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O brasileiro na fila do fim do mundo: reflexões sobre nossa juventude em um contexto de policrise

Gustavo Rosa - 16 jul 2024
Gustavo Rosa, sócio da Questtonó.
Gustavo Rosa - 16 jul 2024
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É fato: não é possível construir um amanhã viável sem que a juventude esteja engajada, inspirada e conectada com as pautas atuais.

Para entender quais movimentos estão moldando a visão de futuro da juventude brasileira, nós da Questtonó mergulhamos nas preocupações, esperanças e comportamentos de jovens brasileiros frente aos desafios atuais.

Atravessando temas como mudanças climáticas, desigualdade social e o avanço tecnológico, o estudo lançado em junho oferece uma visão ampla de como os jovens enxergam seu papel num mundo em transformação.

Chamamos esse estudo de “Quem é você na fila do fim do mundo?”.

Para mapear estes perfis, ouvimos mais de 4 mil jovens durante os últimos cinco meses, aplicando metodologias qualitativas e quantitativas, além da análise de papers científicos e social listening– tudo em parceria com a PiniOn.

Como toda pesquisa, nós aprendemos, confirmamos suposições e, acima de tudo, novas perguntas surgiram.

Neste artigo, me proponho a comentar e analisar os principais achados, trazendo visões e hipóteses que encontramos ao longo de todo esse processo.

CINCO TENSÕES PARA O FUTURO DO PLANETA

A pesquisa revela uma dualidade na percepção dos jovens. Se por um lado, há preocupação com o futuro do planeta, potencializada por notícias alarmantes, conflitos sociais e mudanças climáticas, por outro, identificamos uma faísca de otimismo, alimentada pela crença na capacidade de superação, na força da coletividade e no papel da ciência.

Dessa dualidade, encontramos cinco grandes tensões:

1) “Sou pessimista quanto ao futuro do planeta, mas isso não me impede de fazer a minha parte”
O jovem entende que suas ações individuais podem contribuir positivamente para enfrentar os desafios, mesmo que o panorama geral pareça desanimador. Isso mistura realismo com determinação em fazer a diferença.

2) “Minha ação é individual, mas sei que a preocupação precisa ser coletiva”
As ações do jovem brasileiro são mais voltadas para a esfera individual, embora reconheçam a força da ação coletiva como transformadora. Equilibram o desejo de contribuir para um bem maior com a necessidade de começar por si mesmos.

3) “Apesar de enxergar diferentes fatores que irão impactar o meu futuro, o aquecimento global é o que mais me preocupa”
Há uma urgência em priorizar o aquecimento global, sem ignorar outros desafios importantes para o futuro do planeta.

4) “Tenho descrença no futuro, mas mantenho fé na ciência e na inteligência artificial”
Apesar dos sentimentos de ceticismo, o jovem acredita na ciência e na inteligência artificial (IA) como agentes de solução. Há uma crença na capacidade da ciência e tecnologia para superar desafios.

5) “Embora eu não considere as empresas os principais agentes de mudança, acredito que devem implementar diversas soluções”
O jovem espera ações sustentáveis das empresas, mesmo não as considerando as únicas responsáveis. Esperam proatividade do setor privado, independente do papel de outros setores da sociedade.

A partir destes recortes, podemos dizer que a juventude brasileira entende que suas ações individuais podem contribuir para enfrentar os desafios, apesar de o panorama geral parecer desanimador.

Para se ter ideia, 68,1% deles se preocupam muito com o futuro do planeta e 62,8% acreditam que os problemas atuais vão se agravar.

Desta forma, quando falamos sobre comportamento, a maioria dos jovens pesquisados (83,6%) mudou hábitos de consumo ou adotou ações conscientes nos últimos anos – mesmo que o pessimismo tenha sido agravado pelo aumento dos problemas ambientais

Essa combinação de realismo e determinação reforça a necessidade de contribuir, ainda que a situação pareça desanimadora.

Embora 54% acreditem na ação coletiva, as ações do jovem brasileiro ainda são mais voltadas para a esfera individual. Dados mostram que 59,1% evitam o desperdício de alimentos, enquanto 44,2% diminuíram o consumo de água e 39,5% reduziram o uso de energia.

Um ponto de atenção é o fato de que a falta de uma visão clara de ações coordenadas leva os jovens a duvidarem do impacto de suas atitudes individuais

Neste sentido, percebemos que há um desejo claro de engajamento em uma abordagem coletiva, mas ainda sem saber como, reforçando o sentimento de que é preciso agir sozinho.

Neste mesmo contexto, a Inteligência Artificial ainda é vista como uma ferramenta de performance individual, não como um recurso para questões socioambientais, sendo que 50,6% dos jovens a consideram positiva.

As principais percepções nas contribuições da IA incluem aumento da eficiência (49,2%), produtividade (48,2%) e facilitação da comunicação (43,1%). No entanto, apenas 27,5% entendem o potencial da IA para ajudar com questões ambientais.

Na esfera tecnológica, mesmo pessimistas em relação ao futuro, 69% dos jovens consideram a ciência fundamental ou muito importante para a construção de soluções. Entretanto, a ciência precisa se comunicar de maneira mais simples e acessível com os jovens.

De modo geral, as tensões destacam a importância de uma abordagem que reconheça tanto as ações individuais quanto a força da coletividade.

Integrando esforços individuais e coletivos, é possível engajar os jovens de maneira mais ampla e efetiva, reforçando a ideia de que, juntos, é possível enfrentar os desafios de nosso tempo com maior impacto e esperança.

ENTÃO, QUEM É VOCÊ NA FILA DO FIM DO MUNDO?

Para entender relações específicas com o “Fim do Mundo”, identificamos e mensuramos nove perfis atitudinais:

1) Consciente: o que mais mudou hábitos de consumo pensando no futuro do planeta;

2) Religioso: apesar de colocar o futuro nas mãos de Deus, é o mais pessimista;

3) Adaptativo: o que mais se preocupa com o aquecimento global, e por isso busca se adaptar às mudanças do planeta;

4) Alienado Consciente: prefere a alienação a testemunhar a realidade do planeta;

5) Hedonista: com a maior presença de jovens de 18-24 anos, é o perfil que prioriza aproveitar a vida agora;

6) Pragmático: prioriza resolver as dificuldades do dia a dia, sem tempo para se preocupar com o futuro;

7) Investidor Individualista: pensa mais em si e por isso possui menos crença na coletividade como agente transformador;

8) Engajado: o mais otimista em relação ao futuro do planeta;

9) Cético: o menos se preocupa com o futuro e que menos mudou hábitos de consumo.

Esses nove perfis atitudinais não significam que as pessoas se encaixam exclusivamente em um ou outro: eles circulam entre esses diferentes perfis. Aqui, buscamos entender qual é a maior identificação dos jovens com cada um. E, ao analisar esses perfis mais de perto, observamos algumas características peculiares.

Por exemplo, o “Consciente” tem uma maior presença nas classes A/B quando comparado à amostra geral. Isso indica que uma condição social favorável permite que esses jovens pensem além de garantir o básico para viver.

É um perfil que não precisa se preocupar tanto com o presente e, por isso, consegue viver mais voltado para o futuro.

Por outro lado, o “Pragmático” tem uma maior presença de jovens nas classes D/E. As dificuldades econômicas e sociais levam esses jovens a focarem em necessidades imediatas, deixando pouco espaço para preocupações com o futuro

O “Religioso” apresenta um paradoxo interessante: é o perfil mais pessimista, mas que, ao mesmo tempo em que coloca o futuro nas mãos de Deus acredita na ciência como essencial para enfrentar os desafios globais.

O “Investidor Individualista” é o perfil com maior predominância das classes A/B e é o que menos acredita na coletividade. Este perfil mostra um comportamento mais centrado na sua sobrevivência individual, utilizando seus recursos para benefício próprio.

Com a nossa investigação, confirmamos uma hipótese inicial de que os jovens entre 18 e 24 anos seriam mais “Hedonistas”. Comparado com a amostra total, considerando todos os outros perfis, há mais jovens dessa faixa etária entre os hedonistas do que em outros perfis. Esses jovens estão mais focados em aproveitar o presente ao máximo.

AFINAL, PARA ONDE PODEMOS IR?

O estudo nos permite afirmar que a juventude brasileira deseja se envolver em iniciativas coletivas que promovam mudanças significativas.

Contudo, para transformar esse desejo em realidade e criar um futuro mais sustentável e inclusivo, é essencial promover uma comunicação eficaz e ações coordenadas entre diferentes setores da sociedade

O que apresentamos aqui é uma forma de entender como os jovens estão se relacionando com os desafios globais. Convidamos você a ler o relatório completo para aprofundar esses conhecimentos e explorar novas questões a partir dessa base de conhecimento.

Sabemos que as mudanças climáticas são uma realidade e que as novas tecnologias emergentes transformarão nossas vidas. Acreditamos que não existe mudança sem o coletivo.

A Questtonó é parte da QNCO, um ecossistema de empresas de design. Acreditamos que o que se cria no coletivo é mais forte.

Para evoluir a partir de um desafio sistêmico, precisamos de pensamento sistêmico e da colaboração de todos, especialmente dos jovens, para desenhar um futuro, pelo menos, habitável.

 

Gustavo Rosa é sócio e diretor da área de Pesquisa e Estratégia da Questtonó. Seu trabalho tem um amplo alcance que vai desde grandes pesquisas nacionais e internacionais até organizações como as Nações Unidas e a Prefeitura de São Paulo, bem como projetos para o desenvolvimento estratégico de grandes marcas. Nos últimos anos vem liderando projetos estratégicos para clientes como Ambev, Google e Energisa.

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