A Ecozinha é uma experiência gastronômica em busca de relações mais saudáveis com a comida e com o dinheiro. “Restaurante? Não, estamos mais para anti-restaurante”, afirma Fátima Mazarão, 27, a historiadora e cozinheira que toca a empreitada junto com Luciano Vaini, 37, seu namorado e cozinheiro por formação. Um quadro negro posicionado ao lado das travessas com a comida explica a proposta da dupla: “Feijoada vegana, farofa de banana, arroz/salada: esse almoço custou 220 reais, deixe sua contribuição =)”.
Sua cozinha itinerante é recente, tem apenas quatro meses e ainda testa o modelo de negócio. Realiza este tipo de refeição com preço livre às sextas-feiras no espaço Solimões 541, casa coletiva em Curitiba que ocupa junto a outras três iniciativas culturais. O almoço é servido como em casa de família: comida na mesa e todos sentados ao redor, nada de garçons, menu ou conta. Quando dá tempo, os cozinheiros sentam junto e comem com os presentes, que também estão convidados a lavar o prato após a refeição. A proposta é desacelerar para se aproximar de uma rotina melhor, mais saudável e com mais olho no olho.
Fátima e Luciano testam o mesmo modelo de contribuição livre também no Espaço Cultural Terreirão, onde realizam quinzenalmente o projeto Angu – cozinha popular brasileira, que revisita nossos pratos típicos em versões vegetarianas. Ela diz que é sempre gostoso participar das atividades do Terreirão, mas pondera que a lógica da conta aberta não funciona tão bem por lá. Eles nunca tiveram prejuízo, mas, se a arrecadação voluntária não melhorar, estudam ir com mais calma na experiência e colocar um preço fixo no Angu.
UMA CULINÁRIA VEGANA, ARTESENAL E COLETIVA
Além destes encontros periódicos, a Ecozinha também presta serviços para eventos e participa de feiras no circuito cultural de Curitiba. Sua culinária não utiliza nada de origem animal ou industrial, prefere orgânicos da estação. Fátima descobriu sua vocação para a cozinha durante um mestrado em Portugal, onde foi estudar História Contemporânea. Morava numa casa coletiva e cozinhava para muita gente. Todos dividiam os custos mas, com o tempo, ela notou que as contribuições começaram a ser maiores do que a conta do mercado. Seus amigos passaram a financiar espontaneamente a empreitada, sem nunca terem conversado a respeito. Assim, plantaram a semente do modelo de contribuição livre que a Ecozinha testa hoje.
A iniciativa tomou forma como empresa em 2014, com Fátima e a amiga Daniela Carvalho cozinhando para o evento que aparecesse. O projeto seguiu para Portugal em julho do mesmo ano, quando a amiga Cuka Linck se inspirou no trabalho da Ecozinha e começou o mesmo trabalho na cidade do Porto. Em outubro, Fátima se mudou para lá e colaborou com Cuca até voltar novamente para o Brasil, em janeiro de 2015. Então, conheceu Luciano, ele sim gastrônomo que sempre trabalhou em cozinha. O casal se encontrou com a mesma vontade de viver bem, de buscar uma alimentação saudável e possibilidades mais justas para ganhar seu dinheiro. Compartilhar dessa ideologia faz parte da relação dos dois.
Para eles, a parte mais prazerosa da empreitada é inventar novas receitas, misturar ingredientes, testar novos pratos. Se entendem alquimistas: páprica defumada, cúrcuma, sal marinho, açafrão, gengibre, sempre em busca de uma combinação nova. Ocuparam a cozinha da Solimões 541 com uma prateleira enorme, cheia de potes de vidro com especiarias e outros ingredientes, é o seu laboratório ou, como já disseram, caldeirão de bruxa.
A casa é uma iniciativa recente, começou a funcionar em abril deste ano bastante inspirada nos preceitos de troca e abertura propostos pela Laboriosa 89, espaço coletivo em São Paulo que acabou recentemente após uma rica experiência de colaboração (contamos essa história no Draft, aqui).
Na Solimões, estão hoje quatro iniciativas: Ecozinha, Bambaê produções culturais, a fotógrafa Daiana Luiza e a produtora Larissa Maris. A casa segue como espaço aberto e apropriável, suas contas estão dispostas em um grande quadro negro na sala e o financiamento também é coletivo: levantam cerca de 2 000 reais por mês via Unlock, plataforma de crowdfund recorrente por meio da qual os apoiadores financiam uma parte da empreitada.
TRABALHAR PARA VIVER, E NÃO O CONTRÁRIO
A contabilidade é feita a lápis em um caderninho que Fátima guarda em casa. Não há perspectiva de acumular, pois eles não se entendem como empresa que busque lucro. Querem, em vez disso, tranquilidade para viver bem. Luciano se dedica integralmente à iniciativa, enquanto Fátima divide expedientes e é professora de História para o ensino fundamental e médio. Depois de cobertos os custos, no caixa da Ecozinha sobram cerca de 1 500 reais por mês. Eles sabem que não é o ideal — e que Luciano poderia ganhar muito mais trabalhando em um restaurante. Mesmo assim, ela considera que vale a pena:
“Fazemos o que gostamos, do jeito que gostamos, em um projeto pessoal que está funcionando há poucos meses. No fim das contas, é uma delícia e vamos continuar”
Até o final deste ano, pelo menos, eles vão se manter na Solimões, tentando vivenciar a proposta de cozinha colaborativa enquanto levam a produção itinerante para outros espaços. Sabem, porém, que a experiência tem prazo de validade. “O pior mesmo tem sido a grana”, conta Fátima. Ela entende que 2016 será o ano para racionalizar o trabalho, encontrar o que está dando certo e seguir em frente.
Além da realidade de seu próprio negócio, Fátima vê também uma mudança de cenário. Ela considera que estamos enfrentando mudanças nos paradigmas da alimentação, onde a opção natural cada vez mais ganha espaço sobre a industrial. Ela diz não entender bem como gastamos tanto com fast food, mas renovou suas esperanças aos encontrar seções de orgânicos muito bem abastecidas em mercados europeus. Acha que é questão de tempo até a tendência se fortalecer de vez por aqui.
A Ecozinha é uma iniciativa pequena, que não pretende crescer e disputar mercados. Sua lógica é atuar no micro e considerar o impacto no macro. Eles ainda vão plantar uma horta no quintal da Solimões. O objetivo ali é garantir tranquilidade material e prazer no cotidiano, tanto de Fátima e Luciano, como dos frequentadores. E isso, Fátima garante sorrindo, estão conseguindo.
De presente para o Draft, ela deixa a receita da Frida, o hambúrguer mexicano de feijão vermelho que é servido lá na Ecozinha:
Hambúrguer:
1 xícara de feijão vermelho cozido e escorrido
Meia cebola cortada em cubinhos
2 dentes de alho
Meio pimentão vermelho cortado aos cubinhos
Sal, pimenta do Reino, páprica defumada
Farinha de rosca
Colocar todos os ingredientes no processador e misturar até formar uma massa homogênea, adicionar a farinha aos poucos até dar o ponto em que se consiga fazer bolinhas que não grudam nas mãos.
Guacamole:
1 abacate grande maduro
Meia cebola cortada em cubinhos
1 tomate sem sementes cortado em cubinhos
Coentro, sal, cominho, pimenta do Reino
Amasse o abacate até ficar um creme liso, adicione o restante dos ingredientes e misture. Acerte o sal, pimenta, coentro e cominho a gosto.
Pico de gallo:
1 cebola roxa cortada aos cubinhos
1 tomate cortado aos cubinhos
1 pimentão amarelo cortado aos cubinhos
Coentro, sal, azeite de oliva
Misturar os ingredientes até que todos estejam temperados com sal e azeite de oliva.
Servir os ingredientes em pão cervejinha ou pão de água. E, se tiver alguma dúvida, pode escrever para a Fátima que ela ajuda (o contato está logo aqui abaixo, no Draft Card).
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Foodtech que desenvolve alimentos a partir de aveia foi a primeira empresa a usar rotulagem climática, que calcula as etapas da cadeia e informa aos consumidores o impacto do produto no ambiente.