Por Sergio Xavier
Nem sempre as pessoas conseguem explicar por que estão trotando esbaforidas, mas no fundo elas correm por três grandes razões: para perder peso, para ganhar amigos e para zombar da morte.
A grande porta de entrada para o mundo da corrida é a epidemia de obesidade que assola o mundo. Como a corrida é uma das melhores relações esforço-caloria, ela dá o acesso mais rápido e eficiente para quem precisa ou quer entrar na linha. É preciso nadar dias para compensar a cervejada da véspera, caminhar semanas para anular uma feijoada caprichada. Com alguns minutos semanais de corrida os efeitos já aparecem.
O novo livro de Sergio Xavier, lançado ontem em São Paulo: nove personagens, nove histórias de sucesso profissional, muitas aventuras e maratonas realizadas
A segunda grande razão de tanta gente desafiar a inércia é a socialização. Assessorias esportivas, provas animadíssimas, de repente o gordinho virou magrinho e uma nova turma aparece à sua frente. Muitos até se casam nesse ambiente.
Mas eu sou fascinado mesmo pela terceira grande motivação da corrida: zombar da morte. Nem todos os atletas amadores são contaminados pelo vírus da competitividade, mas quem é, não se livra dele tão fácil. A competição não é, no caso, contra um inimigo externo. Na corrida, geralmente o “eu de hoje” tenta ser melhor do que o “eu de ontem”. O que é isso se não uma recusa em envelhecer? E o que é retardar o envelhecimento se não postergar a morte? É disso que estamos falando quando calçamos um tênis ou vestimos aquele inevitável shortinho de nylon aberto na lateral.
O primeiro livro de Sergio Xavier sobre o universo das corridas, de 2010: “Em outubro de 2006, o empresário Amílcar Lopes Jr., o Portuga, realizou um feito memorável ao completar a Maratona de Chicago em 2 horas 43 minutos e 50 segundos. A marca, extraordinária para um amador, fez dele uma espécie de lenda no circuito dos corredores de rua de São Paulo. Desde aquele momento, Portuga se tornou o homem a ser batido…”
Queremos ficar mais fortes, mais rápidos, mais vigorosos, ainda que depois dos 30 nosso destino inexorável seja a decadência física. Eis aí o “milagre da corrida”. Com o treinamento correto, é possível correr mais rápido, ainda que mais velho. Isso é fascinante. Já estou beirando os 50 e corro mais rápido do que quando tinha 30. É claro que há um truque nessa sentença. Se treinasse bem aos 30, correria melhor do que aos 50. Só que aos 30, meus interesses eram outros. O fato concreto é que me sinto mais jovem agora. E a corrida tem papel preponderante nessa revigorante sensação de saúde.
Completar uma maratona é outra aventura instigante. Basicamente, por que não fomos feitos para correr mais do que 25 ou 30 km. A maratona tem 42 longos quilômetros, o único jeito de vencê-la é treinando com muita disciplina. Talvez eu tenha enveredado pelo jornalismo justamente em razão da minha ojeriza pela disciplina. Fugi dos estudos mais pesados das ciências exatas, adorei a ideia de que o jornalista é alguém que domina um mar de conhecimentos, só que com água pelo tornozelo. Desconfiei, e comprovei depois, que venceria os anos de faculdade sem me matar estudando.
O segundo livro de Sergio Xavier sobre corridas, de 2013, reúne as melhores histórias do blog Correria, que mantém em parceria com Iberê Dias
Correr maratonas – e já foram 10 até o presente momento – mudou minha forma de ver o mundo. Aprendi, de fato, o valor da disciplina. Na pista, você não está se submetendo a um chefe – você está negociando, o tempo todo, consigo mesmo.
A corrida tem também muito a ver com meritocracia. Treinou, levou. Suou a camisa no treino da semana? O tempo vai baixar na prova do domingo. Passei minha infância e juventude jogando futebol. Quando algo dava errado, dava um jeito de culpar o time. Quando comecei a correr provas, entendi que não havia mais o “outro”. Era o “eu de hoje” contra o “eu de ontem”. Todos os fracassos eram meus. Os sucessos também. E treinando bem, o resultado vinha. Não adiantava mais dar aquele miguezinho e treinar 5 km quando a planilha recomendava 10 km.
A experiência das corridas transbordou para a vida profissional. Disciplina para fixar metas e ir atrás delas. Não sei se virei um profissional melhor depois que comecei a correr. Acho que sim. Da mesma forma que acho que ando cada vez mais jovem. Pode ser só impressão. Mas é uma impressão forte o suficiente para que eu lhe recomende tentar incorporar esse hábito em sua vida. Faz um bem danado.
Um cuidado, apenas: correr vicia. Eu, por exemplo, além de treinar várias vezes por semana, já estou lançando meu terceiro livro, Vidas Corridas, sobre o universo das corridas. Se me permite, é uma boa dica para o feriado que começa em instantes – tanto a corrida quanto a leitura.
Sérgio Xavier, 49, é jornalista com passagens pelos jornais Diário do Sul e O Estado de S. Paulo e pela revista IstoÉ. Atualmente, dirige um núcleo de revistas da Editora Abril (Playboy, Men’s Health, Women’s Health e Placar), além de comentar diariamente futebol na BandNews FM. É autor dos livros Operação Portuga e Correria. E divide o blog Correria com Iberê Dias. Está com 10 maratonas nas costas.
André Vieira era gerente no ramo de telecomunicações e levava a fotografia como um hobby. Até que, em busca de flexibilidade e uma renda extra, começou a clicar treinos de corrida – e acabou criando uma agência que fatura R$ 1 milhão por ano.
A influência dos pais fez Ígor de Faria crescer cultivando o gosto por viagens e aventuras. Ele conta como deixou um emprego estável para rodar o continente americano de carona (e recolher histórias pelo caminho).
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