“Você não pode me passar o contato de suprimentos deles? Quero fazer um contato direto.”
Na fase de screening de programas de conexões, entrando em contato com empreendedores para fazer o melhor match entre o problema do nosso cliente (uma grande corporação) e as soluções disponíveis no mercado, quantas vezes não ouvimos essa pergunta aí do alto?
Nossa resposta aos empreendedores e empreendedoras de startups é: “Sim, podemos. Mas talvez o ‘contato direto’ não seja o caminho mais fácil para entrar lá”.
Há diferenças enormes entre o processo tradicional de contratação de fornecedores dentro de uma corporação e as oportunidades geradas dentro de um bom programa de conexão, que ajuda a destravar entraves burocráticos.
A seguir, listamos algumas das principais diferenças entre esses dois modelos.
ORÇAMENTO É SEMPRE UMA QUESTÃO, INCLUSIVE NAS GRANDES EMPRESAS
A seleção de projetos gera uma grande disputa de budget em qualquer empresa.
Em relação ao portfólio de inovação, esse aspecto não é diferente. A empresa estrutura seus horizontes de atuação e decide quanto será alocado em cada projeto para conseguir alcançar os objetivos de sua estratégia.
Mas por que esse ponto é relevante para o relacionamento da sua startup com uma corporação?
Você, startup, precisa entender que sua solução pode, sim, ser significante, e entregar valor para a grande empresa à qual está sendo ofertada. Porém, se a dor que a sua solução resolve não tiver sido mapeada e classificada como relevante dentro da companhia, dificilmente haverá orçamento disponível para o projeto
Num programa de conexão com startups, ao contrário, quando um desafio é selecionado, toda uma estrutura de apoio à execução desse projeto é levantada para dar rapidez e agilidade na entrega de resultado, o que pode resultar na contratação da sua startup.
ACESSAR O INTERLOCUTOR CERTO NUMA COMPANHIA JÁ É UM DESAFIO EM SI
Para ter uma grande corporação como cliente, a startup precisa chegar ao stakeholder que decide por sua contratação.
Porém, esse pode ser um caminho bem árduo.
Imagine que você quer muito uma empresa como cliente. Você batalha e finalmente consegue o contato de um colaborador e a tão esperada reunião.
Nessa reunião podem acontecer quatro coisas: 1) a pessoa pode não saber o que fazer com sua startup; 2) a pessoa pode não entender o que sua startup faz; 3) a pessoa pode gostar da sua startup, mas o assunto não é com ela; 4) a pessoa gostou da sua startup e você acertou com quem deve falar
Se você estiver nos itens 1 e 2, esqueça e procure outro interlocutor.
Se estiver nos itens 3 e 4, com algumas variações, o processo acontece mais ou menos assim:
Uma segunda reunião é marcada para um mês depois. É mapeado que o Fulano, executivo da área tal, também tem que ouvir a startup. Só que o Fulano, azar, vai entrar de férias… Daí, outra reunião é marcada para dali a dois meses, porque o assunto se perdeu durante as férias do Fulano.
Finalmente, a empresa solicita uma proposta comercial. Você entrega a proposta, ufa, agora vai — mas não recebe retorno. Você espera, cobra o retorno dali a um tempo, e ouve que o cenário mudou. Te convidam para voltar e pedem uma nova proposta.
Nesse vai-e-vem, você pisca e percebe que se passaram um ou dois anos.
A EMPRESA CURTIR E CONTRATAR SUA SOLUÇÃO NÃO É A HISTÓRIA MAIS COMUM
É claro que há a possibilidade de a empresa gostar da sua solução, estar precisando de algo exatamente assim, pedir uma proposta e seguir em frente com a contratação.
Mas, sinceramente? Essa não é a história mais comum.
Em programas de conexão, antes de serem lançados, a corporação seleciona seus desafios mais importantes e identifica qual o sponsor e/ou squad necessários para tocá-lo. Esse time fica responsável por selecionar a startup até a execução do piloto.
Para este processo acontecer, os papéis são muito bem definidos: quem ficará responsável por tomar a decisão de aprovar ou não o projeto? Quem irá executá-lo? Quais áreas serão envolvidas? Quem serão os apoios?
Essa definição de papéis é fundamental para que todos os envolvidos estejam engajados desde o início do processo.
NO PROCESSO TRADICIONAL, O TIMING DE CONTRATAÇÃO É UMA INCÓGNITA
Volte alguns parágrafos para trás. Releia o exemplo lá de cima, sobre a tão batalhada reunião com o potencial cliente.
Fica claro que o contato direto com empresas não têm um processo. E que o timing para uma possível contratação é indeterminado.
Em programas de conexão, ao contrário, existe um cronograma anual, fixo, desenhado para otimizar o tempo de cada envolvido e tornar os processos mais enxutos.
Você fica sabendo exatamente quando será o pitch day, quando será a imersão, o piloto e a apresentação de resultados.
Quanto tempo dura tudo isso? Em média, uns cinco meses. Com processos e KPIs claros, objetivos mapeados e equipes estruturadas, o que dá agilidade e transparência.
EM PROGRAMAS DE CONEXÃO, FAST-TRACKS AGILIZAM TRÂMITES INTERNOS
Uma dura verdade é que processos de contratação na maioria das grandes empresas ainda é algo moroso.
São pedidos diversos documentos; o cadastro pode demorar semanas para ser concluído, e o contrato levar meses para ser assinado. Os pagamentos? Costumam ser realizados entre 60 e 120 dias.
Isso é um horror para qualquer empresa pequena, principalmente para uma startup, cujo negócio é de alto risco por natureza. Se fôssemos seguir esse processo para rodar um piloto de três meses, com muita sorte a startup conseguiria ser paga quando o piloto fosse entregue
Para viabilizar um programa de conexão, é preciso criar um fast-track para a contratação do piloto, fazendo com que o tempo de conclusão do processo seja muito menor.
Em alguns clientes, conseguimos cadastrar e assinar contrato em 2 semanas e iniciar os pagamentos em poucos dias.
E se sua startup vier a ser contratada após o piloto (que é quando você entra de fato no processo tradicional de compras), já terá pulado algumas etapas burocráticas, como a do cadastro.
FUNDAMENTAL, O PILOTO FACILITA A TOMADA DE DECISÃO PELA COMPANHIA
Soluções de startups normalmente têm base tecnológica. E sua implementação com frequência significa mudanças radicais na operação de uma grande empresa.
O que não necessariamente facilita a vida da startup.
Por mais incrível que seja aquela solução, sua implementação full pode exigir que a empresa assuma um nível de risco muito alto, principalmente em ambientes fabris.
Nesse aspecto, o projeto piloto facilita a tomada de decisão da grande companhia, pois permite começar uma relação com as startups com um nível de risco reduzido e controlado.
Por natureza, o piloto deve ser enxuto, executado com uma amostra do público total, com o mínimo de tempo e dinheiro investido, sem interferir na solução utilizada atualmente em escala e com métricas claras de resultados esperados
Dentro dessas condições, a empresa se sente, com certeza, bem mais confortável em fazer um teste.
Neste processo você, empreendedor, terá a oportunidade de construir uma relação de confiança com os times internos e gerar dados concretos sobre os resultados do piloto — provas do benefício da sua solução.
E isso, claro, aumenta suas chances de contratação.
AVANÇAR DO ABISMO À OPORTUNIDADE EXIGE COMPREENSÃO MÚTUA
“É o primeiro trabalho da startup com a gente… Eles bem que podiam fazer de graça para a gente testar, não é?”
Quem nunca ouviu isso de um possível contratante?
Nos programas sérios, o piloto é pago, assim como o produto ou serviço que a companhia contratará posteriormente. Simples assim.
Há um abismo entre o universo da startup e da grande empresa em todos os aspectos: caixa, governança, agilidade, tomada de decisão, time, acesso etc. É preciso ter compreensão dos dois lados para que a relação dê certo
E um dos motivos pelos quais essa relação pode dar errado é a falta de conhecimento em relação ao que acontece do outro lado da mesa, o que sempre pode gerar falhas de comunicação.
Por outro lado, ter uma (boa) empresa intermediando o processo e gerindo o programa potencializa as chances desse relacionamento dar certo.
Assim, existe a garantia de uma metodologia envolvida e processos de sensibilização, engajamento e alinhamento de expectativas para os dois lados, a companhia e a startup — sem que o viés de cada parte interfira negativamente.
O caminho tradicional de contratação de uma grande empresa pode ser árduo. Por meio de programas de conexão, há um esforço em agilizar e facilitar esse caminho para que as duas pontas possam usufruir dos ganhos do relacionamento.
Roberta Simões trabalha há seis anos com inovação corporativa. Foi responsável pela concepção, gestão e expansão do Braskem Labs, plataforma de corporate venture da Braskem, e hoje atua como consultora associada na Innoscience (que tem um canal de conteúdo aqui no Draft). Formada em Publicidade e Propaganda e pós-graduada em Gestão e Marketing Digital pela ESPM, compartilha aprendizados e reflexões no Instagram @robertasimoes__.
Mariana Santana é formada em Ciências Sociais pela USP com especialização em gestão estratégica da inovação pelo SENAC. Desde 2015 atua com inovação corporativa em projetos de estratégia, inovação aberta e intraempreendedorismo. Atualmente trabalha na área de estratégia da Brasilseg.
Quantos anos de trabalho você ainda tem pela frente? Entenda por que a métrica para se determinar a fatia economicamente ativa da população está defasada – e por que deveríamos inverter já o nosso conceito de longevidade.
Num mundo em constante mudança, saber abraçar o caos é essencial à inovação. Fernando Seabra, empreendedor, mentor e investidor, explica como atravessar esse “labirinto de complexidades” e aproveitar as oportunidades que ele oferece.
A devoção à "divindade" Trabalho nos deixou doentes. Fabrício Oliveira, CEO da Vockan, explica como conseguiu implementar a semana de quatro dias em sua empresa (e por que quase toda companhia deveria fazer o mesmo).