Identifique um problema de mercado. Crie uma ideia inovadora que possa solucioná-lo. Planeje como ganhar dinheiro com essa – como muitos dirão – maluquice. Por fim, desenvolva o tão sonhado produto e descubra como oferecê-lo ao maior número possível de clientes.
Se todas as startups precisassem mesmo seguir a essa regra, provavelmente, a Pluricell Biotech jamais teria saído do papel. Ou melhor, dos microscópios. Criada em meados de 2013, a empresa já possuía um valioso produto em mãos antes mesmo de enxergá-lo como tal. Antes mesmo de ser uma empresa. Agora, o que começou “apenas” como estudos do biólogo Diogo Biagi, 32, sobre células-tronco induzidas (iPS) pode se transformar numa poderosa ferramenta para as indústrias de cosméticos e medicamentos. E, dentre outros benefícios, reduzir consideravelmente o uso de animais em pesquisas.
Ao falar de si, Diogo logo assume: “Sempre fui nerd”. Nascido em São Paulo em 1983, cresceu em Campo Limpo Paulista, no interior do Estado, jogando “taco” na rua até que, aos 11 anos, os pais decidiram retornar à vida na capital. A adolescência não foi lá muito repleta de namoradas. Em compensação, nesta época o futuro fundador da Pluricell Biotech já começou a se destacar nos estudos e nos esportes. “Minha timidez restringia-se às garotas. Dentro da sala de aula ou da quadra de futebol, eu era um dos caras que comandava a turma e sempre convencia todo mundo a fazer as coisas do meu jeito”, diz ele.
Financeiramente, a vida da família nunca foi de mordomias. Somente no ensino médio Diogo foi estudar em uma escola particular. Quando estava no terceiro ano, ele criou um site no qual, por meio de um fórum, os alunos da sala compartilhavam fotos e trocavam informações. “Poderia ter sido um Facebook, só que não”, brinca. Mesmo sem grandes pretensões, a iniciativa chamou a atenção de um professor do colégio que o indicou para uma vaga de emprego. “Fui trabalhar em um site de presentes de casamento. Minha função era editar as fotos dos produtos”, diz. Apesar da aptidão como web designer, ele decidiu que queria estudar biologia.
Começou a cursar UNESP de Rio Claro, mas, ainda no início da faculdade, transferiu-se para a USP em São Paulo. “Já cheguei procurando estágio e logo apareceu. Uma professora especialista em bactérias me convidou para uma iniciação científica com foco em genética. Fiquei sete meses trabalhando com ela”, conta. Pouco depois, estagiou com outra pesquisadora que dava aulas no curso de Educação Física. “Dessa vez, o foco genético era em atletas com doenças do coração. Além de ser complementar ao que já tinha visto, o trabalho envolvia esportes, minha paixão”, completa.
A rotina do estudante se dividia entre os laboratórios do Incor (Instituto do Coração) onde estagiava, treinos diários de futebol e aulas da faculdade. As raríssimas horas vagas eram preenchidas na companhia da namorada Debora Leite, que na época também cursava biologia na USP e hoje é sua noiva.
QUANDO UMA TESE DE DOUTORADO SE TRANSFORMA NUMA EMPRESA
Diogo emendou a graduação em um mestrado também na USP, sobre genética de doenças cardíacas. Sua dedicação aos estudos era cada vez maior. Após tornar-se mestre, o biólogo deu início ao doutorado que, mais adiante, daria vida a Pluricell Biotech. A tese defendida sobre mutação de células humanas se tornou base do serviço que um dia a empresa ofereceria.
Com a ajuda do orientador e futuro sócio, o médico Alexandre Pereira, 40, Diogo desenvolveu uma técnica capaz de transformar células adultas de qualquer tecido em células-tronco induzidas (iPS). Seria uma espécie de célula-tronco “adulta”.
Explicando de forma bem simplificada, a tecnologia da Pluricell consiste em transformar uma célula de qualquer parte do corpo humano adulto (sangue, pele etc) em uma célula específica, por exemplo, do fígado ou coração.
“Com essa inovação, todas as pessoas podem se tornar doadoras de células induzidas à pluripotência, ou seja, células com capacidade de gerar praticamente todos os tipos de tecidos do corpo humano. Antigamente, essas propriedades celulares só existiam nas já conhecidas células-tronco embrionárias”
Fácil? Nem um pouco. Mas, com o sucesso em laboratório, a dupla percebeu que poderia ir mais longe. “Meu orientador chegou à conclusão de que tínhamos em mãos um produto com forte apelo comercial e que era possível vender nossas células-tronco para, principalmente, indústrias farmacêuticas e de cosméticos”, conta. O uso da ferramenta na fabricação de um novo remédio, por exemplo, poderia reduzir custos de pesquisa, tempo de desenvolvimento, e, principalmente, o uso de animais durante o processo. “Em vez de testes em ratos, o cliente passaria a utilizar as células-tronco induzidas para descobrir se o novo produto causa alguma reação alérgica em humanos. O resultado sairia com muito mais rapidez e precisão”, afirma o biólogo que se tornou empreendedor.
GRANDES CLIENTES E UM SONHO MAIOR À FRENTE
Para abrir a empresa, Diogo recrutou mais alguns colegas biólogos dos tempos de graduação. “Eles já tinham vivido a experiência do que é ser empreendedor. Achei isso importante. Durante um tempo, a minha namorada também chegou a fazer parte do negócio, mas depois saiu para trabalhar com pesquisas científicas”. Atualmente, o único “recruta” que se mantém como sócio de Biagi e Pereira é o biólogo Marcos Valadares, 28.
O trio conseguiu uma linha de financiamento de 400 mil reais com a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Em 2013, com menos de um ano de operação, a startup teve mais uma conquista: venceu o prêmio Desafio Brasil, um dos principais e mais respeitados de empreendedorismo do país.
No momento, a startup foca em oferecer dois tipos de células-tronco induzidas (iPS): de coração e fígado. “Geralmente, os testes em laboratórios com novos produtos fazem análises com esses dois órgãos”, afirma Diogo. Um “pacote” com um milhão de células-tronco induzidas custa em torno de 5 mil reais para o cliente final sendo que, em média, são gastas mais de 20 milhões de células durante uma pesquisa. Apesar de nenhuma venda ter sido concretizada até o momento, gigantes do mercado como a Natura e as farmacêuticas EMS e Cristália já estão familiarizadas com a novidade. A última, por sinal, está em vias de assinar um contrato com a startup.
Em um futuro próximo, a Pluricell Biotech espera conquistar uma patente da solução desenvolvida e o status de referência global entre as empresas de biotecnologia.
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