Cortar os intermediários e provocar a concorrência: essas duas estratégias fazem parte do combo da Dr. Jones para se destacar em seu mercado.
Fundada em 2013, a startup de produtos de higiene e autocuidado com foco exclusivo no público masculino vem deslanchando desde que pivotou em 2019 e adotou o modelo Direct to Consumer (D2C), em que a empresa reduz seus custos vendendo diretamente ao consumidor final.
Em 2020, a Dr. Jones faturou 3 milhões de reais, entregando, na casa do cliente, xampus, lâminas de barbear, esfoliantes e até um gel redutor de medidas que promete queimar a gordura abdominal, facilitando a formação da desejada barriga-tanquinho…
O cofundador Guilherme Campos, 37, conta que, para 2021, o objetivo é mais do que triplicar esse resultado:
“Este ano devemos bater 100 mil pedidos no e-commerce. Em um mercado que no ano passado faturou 24,3 bilhões de reais no Brasil, é bem possível atingirmos a meta de faturar 10 milhões de reais”
Um pouco de polêmica ajuda. Com 50% do público formado por millennials, a Dr. Jones gosta de atiçar a sua clientela a desligar o “piloto automático” na hora de escolher, por exemplo, seu aparelho de barbear.
Incomodada, a Procter & Gamble, dona da Gillette (marca-sinônimo desse produto no país), teria enviado uma notificação extrajudicial, reclamando da startup por interagir — em suas próprias redes sociais — com seguidores que citavam a Gillette de forma negativa.
A queixa inspirou a Dr. Jones a lançar dois vídeos (aqui e aqui) dobrando a aposta e mandando “um obrigado gigantte às 200 mil pessoas que mudaram de opinião. E de marca”.
A vaidade masculina ainda é tabu? Dados de um relatório atribuído à Research & Markets sugerem que o mercado de produtos de beleza para homens deve faturar quase 80 bilhões de dólares em 2023.
Se o segmento hoje pode parecer robusto, nem sempre foi assim. Guilherme e Andre Popoutchi, 40, decidiram investir nesse filão lá atrás, em 2013.
“Desde cedo as mulheres têm uma referência muito clara sobre a beleza. O homem está meio sozinho nessa jornada, homens não falam muito disso…”
Segundo Guilherme, a visão deles “era de um consumidor mal atendido querendo melhorar o mercado”:
“Por volta de 2011, reparamos uma tendência clara de crescimento, um trend de beleza masculina muito mais forte nos EUA e Europa, mas que viria para o Brasil — no exterior as barbearias já estavam bombando.”
Bem antes de se tornar uma marca D2C, a Dr. Jones começou sua jornada no varejo físico.
Os primeiros produtos — espuma de barbear, microesfoliante facial, xampu para cabelo e corpo, e pós-barba “energizante” — chegaram ainda em 2013 às lojas da Beautybox, canal multimarca do Grupo Boticário.
Logo, estavam desembarcando também em farmácias e outras redes de cosméticos.
“Entramos na Sephora como a primeira marca masculina brasileira a fazer parte do mix na rede. E em paralelo entramos na Onofre que fazia parte da CVS, maior rede de farmácias do mundo”
A partir de 2015, a marca Dr. Jones foi intensificando sua presença digital, mas ainda atrelada a terceiros, com seus produtos vendidos em grandes e-commerces: Submarino, Dafiti, Americanas, Netshoes…
Estabelecer uma relação mais direta com seu consumidor (sem depender de marketplaces parceiros) também era um desejo dos empreendedores.
Um movimento nesse sentido se deu ainda no offline, com a abertura de quiosques da Dr. Jones em um punhado de shoppings paulistanos: Center3, Morumbi Shopping, Pátio Higienópolis, Pátio Paulista e Villa-Lobos
Além de reforçar a marca, os quiosques permitiam entender melhor a cuca do cliente final.
“Queríamos entender o cliente e desmistificar os grandes players do mercado, que sempre vendiam o produto masculino para a mulher. Para eles, era um fato que o canal [de venda] deveria ser feminino”
Na visão da Dr. Jones, esse foco no feminino, claro, era um erro da concorrência.
A realidade das novas constituições familiares apontava para a existência de muitos homens solteiros. Com o tempo, a percepção de que eles não queriam entrar em lojas femininas para perguntar sobre produtos masculinos se tornou evidente.
A guinada decisiva da Dr. Jones para se tornar uma marca D2C se deu em 2019.
Naquele ano, a startup foi às compras: sem um barbeador próprio em seu portfólio, adquiriu o Home Shave Club, clube de assinatura de aparelhos de barbear inspirado no Dollar Shave Club (que, por sua vez, tinha sido comprado em 2016 pela Unilever, pelo valor de 1 bilhão de dólares).
“O modelo do Home Shave Club nos ajudou a entender toda a operação de um negócio digital, com os pedidos do dia, atendimento e o customer experience do qual não tínhamos conhecimento”
O negócio foi fechado com a oferta de 5% das ações da Dr. Jones. Atualmente, os clientes podem adquirir os itens de forma avulsa ou aderir à assinatura, recebendo o refil das lâminas em casa, a cada um, dois, três ou quatro meses.
Hoje, na compra avulsa, o aparelho de barbear que polemiza nas redes sociais se tornou o produto de entrada da startup: custa R$ 9,90 mais o frente. O aparelho mais quatro recargas sai por 36 reais; a espuma de barbear vale 35 reais. Pelo site dá para comprar ainda kits com itens diversos.
Nos últimos anos, aportes vêm ajudando a Dr. Jones a alavancar sua operação e a encarar a concorrência.
Meses após a aquisição do Home Shave Club, a startup recebeu 1,5 milhão de reais da Astella Investimentos, em dezembro de 2019.
“A Astella acreditou que fazia sentido focar na assinatura e no e-commerce. Deu certo e aceleramos muito. Hoje somos muito maiores do que no passado”
Em setembro do ano passado, enquanto disparava contra a concorrência nas redes sociais, a startup conquistava um segundo investimento, de 6 milhões de reais, através da Igah Ventures.
Agora, a empresa completou mais uma rodada seed de 4 milhões de reais, de novo com a Igah Ventures. O montante, somado aos 6 milhões já recebidos, será investido em marketing e no lançamento de novos produtos.
Vender produtos não é a única ambição da startup. Guilherme, o cofundador, conta que parte da estratégia é se tornar o maior canal de comunicação relacionado a higiene e beleza masculina no país.
Em seu blog, a Dr. Jones aposta em conteúdos sobre o crescimento do cabelo, o uso de produtos de barbear, ou até mesmo curiosidades como o detox do carvão vegetal, ingrediente utilizado para remover o óleo da pele.
“Queremos trazer esse homem para perto da marca, perceber os diferenciais que o cliente busca e oferecer conteúdo. Metade do nosso tempo passamos atrás de dicas masculinas para barbear ou de temas como a causa da espinha e a queda de cabelo”
As polêmicas, claro, devem continuar fazendo parte do pacote. Segundo Guilherme, a campanha provocando a P&G bateu mais de 25 milhões de visualizações, somando Youtube, Facebook e Instagram.
Em tempos de redes sociais, polemizar é preciso. Para convencer o consumidor a largar a marca líder, fazer barulho faz toda a diferença.
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