Situação hipotética: imagine que você acordou hoje com uma forte dor de cabeça. Pouco antes de começar a trabalhar, resolveu tomar um analgésico. Teve certo alívio, mas, passado algum tempo, a dor voltou. No fim do dia, ela encontrava-se bastante forte, mas sem outros sintomas associados. O que você faria? Iria ao pronto-socorro? Ou daria preferência a ser atendido por um médico por via digital?
Se, hoje, você respondeu que evitaria a emergência hospitalar, provavelmente é por medo: os atendimentos de urgência dos hospitais estão sendo procurados por pessoas com sintomas de Covid-19, a doença provocada pelo novo coronavírus.
Para evitar contágios desnecessários, os próprios profissionais de saúde indicam a pessoas adultas procurar o PS apenas em casos de febre de início súbito acompanhada de sintomas como tosse, dor de garganta ou, e especialmente, falta de ar.
Mas nem sempre foi assim – vivemos, afinal, tempos de exceção. Por questões culturais, pessoas que têm plano de saúde costumam ir aos atendimentos de urgência a qualquer sinal que o corpo dá. O Ministério da Saúde estima que isso aconteça com 50% a 70% dos beneficiários dos planos. Quase a metade dos casos, segundo cálculos de profissionais do segmento, poderiam ser avaliados em uma consulta especializada. Ou por serviços de telemedicina.
Uma lei foi aprovada, em caráter de emergência por causa da pandemia mundial, pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), e foi publicada hoje no Diário Oficial da União. A lei de número 13.989 permite que os médicos façam consultas a distância. E as instituições já estão sentindo aumento da demanda pelo serviço. O Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, por exemplo, viu suas teleconsultas diárias saltarem de 80, antes da pandemia, para 600.
“Telemedicina é um produto derivado da telessaúde”, explica a executiva Claudia Rizzo, da Sodexo. “O serviço usa ferramentas tecnológicas, de comunicação a distância, que são aplicáveis à medicina de modo geral, e é dividido em teleconsulta, feita com um médico via celular ou computador, e telediagnóstico, que é o envio direto, via digital, de exames feitos em laboratórios para o médico avaliar.”
Claudia explica que o telediagnóstico já é uma prática usada com frequência no país. “Não é mais preciso imprimir exames de imagem, radiografias: o paciente recebe uma senha do laboratório e já a encaminha para seu médico”, diz.
Já a teleconsulta, antes vista com olhar de desconfiança, começa a ganhar adeptos. “Nesse modelo, que pode funcionar por meio de um aplicativo específico ou de uma plataforma como as de teleconferências, médico e paciente são colocados frente a frente para uma consulta, como as que são feitas em consultório. O paciente faz suas queixas e, desde que não sejam necessários exames físicos como um raio X, ele pode receber o diagnóstico e a prescrição de tratamento”, diz.
A tecnologia já é usada fora do país, em locais como Estados Unidos e China, além de nações europeias. “O Conselho Federal de Medicina já havia feito uma regulamentação para a prática no país da teleconsulta, estabelecendo algumas diretrizes, desde questões éticas até os tipos de medicamento que poderiam ser prescritos e o detalhamento protocolar”, diz a executiva.
A regulamentação estava esperando avaliação no Ministério da Saúde quando fomos surpreendidos pelo novo coronavírus. “Já havia várias solicitações de empresa grandes e importantes, como o Hospital Israelita Albert Einstein, e startups bem evoluídas nessa questão de telemedicina para a regulamentação. O ministério então reuniu-se em caráter de urgência, analisou a portaria do CFM e a homologou.”
A decisão é temporária, mas dificilmente, acredita a executiva da Sodexo, a portaria deve ser revogada. “Muitas coisas podem ser resolvidas através da telemedicina”, avalia Claudia Rizzo. “Perícias médicas do INSS, por exemplo, em algumas circunstâncias, são resolvidas com teleconsulta. O médico pode realizar a consulta de uma pessoa por meios virtuais e ver se ela está ou não melhor de uma doença que tem recorrência de anos.”
Outro problema que a telemedicina pode resolver – e que já estava sendo debatido há algum tempo – é a redução dos custos de planos de saúde. “Especialmente na Sodexo, onde trabalhamos uma linha de produtos com ênfase em qualidade de vida, bem-estar e saúde, estamos sempre procurando produtos que ajudem a fomentar isso nas empresas clientes”, conta ela.
“No ano passado, já começamos a trabalhar em parcerias com o Einstein e TEG Saúde para construir uma solução de telemedicina para oferecer aos nossos clientes”, afirma. Não tinha nada a ver com isolamento social, já que foi bem antes: o que a empresa queria era fazer melhor gestão da utilização dos planos de seguro saúde de suas empresas clientes.
“A medicina privada no mundo todo é muito cara e já estávamos passando por um momento muito crítico dos planos e seguros saúde, simplesmente porque a conta não fechava”, ela diz. E explica: “Aqui no Brasil, brinco que plano de saúde ou seguro saúde é um cheque em branco na mão do usuário: a empresa dá o benefício para o colaborador e, se ele for para o hospital e gastar 100, mil, 10 mil ou 1 milhão de reais, o plano vai cobrir”.
Quem paga essa conta é a seguradora ou a operadora do plano e a empresa, que têm que fechar entre si um valor que seja aceitável para ambas. “A telemedicina pode ajudar nesse sentido, evitando o uso do pronto-socorro deliberadamente.”
Na própria Sodexo, o aumento de procura das empresas parceiras por esse tipo de serviço cresceram, calcula Claudia sem dados oficiais ainda, cerca de 300%. “Temos dois parceiros que já oferecem o serviço e mais dois ou três que implementaram agora. Neste momento, estamos em vias de implantar em algumas empresas clientes.”
Para a executiva, a telemedicina deve ser um dos legados da pandemia de Covid-19 – embora nem de longe o maior deles. “Espero que haja um legado de humanidade. Que retomemos um sentimento de inquietude, de sentir quando o outro sofre, de empatia. De percebermos que colaborar é muito melhor.”
Muito além de política pública, passou do tempo de equidade racial estar apenas na agenda de responsabilidade social de empresas no Brasil. Saiba o que grandes organizações, como a Sodexo, estão fazendo em prol dessa causa.