Suiane Oliveira Cardoso, 38, tem a voz trêmula e baixa. Tímida, faz questão de falar pausadamente, com muita calma e paciência. Rapidamente, é possível entender por que ela abandonou a vida de diretora de arte de agências publicitárias. “Eu me formei em design gráfico, que é o que mais gosto de fazer, e nunca me interessei muito por publicidade. Mas é lá que estão os maiores salários, então acabei indo por inércia”, conta. Depois de oito anos e após passar por agências importantes, como a Ogilvy, em São Paulo, ela se fez a pergunta que todo empreendedor faz ao deixar um emprego estável: “Nossa, mas o que é que eu estou fazendo aqui?”.
Suiane é nascida em Curitiba. Sua história começou a ganhar as páginas de jornais e sites há quatro anos, quando decidiu abrir a butique de sua marca, a Suiane Maria, instalada em uma rua bastante polêmica no centro histórico da cidade natal. A Rua São Francisco, então conhecida como a “cracolândia” de Curitiba, era meio abandonada. Por lá perambulavam moradores de rua e viciados em drogas. Os poucos visitantes frequentes eram os dos restaurantes antigos da região, mas que iam diretamente a seus destinos e nunca aproveitavam para dar uma voltinha nos arredores impopulares.
“POR QUE UMA LOJINHA TÃO FOFA NÃO ESTÁ NO SHOPPING?”
“Sinceramente, fui para lá porque o aluguel era muito barato. Eu já havia criado a marca há alguns meses e vendia pelo site e em bazares, mas começava a existir uma demanda dos clientes verem as peças pessoalmente e era o momento de dar aquele passo”, diz Suiane. Sua história também está em um simpático vídeo, no YouTube. Pela vitrine, via vizinhos fumando crack (às vezes precisava pedir licença para entrar na loja). Mas acreditou no Plano de revitalização da Prefeitura, em parceria com o Sebrae local e a Federação de Comércio do Paraná, que estava para sair do papel. E se instaleu sem medo, enfrentando vira e mexe um cliente que entrava e perguntava “Por que você abriu esta lojinha tão fofa neste lugar, e não em um shopping?”.
Depois de dois anos de existência – ou pode-se dizer resistência – da Suiane Maria, saiu enfim a revitalização da Rua São Francisco. A partir de então, o cenário mudou completamente. A Prefeitura enterrou os cabos de telefone e eletricidade que poluíam o visual da área, acabou com o estacionamento que servia como esconderijo dos usuários de drogas, investiu em calçamento e iluminação noturna. Isso trouxe curiosos e aumentou o movimento, o que consequentemente trouxe outros comerciantes. Em 2014, a Associação dos Ciclistas local organizou um mutirão para a construção da Praça de Bolso do Ciclista. Sua finalização, em setembro, fez a rua atingir o seu auge: hoje a São Francisco é um dos cartões-postais mais descolados de Curitiba.
Suiane participou ativamente dos movimentos de cobrança das autoridades públicas pelo começo e fim das obras. Se envolveu na criação de associações, participava de reuniões e fez o que estava a seu alcance para cobrar agilidade do poder público. “Parece que todo mundo da região falou, de uma só vez: vamos salvar esta rua. E funcionou, foi muito legal”, diz ela.
UM COMEÇO DIFÍCIL E DESPREPARADO
Como sobreviver ao primeiro ano do negócio, que costuma ser o mais difícil, em um lugar com clientela escassa, se já era tão desafiante convencer as pessoas de que valia a pena passar por ali e que, apesar de inóspita, a região não era perigosa? “Foram dois anos sem ter lucro, só pagando as contas. Ainda nos primeiros seis meses de obras de revitalização, o movimento foi tão baixo que quase fechei a loja, já que não havia calçadas e a passagem de carros estava bloqueada”, conta.
Suiane diz que um de seus principais erros foi abrir a butique sem ter a menor noção de administração de uma empresa. “No primeiro ano, fiquei completamente perdida. No início do segundo ano, procurei o SEBRAE, que começava um programa de gestão de negócios para jovens estilistas. Como não era a minha área de formação, o contato com outros profissionais foi fundamental para eu aprender e entender o meu novo meio. Acho que só virei empresária, mesmo, no terceiro ano da minha empresa”, brinca.
Foi em 2013, também, que Suiane passou a investir em criação de estampas, uma área que ainda não tinha explorado e que lhe permitia entrar em contato com sua primeira profissão, o design. Aproveitando também o momento do país e o turismo cultural da região em que está instalada, ela começou a produzir pequenos objetos de souvenirs, como porta-moedas e bloquinhos de anotação com estampas da cidade de Curitiba.
DESIGN DE CURITIBA FEITO EM CURITIBA
Antes focada apenas em vestuário feminino, Suiane reinventou sua marca aproveitando uma oportunidade do mercado, com a Copa do Mundo e o boom do turismo local. Assim, de um público estritamente formado por mulheres, ela passou a receber também homens, que iam em busca de presentes. O amadurecimento do negócio, e da empreendedora, havia chegado.
Suiane é uma microempreendedora individual – e está muito bem assim. “Meu objetivo não é ter um grande negócio, mas uma marca de design que faça pecas artesanais em pequena escala. Se eu aumentar muito a produção, ela deixa de ser artesanal e passa a ser industrial, e não é o que quero. Alguns serviços precisam ser terceirizados, como produção de aviamentos e costuras de alguns tecidos, mas a maior parte é feita por mim e pela estagiária que trabalha comigo”, conta ela.
Quando foram abertas as inscrições para edição de 2014 do Prêmio Brasil Criativo, a premiação oficial da Economia Criativa Brasileira promovida pelo Ministério da Cultura, Suiane decidiu concorrer. Passou nas primeiras etapas de eliminação e chegou até a fase final, com sua butique entre os três melhores projetos de Design da premiação. “Fiquei superfeliz, concorri com projetos incríveis e cheguei muito longe. É bem gratificante, Curitiba ainda é uma cidade que não consome nem dá tanta importância às indústrias criativas quanto São Paulo e Rio. Às vezes, é complicado até explicar para as pessoas que não são da área o que a gente faz. Então este é um resultado bem bacana até para eu me posicionar localmente”, afirma, com orgulho. E com razão.