“Filho de peixe, peixinho é”? O clichê só se aplica em parte a Guilherme Syrkis, 35, diretor executivo do Centro Brasil no Clima – CBC. Ele assumiu o posto em setembro de 2020, logo após a morte de seu pai, Alfredo Syrkis, fundador da organização, em um acidente de carro.
Ao contrário de Alfredo (que foi vereador, deputado federal e um dos fundadores do Partido Verde), Guilherme nunca enveredou pela política partidária, embora tenha feito parte do Ministério de Minas e Energia durante o governo de Michel Temer.
Hoje, como diretor do CBC, Guilherme dialoga com todo mundo para fazer avançar uma agenda dupla: manter o aumento da temperatura média do planeta abaixo de 2 graus Celsius; e contribuir para a transição rumo a economias de baixo carbono.
O CBC é um think tank que atua na disseminação do conhecimento, elaboração de ações estratégicas e engajamento da sociedade para o combate aos efeitos das mudanças climáticas. Toca vários projetos simultâneos, como uma consultoria, mas com a diferença de ser 100% financiado por grants (doações ou concessões) e recursos vindos de editais.
Estudo recente divulgado pela Carbon Brief indica que o Brasil é o quarto maior emissor de CO2 do planeta, considerando as emissões acumuladas de 1850 até 2021. Portanto, o papo aqui é (ou deveria ser) urgentíssimo.
A seguir, Guilherme fala ao Draft sobre sua trajetória, o trabalho do CBC, o encontro com Barack Obama na COP26, e os desafios e perspectivas para o Brasil no contexto ambiental.
O seu pai, Alfredo Syrkis, foi um jornalista e autor destacado, ambientalista, um dos fundadores do Partido Verde, quatro vezes vereador e depois deputado federal. Como era a sua relação com ele?
Papai era meu melhor amigo, tínhamos uma relação muito forte e próxima. Na época do vestibular, quando pensei em fazer direito, ele brincava: “Advogado é um bicho difícil. Mas você tem que fazer o que gosta e o que quer”.
Todo mundo achava que eu iria para a política eleitoral, porque desde pequenininho, com 5 ou 6 anos de idade, eu panfletava com meu pai
Era engraçadíssimo, porque ele me levava no Posto 9, e todo mundo gritava: “Eu quero o adesivo do ‘Legalize’…” [em 1989, na campanha de Fernando Gabeira à presidência, o PV se manifestou a favor da legalização da maconha]. Eu nem sabia o que era esse negócio; saía distribuindo os adesivos.
Sempre acompanhei muito o meu pai. Quando ele trabalhou como Secretário Municipal do Meio Ambiente [na prefeitura do Rio de Janeiro, em 1996], eu ficava na sala dele. Quando ele foi vereador, eu o acompanhava.
Essa rotina de ver o seu pai atuando no âmbito do poder público te agradava?
Sim. Mas eu também sofria muito, porque ser filho de político era muito complicado. Até o professor fazia bullying comigo! E não só isso: a quantidade de pedidos de emprego que ouvi…
Sempre foi muito desafiante ter que lidar com a questão de meu pai ser um homem público. Eu fui aprendendo a lidar com essas situações constrangedoras
Por outro lado, meu pai tinha uma verve e amava muito o que fazia. Ele era um político bem quisto e reconhecido. Quando eu aprendi a surfar, ia para a Prainha [na Zona Oeste do Rio, a 50 km do Centro] e lá meu pai era queridíssimo pelos surfistas. Então, tinha bônus e ônus.
Sempre foi muito interessante acompanhá-lo, porque ele vivia para o trabalho. Se eu quisesse estar junto dele, não tinha jeito. Ele era um político que tinha as suas ambições.
Nos finais de semana, a gente ia em comunidades, favelas, sei lá para onde do Rio de Janeiro… Ou para as reuniões partidárias chatíssimas e infindáveis do PV (risos). Depois, entrou na minha veia e aprendi a gostar.
Você chegou a cogitar uma carreira política?
Sim, mas o meu pai sempre teve muita resistência. Ele não queria de jeito nenhum! Ele sempre falava: “Meu filho, não faça isso com a sua vida… E se um dia você fizer, que seja só depois de estar bem financeiramente, para poder ser um político de representação, não de profissão”.
Em 2019, quando ganhei a bolsa da Obama Foundation para o mestrado na Universidade de Chicago, criou-se uma expectativa grande. Mesmo assim, meu pai dizia que havia outras formas de se fazer o bem, ajudar o mundo, impactar a vida das pessoas. Depois do falecimento dele [num acidente de carro, em julho de 2020], muita gente disse para eu me candidatar…
Hoje, na minha posição no CBC e com o perfil que eu tenho, que é muito diplomático e de diálogo, vejo que o papel que desempenho – que não deixa de ser fortemente político, mas não na política eleitoral –, me coloca em uma posição na qual consigo conversar com todos os espectros políticos.
Eu consigo ajudar muitíssimo mais na posição neutra que estou do que entrando nesse mundo eleitoral, pelo qual não tenho nenhum fascínio
Sei que ser político é um sacrifício. Para quem quer ser uma pessoa correta e empenhada, como meu pai foi, é um sacerdócio.
Não atuar em defesa da sustentabilidade ambiental poderia ser uma opção para você? Ou esse tema era presente demais em casa?
Eu tentei fugir, entrar para a área de energia, mas não teve jeito. Fui para área de energia renovável, que pega um pouco de tudo… a parte ambiental, inclusive.
Muitos me diziam que eu tinha vocação para a área de Direito, mas acabei indo para Administração na FGV, com foco em Finanças. A minha turma foi a de 2007, quando teve início a explosão de IPOs.
Como você chegou à área de energia solar?
A minha história com a energia solar começa quando eu estagiava na área de planejamento estratégico do BNDES, onde fiquei dois anos.
Rodei as 24 áreas do banco e cheguei até a pensar em fazer concurso para lá, porque gostava muito. Mas sempre tive vontade de empreender. E a administração era algo generalista demais, me deixava um pouco nervoso
Então, comecei a olhar para fora, para o que era tendência de mercado. Aí, desde o quinto período da faculdade, todos os trabalhos eu fazia sobre energia solar. Se tinha cursos, eu ia lá e fazia.
Você viu que lá fora esse tema estava ganhando força?
Sim. Eu queria uma coisa diferente e nova. Queria empreender em um mercado em que ninguém estava. Minha geração foi aquela que sonhava em criar algo inovador, diferente, construir uma startup e explodir.
Fui um dos pioneiros em energia solar aqui. Fiz o primeiro projeto de energia solar conectado à rede de distribuição do Rio de Janeiro – a MetaSolar [empresa que fundou e presidiu entre 2012 e 2016]
Queria fazer o modelo de negócio parecido com o da SolarCity [comprada pela Tesla em 2016], na época a líder de mercado nos Estados Unidos, que estava bombando com o modelo de leasing das placas fotovoltaicas. Isso foi algo que sempre tentamos criar na empresa.
O que você aprendeu à frente da MetaSolar?
Nossa, foi quase um PhD de vida! Nós éramos quatro sócios e, na sua própria empresa, você pega tudo: de finanças e marketing até logística.
Ganhei até hérnia de disco, ao descarregar painéis solares do caminhão… Sofri muito com a empresa, dei murro em ponta de faca, porque não existia mercado
Quando comecei a trabalhar com energia solar, o watt-pico [Wp é a medida de potência em sistemas fotovoltaicos] era 12 reais. Hoje, está em mais ou menos 5 reais. Foi uma época em que não tinha financiamento e era muito caro colocar energia solar.
Fomos um dos primeiros sistemas on-grid, conectado à rede de distribuição [assim, em momentos em que não há produção de energia solar, é possível utilizar a energia convencional]. Fomos os primeiros do Rio, de Brasília e também em Vitória.
Nesses projetos, eu lidava com o diretor da Light e também com o “peão”. Então, em termos de inteligência social, foi um aprendizado enorme. Não perdi dinheiro, mas também não ganhei.
E como você chegou ao Ministério de Minas e Energia – MME, em 2016, durante o governo de Michel Temer?
Em 2013, eu entrei no mundo do “lobby do bem”. Cofundei, com mais seis empresas, a ABSOLAR – Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica, que hoje reúne mais de 600 empresas. Talvez tenha sido o meu grande case de sucesso.
Foi uma experiência riquíssima, em que lidei com relações governamentais e advocacy, que eu desempenhava com excelência e naturalidade. Eu me tornei o vice-presidente da ABSOLAR e rodei o Brasil como uma espécie de “missionário da energia solar’
Eu advogava pela redução de impostos e tributos para energia excedente que ia para rede, advogava por descontos para energia solar para pequenos agricultores em contratos com o Ministério de Desenvolvimento Agrário.
Ia muito para Brasília, onde ajudei a lançar a frente parlamentar pela energia renovável. Então, conversava com os deputados, senadores e ia muito para o MME, onde fiquei conhecido por levar as pautas. Também ia até a Caixa Econômica e o BNDES, para conseguir de fato popularizar a energia solar no Brasil através de um mecanismo de financiamento.
A partir de 2015, fiquei muito dedicado à ABSOLAR, fazia palestras em universidades… Quando aconteceu a troca de governo em 2016, eu já era uma figura bem conhecida no governo e na própria ANEEL [Agência Nacional de Energia Elétrica].
Surgiu o convite para eu ir para o MME para ajudar a implementar a energia renovável e eu virei o assessor especial do ministro Fernando Coelho Filho para essa área.
Que aprendizados você traz dessa época atuando dentro do governo?
Eu participava de praticamente todas as reuniões em que o ministro estava; comecei a auxiliar também com a parte internacional, porque falo bem inglês. Representei o ministro em oito viagens.
Fui para Abu Dhabi com o Luiz Barroso, na época presidente da EPE [Empresa de Pesquisa Energética], participar da negociação da entrada do Brasil na IRENA, a Agência Internacional de Energia Renovável, que estava emperrada há oito anos. Fui à Índia para o lançamento da Aliança Internacional da Energia Solar – ISA.
Eu vinha do lobby da energia solar, que pede e exige mais incentivos. Era um lado da mesa. Quando fui para o MME, passei para o outro lado.
Achava que, uma vez lá [no Ministério], eu iria “botar a energia solar nos telhados do Brasil afora”. Mas não… Lá você realmente entende as dificuldades e os desafios de ser governo – e, principalmente, de ter de conciliar todos os interesses, entender todas as versões
Foi um desafio enorme e uma angústia muito grande, porque quando você está sentado na mesa do Ministério, descobre que todo mundo tem interesses legítimos. E você está em uma posição de mediador, de escutar.
Por exemplo, uma pessoa de quem fiquei amigo, e com quem tenho embates sobre o carvão até hoje, é o [Fernando Luiz] Zancan, um lobista respeitado e conhecido. Tinha que escutá-lo defendendo o carvão, com todos os seus argumentos legítimos [mesmo discordando deles].
E como continuei na gestão do Moreira Franco [ocupou o cargo de de abril a dezembro de 2018], cheguei a trabalhar também com petróleo e gás, com mineração.
Entrei no perrengue da Renca [Reserva Nacional do Cobre e Associados, uma área do tamanho da Dinamarca localizada entre o Pará e o Amapá], quando a Casa Civil liberou a mineração em regiões da Amazônia, que foi uma polêmica gigantesca. Ajudei a mediar a situação entre o Ministério do Meio Ambiente e o MME.
Peguei a crise dos caminhoneiros, em 2018… Imagina o que foi estar lá assessorando o ministro, naquela loucura total…? Me deu muita casca grossa, uma capacidade enorme de aguentar pressão
Lá no MME você tinha pautas que precisavam ser tocadas aos poucos – como a privatização da Eletrobras – e tinha pautas de emergência, como o apagão.
Estar na assessoria do Ministro era uma emoção todos os dias. E eu fazia uma agenda para receber os parlamentares. Tive que pegar o jeito de conversar com todo mundo: senadores, deputados…
Vamos falar sobre o CBC, o Centro Brasil no Clima, do qual você é diretor. Como o CBC atua?
Temos quatro eixos. O primeiro é Advocacy e Relações governamentais. Hoje, o nosso foco [de interlocução] têm sido os governos subnacionais, os estados.
Na parte de Relações Internacionais, temos relação estreita com os Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia. Fazemos um trabalho que a gente chama de “paradiplomacia”, incluindo algumas coisas inéditas, como a carta dos governadores para o Joe Biden.
Nossa terceira área é de estudos sobre economia ambiental e política climática. Desde [um estudo de] finanças climáticas que fizemos para o Tribunal de Contas da União até a precificação das externalidades positivas de se trocar a frota de ônibus de Porto Alegre por ônibus elétrico – e o impacto disso no PIB da saúde da cidade
Nossa quarta área, mobilização e capacitação, é muito ligada ao Climate Reality Project, projeto do [ex-vice-presidente dos EUA] Al Gore. Todo ano tem turmas de formação. Hoje, fazemos a “manutenção” de uma rede de mais de 2 mil líderes climáticos.
Como o CBC se mantém financeiramente?
Hoje, o CBC é 100% financiado por grants, doações como a do próprio Climate Reality Project e da Open Society Foundations, a fundação do George Soros. Há outros [doadores] como: Climate Action Transparency – ICAT, que é uma organização ligada a União Europeia; GIZ; Google; SEBRAE; e ICLEI.
Todos esses foram via PNUMA [braço da ONU para o Meio Ambiente], editais a que a gente se submeteu, concorreu com outras instituições e ganhou.
A gente vem funcionando como se fosse uma espécie de plataforma empreendedora. Se você tem um projeto interessante, pode trazer para dentro do CBC e a gente tenta aplicar para grants, para esses editais internacionais, e depois fazemos a gestão
Esses projetos costumam ter muitas exigências… É preciso, no mínimo, ter doutorado, pesquisas específicas, experiência técnica e, ao mesmo tempo, as instituições [filantrópicas] querem também experiência com a parte política e governamental, que consiga conversar e fazer avançar as temáticas que estão sendo estudadas. O CBC vem se destacando em ganhar esse tipo de edital.
Outro destaque no trabalho do CBC é a Coalizão Governadores pelo Clima. Como o CBC atua nesta frente?
O CBC criou essa coalizão em 2019, principalmente para contrapor o rumo que o Governo Federal vinha tomando [recém-empossado na época, Jair Bolsonaro ameaçava retirar o Brasil do Acordo de Paris]. Ela foi ganhando corpo.
Quando lançada, a coalizão tinha 12 estados. Hoje, são 25 signatários [as exceções são Rondônia e Roraima]. Com eles a gente formata e realiza diversas iniciativas: a parte de capacitação, orientação e diálogos paradiplomáticos
Fizemos uma conversa entre quatro estados, pedindo que cada um trouxesse uma prioridade para conversar com os 28 membros do Conselho da União Europeia. Um trouxe a discussão do selo verde [o rótulo ecológico da UE, obtido mediante critérios ambientais rigorosos], outro trouxe a rastreabilidade da cadeia de pecuária… Tudo para entender como a UE poderia auxiliá-los.
Apoiamos a embaixada do Reino Unido para levar 11 governadores a Glasgow, na COP26 [em novembro de 2021], e os ajudamos a montar as agendas deles – reuniões bilaterais, participação em eventos em que iriam falar…
Temos ajudado também na estruturação dos fóruns estaduais de mudanças climáticas – espaços de discussão da sociedade civil – com metodologia. E apoiamos em determinados pontos técnicos de iniciativas: a parte de inventário, plano de mitigação [de emissões de GEE] e plano de adaptação.
É uma série de ajudas técnicas, com criação de capacidade e de conhecimento para os estados, além de construção de diálogos com sociedade civil, para ajudar a agenda climática a avançar
Tudo que a gente faz para os estados é de graça, não recebemos nada deles. E muitos grants em que a gente concorre são pensados para se somar a esses trabalhos de finanças climáticas, precificação de externalidades negativas [custos gerados pela poluição], estruturação dos fóruns.
Na COP26, você esteve no debate entre Barack Obama e outros líderes jovens. Quais foram suas impressões desse encontro?
Eu fui convidado por ser uma das pessoas que eles chamam de climate leaders e por ter sido bolsista da Obama Foundation.
Meu pai faleceu uma semana depois que eu retornei do programa, então o Obama foi muito carinhoso e generoso comigo. Foi uma conversa superbacana. Lá, pude contar um pouco do trabalho com o Governadores pelo Clima e levantar, fortemente, a bandeira da justiça climática
Os países em desenvolvimento serão os mais afetados pela crise de emergência climática que a gente já está vivendo! São as pessoas que vivem em comunidades, em barracos, em estruturas vulneráveis a chuvas intensas, ao calor intenso.
Quando a ativista alemã Luisa Neubauer reclamou de não conseguirmos chegar [à meta de limitar o aquecimento global] em 1,5ºC, o Obama disse: “Luisa, sendo sincero, minha maior preocupação é como será o compliance disso, principalmente em países que têm muita corrupção e dificuldade de um gasto eficiente dos recursos direcionados, que são altos”.
É algo pertinente, que vamos ter que trabalhar muito nos próximos anos: a transparência e o acompanhamento da implementação das medidas e do empenho desses recursos… Um desafio enorme!
Como você avalia a COP26, os compromissos assumidos pela diplomacia brasileira e as perspectivas para o mercado de carbono no país?
Foi importantíssimo o Brasil ter entrado tanto no Forest Deal [acordo para proteção de florestas que tem como meta zerar o desmatamento no mundo até 2030], quanto no acordo de metano [compromisso de 103 países pela redução de emissão de gás metano em 30%] – que temos plena capacidade de cumprir, fazendo uma melhoria e ganhando eficiência na pecuária.
O problema é que o Brasil se compromete, mas na hora de colocar em prática, quebra a confiança. Foi muito ruim a forma como foi feita a divulgação tardia do índice de desmatamento
(Apresentado em 18 de novembro, apenas após o fim da COP26, o Relatório do Inpe mostrou aumento de 22% no desmatamento da Amazônia Legal, o maior desde 2006.)
Eu costumo dizer que, hoje, o maior problema ambiental do país é a “língua” do presidente [Jair Bolsonaro], que acaba criando um clima de impunidade e libertinagem.
A COP26 deixou um sinal mostrando que o Brasil pode ser, de fato, um dos países que mais vão se beneficiar do mercado de carbono. Temos um potencial de captação de bilhões e mais bilhões. O projeto de lei 528/21 é extremamente importante para podermos regulamentar o mercado voluntário e mandatório.
É uma oportunidade incrível para as empresas e para o setor de energia. Agora, o Brasil precisa fazer o dever de casa. O Governo Federal precisa parar de ficar apenas no gogó e, realmente, fazer o que tem que ser feito na questão do desmatamento na Amazônia
Precisa aumentar o efetivo do IBAMA. Não adianta nada ficar colocando polícia ou exército, que não têm conhecimento e capacidade de fazer essa gestão das nossas florestas. Antigamente, a polícia do IBAMA tinha um nível muito qualificado.
E precisamos voltar a ter concursos como os de antes, para trazer gente com mestrado, doutorado, e que entrava na floresta e queimava os tratores dos desmatadores… Esses caras são verdadeiros heróis.
Trocar a matriz energética de combustível fóssil para energia renovável é suficiente? Ou há outras frentes que precisamos atacar para evitar o agravamento da emergência climática?
O nosso grande problema é o desmatamento e o uso da terra. Mas a preocupação com a energia tem aumentado consideravelmente em função da crise hídrica. Temos muitas usinas a óleo diesel, com emissão considerável de GEE.
O Brasil tem possibilidade de fazer ainda uma maior penetração de energia variável intermitente – energia solar e eólica – no sistema. A EPE calcula um valor de até 40%. Temos que investir em soluções ligadas a grandes baterias que tenham capacidade de fazer a modulação do sistema de distribuição.
A energia de hidrogênio verde [o elemento químico tem alto valor energético: sua queima libera três vezes mais energia do que a gasolina] é interessante, não só para parte de geração, mas para o transporte. Temos de incentivar o nosso etanol e fazer a troca da frota de ônibus para os elétricos, que têm um impacto significativo para as nossas capitais.
Fazer a transição do petróleo ainda vai ser muito difícil. Economias como a do [estado do] Rio de Janeiro ainda são muito suscetíveis às mudanças do preço do petróleo… Mas Niterói é um exemplo, porque está utilizando os royalties para investir em tecnologia, inovação, pesquisa e desenvolvimento
O gás, embora emita menos do que o óleo, também terá que ser substituído aos poucos. Temos uma emergência climática: não dá mais para advogar por petróleo e gás. Precisamos fazer uma transição bem estruturada, porque é complexo.
Quais são as principais travas para que a população se conscientize dessa necessidade da sustentabilidade ambiental e dessa transição?
A Covid-19 foi didática para a questão das mudanças climáticas, a população vem tendo uma compreensão cada vez melhor sobre o tema. Mas aí a gente volta à conversa do início: quando eu sentava na mesa do ministério, tinha que escutar um pouquinho de cada um.
Hoje, o Rio Grande do Sul e Santa Catarina têm matrizes fortes de carvão. Se for fazer uma coisa [transição] abrupta, você quebra a economia de cidades como Criciúma… Por mais que essa população entenda a gravidade do negócio, o carvão tem sido o ganha-pão deles há anos
Tem que haver um processo bem estruturado ali de capacitação e de transição de conhecimento, de empregos.
Como você enxerga a geração Alfa, de ativistas como Greta Thunberg, frente às gerações anteriores? E como você enxerga o futuro do planeta?
Eu acho que a geração da Greta é fantástica. A minha própria geração, a Y, tem resquícios das gerações passadas, alguns pensamentos limitantes… Vejo essa geração da Greta com bons olhos.
Temos até uma preocupação no Climate Reality Project, porque muita gente dessa idade vem manifestando ansiedade climática. Aumentou o número de reuniões em que temos de fazer uma espécie de conversa terapêutica com eles, que sentem uma depressão em relação ao que está acontecendo e ao que será do mundo…
Vejo o futuro do mundo com muita preocupação, principalmente em relação à falta de prioridade dos governos. E temos visto [outros] desafios menores do que a emergência climática: pessoas resistentes à vacina contra Covid-19, enquanto uma nova onda surge na Europa…
Não vou dizer que sou pessimista, nem que estou otimista… Estou na posição de entender que, de fato, o que eu estou fazendo precisa continuar a ser feito. E temos muito trabalho daqui para frente.
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