No cerne da inovação reside uma premissa fundamental: o design vai muito além da criação de uma estética atraente. Ele é o arcabouço que sustenta projetos e delineia o caminho das organizações, permeando suas ações com impactos que reverberam na sociedade. No CESAR, que é um polo de inovação, o design não é apenas uma ferramenta, mas um princípio vital em cada processo. Dos mil colaboradores que compõem o centro, cem são designers, disseminando sua forma de pensar e seus métodos de forma sinérgica e interdisciplinar. Essa interação contínua e a aplicação do design em projetos inovadores são a espinha dorsal que sustenta quase três décadas de atuação do CESAR no mercado.
A confluência desses ideais, debates incessantes e a construção conceitual em torno do papel do design na cultura inovadora conduziu à concepção do mais recente livro lançado pelo CESAR: “O futuro das organizações pela perspectiva design-driven”. A obra não apenas captura a expertise dos designers da instituição, mas também configura um compêndio sobre a relevância do design no contexto corporativo. O livro não se limita a conceitos abstratos; pelo contrário, apresenta uma compilação de entrevistas a especialistas e estudos de caso que, respaldados pela abordagem design-driven do CESAR, revelam uma visão holística e pragmática sobre como o design se torna uma alavanca para a inovação e o desenvolvimento empresarial.
No cenário empresarial atual, marcado pela incorporação de novas tecnologias, transformações do consumo e mudanças constantes, o papel do design tornou-se crucial para repensar e reinventar os negócios. Eduardo Peixoto, CEO do CESAR, destaca a ineficácia das abordagens dedutivas e indutivas tradicionais diante de um mercado dinâmico e sujeito a transformações abruptas, como evidenciado pela pandemia. Em um contexto de incertezas, a lógica indutiva de olhar para o passado e prever o futuro se mostra inadequada.
“Quando a gente fala em design, a forma de pensar é outra. Além de colocar o ser humano mais no centro das soluções, as perguntas sempre são feitas de forma abdutiva. É como se você pensasse em um futuro que ainda não existe e tentasse construir uma ponte até ele”, diz Eduardo.
Um exemplo é que, quando olhamos hoje para a inteligência artificial generativa, vemos apenas a ponta do iceberg. Existe, assim, um universo de oportunidades inexploradas e, para acessá-las, o CEO do CESAR acredita que é necessário adotar uma mentalidade abdutiva, reconhecendo que o potencial da IA generativa vai além do que experiências passadas podem prever.
Mas o pensamento design-driven não opera de forma radical dentro de uma empresa, e sim complementar: deve fazer parte de uma abordagem ambidestra, equilibrando a manutenção dos negócios atuais com a construção de um futuro inovador. A ambidestria, segundo Eduardo, é fundamental para a alocação eficiente de recursos e esforços, permitindo que as organizações enfrentem os desafios presentes enquanto se preparam para o que está por vir.
Priscila Alcântara, consultant designer do CESAR, acredita que, há uma década, as organizações não reconheciam o design como uma ferramenta fundamental, mas essa percepção mudou. Nos últimos anos, as empresas começaram a entender a importância dos processos de design no desenvolvimento de produtos e serviços e, agora, ele está sendo reconhecido como essencial na estratégia empresarial.
“A consciência sobre a importância do pensamento design-driven tende a aumentar, tornando-se uma força que beneficia todas as áreas de uma organização”, diz.
Ela explica o termo “design-driven” como uma filosofia em que o design não é apenas uma etapa do processo, mas parte integrante da estratégia da empresa. Significa adotar uma forma de pensar orientada pelo design em todos os aspectos, desde os negócios até os processos internos. O design consciente, a empatia e a autoridade são assim aspectos fundamentais do pensamento design-driven, tornando-se valores essenciais na cultura organizacional.
No CESAR, Priscila destaca o papel do designer como facilitador dentro dos processos de inovação do centro, independente de ser uma mudança tecnológica, de produto, serviço ou processo. O design, segundo ela, é transversal a todas as formas de inovação presentes no CESAR, desde áreas meio até produtos finais entregues ao mercado, chegando à estratégia e à governança do centro.
Giordano Cabral, presidente do conselho do CESAR, conta que a instituição passou por um processo de redesign de sua governança em 2015. A simplificação e reorganização do conselho permitiram a formação de uma estrutura mais eficaz, responsável por um olhar de longo prazo que levou, por exemplo, às diretrizes para a criação da CESAR School, à importância dada à ESG e à diversificação dos setores na instituição.
Métodos relacionados ao design, como a visualização de dados, co-criação e votação colaborativa têm se mostrado essenciais para decisões estratégicas eficientes.
“O conselho não é hierárquico: eu como presidente não mando nos outros conselheiros, preciso agir para que o conjunto de pessoas tome uma decisão. E, a meu ver, o design ofereceu métodos melhores para isso, porque está fundamentado em processos de co-criação”, diz Giordano.
Para ele, o design tem o potencial de levar a um ganho de desempenho notável em órgãos de governança. Estabelecer governança implica criar uma estratégia de longo prazo e garantir que as ações diárias estejam alinhadas com essas estratégias. O design surge, então, como uma ferramenta para estruturar organizações, tornando-as mais resilientes.
Resiliência é palavra-chave para organizações que pensam seus negócios a partir do design. Eduardo define uma organização design-driven como sendo flexível, menos hierárquica e mais propensa a correr riscos. A busca pela adaptabilidade e inovação, em contraste com planos inflexíveis, torna a organização mais resiliente diante das constantes mudanças. “E é isso que as empresas esperam: não quebrar amanhã porque apareceu alguma nova tecnologia”, diz.
Ser design-driven vai além da otimização, visando à verdadeira transformação digital e à capacidade de antecipar o futuro. Nesse contexto, Eduardo destaca o empreendedorismo como a chave para explorar novas tecnologias e modelos de negócios. Ele lembra de empresas que não operam com ativos próprios, como iFood e Airbnb, e que, apesar de trabalharem com tecnologias já maduras, enxergaram negócios que transformaram o mercado.
“Não é sobre fazer o mesmo, mais rápido ou melhor. É preciso se perguntar: o que essa tecnologia vai permitir fazer que eu não faço ainda? O que ninguém está fazendo ainda?”, explica.
Assim, a verdadeira vantagem competitiva surge ao explorar o que as novas tecnologias possibilitam, não apenas otimizando processos existentes, mas redesenhando o próprio jogo.
O CEO do CESAR destaca atributos essenciais para uma cultura organizacional inovadora, como empatia, colaboração, diversidade, abertura para o novo, conhecimento em design, cultura de experimentação, autonomia, criatividade consciente, tolerância ao risco, engajamento e uma atitude questionadora. Esses atributos, quando incorporados, formam a base para perspectivas organizacionais design-driven e são exploradas mais a fundo no novo livro do CESAR.
O CESAR nasceu em meio às ondas de impacto produzidas pelo manguebeat, movimento de contracultura surgido na cidade de Recife (PE). Assim, com uma origem centrada na arte e na sua mistura com a tecnologia, o centro desde então deposita no design a perspectiva do criar: “é uma perspectiva de que, na arte, nada é errado. Por isso, as barreiras com o design são menores, é possível se arriscar para, de fato, fazer o diferente”, conta Eduardo.
Para Priscila, o CESAR é uma organização que, por sua história, pelo time interdisciplinar de profissionais e pelo seu olhar de inovação, construiu um olhar próprio para o design, diferente da maioria das instituições brasileiras.
“A gente entende que o design é transversal, enxerga todo o valor do design para a inovação e isso se reflete no nosso corpo e em como conduzimos nosso dia a dia. Queremos levar um pouco dessa experiência para ajudar outras organizações a se manterem inovadoras”, conta.
Foi o que motivou a escrita, por designers do CESAR, do livro “O futuro das organizações pela perspectiva design-driven”. A obra é um passo inicial para organizações que buscam se tornar mais adaptáveis. Ao apresentar perspectivas, casos e experiências, a publicação tangibiliza os princípios do design-driven, oferecendo uma visão prática e inspiradora. Priscila enfatiza que o livro tem o poder de mostrar a indivíduos fora do campo do design que eles também podem se beneficiar desse modo de pensar.
A publicação destaca como o design pode ir além da estética e do visual, trabalhando em conjunto com diversas áreas para criar soluções inovadoras. A linguagem do livro busca afastar a noção equivocada de que o design é exclusivamente voltado para o belo, revelando suas raízes profundas na criatividade, nos processos e nos serviços.
Para Eduardo, o livro serve como um guia para aqueles que buscam trilhar esse caminho de transformação e se destacar em um mundo cada vez mais dinâmico e desafiador. Giordano lembra que o CESAR busca não apenas disseminar o entendimento sobre design, mas também construir projetos que façam a diferença na vida das pessoas.
“O livro é mais do que uma obra; é uma missão para contribuir para um país mais inovador”, diz.