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Saiba como a MedRoom utiliza realidade virtual e gamificação para formar médicos melhores

Maisa Infante - 27 jul 2020 Os fundadores da MedRoom, Sandro e Vinicius, querem que a realidade virtual ajude estudantes a superarem o abismo entre a a teoria e a prática médica (foto: Isabele Araujo).
Os fundadores da MedRoom, Sandro Nhaia e Vinicius Gusmão (foto: Isabele Araujo).
Maisa Infante - 27 jul 2020
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Ao vestir os óculos de realidade virtual, futuros médicos podem entrar no corpo de Lucy, vê-la respirando, seu coração batendo, suas artérias pulsando. Lucy é uma paciente virtual criada para que eles possam estudar mais profundamente a anatomia e a fisiologia do corpo humano. Ela é a primeira integrante do Laboratório de Morfofisiologia, um espaço digital onde estudantes de medicina e de outros cursos na área de saúde podem analisar cada órgão ou estrutura e entender as correlações entre eles.

Carinhosamente chamado de lab, esse é o principal produto da MedRoom, startup criada por Vinicius Gusmão, 25, e Sandro Nhaia, 38. Juntos, eles querem melhorar a eficiência do treinamento dos alunos usando como ferramenta a VR e estratégias de gamificação, como explica o biólogo Vinicius:

“Trabalhamos para reduzir o abismo entre teoria e prática. Nosso objetivo é ajudar o aluno a consolidar o conhecimento teórico para chegar à prática melhor preparado”

Não se trata, portanto, de uma aplicação que vai substituir o uso de cadáveres no curso de Medicina, mas sim de uma etapa anterior.

“A vantagem mais evidente com relação ao cadáver é que o nosso ‘paciente’ está vivo, então é possível ver as estruturas anatômicas funcionando. Tem também a facilidade de interação. É muito mais fácil navegar e aprender no ambiente controlado, em uma jornada guiada e gamificada dentro do VR”, afirma.

Além disso, a ferramenta, que pretende abranger os 25 procedimentos médicos diferentes que todo aluno de medicina precisa praticar durante sua formação básica, torna mais práticos e baratos os treinamentos em cursos de graduação ou de especialização médica.

QUANDO SIMULAR É A MELHOR FORMA DE ENSINAR

A ideia começou com Sandro. Formado em computação gráfica e com experiência no desenvolvimento de animação e jogos, ele trabalhou por quatro anos no projeto Homem Virtual, da Universidade de São Paulo, que usava imagens tridimensionais e animações no ensino da Medicina. Quando testou o óculos de Realidade Virtual Rift, feito para games, em 2014, viu que tinha em mãos uma tecnologia que poderia ajudá-lo a desenvolver um produto interessante.

“Apresentei a ideia para o professor Francisco Collet, da Faculdade de Medicina da USP, e a gente começou a modelar no tempo livre”, conta.

Com o software da MedRoom, é possível investigar o corpo de Lucy, o avatar da empresa, que simula um corpo humano e suas funções.

Com a consultoria de quem estava dentro da universidade e sabia quais eram as dificuldades da área, eles criaram um primeiro modelo do laboratório e apresentaram no Started Weekend, em 2015, ocasião em que Sandro conheceu Vinicius e a MedRoom começou a dar seus primeiros passos, com o investimento de 50 mil reais por parte de ambos os sócios .

“Gostei da ideia e a gente começou a fazer protótipos, desenvolver testes com usuários, fazer validação. Fomos conversando com players do mercado e adaptando até chegar ao produto que temos hoje”, diz Vinicius.

Atualmente, o modelo de negócios da MedRoom é a venda de licenças para uso da plataforma. O cliente paga uma anuidade de cerca de 85 mil reais e recebe um kit com computador e software, além de um treinamento para poder usar o sistema.

A ideia é que, ao longo do tempo, o laboratório virtual da MedRoom cresça, ganhe novas funcionalidades e se torne, dentro das universidades parceiras, um centro de apoio aos estudos na área de saúde. Os fundadores querem, por exemplo, que os estudantes possam treinar por meio da realidade virtual uma drenagem torácica, uma entubação, ou mesmo, a colocação de um acesso venoso.

Uma parceria com o Hospital Albert Einstein tem sido fundamental para o desenvolvimento da startup. A MedRoom está incubada no Eretz.bio, centro de inovação e empreendedorismo do complexo de saúde. Todas as validações do lab são feitas em parceria com a faculdade de medicina do hospital, que também é um dos investidores da empresa.

Um dos principais desafios dos fundadores é conseguir criar novas modelagens e validações em tempo hábil. Por isso, a equipe cresceu de 12 funcionários, no fim de 2017, para 22, este ano. A maior parte do time é composta por artistas 3D e desenvolvedores de jogos (sempre com consultoria de médicos e professores da área).

“Tudo está culminando para uma vontade muito grande de ter a proposta pronta por completo, então, a gente tem que aumentar a velocidade de produção. E isso é time”, afirma Vinicius.

Além da universidade do Hospital Albert Einstein, o laboratório virtual já está instalado na Unigran, em Dourados (MS), e deve estar em outras dez instituições diferentes até o fim do ano. No começo de 2018, a empresa recebeu o aporte de um investidor mexicano considerado estratégico pelos sócios, pois vai distribuir o produto para a América Latina. No ano passado, a startup faturou 160 mil reais e, até o fim do primeiro semestre, já têm contratos firmados que permitem uma projeção de 720 mil reais de faturamento este ano.

ELES QUERIAM COMEÇAR COM CIRURGIAS, PRECISARAM REDUZIR A MARGEM DE ERRO

A proposta inicial da MedRoom era ter um modelo para procedimentos cirúrgicos e intervenções. Mas os especialistas da área médica que dão consultoria para o projeto tinham muitas dúvidas sobre essa aplicação. “Esse foi um feedback que a gente teve do próprio Einstein”, conta Vinicius. Eles perceberam que a complexidade exigida por uma operação não era o melhor caminho para um MVP.

Mais do que um game: a simulação dos procedimentos com o sistema da MedRoom permite às universidades reduzirem custos com treinamentos médicos (imagem: reprodução/The Economist).

“O MVP em saúde é bem complexo. No nosso caso, por exemplo, a gente não poderia apresentar o conteúdo errado para um aluno. É uma régua alta e custosa”, diz Sandro. O plano, então, foi partir da anatomia e fisiologia para, gradativamente, implantar novas funcionalidades no laboratório virtual. Mas a ideia é que ele vá bem mais longe e que a realidade virtual se prove mais do que “uma coisa legal”, como fala Vinicius:

“O laboratório não pode ser só um apetrecho de publicidade para uma faculdade, tem que ter uma função efetiva na jornada do aluno e do professor”

Além de parceria com os centros de ensino, hoje, a MedRoom tem como clientes algumas empresas da área de saúde, como Roche e Bayer. De acordo com a demanda, eles desenvolvem as aplicações em VR e acreditam que este é um trabalho que vem para complementar a área educacional, considerada a espinha dorsal da empresa. Recentemente, por exemplo, colocaram dentro do lab um medidor e uma bomba de infusão de insulina para mostrar como o equipamento funciona.

“A indústria é uma fonte riquíssima de informação. Se a gente conseguir aproveitar esse conhecimento, as ferramentas vão ficar mais complexas e acessíveis”, afirma o biólogo.

PARCERIA SAUDÁVEL: COMPLEMENTARIDADES

Do ponto de vista da parceria, Vinícius e Sandro são o típico caso de sócios que se complementam nas habilidades. O designer é a mente criativa, teve a ideia inicial e começou desenvolver o produto. Por sua vez, o biólogo sempre quis tirar a pesquisa do meio acadêmico e levá-la para uma aplicação prática no dia a dia das pessoas.

Dentro da USP, o biólogo participou de empresa Júnior e do Centro de Inovação. Foi para os Estados Unidos pelo programa Ciência sem Fronteiras e cursou disciplinas de Administração, Economia, Marketing, Globalização e Criatividade. Sem experiência prática como empreendedor, já que a MedRoom é seu primeiro negócio, ele diz que está aprendendo no dia a dia a lidar com o mercado e os altos e baixos da vida de uma startup

Já Sandro teve seu primeiro empreendimento aos 16 anos: uma escola de informática. Durou dois anos e o lucro, de acordo com ele, era todo gasto em banana split na sorveteria ao lado. Mesmo assim, o designer absorveu bons aprendizados desta experiência na parte administrativa e, hoje, seus desafios e preocupações são outros. Além de desenvolver o produto da MedRoom, ele luta para perder a timidez de falar em público e poder realizar os pitches da startup com tranquilidade. Já está fazendo um curso para melhorar isso. Em realidade virtual, é claro!

 

(Reportagem publicada originalmente em maio de 2018.)

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