A sede da Vagas, empresa de recrutamento online, ocupa dois andares de um prédio comercial na Avenida das Nações Unidas, em São Paulo. Os 160 funcionários de áreas como pesquisa e desenvolvimento, finanças e recursos humanos dividem mesas sem baias em um escritório sem divisórias. Nas paredes, há post-its colados e lousas cheias de listas e gráficos.
Há também um recado escrito por Gary Hamel, professor da London Business School e autor de alguns best-sellers de gestão. O destinatário é o engenheiro Mário Kaphan, de 61 anos, fundador da Vagas. Era fim de 2013 e Gary tentava convencer Mário a inscrever a Vagas no Unlimited Human Potential Challenge, concurso americano que busca reconhecer inovações em gestão. “Acabou que aceitamos participar e fomos uma das sete empresas premiadas, a única brasileira”, diz Mário. “Foi uma felicidade.”
O modelo de gestão da Vagas é mesmo fora do comum. Para começar, não há nenhum nível hierárquico. “Não está escrito diretor, supervisor ou gerente no crachá de nenhum dos nossos funcionários. Nem no meu”, diz Mário. Todas as decisões são tomadas por consenso entre os que trabalham na empresa. Também não existem metas financeiras, nem para a área comercial. “Empresas focadas em resultado financeiro estão desperdiçando energia”, diz Mário. “Estamos focados em fazer direito o que sabemos fazer.”
“Empresas focadas em resultado financeiro estão desperdiçando energia”, diz o fundador da Vagas. “Estamos focados em fazer direito o que sabemos fazer”
Mário fundou a Vagas em 1999, junto com o também engenheiro Sidney Monreal Martin, de 55 anos, que havia sido seu aluno na Escola Politécnica da USP. No mesmo ano, os sócios começaram a fazer juntos aulas da arte marcial tai chi chuan. “Fazemos até hoje, todo sábado de manhã”, diz Mário. Ele conta que o esporte ensinou muito sobre equilíbrio, tanto físico quanto mental. “Foi uma mudança completa de vida.”
Mário e Sidney já eram sócios em outra empresa, a Humana Informática, que então produzia um software para conectar computadores em rede. “Para criar a Humana, em 1984, deixei um emprego em uma grande empresa de tecnologia e usei o dinheiro do meu fundo de garantia e da venda de um computador”, diz Mário. Com o surgimento da internet, a Humana ficou obsoleta do dia para a noite. As receitas caíram e os sócios precisaram enxugar o quadro de funcionários.
A empresa, que tinha cerca de 60 funcionários, passou a ter dez. “Foi um período perverso, pois o nosso maior patrimônio eram as pessoas”, diz Mário. Ele conta que percebeu que precisaria se reinventar quando viu pela primeira vez o Mosaic, primeiro navegador a rodar no Windows. “Eu e Sidney decidimos criar um negócio de internet, era o futuro”, diz Mário.
Os sócios precisaram de três meses de brainstorming para chegar a um novo plano de negócios. “No começo, tudo o que sabíamos era que queríamos ajudar a resolver os problemas de algum mercado”, diz Mário. Certo dia, surgiu a ideia de criar um software para a área de recursos humanos. Na época, as oportunidades de emprego costumavam ser divulgadas apenas em jornais e murais de faculdades – e o processo até a contratação de um candidato podia demorar meses. “Para nós, ficou claro que era possível melhorar esse cenário com tecnologia”, diz Mário. Os funcionários remanescentes da Humana foram realocados para a Vagas, assim como os recursos da primeira empresa.
O primeiro produto da Vagas foi um software de gestão de processos seletivos que funcionava offline. “Começamos vendendo esse programa para empresas enquanto esperávamos a internet evoluir o suficiente para conseguirmos trabalhar online”, diz Mário. Hoje, o negócio da Vagas é atrair, encontrar e selecionar pessoas pela internet. “Nós ajudamos as empresas a gerir todas as etapas dos processos seletivos. Os nossos clientes publicam vagas, gerenciam testes, recebem currículos e escolhem os melhores candidatos pela nossa plataforma”, diz o fundador.
A Vagas também hospeda bases de funcionários de clientes que fazem processos de recrutamento interno. “Temos mais de 2 600 clientes, 450 mil visitantes únicos por dia e 8 milhões de currículos cadastrados”, diz Mário. No ano passado, a Vagas faturou 28,5 milhões de reais. Este ano, a empresa planeja crescer 25%. “Todo ano, desde a nossa fundação, crescemos pelo menos 25%”, conta ele.
“Aqui, todo mundo pode fazer o que quiser, desde que todo mundo tenha a ver com isso”, conta Mário. Quando um funcionário precisa decidir algo importante, ele recorre à ajuda de quantos colegas julgar necessário. Qualquer pessoa, que está envolvida na conversa ou não, pode opinar e discordar.
Os clientes da Vagas pagam a partir de 400 reais por mês pelos serviços. O preço varia de acordo com o número de processos seletivos que a empresa abre nesse período. Até chegar ao melhor preço, Mário e Sidney erraram bastante. No início, eles pensaram em cobrar uma quantia pelo número de pessoas que se candidatassem a determinada vaga. Não deu certo. O desafio era encontrar um meio termo entre o preço ideal para os sócios e o preço ideal para o mercado. “Muitas empresas contratam mais num mês do que no outro. Por isso, a precificação por número de processos seletivos tem dado certo”, diz Mário. Para ele, o prazer do empreendedorismo está nessa constante construção. “Todo dia erramos, refazemos e melhoramos alguma coisa na empresa.”
Foi nos primeiros anos da Vagas que Mário e Sidney perceberam que não queriam seguir um modelo de gestão tradicional. “Éramos tão poucos que não fazia sentido nenhum um mandar no outro”, conta Mário. “E continua não fazendo.” Só depois de muito tempo, eles perceberam que fazem na Vagas o que é chamado de gestão horizontal — ou horizontal management, aspecto que o Unlimited Human Potential Challenge premiou.
“Aqui, todo mundo pode fazer o que quiser, desde que todo mundo tenha a ver com isso”, diz o fundador. Quando um funcionário precisa decidir algo importante, ele recorre à ajuda de quantos colegas julgar necessário. Qualquer pessoa, que está envolvida na conversa ou não, pode opinar e discordar. “Muitas vezes, demoramos mais para tomar uma decisão do que uma empresa em que as ordens partem de um chefe. A vantagem é que os nossos funcionários já começam um projeto engajados porque participaram desde a criação.”
Para Mário, os principais resultados da gestão horizontal são a colaboração entre as pessoas e a inovação. “Nossos funcionários têm autonomia para criar projetos além das suas obrigações do dia a dia”, diz ele, e afirma que muitas ideias de novos produtos surgiram assim.
A maior dificuldade deste modelo é definir os salários. “O valor do salário depende do tipo de trabalho e da especialidade de cada funcionário”, conta Mário. “Recentemente, contratamos uma consultoria externa para avaliar se estamos pagando de acordo com o mercado e está tudo bem.”
“O valor do salário depende do tipo de trabalho e da especialidade de cada funcionário”, conta Mário. “Recentemente, contratamos uma consultoria externa para avaliar se estamos pagando de acordo com o mercado e está tudo bem.”
O planejamento estratégico na Vagas é feito pelos próprios funcionários. Ele começa com uma discussão para definir quais são os objetivos da empresa para o próximo ano. Em seguida, criam-se comissões para discutir esses temas a cada quinze dias. “Assim, podemos adaptar nossos planos conforme o mercado muda”, diz Mário. Também não há nenhuma meta financeira. “Não concordo com empresas que impõem metas irreais e obrigam os funcionários a fazerem qualquer coisa para batê-las”, conta Mário. Pelo mesmo motivo, a Vagas não tem investidores externos. “Acho que seria difícil encontrar um fundo que se acostumasse com o a nossa gestão.”
Mário e Sidney se orgulham de ter criado uma empresa que funciona de acordo com o que eles acreditam. “O que eu sei é que a experiência de gerir um negócio tem que fazer sentido, ser divertida e fazer a diferença para as pessoas”, diz Mário. Recentemente, a Vagas passou a convidar especialistas em diversas áreas para dar palestras durante o horário de almoço da empresa. Os encontros são chamados de PF, ou prato feito. Nos últimos meses, eles levaram à empresa mergulhadores, artistas plásticos e o cantor Zeca Baleiro, entre outros palestrantes. “É para inspirar nossos funcionários”, diz Mário. “Nesses dias, todo mundo traz comida de casa para não perder nem um minuto.”
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