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“Meus pais me ensinaram que a vida só faz sentido quando vivida com propósito. E o meu é ajudar os outros a empreender”

Lina Maria Useche Kempf - 1 nov 2024
Lina Maria Useche Kempf, diretora executiva da Aliança Empreendedora.
Lina Maria Useche Kempf - 1 nov 2024
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Quem olha a Fran hoje não imagina como foi a sua trajetória até aqui. Hoje ela é empreendedora, presidente da Associação das Artesãs de Caruaru e Embaixadora da Aliança Empreendedora e inspira diversas outras mulheres.

Anos atrás, a Fran chegou a morar na rua e quase perdeu seus dois filhos para a assistência social. Para conseguir uma renda, passou a produzir artesanato e por isso participou de um programa de TV. Foi aí que as pessoas começaram a comprar mais seus produtos, porém ela não sabia administrar o seu negócio.

Foi nesse período que ela conheceu o trabalho da Aliança Empreendedora, por meio de um curso ela aprendeu gestão de negócios e contabilidade. A vida da Fran se transformou, e como ela mesmo diz: “Sempre achei difícil estudar, mas com a Aliança foi mais prático. Me deram valor, me ensinaram, me transformaram através do empreendedorismo”.

Histórias como a de Fran são o que inspiram nosso trabalho. Cresci em uma família onde meus pais sempre me ensinaram que a vida só faz sentido quando vivida com propósito, e o meu e dos meus parceiros de jornada é ajudar os outros a empreender

Nasci em Chinchiná, uma pequena cidade colombiana com cerca de 3 mil habitantes, situada no eixo cafeeiro do país. Quando eu ainda era bebê, nos mudamos para Cali, também na Colômbia, onde grande parte de minha família vive até hoje.

Pouco depois, nos mudamos novamente para Buenos Aires, na Argentina, onde vivi por dez anos e onde nasceu meu irmão. Posteriormente, meus pais, que eram missionários, foram transferidos para Curitiba. E assim, aos 12 anos, passei a morar na capital paranaense.

O ESTEREÓTIPO DO EMPREENDEDOR COMO UM HOMEM BRANCO DE TERNO NÃO CORRESPONDE À REALIDADE AO NOSSO REDOR

Desde cedo, me envolvi com atividades de voluntariado. Depois de dois anos como voluntária numa empresa júnior, em 2004 comecei a trabalhar em uma organização sem fins lucrativos que apoiava jovens empreendedores de comunidades de baixa renda.

A organização havia acabado de apoiar dez jovens com seus modelos de negócios, e eles estavam cheios de expectativas para acessar o crédito prometido.

No entanto, sem aviso prévio, o programa encerrou suas atividades, deixando esses jovens prontos para produzir e vender, sem o capital necessário. Esses jovens acabaram não conseguindo crédito e desistiram dos seus projetos

Foi naquele momento que entendemos que precisávamos oferecer um apoio mais completo para os empreendedores: criar uma jornada que fosse mais próxima da realidade deles, sem tanta dependência de outros atores, e que pudéssemos trabalhar a partir do que eles já têm.

Assim nasceu, em 2005, em Curitiba, a Aliança Empreendedora, que capacita e apoia gratuitamente microempreendedores formais e informais em comunidades e periferias de todo o país, gerando inclusão e desenvolvimento econômico social.

Percebemos que no imaginário coletivo o empreendedor era representado por um homem branco de terno. Porém se observarmos ao nosso redor vemos que não é bem assim.

Negros, brancos, indígenas, mulheres e homens em comunidades de baixa renda são essenciais para a prosperidade do nosso país e muitas vezes são empreendedores e não se dão conta disso. Fazem o dia a dia acontecer, preparam comida, assam bolos, confeccionam e consertam roupas ou oferecem serviços de beleza

E mesmo com toda essa diversidade, temos muito em comum, e foi isso que nos fez querer que esses trabalhadores fossem vistos e recebessem apoio.

Assim como esses trabalhadores, no início, as pessoas também não levaram a sério o projeto da Aliança Empreendedora. No começo, eu e a maior parte dos fundadores éramos muito jovens e em muitas reuniões o nosso projeto era considerado utópico, como se fosse apenas um sonho, um projeto “bonitinho”.

Hoje, o projeto cresceu e tem como princípio que todas as pessoas possam empreender de forma digna e justa, e usar o empreendedorismo como forma de transformar o Brasil, atuando em parceria com empresas, governos, organizações sociais e interessados na causa.

Com a missão de apoiar microempreendedores de baixa renda, ajudando-os a construir resiliência e prosperidade, a Aliança Empreendedora já impactou mais de 250 mil empreendedores em todos os estados brasileiros, sendo 80% mulheres e 60% empreendedores negros

Além disso, nosso trabalho tem influenciado políticas públicas, fortalecendo o ecossistema de apoio aos microempreendedores e contribuindo para a construção de uma economia mais inclusiva.

AS MICROEMPRESAS CONTRIBUEM COM 27% DO PIB E MESMO ASSIM SÃO INVISÍVEIS NO ECOSSISTEMA DE NEGÓCIOS

Recentemente, o nosso trabalho foi reconhecido pela ONU, com o prêmio The WE Empower Challenge, que premia mulheres empreendedoras que estão promovendo os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU e inspirando comunidades.

Mas ainda temos muito o que fazer em prol destes empreendedores. Dos 90 milhões de trabalhadores no Brasil, 45 milhões são informais e quase metade deles administra microempresas, mas não se veem como empreendedores.

Sem contar que 99% das empresas são micro e pequenas empresas e 70% são informais, sendo que quase metade delas são administradas por mulheres e empreendedores negros. As microempresas contribuem com 27% do PIB e mesmo assim são invisíveis no ecossistema de negócios.

Outra questão que devemos levar para discussão e trabalhar para minimizar o impacto negativo na sociedade é a diferença de gênero, que vai da violência ao impacto econômico.

Uma em cada três meninas e mulheres no mundo todo sofre violência, minando tanto a dignidade quanto o potencial e infligindo enormes custos – incluindo o custo econômico. Um estudo de 2015 descobriu que a violência doméstica contra mulheres e crianças custa à economia global 8 trilhões de dólares

A desigualdade de gênero também tem um grande impacto. Pesquisa da McKinsey demonstra que de 12 trilhões a até 28 trilhões de dólares poderiam ser adicionados à economia global até 2025 se todos os países eliminassem a lacuna de gênero.

Mulheres empreendedoras desempenham um papel crítico na criação de riqueza global. O custo econômico da violência contra mulheres e meninas e a desigualdade de gênero ressaltam a extrema necessidade de comprometimento e ação de todos os setores, incluindo o setor privado.

ACREDITAMOS QUE O MICROEMPREENDEDORISMO PODE DESTRAVAR UMA TRANSFORMAÇÃO E ALAVANCAR A INCLUSÃO SOCIAL E ECONÔMICA

Como demonstrado pelos números, vivemos hoje uma grande desigualdade, porém temos como mudar essa realidade.

Os microempreendedores, formais e informais, são pessoas criativas, honestas e trabalhadoras, que em muitos casos começam seus negócios para gerar renda para suas famílias. São, geralmente, mulheres que simplesmente não percebem que são empreendedoras e que existe todo um ecossistema pronto para apoiá-las.

Acreditamos que os cerca de 20 milhões de empreendedores e empreendedoras são a chave para a inclusão social e econômica.

Recentemente, Daniel Duque, pesquisador do Instituto Brasileiro de Estudos Econômicos fez uma projeção que mostrou que um aumento na qualificação, apoio e formalização de microempreendedores comunitários pode gerar um incremento de 8% no PIB, tirando 5 milhões de pessoas da pobreza em quatro anos.

Esse é o poder do microempreendedorismo no Brasil – e uma grande transformação pode vir deste ecossistema

O empreendedor brasileiro é diverso, composto por negros, brancos, indígenas, mulheres e homens em comunidades e territórios. Usam sua criatividade para oferecer produtos e serviços que fazem parte de quem eles são e contribuem para formar o que somos como brasileiros, contribuem diretamente para nossa cultura. Eles são essenciais para a prosperidade do nosso país.

 

Lina Maria Useche Kempf, 40, é diretora executiva da Aliança Empreendedora. Em 2024 recebeu o prêmio The WE Empower Challenge, promovido pela ONU e Vital Voices. Ela é graduada em Administração pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e tem pós-graduação em Direito do Terceiro Setor pela Universidade Positivo, além de formação em Medição de Desempenho para Gestão Eficaz de Organizações Sem Fins Lucrativos pela Harvard Business School.

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