um dia criaria uma multinacional”, conta.

A hiperatividade de Tallis vem de cedo. Na infância ele era bagunceiro, mas já se incomodava de ver a pobreza na sua cidade, os amigos sem os mesmos recursos que ele:

“Sempre fui muito questionador, mas no Brasil não somos criados para fazer algo grande, transformador”

Parte do incentivo para não assumir o complexo de vira-lata vem da experiência de Tallis em outros países. Ele morou na África do Sul em 2006 para aprender inglês. Mais tarde, para internacionalizar a Easy Taxi, viveu na Colômbia, no México e na Coreia do Sul. Esta última foi a experiência mais marcante. “É impressionante o projeto de educação do país. Por lá 80% da população tem curso superior.” Ver o que é possível lá fora ajudou Tallis a pensar em como contribuir para o Brasil. “Minha vida é baseada em criar bem-estar social através dos negócios. Que eles sirvam como contribuição direta para melhorar o país, para empoderar pessoas para que elas escolham como ganhar dinheiro”, diz.

Os resultados dos negócios de Tallis até agora mostram que há espaço para sonhar alto. O objetivo de vida do mineiro é grande: “Quero impactar diretamente 1 bilhão de pessoas antes de morrer”, afirma, de olho em beneficiar nada menos do que um sétimo da população mundial. “Vou ter de fazer muitas Singus ainda para chegar a este número”, brinca. Soa pretensioso mas, ainda assim, quem duvida que ele possa completar o quebra-cabeças?

DRAFT CARD

Draft Card Logo
  • Projeto: Singu
  • O que faz: Conecta clientes a profissionais de beleza e bem-estar
  • Sócio(s): Tallis Gomes, Marcela Gianella, Alexandre Gareffa, e Pedro Nunes
  • Funcionários: 12
  • Sede: São Paulo
  • Início das atividades: julho de 2015
  • Investimento inicial: R$ 1 milhão
  • Faturamento: NI
COMPARTILHE

Confira Também: