Saúde, justiça social e urgência climática são os três problemas que a foodtech Mahta quer ajudar a resolver. Como? Produzindo e comercializando um “superfood” feito com ingredientes amazônicos produzidos em sistemas agroflorestais ou retirados da floresta por meio do extrativismo.
Sem uma definição científica, superfood é um conceito associado a alimentos que oferecem alto nível de nutrientes desejáveis. No caso da Mahta, o alimento em pó é feito com cacau, cupuaçu, açaí, coco, castanha do pará, taperebá, bacuri, graviola, muruci, bacaba, cumaru, cogumelo yanomami e pimenta baniwa. O resultado, segundo a marca, é um shake superproteico, com 14g de proteína por dose (o que ajudaria, por exemplo, na construção dos músculos), sem corante nem aditivos.
Fundador da Mahta (com Edgard Calfat, em 2021), Max Petrucci acredita que a floresta ainda guarda grande potencial inexplorado para a nutrição humana:
“A nossa pegada é ir atrás da riqueza da biodiversidade em nutrição e fazer produtos diferentes. Com certeza a Floresta Amazônica tem muito mais a oferecer do ponto de vista dos superfoods do que o mundo conhece, que é só açaí e cacau”
Os ingredientes são comprados de cooperativas como Associação dos Pequenos Agrossilvicultores e Cooperativa Agropecuária e Florestal do Projeto RECA, ambas de Rondônia, e a Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer (Coopavam), do norte de Mato Grosso. Todas trabalham com sistemas agroflorestais, que não desmatam para produzir.
“São vários os desdobramentos da agricultura regenerativa”, diz Max. “Devido à variedade das culturas, você tem uma agricultura perene, diversa, que fortalece a vida do solo para cima e também do solo para baixo.”
Em indústrias parceiras da Mahta, estes ingredientes são liofilizados (esse processo de desidratação retira a maior parte da água e mantém os nutrientes dos alimentos, o que aumenta o prazo de validade), misturados e embalados.
O produto final, um pó que pode pode ser misturado em água e consumido como um complemento nutricional ou como substituição de uma refeição, começou a ser vendido em abril deste ano apenas pelo site, ao preço de R$ 189,97 (440g).
A ideia de unir o conceito de superfoods com os ingredientes produzidos dentro da Amazônia surgiu de uma combinação de várias experiências pessoais de Max.
Graduado em Administração pela FGV, ele trabalhou como executivo da Microsoft entre 2000 e 2005, quando foi responsável pelo lançamento do MSN Messenger no Brasil.
Nesse período, uma desregulação da glândula adrenal o deixou com a saúde desequilibrada e o fez querer melhorar a nutrição e o estilo de vida, o que incluiu um contato mais próximo com os superfoods.
“Minha curva de cortisol estava super alterada, então eu acordava me sentindo um lixo. O que mais me ajudou foi a nutrição: recuperei a vitalidade, perdi peso, ganhei massa muscular e foco. Aí, comecei a acompanhar mais esse mercado de superfoods”
Paralelamente, ele vivia uma jornada pessoal de descobertas que incluiu yoga, xamanismo e outras sabedorias ancestrais. Logo, essa miscelânea de conhecimentos o levaria a questionar, também, as relações de trabalho.
Naquela época, Max atuava como CEO da Garage, agência de marketing fundada por ele em 2006 (e da qual permanece até hoje como sócio, mas agora distante do dia a dia operacional).
Ele começou a se perguntar sobre o papel das empresas em um mundo mais conectado e em rede – e como seu trabalho poderia ajudar nisso.
Depois de enfileirar uma série de projetos que tinham como pano de fundo o propósito das marcas, decidiu que era hora de empreender com impacto. Ou, como ele prefere dizer, “de um modo regenerativo” (nada a ver com filantropia).
“No nosso modelo, quanto mais as pessoas consumirem Mahta, mais a floresta vai ser regenerada. E vai regenerar o tecido social também, porque estamos gerando renda para que aquelas pessoas possam viver cada vez melhor ao produzir ingredientes de forma sustentável”
A empresa surgiu de fato em 2021, mas o passo inicial foi dado em 2020, quando Max e os primeiros sócios — que já não estão mais no negócio — encomendaram uma pesquisa junto à Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) sobre a composição nutricional desses ingredientes amazônicos.
Com os bons resultados em mãos, partiram para a produção e testes de mercado que, segundo Max, se mostraram promissores.
A ideia inicial era lançar o produto nos Estados Unidos, onde esse mercado de superfoods já é mais desenvolvido. Com a pandemia, porém, os planos foram alterados.
Nesse intervalo, os primeiros sócios saíram e Edgard entrou na sociedade. Primeiro foi contratado como consultor, já que possui experiência no mercado como cofundador da PuraVida e CEO da B-on, e logo convidado para ser sócio. E o lançamento acabou acontecendo no Brasil. Na avaliação de Max, os resultados são surpreendentes.
“Um fato muito contundente que prova o quanto esse mercado já está maduro e vai crescer exponencialmente foi a compra da PuraVida pela Nestlé. Este formato de produtos em pó, super práticos e nutritivos, vai entrar na vida das pessoas. Acho que 60% das pessoas vão ter 20% das da sua alimentação desta forma”
O aporte inicial no negócio foi de 2 milhões de reais, um investimento-anjo de Guilherme Azevedo, empreendedor do setor de saúde: ele é cofundador da Dr. Consulta e hoje está à frente da Alice.
As vendas ainda estão bem no início, diz Max, mas o crescimento do faturamento mostra potencial. Foram 20 mil reais no primeiro mês, 60 mil reais em agosto e a ideia é fechar o ano com 300 mil reais.
A meta é, nos próximos dois anos, se firmar no mercado brasileiro, alcançando o break-even e um faturamento de 20 milhões de reais.
A Mahta foi selecionada no programa de aceleração da AMAZ (Aceleradora de Impacto da Amazônia) e conta com um recurso de 200 mil reais para ajudar a desenvolver o negócio.
Com uma produção de cerca de 300 quilos do superfood por mês, a foodtech planeja lançar um novo produto por trimestre. A primeira novidade deve chegar no final do ano.
Porém, existe um grande desafio pela frente quando se fala em ganho de escala: a disponibilidade dos ingredientes produzidos de forma sustentável.
Mesmo com algumas cooperativas mais consolidadas (fornecendo, inclusive, matéria-prima para gigantes como a Natura), é preciso levar infraestrutura, conhecimento e mercado até esses produtores. E reforçar a mensagem de que a floresta em pé pode ser muito mais valiosa do que derrubada.
Segundo um estudo publicado pelo Instituto de Engenharia e coordenado pelo professor Carlos Nobre, pesquisador sênior do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP e diretor científico do Instituto de Estudos Climáticos da Universidade Federal do Espírito Santo, a rentabilidade anual por hectare de açaí, caju e castanha produzidos com a floresta em pé é de 12.300 reais. Já a rentabilidade da carne e da soja, que demandam desmatamento, é de apenas 604 reais.
“O que a gente está fazendo é, na ponta do mercado, ajudar a mostrar que este é o modelo que temos que rodar como sociedade. E não o modelo estúpido de derrubar a floresta pra plantar soja e gado”
A Mahta também quer ajudar a agregar valor aos produtos para que os agricultores possam atuar além da venda dos ingredientes in natura. A foodtech apoia um projeto desenvolvido pelo RECA que pesquisa a formulação de uma proteína isolada de cupuaçu a partir dos resíduos que sobram da extração da manteiga, hoje vendida pela comunidade para a Natura.
“A nossa visão é ajudar essas comunidades a, o quanto possível, fazerem a Mahta ou o concorrente da Mahta”, diz Max. “Eu sou necessário só porque hoje não tem empreendedor com a minha história e visão. Quando não for mais útil, eu vou pra casa.”
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