Há uma nova etiqueta no mundo dos negócios: a falta de etiqueta.
Você entra em contato com a pessoa e ela simplesmente lhe ignora. Como se você não valesse o esforço de digitar quatro palavras: “Não tenho interesse, obrigado(a).”
Às vezes é a pessoa que entra em contato com você. Você engata uma conversa. E a pessoa, de repente, desaparece do outro lado da linha. Sem deixar vestígios. Porque as prioridades dela mudaram. Você era só um meio de ele ou ela realizar o que queria – e agora não quer mais. Então você é sumariamente descartado. Sem qualquer esclarecimento.
Gostaria de dizer que não estou de acordo com isso.
Acho que estamos nos tratando muito mal.
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Entendo que o fluxo de informações trazido pelo mundo digital devassou nosso e-mail, o inbox de nossas redes sociais, os apps de mensagens em nossos celulares. (Só ligação telefônica mesmo é que quase ninguém mais faz.)
Somos diariamente bombardeados por pedidos de atenção e de conversa. E administrar isso de fato toma tempo… Mas peraí. Se celebramos viver num mundo mais conectado e menos intermediado, então não podemos lamentar estarmos mais interligados e acessíveis
Por outra: de que adianta tanta tecnologia, tantas ferramentas, tantas traquitanas, se do outro lado permanecemos em silêncio, fechados em copas, escondidos no mato como se vivêssemos na era pré-telefone?
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Como eu lido com o bombardeio?
De um lado, como recipiente, tenho tentado estabelecer algumas táticas de sobrevivência em meio à avalanche de toc-tocs na porta de entrada.
Não respondo mensagens automatizadas ou enviadas em massa. Porque não estão falando de verdade comigo.
Mas procuro responder sempre que percebo que a mensagem foi enviada para mim, individualmente. Ainda que a proposição ali não me interessa.
Porque é aí que residem os bons modos: como você trata pessoas com quem não quer necessariamente conversar. Conversar com quem lhe interessa é fácil, isso qualquer arrivista é capaz de fazer.
Claro que isso exige certa dose de generosidade. E com meu bem mais precioso: o tempo. Mas de modo geral acho que esse é um investimento que se paga: é sendo acessível que você pode esperar a reciprocidade de poder acessar os outros. É se mostrando aberto que você exercita a modéstia e a não-afetação.
Ao longo da vida e da carreira, ganhei muito mais do que perdi deixando a porta aberta. Apesar dos canalhas que sempre tentarão se aproveitar da nossa disponibilidade sem nos oferecer nada em troca. (É bom que eles se mostrem logo, para você riscá-los logo do mapa.)
Mas na maioria das vezes você terá acesso a boas oportunidades, conhecerá gente bacana e ganhará crédito junto a pessoas que um dia poderão retornar a gentileza, em momentos em que quem esteja precisando da conexão seja você.
Não custa desejar boa sorte a quem lhe envia um currículo que você nunca vai contratar, ou agradecer por aquela proposição de negócio que está a centenas de quilômetros da sua estratégia.
Gentileza gera gentileza – não é assim? Duas ou três palavras de acolhimento tornam mais macios os dias duros de quem está na batalha.
Frieza e indiferença só tornam o mundo mais frio e indiferente. Se é ruim para você sentir isso, por que não contribuir para que outra pessoa não precise passar por esse tipo de coisa?
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De outro lado, como emissor, busco ser econômico em minhas mensagens.
O que tenho a dizer só interessa a mim ou interessa também ao outro? Estou levando ao interlocutor uma boa oportunidade – para ele ou ela, não só para mim? O que tenho a dizer é relevante, é oportuno, vale o tempo e o desgaste — os deles e também os meus?
Cada um de nós tem a chance de contribuir para um mundo com menos ruído, menos conversa mole, menos distrações que nos subtraem a energia e a atenção dos projetos que realmente importam
Economize e-mails, reduza mensagens por Whatsapp, evite reuniões inúteis. Copie o menor número de pessoas possível nas reuniões que precisarem ser feitas ou nos e-mails que precisarem ser enviados. Poste menos nas redes sociais. Gaste menos tempo de vida – seu e dos outros – com esse tipo de coisa.
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Dito tudo isso, se eu puder lhe pedir uma só coisa, rogo que você me diga “não”.
Follow-up bom é follow-up resolvido, para o bem ou para o mal. Ruim não é uma resposta negativa. O ruim é a ausência de resposta.
O “não” nos liberta para outros voos. A indefinição estabelece uma conversa-zumbi – um papo morto-vivo – na agenda do outro: ele ou ela não sabe se vai ou se fica. Preso que está à espera de uma resposta sua.
Quanto mais poder você tiver, mais você será confrontado com esse tipo de situação. E mais você estará na posição de começar e finalizar conversas. Busque ser ágil em suas decisões. E não deixe de comunicá-las com clareza e celeridade
Sempre que sua resposta não puder ser sim nem não naquele momento, deixe seu interlocutor saber disso também.
A transparência e a honestidade estão entre as mais importantes formas de respeito que você pode oferecer a seus interlocutores – no mundo dos negócios e em outros campos da vida também.
A sinceridade jamais representará falta de polidez. Uma resposta do tipo: “não tenho uma resposta” será sempre melhor do que falta de resposta.
Não há problema algum em recombinar um prazo ou reagendar uma conversa. O duro mesmo é o WO. É combinar e não aparecer. É calar. Sumir. Escafeder-se. Na esperança, talvez, de que o outro vá compreender, com a passagem dos dias, que você simplesmente não está mais ali – e nem pretende voltar.
Não há problema algum em você partir para outra. Desistir. Mudar de ideia. Colocar um ponto final não é ilícito. Mas ignorar o outro, sim.
O ponto aqui é apenas e tão somente ter a elegância de avisar a pessoa que está do outro lado da linha, com o telefone preso entre o ombro e a orelha, que você não está mais naquela ligação.
Acredite: você poderá dar poucas contribuições melhores do que essa para o aumento da produtividade nos negócios e para a diminuição da ansiedade no planeta
Se não por altruísmo, faça isso pelo simples fato de que, ao não encerrar uma conversa, aquele incauto continuará batendo na sua janela.
(Bem, pode ser que algumas pessoas curtam exatamente essa parte da brincadeira: ver gente fazendo fila diante da sua porta – que jamais será aberta. Talvez haja, para alguns, um prazer perverso nisso, um mecanismo que faça o sujeito se sentir importante às custas dos demais. Espero que você não seja um desses, ou uma dessas.)
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Isso já aconteceu com você? Já te deixaram em modo de espera infinito? E você, quantas vezes já brincou de exasperar o interlocutor – só porque podia?
Adriano Silva é fundador da The Factory e Publisher do Projeto Draft, Founder do Draft Inc. e Chief Creative Officer (CCO) do Draft Canada. É autor de nove livros, entre eles a série O Executivo Sincero, Treze Meses Dentro da TV e A República dos Editores.
Ao longo da vida, vamos colecionando papéis sociais que “definem” quem somos – mas só na superfície. Quando foi a última vez que você se despiu dessas personas e se viu no espelho? Ou enxergou de verdade quem estava ao seu lado?