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Tudo que aprendi sobre administração de empresas (assistindo televisão)

Eduardo Vieira - 3 mar 2015 Edu Vieira, da Ideal: os poderosos – e frágeis – protagonistas das séries de TV ensinam um bocado sobre a vida profissional
Edu Vieira, da Ideal: os poderosos – e frágeis – protagonistas das séries de TV ensinam um bocado sobre a vida profissional
Eduardo Vieira - 3 mar 2015
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Por Eduardo Vieira

Todo mundo sabe que o cinema vem perdendo em charme, talento e preferência do público para as séries de TV. O que pouca gente se dá conta, no entanto, é que a influência que os seriados vêm exercendo na cultura do século XXI está extrapolando o mundo do entretenimento. Por conta dos carismáticos protagonistas da telinha, chegou até a cultura das empresas.

Se antes a figura icônica, caricata e definitiva de um mandachuva do mundo corporativo era o superlativo e poderoso Vito Corleone, hoje ela é representada pela truculência doce de um Tony Soprano ou pelo autodestrutivo Walter White, de Breaking Bad. Se antes o exemplo maior de agressividade empresarial era o inescrupuloso Gordon Gekko, de Wall Street, hoje está na arrogância frágil de Don Draper, de Mad Men – com doses homeopáticas da inocência violenta de Dexter Morgan (um serial killer, óbvio).

Qual deles é o seu chefe? Qual deles você quer ser quando crescer?

Antes de responder (e eu vou adorar ouvir a sua resposta), me permita tentar compartilhar aqui o que eu aprendi com cada um desses caras. Sim, eu tento aprender com os seriados de TV. Sou daqueles aficionados que não se contentam em somente assistir às duas temporadas de House of Cards de uma vez, varando madrugada ou emendando o sábado no domingo. Sou o tipo de fanático que se preocupa em entender o que se passa na cabeça do Kevin Spacey na hora de interpretar aquele cara. Que perde o sono tentando responder qual empresa da vida real é a maldita SanCorp. E que se dedica arduamente a tentar reproduzir o raciocínio e os atos do Frank Underwood (o nome do personagem vivido brilhantemente por Kevin) no dia-a-dia da empresa que administro.

É, eu tenho uma empresa. Depois de 12 anos de carreira como jornalista, resolvi largar tudo e abrir uma agência de comunicação/digital/relações públicas/publicidade/conteúdo/whatever. E ser empresário é aquela coisa: ao mesmo tempo em que a bola está contigo, e que você se tornou o dono da bola, num jogo (ou em posições) que você nunca jogou antes, você precisa marcar os gols, vencer as partidas e ensinar os outros a jogar, a marcarem gols também (ou ao menos a não sofrerem muitos gols), tudo ao mesmo tempo. Piece of cake, #sqn. Por isso cada empresário necessita de inspiração. Venha ela de onde vier.

Com Tony Soprano eu aprendi que, no mundo corporativo, o arrogante de nariz em pé, na grande maioria dos casos, não manda picas. O cara que manda pode ser simplesmente o bonachão do seu vizinho, que finge viver uma vida normal – mas que opera uma agenda pessoal maquiavélica.

As minhas principais epifanias vêm de Tony. Poderia ser o Kroos ou o Mendez ou o Manero ou o Ramos. Mas meu Tony é o Soprano. Ao longo das vinte e cinco vezes em que assisti a saga completa da Família Soprano, descobri que o poderoso chefão não precisa ser o Marlon Brando de smoking, com algodões na bochecha, resguardado numa salinha, esperando receber beijos na mão. O cara que manda pode ser simplesmente o bonachão do seu vizinho, que finge viver uma vida normal e trabalhar “no ramo de coleta de lixo”. Com o Tony eu aprendi que, no mundo corporativo, o arrogante de nariz em pé, na grande maioria dos casos, não manda picas.

Outra coisa que o Tony me ensinou é que a influência da família na sua carreira é maior do que você pensa. Minha geração tende a separar a carreira da família. Fomos educados assim, deixando na rua os assuntos do trabalho e conversando qualquer outra coisa dentro de casa – sem deixar um ambiente contaminar o outro. Tony me mostrou que essas coisas se misturam, e muito. Graças a ele eu acredito que não dá para ter uma vida plena sem compartilhar as vitórias, empates e derrotas da carreira com aqueles que você ama na sua casa.

Outra inspiração das boas é Jack Bauer. Uma das aquisições de que mais me orgulho é um bonequinho de mesa do Jack enfiando o pé na porta, que eu comprei nem-me-lembro-onde. O agente da CTU (Counter Terrorist Unit, em bom português) me ensinou que é preciso ser agressivo no trabalho, ainda que esse conceito tenha mudado para mim ao longo do tempo – por vários anos o bonequinho esteve em cima da minha mesa; hoje ele está na estante, veja que curioso.

Antes eu achava que ser agressivo no trabalho significava sair quebrando tudo, arrebentando e fazendo whatever it takes para atingir um objetivo, como diria o próprio Jack. Hoje acredito que ser agressivo é agir rápido e com assertividade para não perder oportunidades. (Melhorou, vai…) De um jeito ou de outro, Jack me lembra que não dá para ficar esperando a vida passar no trampo. É preciso ser proativo, ir atrás, querer ser protagonista da própria carreira e cultivar o genuíno desejo de salvar o mundo. Mesmo que, no final, você não seja reconhecido por isso. Ou que o mundo simplesmente não possa ser salvo.

Dexter me ensinou que, por trás de um almofadinha de fala mansa e aparência frágil pode existir um verdadeiro animal. Em todos os sentidos possíveis.

Uma “evolução” dessa agressividade do Jack vem do Dex. Não, não estou dizendo que a vingança perfeita para aquele colega de trabalho que você odeia é amarrá-lo numa mesa com fita transparente (hum), matá-lo a facadas (hummm) e depois cortá-lo em pedacinhos antes de jogar a sua carcaça no mar (hummmmm!!!). Quero dizer que existe em Dexter Morgan uma ternura que dá a ele uma característica única, o que a minha avó Alcinda chamaria de “lobo em pele de cordeiro”. Esse verniz que muitas vezes está presente nas pessoas aparentemente inofensivas é um dos truques que mais dão certo no mundo corporativo. Dex me ensinou que, por trás de um almofadinha de fala mansa e aparência frágil pode existir um verdadeiro animal. Em todos os sentidos possíveis. Desde então, descobrir a verdadeira agenda de cada pessoa se tornou o objetivo principal de cada reunião de que participo. Tenho me divertido horrores.

Outra lição valiosa vem do professor de química mais amado e odiado da história. Pense um pouco na figura de Walter White. Ele fez todo o tipo de cagada possível. Barbaridades mil. Acabou com sua família, amigos, e com sua própria vida. Mas, no final das contas, ele resolveu a situação. Teria sido mais fácil desistir, mas ele nunca se entregou. Teria sido mais fácil sumir com uma nova identidade, mas ele voltou para assumir suas responsabilidades. Mr. White me ensinou, com seu exemplo extremo, que é preciso ter determinação e flexibilidade para cumprir um objetivo. Um das coisas mais difíceis para um empreendedor é manter o sangue-frio ao longo de uma trajetória longa. Seja na hora de fazer um projeto para um cliente, numa negociação ou mesmo na vida – pois as coisas mudam e você precisa estar preparado para circunstâncias absolutamente impossíveis de prever. Com Walter White aprendi que todo bom executivo deve ter sua parcela Heisenberg dentro de si.

Por fim, não poderia esquecer o Don. Ele é para mim a síntese do executivo moderno: poderoso por fora e frágil por dentro. Don Draper pode estar destruído emocionalmente, mas brilha no trabalho. Não sabe direito quem é, mas quando entra na agência, se descobre. Usa a arrogância como escudo e, quando questionado, simplesmente foge (quem conhece um colega ou chefe assim põe o dedo a-qui, que já vai fe-char). Saber lidar com esse paradoxo é a arte mais importante de quem trabalha com pessoas, pois mostra que por trás de todo sucesso existe uma fragilidade que é inerente a todos nós.

Uma das grandes vantagens de ser empreendedor é saber que, se você trabalhar direito, sua empresa pode não ter limites. Mas a grande lição de Don, talvez a mais importante que já aprendi, é que VOCÊ sempre terá limites. E é preciso conhecê-los. Até mesmo para desrespeitá-los.

 

Eduardo Vieira, 38, é sócio-fundador da Ideal, agência que cuida da gestão de reputação de empresas como Nike, Facebook, Diageo, Whirlpool, Dell, GE e Spotify, entre outras.

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