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Verbete Draft: o que é Artwashing

Isabela Mena - 18 dez 2019
Protesto organizado por artistas para pedir a renúncia de , Warren Kanders do cargo de vice-presidente do conselho do Whitney Museum of American Art, em Nova York.
Isabela Mena - 18 dez 2019
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Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete de hoje é…

ARTWASHING

O que acham que é: Limpeza de grafites em áreas públicas.

O que realmente é: Artwashing é, em uma definição genérica, a utilização da arte para fins escusos.

A palavra washing, neste contexto, pode ser traduzida livremente como “maquiagem”, dando a ideia de algo encoberto, disfarçado e até mesmo embelezado. É assim que funciona no racismo, com whitewashing, em práticas não sustentáveis ou ecológicas, com greenwashing e em negócios da economia compartilhada, com sharewashing.

Em Artwashing, segue-se a mesma linha, mas a função do neologismo é dupla: apontar, sob o escudo da importância da arte, tanto processos de gentrificação como de filantropia tóxica.

O primeiro, é o cenário no qual o termo foi cunhado (leia mais no item “Origem”) e denuncia o aumento do padrão de vida em áreas até então depreciadas e habitadas por populações de baixa renda em razão da chegada das galerias de arte, o que as torna atrativas para um público de maior poder aquisitivo. Surge a especulação imobiliária, aumenta o preço do metro quadrado, os valores dos aluguéis sobem a ponto se tornarem impeditivos para os moradores e comerciantes originários e acontece a mudança de perfil socioeconômico e cultural da área. Ou seja, a gentrificação.

A filantropia tóxica, que aparece no segundo cenário de Artwashing, refere-se ao investimento de empresas em arte com o objetivo de melhorar sua imagem. Isso pode acontecer caso seu core business seja controverso (como armas, por exemplo) ou em situações emergenciais (ser responsável por desastres, tragédias, crise etc.).

Segundo a curadora e pesquisadora Nathalia Lavigne, a discussão sobre filantropia tóxica e Artwashing teve um ponto alto este ano com a renúncia de Warren Kanders como vice-presidente do conselho do Whitney Museum of American Art, em Nova York, quando descobriu-se que granadas de gás lacrimogêneo de sua empresa, a Safariland, foram usadas contra imigrantes na fronteira entre os Estados Unidos e o México, além de outros lugares. “Foram meses de protestos organizados pelo grupo multidisciplinar Decolonize This Place, que chegaram ao ápice quando artistas da exposição ameaçaram tirar seus trabalhos caso Kanders não renunciasse. Mas além desse, outros casos de Artwashing e filantropia tóxica que aconteceram nos últimos anos levaram a um debate bem delicado para as instituições envolvendo patrocinadores com negócios contestáveis”, afirma.

Lavigne escreveu um texto sobre o assunto na edição de setembro da revista Select (link no item “Para saber mais”).

Origem: O termo foi cunhado por ativistas do distrito de Boyle Heights, em Los Angeles (EUA). Embora já lutassem há alguns anos contra a gentrificação do local, em 2016, voltaram seus esforços contra as galerias de arte, criando uma coalização e batizada de “Boyle Heights Alliance Against Artwashing and Displacement” (Aliança de Boyle Heights Contra Artwashing e Deslocamento, em tradução livre), ou BHAAAD.

Em entrevista ao L.A. Weekly (link no item “Para saber mais”) à época, uma ativista chamada Maga Miranda disse que o grupo não é contra a arte ou a cultura, mas que as galerias são parte de um esforço mais amplo de planejadores, políticos e construtoras que querem gentrificar o distrito por meio de Artwashing.

Dissociações: Pelo menos 60 galerias de arte chegaram à Chinatown, em Nova York (EUA), a partir de 2014, fator considerado preponderante para gentrificá-la, mudando radicalmente a cara e a vizinhança local.

A BP (multinacional britânica de petróleo e gás) tem visto esvair pelo ralo sua parceira com algumas das mais importantes instituições de arte no mundo. Em 2016, foi a Tate. Embora tenha sofrido anos de protestos — manifestantes passaram 25 horas rabiscando mensagens, em carvão, sobre mudanças climáticas no chão de uma área da Tate Modern. Alguns meses depois, ativistas ocuparam parte da Tate Britain tatuando uns aos outros com o número de concentrações de CO2 na atmosfera no ano em que nasceram — o motivo alegado pelo fim da parceira foi genérico.

Este ano, a The National Galleries of Scotland encerrou sua parceria de uma década com a multinacional petrolífera. Sediou pela última vez exposição anual BP Portrait Award e, em nota oficial, disse “reconhecer a responsabilidade de fazer todo o possível para lidar com a emergência climática e que, para muitos, a associação como a BP é vista como contrária a esse objetivo”.

Responsável pelo financiamento de 23 instituições de arte, a família Sackler, viu seu nome e dinheiro serem publicamente dissociados este ano da Tate de Londres e Guggenheim de Nova York, em março; do Metropolitan Museum of Art, em maio e do Louvre, em julho (que removeu o nome Sackler da ala oriental e de antiguidades).

Os Sackler são associados à Purdue Pharma, que fabrica o remédio para dor OxyContin, um opioide de forte poder viciante e está relacionada à crise dessa droga nos Estados Unidos. Grande parte da fortuna Sackler deve-se à venda do medicamento.

Associações: Há diversos artistas e coletivos que utilizam justamente a arte para protestar contra o Artwashing. É dicotômico, já que os efeitos perversos dessa prática, em certo sentido, os beneficiam, mas é também a própria inerência da arte, sua razão de existir.

Nessa pegada está o já citado Decolonize this place, que se define como “movimento orientado para a ação, centrado na luta indígena, na libertação dos negros, na Palestina livre, nos assalariados globais e na ‘des-gentrificação’”. Sua série de protestos Nine Weeks of Art and Action, da qual participam 30 grupos, atuou para a saída de Warren Kanders do Whitney Museum e um de seus coletivos Chinatown Art Brigade está envolvido na briga contra a gentrificação da área em Nova York.

Após se recuperar do vício no remédio OxyCondin e tomar conhecimento da ligação da droga com a família Sackler, a fotógrafa e artista americana Nan Goldin criou o grupo PAIN, sigla de Prescription Addiction Intervention Now, clamando por intervenção urgente para a prescrição médica de uma droga viciante por meio de uma série de ações.

Vozes dissonantes: No artigo “Artwashing: the new watchword for anti-gentrification protesters”, publicado no The Guardian, em 2016, o jornalista e crítico de arte inglês Jonathan Jones critica o Artwashing e questiona se, ao desejar a retirada das galerias de arte de Boyle Heights, os ativistas desejam a segregação da área. O tom de Jones é de escracho — em uma segunda pergunta , ainda na  primeira linha do texto, ele manda:  “Ao ouvir a palavra cultura, você pega sua cópia de Das Kapital?”.

Editora de arte do Financial Times, Jan Dalley, retorna à crítica em 2018, inclusive citando o artigo de Jones, mas com tom menos ácido e outros argumentos. Em “Why artwashing is a dirty word”, Dalley critica o uso do neologismo (ao qual dá uma leva zombada) se relacionado à gentrificação, mas diz fazer sentido quando o verniz do engajamento cultural encobre comportamento tirânicos. Ela dá exemplos.

Os links dos textos citados acima estão no item abaixo, “Para saber mais”.

Para saber mais:

1) Leia, na Select, Bienal do Whitney traz à tona filantropia tóxica.
2) Leia, no L.A. Weeky, Boyle Heights activists demand that all art galleries get the hell out of their neighborhood.
3) Leia, no The Guardian, Artwashing: the new watchword for anti-gentrification protesters.
4) Leia, no Finantial Times, Why artwashing is a dirty word.
5) Leia, no site do Open Democracy, Why culture competitions and ‘artwashing’ drive urban inequality.

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