Nascida em casa de bamba, Solange Cruz tem nítida na memória sua mais distante lembrança de Carnaval. O cenário é a quadra da escola de samba paulistana Mocidade Alegre, no bairro do Limão, em São Paulo, onde reside até hoje. Quando criança, ela se embrenhava entre as saias das baianas para driblar o juizado de menores. A família toda estava ali, mas não era permitida a presença de crianças nos ensaios. “A gente ouvia o alerta e logo corria para a sala de fantasias”, conta.
Ao lado de dois tios, o pai, Carlos Augusto Cruz Bichara, fundou a agremiação em 1967, quando Solange tinha dois anos. Ela nasceu em Barueri, cidade vizinha à capital paulista, mas a família mantinha uma loja no Limão, onde a escola foi fundada. A menina criada no encanto do Carnaval já foi passista, destaque, locutora oficial e vice-presidente. Como diretora de eventos, ela criou o grupo Miscigenação, braço da escola que se apresenta em hotéis, eventos e convenções – uma forma de divulgar a marca Mocidade Alegre depois da Quarta-Feira de Cinzas.
Com a morte do pai e da irmã, que ocupava o cargo máximo da Escola até 2003, Solange assumiu a presidência e trouxe bons ventos para a Mocidade. No primeiro Carnaval sob sua gestão, em 2004, veio o primeiro campeonato, encerrando um jejum de 23 anos. “Foi também o mais marcante, já que havia uma geração na comunidade que nunca tinha visto a Escola ser campeã, e São Paulo comemorava 450 anos”, diz. O feito se repetiria por mais cinco carnavais: 2007, 2009 e pelo atual tricampeonato, em 2012, 2013 e 2014.
A performance como gestora de resultados notáveis fez com que a presidente passasse a ministrar palestras motivacionais em empresas. São cerca de duas por mês. “Com base na minha experiência, tento mostrar que é muito mais fácil fazer as coisas com amor”, diz. A frase é dita por uma gestora que lidera uma força de trabalho que não tem remuneração para mover a escola.
Para Solange, nenhum ambiente é mais democrático que uma escola de samba. “Há empregadas domésticas que são diretoras aqui, comandando um monte de gente, e cheias de responsabilidades”, diz. Apesar dos seis títulos em uma década, ela não atribui as conquistas a si mesma, mas à toda comunidade, cujos interesses promete defender com garra.
Se os ventos continuarem soprando a favor da Mocidade Alegre, o tetracampeonato virá para coroar os 50 anos da sua vitoriosa presidente. O enredo deste ano será a atriz Marília Pêra, presença confirmada no desfile e primeira mulher homenageada pela agremiação. “O Sambódromo do Anhembi vai se transformar em um teatro a céu aberto”, diz Solange.
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