Sobre construir pontes entre marcas e histórias de inovação: como é ser editor de brand content do Draft

Bruno Leuzinger - 31 ago 2017Bruno Leuzinger, editor de Brand Content do Draft.
Bruno Leuzinger, editor de Brand Content do Draft.
Bruno Leuzinger - 31 ago 2017
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por Bruno Leuzinger

“’O pensamento voa e as palavras andam a pé’, assim definiu Julien Green o drama de todo escritor. Quando fala de trabalho, o paulistano Paulo Silveira, de 35 anos, adota um discurso veloz, impondo às palavras o ritmo acelerado de seu pensamento…”

Foi assim que abri o meu primeiro texto publicado (em 21/8/2015) no Draft, que dali a dez dias completaria um ano – e hoje, três.

Aquela reportagem contava a história do Paulo Silveira e da origem de sua Casa do Código, uma editora de livros digitais sobre linguagens de programação e temas afins, com títulos divertidos (pense em Cangaceiro JavaScript), e que naquele momento queria ampliar seu portfólio e engajar novos autores interessados em escrever sobre design thinking, business model canvas e outras ferramentas da economia criativa.

Como alguém que até então vinha trilhando uma carreira na imprensa mainstream, focado no chamado jornalismo de serviço, trabalhando com críticas gastronômicas, reportagens de turismo e roteiros culturais (passei três anos, por exemplo, testando os limites de regeneração do meu fígado como crítico de bares de uma revista mensal), de repente poder ouvir e contar a história do Paulo, um cara graduado em ciência da computação que resolveu empreender publicando e-books sobre Java, Front End, UX Design… Bom, digamos que foi uma experiência nova.

Havia outra novidade importante, para mim: o logotipo da editora, encimando o título da matéria, informando que o texto era um “Conteúdo Casa do Código”.

O Draft foi a minha primeira experiência com brand content. Perdi a virgindade

Diferentemente do jornalismo, que requer (ou deveria) independência editorial, o brand content está sujeito, por definição, à chancela de uma empresa. A pauta está sempre ligada a temas ou valores vinculados ao cliente, que aprova o conteúdo antes de sua publicação. Mas as técnicas empregadas para apurar e escrever um texto são exatamente as mesmas. E a clareza visual no posicionamento da marca da empresa transparece a relação para o leitor.

Porque esse é um ponto-chave: transparência. Na relação com os leitores, com os clientes e com os entrevistados.

Nesses meus dois anos de Draft, escrevi e editei textos de brand content para quase duas dezenas de marcas – de cerveja a uísque, de indústria farmacêutica à petroquímica. Marcas que procuram o Draft para contar histórias sobre gente que empreendeu criando um produto ou modelo de negócio revolucionário. Ou gente que revolucionou a própria vida, vencendo barreiras sociais, os limites do corpo ou “apenas” e simplesmente a inércia, que é talvez a força mais poderosa do universo.

Criamos pontes com as empresas. Vamos até elas, escutamos o que elas têm a dizer, e como elas querem dizer

Trocamos ideias, afinamos expectativas, damos sugestões. Oferecemos a essas empresas – de startups empolgantes que tiraram o CNPJ anteontem a gigantes corporativas que dominam com folga seus mercados – uma plataforma alternativa de comunicação com a sociedade. Uma plataforma para uma comunicação menos amarrada e institucional. Mais livre, direta e despojada.

Um desafio, às vezes, é alinhar a voz do Draft com o tom que o cliente quer dar ao texto. O que pode variar conforme o perfil da empresa. Nessas horas, seria bom poder personificar heterônimos, seus estilos e expertises, à moda de Fernando Pessoa. A pauta pede um texto caudaloso, hiperexpressivo? Aciona o Álvaro de Campos. O cliente prefere um texto mais contido, milimétrico? Chama o Ricardo Reis. O conteúdo deve ter uma pegada mais aspiracional? Alberto Caeiro, por favor.

Parênteses: como é sabidamente duro viver de poesia, Pessoa ganhou um troco, numa fase da vida, escrevendo publicidade para uma marca de tintas automotivas e chegou a criar um slogan para a Coca-Cola (!), que tentava então entrar no mercado português: “Primeiro estranha-se. Depois entranha-se”. O slogan causou, digamos, estranhamento e não vingou (hoje, o poeta provavelmente faria brand content).

Nesse tempo de Draft, não cheguei a psicografar uma entrevista com Pessoa. Mas ouvi pessoas. Contei histórias.

Histórias como a do Júlio Oliveto, engenheiro mecatrônico e empreendedor de São José dos Campos (SP), que inventou um dispositivo que se acopla a qualquer cadeira de rodas manual, transformando-a instantaneamente num triciclo elétrico e motorizado. Histórias como a da Marinalva de Almeida, que nasceu no Noroeste do Paraná, ralou como bóia-fria na infância, perdeu a perna num acidente aos 14 anos e depois virou a primeira mulher a completar a São Silvestre de muletas (depois do nosso texto no Draft, ela participou do BBB17). Histórias como a do Onício Leal, biomédico pernambucano, criador de uma ferramenta colaborativa para mapeamento de surtos epidemiológicos que bombou durante a Copa do Mundo de 2014.

Pessoalmente, o mais bacana de ler e escrever para o Draft é a possibilidade de apre(e)nder o novo, a cada pauta

Redescobrir continuamente a enorme dimensão da minha própria ignorância. Que não é só minha, claro, e é condição básica para a curiosidade. “Draft”, em inglês, é esboço, rascunho, projeto. Algo em andamento, work in progress. Gosto dessa ideia. Gosto da visão otimista do Draft (um otimismo que contraria um pouco a minha natureza, por temperamento e credo futebolístico), uma visão redentora do empreendedorismo e de seu poder de melhorar o mundo.

O pensamento voa e as palavras andam a pé.” A frase lá do topo, emprestada do Julien Green (e que resume, admito, todo o meu conhecimento sobre o seu autor), expressa o desafio de capturar por meio da escrita essas coisas essencialmente velozes, fugazes e intangíveis que são os pensamentos.

É também o desafio de quem acompanha profissionalmente o cenário fervilhante do empreendedorismo, hoje. Correr atrás das histórias de quem corre atrás das ideias.

Seguiremos correndo, todos. Em frente, embora nem sempre em linha reta.

 

Bruno Leuzinger é editor de Brand Content do Draft.

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