Os empreendedores da Acqua.Tís consideram que marketing tradicional ainda é “muito chato” e por vezes invasivo. Quem nunca “fugiu” de alguém que estava entregando folhetos de propaganda de uma marca?
E se em vez de tentar te vender alguma coisa na rua, uma marca te oferecesse algo de graça – e esse produto fosse água mineral?
Essa é a proposta do negócio, que aposta no que o trio de cofundadores chama de “marketing retributivo”. Bernardo Bloisi, que toca a Acqua.Tís ao lado de Felipe Figueiredo e Pedro Souza, explica:
“Entregamos um produto premium para a pessoas, que têm uma experiência positiva e se envolvem com a mensagem do patrocinador, gerando uma conexão mais humana entre consumidores e marcas”
Na prática, o negócio entrega ao público-alvo ou aos consumidores da marca cliente caixinhas de água de 500 mililitros personalizadas com a cor, logo e mensagem da empresa estampadas na embalagem e um QR Code que conecta a promoções especiais, cupons etc.
As pessoas não pagam nada para se refrescar, já o patrocinador arca com os custos das caixinhas e da logística por trás. Apesar de nova — a Acqua.Tís foi fundada em março e começou a operar em outubro de 2023 –, a startup paulistana já realizou seis campanhas, inclusive fora de São Paulo.
Os três fundadores se conhecem da época do colégio. Felipe, 24, se formou em publicidade, já Bernardo, 25, e Pedro, 27, em direito. Mas quando decidiram empreender juntos, viram na área de marketing uma grande oportunidade. Felipe conta:
“A gente entendeu que era preciso um novo meio para criar vínculo entre os consumidores e as marcas”
Ao pesquisar possibilidades, eles se depararam com a Free Water, dos EUA, que viu na água uma forma de veicular publicidade e oferecer a bebida gratuitamente ao consumidor final.
O modelo da startup estadunidense serviu, então, de inspiração para a criação da Acqua.Tís, fundada com um investimento de 740 mil reais.
“É um meio de fazer publicidade em uma plataforma praticamente impossível de não ser notada. Não tem como, na rua, num evento, em qualquer lugar que você esteja, receber uma água gratuita e não conferir a embalagem antes de beber. Afinal é algo que você vai colocar dentro do seu corpo”
O “Tís” do nome, explica Felipe, faz referência à palavra grátis e é o apelido dado pelos empreendedores para suas caixinhas.
No Brasil, mais de 35 milhões de pessoas não têm acesso à água, segundo Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA). Assim, oferecer um modelo de negócio que ajude a democratizar esse recurso fez muito sentido para os empreendedores.
Por outro lado, eles entendem que, pelas definições de área de entrega escolhidas pela marca patrocinadora, as caixinhas acabam chegando a um público-alvo que não costuma ser formado por pessoas sem acesso à água. “Mas a gente nunca vai negar água para alguém ou ignorar uma pessoa na rua, mesmo que não seja o alvo do patrocinador — isso nós deixamos bem claro para os clientes.”
Assim, para alcançar pessoas em situação de vulnerabilidade social, a Acqua.Tís firmou uma parceria com a ONG WaterisLife Brasil, que atua em mais de 50 países e por aqui atende comunidades quilombolas, ribeirinhas e de povos originários.
Segundo Pedro, a Acqua.Tís doa 6% do faturamento de cada campanha vendida para impulsionar as ações da organização:
“Eles trabalham com três tecnologias. Canudos com filtros em que a pessoa pega aquela água lamacenta, suga e ela já sai potável. Também atuam com filtros de membrana, que eliminam 99,9% das bactérias e abastecem uma família de quatro pessoas durante um ano a um custo de 300 reais. E com uma máquina da startup israelense Watergen que condensa a umidade do ar e a transforma em água potável”
Outra preocupação da startup é com a sustentabilidade. Por isso, os empreendedores decidiram trabalhar com embalagens Tetra Pak, que são reutilizáveis, 100% recicláveis e compostas por 82% de materiais renováveis (papel de florestas certificadas e plástico de cana de açúcar).
“Estamos estudando formas de desenvolver um produto com uma embalagem ainda melhor”, diz Pedro. “A gente aposta em algo de alumínio, mas que seja reutilizável.”
Quando um cliente procura a Acqua.Tís, as três perguntas que os empreendedores fazem são: quem a marca quer atingir, onde essas pessoas estão e qual mensagem a marca quer passar.
No momento da entrega, os fundadores (ou promoters contratados para a ação) conversam com o público e explicam quem está por trás daquela água gratuita, ou seja, fazem um pitch da empresa patrocinadora.
Também contam como aquela marca contribuiu com uma causa social, já que afinal é o contrato do patrocinador que garante o repasse do faturamento da Acqua.Tís para a WaterisLife.
O negócio ainda busca maximizar essa propaganda no universo online, com a produção de conteúdos sobre os clientes divulgados em suas redes sociais. Lá, eles compartilham vídeos das experiências de entregas.
Para se ter uma ideia do alcance desses conteúdos, até novembro de 2023, somando os perfis do Instagram e TikTok, a Acqua.Tís já tinha impactado 7 milhões de pessoas em suas redes, onde soma quase 70 mil seguidores, com um engajamento na marca de 1 milhão (entre curtidas e comentário).
Hoje, o negócio possui dois tipos de serviço. O primeiro é o pacote publicitário, que conta com a distribuição das caixinhas de água pela própria Acqua.Tís onde e para quem o patrocinador desejar, junto da posterior divulgação de conteúdo nas redes.
Há também outro modelo em que o negócio vende apenas a caixinha de modo unitário e a personaliza para o cliente usar em eventos ou festas. O pedido mínimo é de mil unidades.
Na estreia da Acqua.Tís, os empreendedores já vivenciaram aprendizados ao atender em outro estado, na Bahia. “Quando a gente foi para Salvador éramos em três pessoas, mil garrafas e um sonho”, diz Felipe.
Foram duas ações em Salvador: uma campanha para a Mais Cabello, em que os empreendedores distribuíram as caixinhas na rua, e outra para um evento da Alia Empreendimentos + Biosphere Essence. Pedro relembra os desafios:
“A gente teve que aprender sobre logística e sobre como enviar água para outro estado. E para piorar, a empresa de transporte achou que a caixinha da Mais Cabello era xampu, então os produtos ficaram quatro dias presos na doca até a gente conseguir despachar”
Ele também conta outro perrengue:
“A gente ficou num condomínio e um dia antes da campanha, descobrimos que o caminhão com as águas não poderia entrar lá. Tínhamos alugado um carro e começamos a entupir o veículo com as caixinhas para fazer o transporte da entrada do condomínio até porta da casa, um percurso de só 300 metros, mas que nos tomou quatro horas.”
Os cofundadores consideram, no entanto, que todos esses contratempos catalisaram o crescimento e maturidade do time. Bernardo resume os aprendizado:
“Fomos entendendo os processos e na segunda campanha a gente já tinha praticamente tudo dominado, mas antes tivemos que ir para a rua, ‘levar uns tapas na cara’ e aprender”
Depois daqueles primeiros clientes, a startup atendeu outros quatro em São Paulo: Alymente, B4 Capital, Cumbuca e Invictus. Até o momento, a Acqua.Tís faturou 230 mil reais. A meta para 2024, segundo os empreendedores, é fechar o ano faturando 3,6 milhões de reais.
Por enquanto, eles dizem não ter concorrência no Brasil. A Água na Caixa, que lançou em dezembro um modelo de negócio chamado Água na Faixa com a proposta de distribuir água gratuita em eventos e locais públicos por meio de publicidade nas caixinhas, não é considerada um concorrente pelos sócios. Bernardo explica:
“A similaridade que temos é a busca pela sustentabilidade. No mais, nosso maior ideal é a democratização do acesso, por isso nós não vendemos para o consumidor final como eles fazem. Para a gente essa entrega tem que ser sempre gratuita.”
No dia 17 de novembro de 2023, um incidente trágico acendeu um alerta. A universitária Ana Cara Benevides, de 23 anos, morreu após uma parada cardiorrespiratória durante o show da cantora Taylor Swift no Rio de Janeiro, em meio a uma onda de calor no Brasil.
Naquele dia, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a máxima no Rio de Janeiro chegou aos 39,1°C. Na sequência, o governo anunciou uma portaria para permitir a entrada de garrafas de água para uso pessoal em shows fechados e a obrigatoriedade dos produtores de distribuir água gratuita.
Felipe conta que o fato despertou o interesse de mais empresas no negócio.
“Isso é uma tragédia, não é um fato no qual a gente queria ter surfado. Mas nossa visão é de que a partir do momento que conseguirmos estar mais nesses eventos, vamos ajudar a prevenir que situações como essa aconteçam de novo”
Eles torcem para que a portaria — que tem prazo de 120 dias após a publicação — vire um projeto de lei.
Agora, os empreendedores traçam planos para o Carnaval, que também deverá ser um período de muito calor — e de oportunidade para as empresas que desejam fazer publicidade distribuindo água gratuitamente aos foliões.
Outro projeto da Acqua.Tís, no longo prazo, é aumentar o seu portfólio. “Somos uma marca de produtos grátis. Então, no futuro, quando estivermos mais estabelecidos, podemos oferecer outros itens essenciais além de água para a distribuição gratuita nas ruas.”
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