Net zero é o compromisso de reduzir as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera. A expressão completa é net zero carbon emissions (zero emissões líquidas de carbono, em tradução livre).
Trata-se de um acerto de contas da humanidade com o planeta Terra envolvendo indivíduos, empresas e governos. O objetivo é frear o acelerado processo de aquecimento global em que embarcamos a partir da industrialização, em meados do século 18.
De lá para cá, num período de aproximadamente 250 anos, depositamos gases de efeito estufa à vontade na atmosfera – destaque para o dióxido de carbono (CO2) –, sem pagar tarifa. E agora o boleto chegou: a temperatura média global já subiu 1,1 ºC desde a Revolução Industrial.
As consequências disso estão no noticiário com cada vez mais frequência e intensidade: enchentes, queimadas, degelo nos polos, temporadas de temperaturas acentuadas – para cima e para baixo – em todos os continentes.
As implicações dessas tragédias vão desde mortes de seres humanos e animais até fluxos migratórios e vulnerabilidade social gerados por inundações de áreas urbanas costeiras densamente povoadas – imagine Rio de Janeiro e Nova York sendo desocupadas porque o nível do mar subiu e invadiu as cidades.
Cálculos deste estrago já consumado e projeções do que está por vir são publicados, periodicamente, por um grupo de mais de 700 cientistas em relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), criado em 1988 pela Organização das Nações Unidas (ONU). O documento mais recente do IPCC, de agosto de 2021, é alarmante. A expectativa é de que, até 2030, a temperatura suba mais 0,4 ºC. Isso significa um aumento de 1,5 ºC em comparação com o período pré-industrial.
Este avanço aparentemente sutil indica que os eventos climáticos extremos serão ainda mais rotineiros e coloca todos nós diante de uma encruzilhada:
Se as emissões continuarem no mesmo ritmo…
O aumento da temperatura global chegará a 2,4 ºC em 2050 e 4,4 ºC até 2100.
Se mantivermos as emissões em queda nesta década e zerarmos até 2050…
O aquecimento global se estabiliza em 1,6 ºC no meio do século, podendo recuar para 1,4 ºC até o fim do século.
Diante da urgência e da gravidade deste climão causado pela humanidade, não é exagero dizer que o net zero é a principal estratégia de sobrevivência da espécie.
Há duas maneiras principais de reduzir emissões: a primeira delas é diminuir ou eliminar atividades que produzam gases de efeito estufa. No caso de indivíduos, trocar trajetos de carro por caminhadas ou pedaladas é uma maneira de gerar menos impacto. Instalar paineis solares para abastecer casas ou prédios residenciais também.
Empresas comprometidas com net zero precisam atentar para o tipo de matriz energética que usam para oferecer seus produtos e serviços, direta e indiretamente. Isso inclui imóveis, rede logística, fornecedores e terceiros. Numa política de net zero, a corporação se compromete a compensar emissões de todos os envolvidos em sua cadeia produtiva. Esta aliás, é a principal diferença entre net zero e neutralidade de carbono – pois é, eles não são sinônimos e a gente explica mais à frente.
A partir desta análise, a companhia sabe em que atividades pode diminuir emissões. O foco pode ser substituir frotas de veículos a combustão por equivalentes elétricos. Ou utilizar energia gerada por fontes renováveis, como a eólica e a solar, por exemplo.
Globalmente, de acordo com reportagem da Superinteressante, um estudo da Universidade de Oxford que analisou 4 mil empresas dos 25 países que mais emitem CO2, observou que 19% delas aderiram a metas net zero. Pode parecer pouco, mas elas representam 61% das emissões globais de carbono.
Instâncias governamentais também devem adotar as estratégias citadas acima. Além disso, devem promover políticas públicas que aumentem a oferta de energia de fontes renováveis para o setor privado e para a população. Uma maneira de fazer isso é substituir usinas termelétricas por estações de energia eólica, hidrelétrica ou solar.
Até aqui, países e blocos comerciais que são grandes emissores se comprometeram com as metas do IPCC e do Acordo de Paris, assinado em 2015. EUA e União Europeia se comprometem em ser net zero até 2050; a meta da China é alcançar o status em 2060. Outros países já até fizeram o dever de casa. O Butão, na Ásia, e o Suriname, já superaram o net zero e são negativos em emissão de carbono – nosso vizinho sul-americano está neste patamar desde 2014.
Se não for possível zerar o impacto reduzindo emissões, o segundo passo é compensá-las. Isso é possível com o uso de “tecnologias de emissão negativa”. Mas não confunda: embora a sigla para elas, em inglês, seja “NET”, ela não representa o “net” de net zero – mas bem que poderia.
As NETs incluem diversas maneiras de sequestrar o carbono emitido pelas diversas atividades humanas. O plantio de florestas, por exemplo, promove a captura de um volume quantificável de CO2 da atmosfera. Logo, uma empresa pode calcular suas emissões e plantar árvores suficientes para compensar o seu impacto ambiental.
Uma outra maneira de compensar emissões é tornando o sequestro de carbono mais, digamos, literal. A técnica envolve retirar carbono da atmosfera – ou impedir sua emissão – mantendo os gases em câmaras fechadas, geralmente subterrâneas, em legítimo cativeiro.
Era uma vez, 30 mulheres, reunidas numa mansão escocesa do século 19 chamada Glen House. Em 2013, sob a liderança de figuras como Farhana Yamin, advogada ativista da causa ambiental; Christiana Figueres, secretária executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima; Tessa Tennant, dona da casa e ativista ambiental e Rachel Kyte, do Banco Mundial.
Em 2015, outra participante, Jennifer Morgan, do World Resource Institute (WRI), convenceu a administração da alemã Angela Merkel a unir o G7 (sete maiores potências) no compromisso de descarbonização no século 21.
A partir de dezembro do mesmo ano, sempre teremos Paris para nos lembrar dos acordos para compensar emissões de gases estufa até 2050. O net zero se estabeleceu, enfim, globalmente.
Em 2021, a agenda net zero volta para a Escócia, sua “terra natal”, em Glasgow. E será, novamente, protagonista da Conferência das Nações Unidas sobre mudanças Climáticas, também conhecida como COP26 – que o NetZero vai cobrir diariamente.
Como já mencionamos, é importante não confundir os termos. E quem ajuda a explicar isso é o GHG Protocol (Protocolo de Gases de Efeito Estufa). A metodologia foi criada pelo WRI e pelo World Business Council for Sustainable Development para padronizar a contabilidade de emissões e remoções de gases estufa.
Neutralizar carbono é diminuir emissões e compensá-las. Ser net zero, por sua vez, é compensar, também, as emissões indiretas, geradas por toda a cadeia produtiva envolvida nas atividades do emissor. Isso inclui emissões de fornecedores, terceirizados e até mesmo de clientes.
De acordo com o GHG Protocol, a neutralidade de carbono consiste em compensar emissões pelas quais se é diretamente responsável (escopo 1) e emissões relacionadas a compra de energia (escopo 2). O net zero requer neutralizar, também o escopo 3, que tem a ver com bens e serviços adquiridos, distribuidores e itens e serviços vendidos ou prestados.
Compensar emissões diretas e indiretas é um processo recente mas que tem engajado cada vez mais governos e instituições. O problema é que cada um está correndo para um lado. Diversos especialistas concordam que falta estabelecer métricas e protocolos universais que coloquem todos na mesma página.
Definir e adotar uma metodologia padronizada para calcular emissões e compensações é necessário para gerar relatórios confiáveis e uniformes. E isso é fundamental para alinhar os variados entes comprometidos com metas net zero e analisar a efetividade de suas políticas e práticas.
1) Site do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC);
2) Leia no site do World Resource Institute (WRI): Mudanças climáticas alarmantes: veja 5 grandes resultados do relatório do IPCC;
3) Conheça um pouco da história da reunião de mulheres que “inventou” o net zero;
4) Conheça o Protocolo de Gases de Efeito Estufa no site do GHG Protocol.
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