Por Gabriel Borges
O TEDGlobal 2014 está sendo realizado nesta semana no Rio de Janeiro. É a primeira iniciativa dos organizadores do TED na América do Sul. O tema do evento não poderia ser outro: “South!”. E eles fazem questão de chamar atenção para o ponto de exclamação ao final. Talvez porque estejam entusiasmados com o que estão (re)descobrindo por aqui.
A jornada da terça, 7 de outubro, dia inaugural do TED no Brasil começou com uma boa dose do tempero latino. Guiado pelo tema Stories, o primeiro painel explorou histórias do continente. Dentre elas, ouvimos sobre a importância persistente de Bolívar como símbolo de libertação local; lendas de um rio peruano com água fervente que inspiraram um geógrafo em sua pesquisa de doutorado; os bastidores da campanha publicitária colombiana que tenta promover a redenção voluntária de guerrilheiros das FARC; e a visão de mundo do líder da tribo nativa da Amazônia Yawanawá.
Histórias muito distantes, mas, talvez, com um grande elo de conexão entre elas: o jeito apaixonado dos latinos de se envolverem em tudo que realizam sem perder suas identidades. Quem provavelmente conseguiu condensar a sessão com um recado poderoso para a comunidade multinacional dos TEDsters foi o chefe Yawanawá ao declarar: “não preciso deixar de ser eu para imitar vocês”.
A proposta de que estamos precisando de um Digital Reboot foi o tema do segundo painel. As cinco apresentações tiveram como assuntos dominantes as oportunidades da internet em se tornar um meio de democratização das forças públicas e os impactos provocados pela rede às questões de nossa privacidade. Ouvimos histórias envolventes como a do partido político da internet criado na Argentina; do serviço de e-mails encriptografados que está sendo criado pelos cientistas do CERN em suas horas vagas, o ProtonMail; ou das incríveis mobilizações sociais promovidas por pequenos grupos através da plataforma MeuRio.
Neste painel, também fomos anestesiados com as afiadas opiniões do jornalista Glenn Greenwald – aquele que ajudou a amplificar as revelações de Snowden – sobre a legitimidade das pessoas se preocuparem com suas privacidades, mesmo quando não têm nada a esconder. A grande lição do painel é a de que parece que ainda estamos aprendendo o que fazer com um mundo onde a internet e a tecnologia são dominantes. Como se estivéssemos saindo da era em que nos deslumbramos com as possibilidades da vida conectada e entrando num momento de entender como acomodar todas essas transformações em nosso cotidiano.
O terceiro e último painel do dia propôs o tema Crossing Borders. As histórias compartilhadas na sessão exploraram a ideia de que fronteiras não existem. Elas são inventadas apenas como tentativas de simplificar a complexidade do convívio social. E que suas principais consequências, ironicamente, são justamente trazer mais complexidade para nossas relações. Foi o que José Padilha mostrou ao narrar as relações dos policiais com os traficantes cariocas; o que Ethan Nadelmann relatou em sua batalha para fomentar as discussões sobre a legalização das drogas nos Estados Unidos; e o que o economista Dilip Ratha expô sobre suas reflexões sobre as dificuldades dos imigrantes de enviar as riquezas que constroem para seus familiares em seus países de origem.
Provavelmente, não foi à toa que a escritora Taiye Selasi foi deixada para fechar esse painel e o dia. De uma maneira suave, mas incisiva, ela compartilhou suas aflições em definir se sua real origem é inglesa, nigeriana ou ganesa (países das raízes de seus familiares). Afinal, como ela bem disse, quando fronteiras são apenas invenções, mais importante do que nos perguntamos de onde viemos, é nos questionarmos sobre onde nos sentimos à vontade como locais.
O evento continua até sexta-feira, mas já nos dá uma sensação de precisaremos de bom um tempo (e de algumas conversas de bar!) para digerir tudo que já foi visto por aqui. Enviarei diariamente a vocês minhas impressões sobre o TEDGlobal 2014: South!, diretamente daqui das areias de Copacabana.
Gabriel Borges, da Ampfy, voltou do Lift, na Suíça, com uma reflexão no bolso - não é a inovação, é a realização; não são as novas ideias, mas sua execução; não é a comunicação e a publicidade, mas a experiência do usuário com o produto e com a empresa.