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Carol Paiffer: “É muito mais difícil ser racional no Shark Tank do que na bolsa de valores, onde literalmente vejo um número e pronto”

Marina Audi - 22 jun 2023
Carol Paiffer, CEO da holding Atom S/A e integrante do Shark Tank Brasil.
Marina Audi - 22 jun 2023
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Carol Paiffer, 35, é descrita na internet como milionária. A curiosidade do público em torno da CEO da Atom S/A (ATOM3) – holding listada na B3, controladora da Atom Educacional, Atom Traders, Atom Editora e Shark Tank e-School – se deve, em especial por ela ter se tornado uma participante fixa do reality show Shark Tank Brasil, em 2020.

A própria Carol reconhece que uma das grandes curiosidades dos internautas a seu respeito é saber o quanto ela tem de dinheiro. 

“Eu falo sobre dinheiro, isso pra mim é muito natural. Há 18 anos, eu me provoquei a aprender sobre o mercado financeiro e sou investidora profissional” 

Em contraposição à maior parte dos brasileiros, Carol não tem receio de falar sobre o assunto. Desde cedo, antes mesmo de terminar a faculdade, começou a palestrar sobre a bolsa de valores para que mais pessoas se tornassem investidoras e contratassem a empresa que ela fundou com o irmão, Joaquim Paiffer. 

Mais recentemente, Carol tomou para si a missão de desconstruir o tabu nacional em torno da matemática e das finanças, em duas frentes. Pelo Instituto Êxito de Empreendedorismo, do qual é cofundadora, ela atua na formação de novos empreendedores e no aperfeiçoamento de quem já empreende; pelo Instituto de Educação Financeira, que capitaneia o Clube do Teo Tourinho, Carol investe em educação de alunos e professores da rede pública de ensino, com uma série animada distribuída gratuitamente.

A história de Carol começou lá atrás. Junto com o irmão, ela desbravou o mercado de agentes autônomos, fez o único IPO reverso da B3 (comprou uma empresa já listada na bolsa para que a própria operação tomasse o lugar da antiga) e lidera hoje a maior mesa proprietária de traders da América Latina (só opera com dinheiro próprio, na bolsa de valores — ou seja, não tem clientes!). 

De 2015 para cá, Carol passou a se dedicar à educação de profissionais, os traders. Hoje, esse braço de negócio traz mais receita ao grupo do que a própria mesa de traders. Ao entrar para o Shark Tank Brasil, ela começou a investir em outros negócios. Hoje, tem 60 empresas no portfólio de uma aceleradora chamada Proton, que organiza o fluxo de mentorias e o back office das investidas.

“O que eu tento passar na minha comunicação é que o dinheiro não é bom, nem ruim. Ele não deve ser o peso. Ele é só consequência do seu potencial bem aplicado”, diz. 

Confira abaixo o papo de Carol Paiffer com o Draft, no qual ela conta como coloca o próprio dinheiro para que outras pessoas operem na bolsa de valores — e também para que pessoas que empreendem realizem seus sonhos.

Hoje você provavelmente é mais conhecida por participar, desde 2020, do programa Shark Tank Brasil. Ali, você analisa pitches de empreendedores e já investiu em 60 negócios. Antes disso, porém, em 2019 já tinha começado a fazer investimentos-anjo. Como você se aproximou desse tipo de negócio?
Eu comecei pela Bossanova Investimentos no pool de Edutech, porque a minha empresa é de educação. Eu fiz duas frentes. Aqui na Atom, focamos em ensinar as pessoas, porque não encontrávamos pessoas para trabalhar com o nosso dinheiro, a gente sentia uma falta desse tipo de profissional. Então, focamos em educação.

Em seguida, fiz dois movimentos. Um foi investir no pool de Edutech para trazer empresas de educação mais para perto. E, dois, eu me inscrevi no mestrado e estou me formando em Tecnologias Emergentes em Educação pela MUST University. Acredito que as pessoas aprendem de jeitos diferentes e eu precisava entender como as pessoas queriam aprender. 

Aí, quando comecei a investir pela Bossanova, também entrei no pool de Esportes e Saúde, afinal quando você cuida do seu corpo e da sua mente, produz mais. Sempre acreditei nisso, tanto que dentro da Atom a gente tem essa preocupação – um módulo do nosso curso que é sobre mindset, mentalidade, com a psicóloga e performance coach Priscila de Sousa. Temos toda uma preocupação em relação a como você cuida do seu corpo e da sua mente, para trazer mais performance.

Em 2020, montei o pool Ladies, no qual o comitê só tem mulheres. No mercado financeiro e também nos comitês, só havia eu de mulher. Percebia que as mulheres ficavam aliviadas quando me viam e daí criei esse pool para que as mulheres empreendedoras tivessem oportunidade de fazer um pitch para mulheres 

Daí veio o convite do Shark Tank, que foi uma grata surpresa. Na verdade, há mais de 10 anos eu gravo vídeos e as pessoas me falavam que eu deveria estar no programa. Aí quando o Shark Tank veio para o Brasil, comecei a palestrar muito em São Paulo – sou fundadora do Instituto Êxito – e as pessoas começaram a me conhecer. 

Muita gente falava que eu deveria estar no Shark Tank Brasil; a Fabi Saad me entrevistou pro Mulheres Positivas e falou a mesma coisa. Em seguida, marcaram uma reunião comigo e fui convidada pra entrar no programa.
Investi em 60 empresas que me foram apresentadas no programa ou porque me apresentaram projetos por causa do Shark Tank Brasil.

Por exemplo, tenho uma investida, a Dionisio.Ag [a agência de comunicação visual, fundada por Jean Paschalis, Rafael Araujo e Victor Barros, busca conectar artistas com empresas interessadas em inserir a arte no seu dia a dia], na qual investi pelo Shark, em 2021; depois disso, já investi em outro negócio com ela.

Na startup de impacto social Afro Academy, que é da Graciane Martins, eu investi pelo Shark também. Depois investi em mais duas empresas que a Gra é sócia e que ela montou. 

O Shark me abriu muitas possibilidades e eu tenho olhando o que faz sentido dentro do meu ecossistema. Aí, montei uma aceleradora e um CSC – centro de serviço compartilhado – para que eu pudesse cuidar e amparar essas empresas em que eu investi via Shark Tank. 

A minha entrada no programa é um desafio enorme, porque investir na bolsa de valores é muito mais fácil: posso comprar e vender ações e ninguém fica sabendo. Já no Shark, tenho de tomar uma decisão muito bem pensada, porque terei de conviver com aquela pessoa, vou dedicar horas àquela pessoa 

De fato, é uma decisão de me relacionar com aquela pessoa em longo prazo – esse é o maior desafio.

Vou confessar duas coisas. Nunca imaginei fazer esse movimento, isso me provocou a conhecer sobre vários assuntos diferentes do que eu estava acostumada e também a montar uma outra empresa só para atender as minhas investidas do Shark Tank. Então, estar ali é um grande presente. 

E eu gosto tanto que negociei com a Sony e licenciei a marca Shark Tank e-School, via Atom. Como o meu foco aqui é educação, montamos uma escola para ensinar as pessoas a serem líderes de negócios. Ou seja, não importa se você vai montar o CNPJ ou se vai ser um intraempreendedor: estamos aqui pra te ajudar com o know how que temos na Atom.

Investir em um empreendedor que está ali na sua frente – e ainda não tem um histórico de EBITDA etc. — é muito diferente de comprar ou vender ações de empresas em que você pode nunca ter estado presencialmente, como faz um traderprofissional investidor que opera a curto prazo para gerar renda?
Boa pergunta. No Shark Tank temos de tudo – desde pessoas que estão muito seguras e outras que não estão.

O cuidado ali… até fui aprender mais sobre leitura corporal, porque às vezes uma pessoa que se vende muito bem fala coisas que não são verdade, porque tenta nos convencer ou porque está muito exposta. E há pessoas que estão ali nervosas, mas têm propriedade no assunto e, de fato, sabem o que estão fazendo.

Ali no Shark Tank, olho o pitch não só a partir de números, mas também a partir das pessoas. É óbvio que é difícil de eu investir em quem não conhece seus números… Olho mais como as pessoas se posicionam e o ponto chave da minha análise é sempre se aquilo tem um impacto na sociedade

Se tem impacto apenas no bolso da própria pessoa, sendo muito sincera, não vale a pena pra mim. Posso fazer isso na bolsa de valores com muito menos exposição e responsabilidade. 

Quando eu olho o pitch no Shark Tank, analiso quem é aquela pessoa, quanto ela acredita que aquilo tem um impacto na sociedade e o quanto ela vai ser leal ao projeto. É muito mais uma análise do empreendedor, da empreendedora, do que do negócio.

Foi fácil pra você fazer essa mudança e passar a avaliar pessoas? Fazia 15 anos que você avaliava números e gráficos na bolsa de valores…
Pra mim é um baita desafio porque, diferentemente do que todo mundo acha, analisar empresa na bolsa é muito mais fácil – são só números, não tem apego emocional.

No Shark, às vezes a gente tem que se segurar pra não chorar diante de uma história de alguém que ralou pra caramba, perdeu um ente querido ou que enfrentou uma desgraça. É muito mais difícil ser racional ali do que sou na bolsa, onde literalmente eu vejo um número e acabou. 

Essa transição de mentalidade foi o meu maior desafio em toda a minha história, com certeza. Lidar com pessoas e com histórias é uma provocação muito grande

Olha, vou te confessar que, até entrar no Shark Tank Brasil, eu não imaginava que as pessoas em geral tinham tanto preconceito contra a bolsa de valores. As pessoas escreviam assim no YouTube: “A Carol é do mercado financeiro. O que ela entende sobre empresas ou sobre pessoas?”.

Caraca, mano, mas são mais de 400 empresas na bolsa de valores brasileira. A gente está falando de milhares de empresas nos EUA! As pessoas me provocavam por ali para ver se eu entendia sobre o mercado, pessoas etc.

Daí, percebi o quanto as pessoas são preconceituosas em relação aos profissionais do mercado financeiro, porque elas acham que nós só olhamos números, temos um foco muito capitalista e esquecemos do ser humano por trás daquele negócio. 

Isso te incomodava, Carol?
Com certeza, mas sou um tipo de pessoa que nunca olha o quanto o copo está vazio, e sim o quanto ele está cheio. Eu tinha até um apelido na faculdade: “insuportavelmente feliz” (risada).

Sempre olho para o que posso fazer com essa informação. E olhei esse comentário não como uma crítica, mas como uma oportunidade de refazer uma leitura sobre as pessoas do mercado financeiro.

Porque, vamos lá: somos pessoas que ganham dinheiro e colocam dinheiro na economia. Eu não tenho nenhum problema em ensinar todo mundo sobre o mercado financeiro, porque tenho orgulho do que eu faço, da minha história e do impacto que tenho na vida de outras pessoas. 

Então, vi uma oportunidade de corrigir uma leitura equivocada que as pessoas tinham sobre nós. Somos pessoas normais – eu e meu irmão somos de Porto Feliz (SP), que tem 50 mil habitantes; nunca imaginei acessar e nem ter o patrimônio que tenho hoje. Graças ao mercado financeiro, a gente acessou isso 

Então, quando a gente pode compartilhar com as pessoas a nossa história e provocá-las a darem o melhor de si para ganharem mais dinheiro, eu vi ali naquele comentário uma oportunidade de correção de uma leitura equivocada que as pessoas têm sobre um mercado que é altamente promissor.

Olha só, nos EUA, 56% da população investe na bolsa. No Brasil, são 3%. Até quatro anos atrás, a gente tinha mais gente na cadeia do que na bolsa – esse é um número assustador!

Ou seja, a minha entrada no Shark é literalmente levantar uma bandeira e falar: “Vocês estão enganados. Nós, do mercado financeiro, somos pessoas iguais a você. Sentamos a bunda numa cadeira, estudamos, estamos ganhando dinheiro com o mercado em que você também poderia ganhar dinheiro”. 

Vi ali uma oportunidade de reverter [essa percepção] e acho que consegui fazer nessas últimas quatro temporadas.

Muitas aceleradoras de negócios têm uma trilha, tipo um playbook de como ajudar as empresas a saírem do nível em que estão e irem além – seja em estágio inicial ou mais maduro. Como você estruturou isso para as empresas em que investiu, tendo em vista a sua experiência em analisar números e ver, através deles, se empreendedores estão indo para o caminho certo?
Primeiro de tudo, devo dizer que, ao contrário do que todo mundo acha, o Shark Tank e a minha aceleradora não são focados em startups. 

Com startups, infelizmente a gente tem muita fumaça e pouca entrega… O mercado financeiro é muito mais focado em resultado do que o mercado de startups. Tem pouquíssimas startups listadas na bolsa, principalmente quando a gente fala de Brasil. Então, meu foco são PMEs — e o que sei fazer é gerar lucro 

Voltando à minha história junto com o meu irmão, sempre tivemos uma empresa lucrativa. A gente nunca pegou dinheiro de ninguém, nunca pegou um real de empréstimo na nossa vida; a gente não fez um IPO; fizemos um IPO reverso, ou seja, compramos uma empresa que já era listada, colocamos pra dentro dela uma empresa que já era lucrativa.

Sempre tivemos muito pé no chão para fazer as coisas do jeito mais tradicional que existe – empresas geradoras de caixa, que contratam pessoas. Com minha entrada no Shark Tank, eu me provoquei a fazer a mesma coisa, porque é o que eu sei fazer. 

Na aceleradora, a gente não foca em startups. A gente foca em empresas que são geradoras de caixa e podem contratar mais pessoas. Então, começamos a mapear: quais são as dificuldades que essas empresas têm? Por exemplo, todas elas vão precisar contratar tributário, contábil, jurídico, financeiro, elas precisam ter isso dentro delas, além de uma área de marketing e de vendas. 

Então, foquei em criar a minha aceleradora com serviços que são comuns a qualquer empresa. Aí montamos o CSC, pra gente reduzir custo. Eu nem comuniquei o mercado ainda, mas já estou sendo procurada por muitos grupos de empresas que querem estar dentro da minha aceleradora

É legal de falar que muitas pessoas acham que sou mentora de 60 empresas — mas eles se mentoram, estão no mesmo grupo do WhatsApp. Todos os sábados tem mentoria obrigatória. Aí eu trago uma pessoa de peso pra falar de algum assunto que eles têm de conhecer. Eles trocam muitas figurinhas e se ajudam muito, além das mentorias individuais que eu montei.

Estou muito longe do formato tradicional de startups pré-seed, seed, série A, série B – este não é o meu foco. Eu não gosto muito quando a pessoa vai no Shark Tank e diz: “Eu não vou te dar muito percentual, porque estou pensando na segunda e terceira rodadas”.

Eu entro em empresas que nunca mais precisarão de outras rodadas, a não ser que elas mudem ou cresçam a nível de precisar de outras rodadas. Apesar de eu ser trader e ser até curioso dizer isso, empresas que atraem investidores para venderem a sua participação nas próximas rodadas não me atraem 

Não gosto de imaginar que vou treinar empresas e startups. Gosto mais de “tradar” na bolsa de valores e investir em empresas com foco de impacto na sociedade, com foco em geração de emprego e caixa. 

Muitas holdings que investem somente em startup fazem o que você fez: criam o que se chama de back office – RH, jurídico e contabilidade. Você está resolvendo, através dessa aceleradora, a dor que o brasileiro tem: entender por que os números são importantes, concorda? E por que você acha que temos tanta dificuldade de entender que os números são importantes, Carol?
Porque nós temos crenças limitantes sobre matemática e dinheiro que estão enraizadas na nossa história. 

Tanto é que tenho um desenho animado em 10 episódios, Clube do Teo Tourinho, disponibilizado gratuitamente a todos as escolas públicas. Já fechamos com São Paulo, Minas Gerais, Balneário Camboriú e alguns outros locais. E a gente vai criar mais 16 episódios.

Mas é curioso… eu me fiz essa pergunta ao longo da minha jornada: por que as pessoas têm receio de falar sobre dinheiro? As pessoas acham que o dinheiro é “difícil”, “sujo”, que matemática é difícil de aprender. Como uma criança tem preconceito com matemática se ela não teve contato com a matemática? Isso é culpa dos pais 

Ou seja, por gerações nós estamos sempre com preconceito em relação aos números. E é óbvio que ao crescer – e não tem como ser diferente –, as pessoas terão contato com o dinheiro, mas não querem ter. 

O que eu mais escuto é: “Sou péssima em matemática. Sou péssima em finanças”. Eu digo que você pode ser péssimo, mas tem de saber seus números. E sabê-los é conhecer o seu negócio. 

É um movimento que estou fazendo para tentar ajudar a limpar essas crenças que temos em relação a números e finanças. Aí, com certeza, a gente vai ter no nosso país empreendedores melhores. 

Sua mãe empreendeu com confecção infantil, e por isso você cogitou estudar moda — e chegou à faculdade de administração, aos 17 anos, com intuito de criar uma confecção teen. Quando e como a chave virou? Teve a ver com o fato de o mercado de moda ser um oceano vermelho?Eu sempre me imaginei no mundo da moda. Eu queria fazer moda teen, algo que não existe bem feito até hoje… como eu gostaria que estivesse sendo executado. Porque é uma fase de transição entre a criança e o adulto. Uma adolescente ainda não é adulta, então não usa decote; mas ela não é mais criança e não usa babado. É uma transição tão importante na autoestima e eu queria participar disso.

Mas aí conheci o mercado financeiro através do meu irmão, que tinha sido instigado pelo professor, e migrei — e não me arrependo nem um pouco.

Não foi só pelo fato de já ter muita confecção. Não é só porque o mercado financeiro é um oceano azul – afinal 97% da população ainda está fora da bolsa –, enquanto 100% das pessoas estão, de alguma forma, no mercado da moda, não necessariamente com as grandes grifes, mas você usa alguma coisa, alguma identidade você traduz na sua roupa, no seu estilo e etc. Mas não é sobre isso. 

O que me distanciou do mundo da moda foi o ego. Existe uma competição nada amistosa nisso. E quando a gente fala sobre o mundo dos investimentos, existe um propósito, uma causa tão nobre, porque todo mundo pode ganhar dinheiro 

E quando a gente fala do mundo da moda, infelizmente, algumas pessoas vão dar muito certo e outras vão dar muito errado. E as pessoas são capazes de qualquer coisa para ter autoridade. São coisas que, em longo prazo, não me fariam feliz em representar ou fazer parte.

Hoje, vejo dessa forma. Quando eu tinha 17 anos — inclusive, ninguém nessa idade deveria ser obrigado a escolher uma carreira, porque a gente não tem capacidade de entender os prós e contras de nenhum setor ou segmento… Hoje, assistindo de fora, eu não me identifico com o propósito, com o porquê, com o que eu ia representar… Talvez um consumo muitas vezes até doentio e desnecessário. 

Hoje, sei que o que eu faço tem muito mais impacto na vida das pessoas. Eu me sinto muito realizada em receber depoimentos e feedbacks de pessoas que vivem e que transformaram suas vidas. E não estou criticando o mundo da moda, mesmo porque sou consumidora. É só sobre como eu me sentiria realizada 

Talvez eu tivesse criado lá atrás algo como a startup de moda Florent [que desenvolve processos inovadores com o objetivo de facilitar a moda circular], na qual investi pelo Shark Tank Brasil, que é uma empresa que faz Upcycling [processo de criar algo novo e melhor a partir de itens que já existiam].

Talvez eu tivesse caminhado para uma empresa no mercado de moda de impacto social ou de repensar o como o mundo da moda poderia fazer aquilo. 

Ainda acho que trazer autoestima é importante, as pessoas se vestirem bem, se gostarem, olharem no espelho e entenderem quem elas são. Mas comparando com a educação… Pra mim, a educação é muito mais interessante, tem muito mais impacto e poder do que eu teria no mercado de moda 

Até um movimento que estou fazendo agora é de educação no mundo da moda, para as pessoas aprenderem a se vestir de uma forma que elas resgatem a autoestima. Isso me dá muito mais prazer do que criar uma roupa cara para as pessoas consumirem, ou algo para usar no dia a dia. 

Só vejo coisas boas que aconteceram com a minha decisão.

Como você começou a operar na bolsa de valores? Você era jovem, cursava a faculdade e até deixou para trás uma vaga na Unilever para abrir junto com seu irmão um escritório de agente autônomo de investimentos. Parece que foram dois saltos – sair do mundo da moda e sair do mundo corporativo… Como foi esse caminho?
Eu e meu irmão entramos na faculdade no mesmo ano, em 2005 – ele foi fazer PUC-Campinas e eu, FACAMP.

Como a gente começou? A gente não tinha grana, então começamos como agentes autônomos de investimentos em 2006, com a Paiffer Investimentos. Inclusive, na época, não era obrigatória a certificação, e fomos uns dos primeiros certificados nessa categoria 

Depois, em 2010 montamos um asset, uma gestora. Em 2014, montamos a mesa proprietária de traders [como não está autorizada a utilizar o capital individual do trader associado, disponibiliza o próprio capital para traders operarem, assumindo o risco das operações e compartilhando um percentual do lucro obtido; a Atom, por exemplo, repassa de 80% a 90% dos lucros para os traders]. Em 2015, compramos a Inepar, uma empresa listada na bolsa de valores.

Começamos operando dinheiro de clientes, ajudando-os a operar. Naquela época, apresentamos para o dono de um escritório de Campinas um projeto para criar uma área educacional dentro do escritório dele. 

Meu irmão era mais arrojado do que eu e pensou em substituir o gerente de lá. O dono do escritório tinha pouco mais de 60 anos, o gerente tinha 40 e poucos anos, o meu irmão tinha 19 e eu tinha 17. Daí o dono do escritório falou: “Claro que… não! Vão aprender mais um pouco e depois voltem”.

Meu irmão veio para Sorocaba porque em Campinas já tinha concorrente e em Porto Feliz tem só 50 mil habitantes. Ou seja, a gente não ia conseguir desenvolver o nosso projeto. 

Começamos lá atrás em um escritório de 50 metros quadrados – metade era pra dar palestra e a outra metade era o espaço pra gente trabalhar –, operando o dinheiro de clientes. Depois montamos o clube de investimentos e na sequência vieram Clube da Luzinha, Clube do Bilhão, Clube Fênix, na época da crise de 2008 

Aí, meu irmão tirou uma certificação de gestor – ele foi a pessoa mais jovem registrada – e montamos um asset pra ganharmos no que a gente era melhor do que o mercado. Ou seja, na performance. Só depois veio o projeto de montarmos o modelo que, hoje, todo mundo conhece, que é ter o educacional e a mesa de traders. 

Isso tudo começou lá atrás, em 2006, em Campinas, quando o Joaquim era estagiário de uma corretora [Gradual Investimentos].

De onde veio o insight que vocês teriam de investir nessa área da educação dos clientes?Para ser sincera, ninguém teve insight. A gente replicou o modelo americano. Os EUA fazem isso há muitos anos e a vantagem de morar no Brasil é que a gente pode, literalmente, pegar o futuro e adotar no presente.

É nossa realidade – sempre estamos atrasados. O que Benchimol fazia na XP, a gente também fazia… acho que a gente começou até um ano antes.

Começamos dando palestra… eu dava palestra em cafés e fazia uma coisa que hoje é chamado de marketing de conteúdo. A gente distribuía cadastro e eu ensinava as pessoas a operar na bolsa, porque se elas entendessem, investiriam. Eu não tentava convencer. Eu educava para convencer as pessoas abrirem encontro com a gente 

Eu fazia isso todo final de semana. Brinco que estou rouca até hoje de tanto falar, porque era isso que a gente fazia. Todo espaço que a gente tinha, a gente falava. Eu tinha uma assessoria de imprensa na época, porque o importante era sair uma notinha no jornal dizendo: “Palestra gratuita sobre investimentos” e lotava. Cabia 20 pessoas. 

Eu pegava a lista telefônica para ligar para as pessoas mais ricas da cidade e apresentava. Tenho clientes que até hoje são amigos e dizem: “Você teve cara de pau de me ligar e falar que você precisava me explicar algo novo”

A gente criou uma estratégia de marketing de conteúdo, um funil de vendas. Tudo que a gente fala hoje no digital, fazíamos no presencial. Eu tinha um folder para entregar na porta das escolas e universidades. 

A gente fazia eventos – que era o Clube da Luzinha – em bares e restaurantes que chamávamos de happy hour da bolsa de valores. Teve o nosso famoso After Market, que era literalmente o pós-mercado [após o fechamento do mercado] para ensinar as pessoas. A gente nem fazia ideia que aconteceria uma XP e uma Atom e tudo que aconteceu

A gente sabia que em algum momento no Brasil, a corretagem não ia se sustentar. Foi o que aconteceu quando a coreana Mirae Asset veio para cá [em 2011, a corretora lançou o Home Broker com a menor taxa de corretagem do mercado brasileiro – R$ 2,90 por operação]. Ela foi a primeira a provocar a corretagem a R$ 1,00. 

Antes, [a remuneração] era pela tabela Bovespa – 0,5% mais R$25,21. Para você fazer um day trade [operação em que um mesmo investidor compra e vende, no mesmo dia, a mesma quantidade de títulos de uma mesma empresa, utilizando a mesma corretora], tinha de ganhar mais do que 1%, porque era cobrado 0,5% na entrada, 0,5% na saída e mais R$ 50,42. A gente estudou esse movimento, viu o que acontecia e adotou aqui. 

Foi por isso que a Atom foi criada. A WHPH é uma mesa proprietária de traders. Sabe quantas mesas existem hoje nos EUA? Oito mil. A gente está falando de um negócio em que não inventamos a roda. Percebemos que a gente fazia de forma meio amadora e a gente trouxe pra cá. 

A única coisa que eu e o Kim [Joaquim, seu irmão] sempre fizemos foi ver o que acontecia lá fora e adotar aqui dentro. A gente fez muitos cursos lá. Eu vou de três a quatro vezes por ano para Nova York, que é um mercado que respira bolsa de valores. 

Montar a mesa de traders e operar dinheiro próprio também tem a ver com a dificuldade de chamar pessoas para investir na bolsa? Ou teve mais a ver com essa precaução que vocês tiveram de não sofrer a mesma dor que o pessoal nos EUA sofreu?
As duas coisas. A gente queria operar nosso dinheiro por quê? 

Chegou um ponto em que os clientes queriam muito renda fixa. O Kim opera muito bem juros e não tem como desprezar o mercado de renda fixa no Brasil, porque a taxa de juros é altíssima. E os nossos clientes são grandes empresários que já tomam risco [em seus negócios] e vimos que eles não queriam tomar o risco de operar no mercado de renda variável. 

Então, começamos a operar a renda variável com o nosso dinheiro. Aí, entendemos que existia um formato profissional nos EUA de montar o que tínhamos aqui de forma amadora. Juntou um pouco de insights nossos com algo que estudamos lá e entendemos que era possível acelerar o processo. 

Agora, é curioso dizer que todas as mesas proprietárias lá fora não têm educacional. A própria XP criou um educacional para atrair clientes. A gente criou um educacional para atrair traders para operarem o nosso dinheiro. A gente forma profissionais.

A diferença gritante entre o modelo XP e o modelo Atom é que formamos profissionais que vão trabalhar na XP, no BTG ou na Mirae etc. e serão analistas, agentes autônomos, gestores, compliances e traders. A XP forma investidores, tem interesse só em atrair clientes. A gente não tem esse interesse, porque não temos mais clientes: só operamos com o nosso dinheiro 

A Atom se posicionou como uma escola – essa foi a diferença. É o que a gente via que faltava no Brasil. Diferente do que acontece nos EUA, onde, aos 3 anos de idade, a criança já tem contato com bolsa de valores. Aqui, não, porque os pais não sabem investir – como vão falar com a criança sobre isso? 

A gente sempre se espelhou no que acontecia lá, mas é igual comida japonesa, que é totalmente diferente aqui. Pegamos o mercado financeiro e abrasileiramos – entendemos a necessidade e quais eram os desafios que a gente teria aqui.

Queria que você comentasse o que foi o IPO reverso. Primeiro, vocês descobriram uma empresa que podia ser o alvo do “apetite” de vocês? Isso pode ajudar a desmistificar alguém que trabalha no mercado financeiro e que não está na bolsa apostando como se ela estivesse em um cassino de Las Vegas…
O que aconteceu foi: começamos a olhar para empresas já listadas, uma vez que tínhamos interesse de ter capital aberto, porque você passa ter uma imagem institucional. 

Ter capital aberto significa ser conhecido pelo mundo todo, ter seus dados publicados – todo mundo tem acesso às nossas informações – e víamos isso com bons olhos. 

Quando surgiu a possibilidade de comprar a antiga Inepar Telecom, ela era uma casca e transferimos gratuitamente para dentro dela um negócio que já era lucrativo – já era WHPH. A gente já tinha o educacional e a mesa de traders. Aí vem um pouco de loucura, porque doamos para gente que nunca tínhamos visto na vida um negócio que já era lucrativo 

O nosso foco era melhorar a nossa imagem institucional. Quando a gente fala da mesa de traders e criar o educacional, a gente sabia que poderíamos abrir muitas portas. 

Hoje, já é muito maior do que isso, porque temos Shark e-School – a primeira escola de negócio com a bandeira Shark, a gente licenciou a marca depois da minha entrada no programa; temos a Atom Concursos, pela qual ensinamos como as pessoas podem ser aprovadas em concursos; temos a Atom Tech, pela qual a gente ensina programação e tem a digital que a gente ensina as profissões do mundo digital. 

A Atom cresceu para outras linhas e vertentes para além do mercado financeiro. E ter uma empresa, fazer esse IPO reverso, foi justamente uma provocação de ter mais exposição da marca e mais imagem institucional para trazer fundos de investimento etc. 

Isso chamou a atenção da Exame e do BTG e eles se tornaram nossos sócios. A finalidade foi justamente ter essa conexão com o mercado, para as pessoas entenderem o que a Atom fazia. Talvez, se a gente fosse no modelo tradicional, demoraria mais tempo para abrir algumas portas 

Não foi com uma finalidade de captar dinheiro, nem de girar uma dívida, nada do tipo. Compramos uma casca e colocamos para dentro dela o que já era gera lucrativo. 

Em 2021, a Exame adquiriu 34,78% do capital social da Atom SA. Ouvindo você agora, minha impressão pela nossa conversa é que sua vontade não é vender empresas, mas sim construir negócios e crescer a rede. Em termos pessoais, foi difícil tomar a decisão de vender uma parte do negócio?
Foi uma decisão difícil. Na verdade, muita gente nos procura há muitos anos para serem nossos sócios e nunca tivemos a intenção de vender. Primeiro, porque a gente sempre teve caixa, sempre cuidamos com carinho e atenção aos números do nosso negócio. 

A entrada da Exame, do BTG, foi estratégica. É aquele negócio: o que é melhor pro seu filho? Muitas vezes, você toma a decisão de que ele precisa morar fora do país, por exemplo. Não é o que você quer, afinal você o quer pertinho de você. Mas você precisa tomar essa decisão para o bem dele.

E a Exame… estamos falando de uma empresa com uma imagem muito forte no mercado e que conversa com PMEs, pequenas e médias empresas, um público que eu gosto muito e que tem tudo a ver com a Shark Tank e-School. Então, estrategicamente a Exame já era útil pra gente.

Fora que sair matérias – eu sou colunista da Exame. Eu já era colunista do Estadão E-Investidor, fui do UOL, estou entrando em alguns outros canais. Sempre fui uma pessoa que produziu conteúdo, mas ter um sócio com o peso e a visibilidade da Exame e uma mesa de trader que pode ter o suporte de um BTG – o meu trader poder aprender com um trader do maior banco [de investimentos] da América Latina – é literalmente o smart money. É o que as pessoas buscam em mim no Shark Tank Brasil.

Eu não precisava de dinheiro e nem necessariamente vender pra ninguém, mas posso escolher crescer sozinha ou crescer acompanhada mais rapidamente. Nossa decisão foi estratégica para o negócio. Hoje, a Atom não é da Carol e do Joaquim. Ela é dos alunos, dos traders e dos acionistas

Esse é um projeto muito maior do que a minha existência. É tipo – bate na madeira (risada) – se eu morrer amanhã, a Atom vai ser muito maior do que a minha vida. É a mesma coisa que o meu irmão sempre pensou.

Essa parceria foi muito estratégica pra isso. Foi uma decisão difícil? Com certeza, porque a gente não precisava financeiramente, mas em velocidade, know-how e abertura de portas no mundo… Pô, a Atom é uma empresa de capital aberto, mas todo mundo sabe o que é o BTG.

Você é presidente do Museu de Arte Contemporânea de Sorocaba, um museu privado, hoje fechado por conta de uma inundação. Já te ouvi contar que, quando criança, estudou piano e teve contato com outras atividades artísticas como o teatro. Sua posição no MACS é por prazer de estar perto de arte? Ou para dar um choque de gestão?
Eu assumi a presidência do MACS há pouco mais de um mês. É bem recente. Sou voluntária há dez anos. Comecei por causa da Cristina Delanhesi, a fundadora do MACS; ela me provocou, me pediu pra ser voluntária, para ajudar nos números e eu me tornei patrocinadora no ano passado.

Sou colecionadora há oito anos por uma provocação dela. Você vê atrás de mim uma de minhas obras prediletas, “Mi Tiempo em mis Manos, 2018”, do Luca Benites. Ele queimou 20 anos de obras de arte e colocou as cinzas ali. Essas são as mãos dele mesmo, é uma reflexão. 

Comecei a colecionar obras que dialogavam com o mercado financeiro, sobre tempo, volatilidade, fazenda, café, piano, música – coisas que eu gosto. A minha coleção é muito parecida com a minha identidade. A Cris me provocou a aprender e a desenvolver isso

Quando a Cris saiu – porque ela fundou também a Dan Galeria há mais de 50 anos em São Paulo e ao trazê-la para o interior, ela não poderia tocar o museu e estar à frente da galeria —, ela colocou outra pessoa na presidência, mas as coisas não andaram como a gente imaginava. 

Esse museu é um negócio ao qual sou muito grata – eu não estaria no mundo da arte, meu escritório inteiro não teria obras de arte, nem a minha casa, se não fosse pela provocação da Cris. Então, me senti quase na obrigação de assumir essa presidência. 

Acho que você está correta: entrei para fazer um choque de gestão, para trazer o meu olhar empreendedor para o museu. Porque o museu tem de sobreviver sozinho. Estamos criando algumas iniciativas para que o museu se mantenha de pé, sem precisar passar o chapéu como acontece com todas as instituições.

Quando a gente fala de patrocínio de arte, estamos concorrendo com o Hospital do Câncer, com crianças… com certeza tem muitas causas que merecem ser abraçadas. Ou seja, é muito difícil fazer captação ou arrecadar fundos para um museu, porque muitas vezes as pessoas não entendem a importância do museu na sociedade.

Daí, esse movimento que eu quero fazer não só junto a minha imagem, mas também o meu conhecimento em gestão pra que a gente possa aí fazer o museu decolar. 

E sim, ele ficou fechado por causa de uma enchente. Estamos em reforma e até o final do ano devemos ter o museu de pé de novo e com mais ambientes. 

Teremos um auditório, um restaurante… e isso significa impacto na região, porque as pessoas poderão vir para o museu em Sorocaba absorver conhecimento – são 750 obras de arte de artistas renomados do mundo todo, um patrimônio de mais ou menos 20 bilhões de reais

Tem uma baita história bonita que a gente está ali realçando, deixando um pouco de holofotes para ele. O fato de eu ser uma pessoa pública pode ajudar a dar visibilidade para o museu.

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