Juliane nasceu e viveu até os 25 anos em uma pequena cidade no interior do Paraná, chamada Assis Chateaubriand. Esse convívio próximo à natureza e à zona rural acabou influenciando a sua paixão por plantas. “Cheguei a pensar em estudar nutrição para ser uma profissional que recomendaria uma alimentação mais natural, porém o destino me levou para a biologia. Com o ingresso na universidade planejava seguir a carreira de professora-pesquisadora para gerar conhecimento básico e melhorar as formas de produção de alimentos saudáveis e sustentáveis. Empreender nunca passou pela minha cabeça, até encontrar minhas sócias atuais e entender o propósito de tantos anos de estudos”, lembra a fundadora da ManjeBem.
Batemos um papo com a Juliane para saber como tem sido sua experiência como empreendedora:
O que você fazia antes de empreender?
Sou Bióloga, especialista em Biotecnologia aplicada a Agroindústria, Mestre em Agronomia e Doutora em Biotecnologia e Biociências. Minhas experiências profissionais sempre foram na docência e pesquisa de métodos alternativos para controle de doenças em plantas.
E como surgiu a ideia de empreender?
Empreender ocorreu totalmente por acaso. No começo de 2016, minhas sócias e eu estávamos terminando a pós-graduação, estudando o controle ecológico de doenças e pragas agrícolas no Laboratório de Fitopatologia. Vimos um edital do Social Good Brasil com uma chamada para ajudar ideias de negócios que resolvessem algum problema social. Resolvemos nos inscrever pois naquela época estávamos com várias inquietações: Como levar informação para o campo? Como viabilizar a troca de conhecimento sobre manejo sustentável? Como impactar positivamente na vida de agricultores familiares? Fomos selecionadas e passamos por meses de capacitação e validação de público alvo, problemas e soluções. Quando terminamos o processo constituímos nossa primeira empresa, a Fitocon Consultoria Agrícola.
Como nasceu a ManejeBem?
Quando montamos a Fitocon, nossa primeira empresa de consultoria agrícola, sentimos que iria demorar muito para alcançar todos os agricultores familiares do Brasil. Queríamos atingir mais agricultores e de forma mais rápida. Foi aí que surgiu a iniciativa ManejeBem, com o objetivo de criar uma rede de conexão entre produtores, técnicos e pesquisadores em prol de uma agricultura mais sustentável. E como fazer isso? Primeiramente criamos um grupo no WhatsApp, aos poucos as pessoas que convidamos iam aderindo e timidamente trocando conhecimento. Eram perguntas diárias e acabávamos respondendo com o pouco conhecimento que tínhamos que somava com a experiência prática de outros. Aos poucos as informações compartilhadas se complementavam e o grupo foi crescendo! Acreditamos que a comunicação rural é a chave para impulsionar a agricultura sustentável e o desenvolvimento humano nas comunidades rurais, e que essa comunicação deve ser feita com base no diálogo e participação, permitindo que o agricultor expresse suas opiniões, compartilhe conhecimento e participe ativamente na produção da informação. Neste contexto vislumbramos a oportunidade de estruturar as informações que vem do campo na forma de uma ferramenta tecnológica que pudesse se inserir no cotidiano do produtor, facilitar assim o acesso e a troca de informações e permitir uma maior inteligência na resolução dos problemas na produção.
“Hoje todo o conhecimento está organizado e é compartilhado através de uma plataforma de livre acesso para produtores e técnicos cadastrados. Mais do que conectar pessoas, a plataforma, que já recebeu mais de 180 mil visitantes, está se tornando uma referência e levando informação de qualidade ao pequeno produtor”
Explique-nos como funciona o negócio.
Hoje, além da rede social que funciona de forma gratuita para técnicos e agricultores, temos um serviço de auxílio no desenvolvimento de comunidades rurais junto a grandes compradores de matéria-prima agrícola, ou seja, as agroindústrias são os nossos clientes. Desenvolvemos uma tecnologia para facilitar a assistência técnica, organizar os dados do campo e gerar inteligência para melhor desempenho da agricultura familiar no Brasil e no mundo.
Como é a sua atuação na empresa?
Sou responsável por buscar e identificar parcerias estratégicas, bem como novos clientes e atuo na gestão financeira da empresa.
Quais estratégias têm dado melhor resultado nesta trajetória?
Participações de editais, eventos e premiações tem nos trazido muita visibilidade e bons contatos. Temos uma das sócias muito focada na busca dessas melhores oportunidades. Outra estratégia que tem feito toda diferença são nossas ações para engajamento dos técnicos e agricultores que usam nossas plataformas. Ter esses produtores e profissionais satisfeitos com a nossa entrega e advogando pela causa é o nosso maior tesouro.
Por outro lado, quais caminhos foram deixados de lado?
Tentamos algumas parcerias que não foram muito exitosas nesse período de atuação. Nos enganamos com desenvolvedores e com outras startups que pareciam ter fit com o nosso negócio mas que, na realidade, não foram interessantes. Fizemos alguns testes e, diante dos resultados, deixamos de lado algumas possibilidades de modelos de negócio.
Quais impactos positivos você quer atingir através do seu negócio?
Tudo que desenvolvemos tem, como foco principal, o impacto que isso vai causar na vida dos agricultores. Queremos melhorar a qualidade de vida dessas pessoas que são responsáveis por mais de 70% dos alimentos que chegam até a nossa mesa todos os dias. Quando conseguimos ser um canal de facilitação de assistência técnica (seja ela presencial ou remota), estimular a adoção de práticas sustentáveis na produção dos alimentos com respeito ao meio ambiente ou auxiliar na organização de informações da porteira para dentro, vemos os impactos nas comunidades rurais e nos entornos. Essas ações melhoram a qualidade dos alimentos, garantem a disponibilidade desses produtos e por consequência melhoram renda de todos os envolvidos. Como empresária e como cidadã estou comprometida com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos pela ONU.
Quais as principais lições que você tirou desde o início da sua trajetória empreendedora até agora?
Aprendi muitas lições nessa trajetória e considero que todo dia é dia de aprender mais alguma coisa. Como mencionei, não passava pela minha cabeça ser empreendedora. Mas a paixão pela agricultura familiar e o problema que nos propusemos resolver, me faz querer ir atrás e aprender como gerir uma empresa, cuidar de financeiro, pensar em marketing, produzir conteúdos, falar em público. Na parte de gestão financeira, aprendi que o empreendedor tem que sempre estar atento. Eu costumava somente pagar as contas e conferia se no final do mês sobrava algum dinheiro. Até que não sobrou, entramos no vermelho e tivemos que tirar dinheiro do próprio bolso para quitar as contas. Isso ocorreu simplesmente pela falta de gestão correta do fluxo de entrada e saída de dinheiro.
A ManejeBem tem concorrentes?
Ainda não encontramos um concorrente direto das nossas atividades, visto que focamos não apenas em tecnologias ou dados, mas sim em um serviço de pensar junto como desenvolver comunidades rurais para fornecimento para grandes agroindústrias. Sabemos que algumas empresas desenvolvem soluções para o agronegócio, para os grandes produtores, e quando enxergam uma oportunidade, tentam lançar suas soluções para o pequeno agricultor, também. Essas empresas não desenvolvem soluções pensando especificamente nos pequenos e, por vez, têm pouco adesão desse público.
Qual foi o maior desafio que você enfrentou na vida empreendedora?
Conflitos próprios de achar que não daria conta, que nunca estaria preparada para empreender. Isso tem sido superado com muita capacitação e mentoria. Estou ciente de que problemas sempre existirão. Ao resolver um problema quase que automaticamente criamos outro. Então vejo como responsabilidade minha resolvê-los da forma mais tranquila possível.
Qual a sua maior conquista até aqui?
Ver a alegria e o sorriso no rosto dos agricultores quando chegamos nas comunidades para os Dias de Campo. Realizamos estes eventos com os agricultores para falar dos principais problemas encontrados na lavoura, as soluções que poderiam auxiliar na melhoria da produção e aproveitamos para apresentar nossa tecnologia. Assim, ficamos próximos da realidade local, conquistamos e mantemos o engajamento dos agricultores e técnicos além de presenciar toda a evolução no desenvolvimento das comunidades rurais.
Qual é o seu sonho? O que ainda falta realizar?
Levar assistência técnica e informações de qualidade para todos os agricultores familiares. Como estamos falando da base da agricultura no mundo, o número de agricultores familiares é enorme. Só no Brasil são 4,4 milhões de pequenos agricultores, então talvez demore um pouco para atingirmos todos. Mas o que importa é que estamos caminhando para isso, com passos firmes e focadas no nosso propósito.
Se pudesse voltar no tempo e refazer uma decisão, corrigir algum momento da sua trajetória empreendedora, o que seria?
Não mudaria nada. Todos os passos que foram dados me fizeram ser mais resiliente, pensar de forma mais ágil e estar preparada para desafios maiores.
Se pudesse dar apenas uma dica para quem está querendo empreender, qual seria?
Se você tem um sonho, feche seus olhos e procure imaginar o tamanho do impacto que ele pode causar. Se seu coração acelerar, vá em busca desse sonho. Não tenha medo dos desafios, capacite-se para estar preparada e não desista antes de alcançar o seu objetivo maior.
Quais seus planos para o futuro?
Expandir os negócios para outros países, de início na América Latina. Já estamos articulando possibilidades e se tudo der certo próximo ano iniciaremos nossos projetos no Peru.
Para saber mais:
O que faz: Tecnologia que gera inteligência para o desenvolvimento da agricultura familiar.
Sócios: 3
Funcionários: 2
Sede: Florianópolis
Início das atividades: 2016
Investimento inicial: R$ 100 mil
Contato: [email protected] / www.manejebem.com.br / (48) 9 99104 3042
Esta matéria pode ser encontrada no Itaú Mulher Empreendedora, uma plataforma feita para mulheres que acreditam nos seus sonhos. Não deixe de conferir (e se inspirar)!
Os empreendedores por necessidade são os mais atingidos em momentos de crise, e os impactos com as medidas de contenção da pandemia do novo coronavírus se tornam inevitáveis. Veja como enfrentar esse período.