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Ele abriu mão do emprego para conhecer o mundo como blogueiro de viagens. Hoje, tem mais de 70 países carimbados no passaporte

Marília Marasciulo - 8 maio 2024
O designer Fabrício Moura, criador do blog Vou na Janela, em viagem à Noruega.
Marília Marasciulo - 8 maio 2024
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O designer gráfico Fabrício Moura, 45, conquistou o sonho de todo viajante: viver viajando — e de viagens. 

Com 71 países carimbados no passaporte, atualmente ele obtém 70% de sua renda com seu blog, o Vou na Janela, e o respectivo canal do YouTube (com 103 mil seguidores), e reinveste os ganhos em mais viagens. 

O caminho para alcançar essas marcas não foi simples:

“Muitos influenciadores vendem essa ideia romantizada de que abandonaram tudo para virar nômade, mas não é assim que funciona. Os boletos vão chegar, o aluguel vai vencer, então é preciso se planejar para isso”

Para alçar voo como blogueiro de viagens, Fabrício precisou abrir mão, primeiro, de sua carreira numa multinacional – e, mais tarde, do emprego em uma grande agência de comunicação.

NETO DE UM PILOTO DA VARIG, ELE SONHAVA EM SER JORNALISTA, MAS ACABOU CURSANDO DIREITO

Nascido em Santo Antônio de Pádua (RJ), a 265 quilômetros da capital fluminense, Fabrício cresceu com a expectativa do pai de que trabalhasse na aviação. 

O avô era piloto da Varig, uma carreira que o pai de Fabrício se viu impedido de seguir por conta de um acidente. “Eu gostava de viajar, mas não me imaginava naquele universo”, admite.

Fabrício, na verdade, achava que seria jornalista. 

“Devorava o caderno Internacional do Globo, recortava as notícias que achava mais relevantes ou exóticas, anotava a escalada do Jornal Nacional… Não conheço nenhum moleque que fazia isso aos 12 anos”

Na hora de prestar vestibular, porém, ele acabou escolhendo direito.

“Fui morar no Rio de Janeiro para fazer a faculdade sem saber ao certo o que cursar. Queria jornalismo, mas meu pai tinha alguns contatos e conseguiu uma entrevista para mim na Volkswagen.”

Para o cargo, ele diz que “precisava ter cursado direito ou administração”. E reconhece o privilégio: “Quem consegue um trabalho em uma multinacional sem ter nem uma graduação?”

O BOM SALÁRIO E OS BENEFÍCIOS NÃO TRAZIAM FELICIDADE NO DIA A DIA

Fabrício detestava o curso de direito e nunca chegou a exercer de fato a profissão — ele nem sequer se registrou na Ordem dos Advogados Brasileiros (OAB).

Mesmo assim, continuou no emprego, muito por causa do bom salário e dos benefícios.  “Os caras pagavam meu aluguel, eu tinha 30% de desconto para trocar de carro…”, diz.

No Laos, um dos passeios preferidos de Fabrício foi nas margens do Rio Mekong, um dos mais importantes da Ásia.
Em visita ao Catar antes da Copa do Mundo de 2022, Fabricio fez um tour pelo deserto.
No Peru, ele enfrentou mais de 4 mil metros de altitude e temperatura de -15°C nas montanhas Palcoyo.
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Ele entrara na empresa como auxiliar de coordenação de vendas especiais (que atendia grandes frotistas e órgãos públicos) e chegou a diretor de vendas especiais da regional Rio de Janeiro. 

No período, teve inclusive a oportunidade de morar por um ano na Alemanha para “desenvolver uma ferramenta para venda de veículos em uma tal de internet”, brinca. 

Apesar dos benefícios, porém, sentia-se infeliz. 

“Vivia doente, tinha dores que médico nenhum conseguia explicar, sofria de burnout antes mesmo de saberem o que é burnout… Você vai afundando de uma forma, entrando em um buraco que parece que não vai conseguir sair dali”

Em 2006, com seis anos de empresa, ele começou a cursar design gráfico — e a montar seu portfólio na área (que hoje inclui diversas colaborações com o Draft).

AO MUDAR DE CIDADE E DE EMPREGO, FABRÍCIO PASSOU A TIRAR FÉRIAS COM FREQUÊNCIA – E A REALIZAR O SONHO DE CONHECER O MUNDO

Em janeiro de 2011, logo após se formar, Fabrício passou a disparar seu portfólio para agências de publicidade em São Paulo, e a realizar entrevistas na capital paulista. 

“Pegava a ponte aérea às 6h, ia para a entrevista, voltava e trabalhava. Na terceira vez, fui contratado”

Em poucos dias ele viu sua vida se transformar. No fim de março de 2011, Fabrício se mudou para São Paulo, a princípio trabalhando para o Grupo Rái e, ainda em 2011, na agência Ideal.

Foi aí que teve início a segunda virada: pela primeira vez em cinco anos, pôde tirar férias. E não só isso: eram férias três vezes por ano, visto que a agência incentivava os funcionários a dividirem os 30 dias em períodos de 10.

A primeira viagem foi para Londres — e dali em diante ele não parou mais. 

“Passei a virar referência entre colegas da agência por viajar sempre. Me pediam dicas de como comprar chip de celular, como ir do aeroporto ao centro da cidade, como fazer o câmbio…” 

Ele já tinha o hábito de escrever sobre os lugares e experiências para registro próprio, e resolveu experimentar criar um blog. 

“Era uma época de popularização dos blogs de viagem. Lembro de uma estatística da época que dizia que surgiam 600 blogs de viagem por ano e menos de 1% durariam mais de um ano. Todo mundo queria ser blogueiro.”

APÓS FAZER UM BENCHMARK DE BLOGS DE VIAGEM E ASSEGURAR UMA RESERVA FINANCEIRA, ELE RESOLVEU ARRISCAR

Fabrício decidiu arriscar. Bolou um plano de negócios para que o blog não fosse só um hobby, conversou com outros blogueiros e descobriu que sim, era possível viver daquilo.

Ele passou os dois anos seguintes elaborando tudo — e, principalmente, consolidando uma reserva financeira.

Em maio de 2015, pôs no ar o Vou na Janela. Fabrício ainda trabalhava na agência, mas isso logo mudou:

“Em novembro de 2015, viajei para a Alemanha para produzir conteúdo e, quando voltei, pedi demissão”

Na época, ele calcula que tinha dinheiro guardado o suficiente para pagar suas contas por dois anos, o tempo que acreditava ser necessário para monetizar o projeto. 

Fabrício afirma que até então não havia pensado na possibilidade de equilibrar o trabalho de designer com o de blogueiro. 

“Com o tempo, alguns clientes começaram a me procurar, e passei a conciliar os dois trabalhos”

Isso foi especialmente importante durante a pandemia, período em que ele diz ter sido “salvo” pelos ganhos como designer.

HOJE, A MELHOR PARTE DE VIAJAR SÃO AS PESSOAS QUE ELE CONHECE PELO CAMINHO

No blog, Fabrício faz tudo sozinho: do planejamento de cada viagem — que leva em torno de dois meses, da escolha do destino até o roteiro — à redação dos textos e produção dos vídeos. 

“Sempre fui o louco das planilhas. Acho que levei a organização que o trabalho na Volkswagen me exigia para as viagens”

Ele diz que, no começo, gostava de passar entre 30 a 40 dias em cada lugar. Agora, com a prática (e a idade), encurtou esse tempo para no máximo três semanas. 

“Quando você é mais novo, encara tudo. Já passei nove horas no aeroporto de Amsterdam achando incrível. Hoje, não quero mais perrengue.”

Talvez esse seja o único ponto negativo de transformar um hobby em trabalho. 

“Chega um ponto que nada mais é novidade. Não existe mais frio na barriga de passar pela imigração e chegar a um país estranho acaba virando uma coisa meio mecânica”

É por isso que, atualmente, ele considera que a melhor parte de viajar são as pessoas que conhece em cada lugar. 

“Elas são o maior patrimônio. Os pontos turísticos vão estar sempre lá, a relação com as pessoas é o que mais me encanta.”

TRANSFORMAR UM HOBBY EM TRABALHO TRAZ DESAFIOS E LIÇÕES IMPORTANTES

A vida de viajante trouxe algumas lições importantes. A primeira é que viajar é muito mais fácil do que a maioria das pessoas pensa — especialmente em tempos de internet. 

Hoje, é possível organizar viagens para qualquer lugar do mundo por conta própria. 

“Não existe mais desconhecido, isso dá segurança. E existem opções para todos os bolsos, é só entender o destino e se adequar à realidade e tirar o olhar exclusivo de turista”

A segunda — e talvez principal — é respeitar a cultura local. “Não adianta querer transportar costumes a uma cultura diferente da nossa.”

Esse olhar particular sobre viajar é importante também para o modelo de negócios de Fabrício, que parece ter encontrado um equilíbrio entre entregar aquilo que o público quer e conteúdos inéditos. 

“É preciso ter um mix de aderência com o que ainda não foi feito. Miami, por exemplo, é um destino que as pessoas sempre vão querer ir, mas já tem muita informação sobre, então nem faço mais”

Um ponto de virada para o crescimento no YouTube, hoje sua maior aposta, foi a Copa do Catar. Para produzir os conteúdos, Fabrício viajou ao país três anos antes do evento. 

Ele espera alcançar 1 milhão de inscritos — sem prazo específico —, mas quer que, daqui a dois anos, o YouTube seja responsável por 100% de sua receita. 

“Me encontrei muito bem”, diz Fabrício. “Acho que estou colhendo algo que talvez foi plantado lá atrás, quando o garoto de 12 anos que gostava de jornalismo anotava a escalada do jornal.”

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