Minha rotina neste projeto começou em agosto do ano passado. O site ainda não estava no ar e eu penava para me adaptar à rotina de trabalhar em casa pela primeira vez em 17 anos (o novo jornalismo, líquido, está em todos os lugares, donde, em lugar nenhum: no hay redação). Além de esquecer de almoçar ou beber água, era especialmente difícil saber a hora de parar de trabalhar. A gente (eu, Adriano Silva e Pedro Burgos, então editor do projeto) passava o dia inteiro conectado, fritando, organizando pautas, links, ideias, pessoas, abordagens para as histórias que queríamos contar.
Também nos encontrávamos e fizemos, a três, algumas das primeiras entrevistas e filmagens (a Natália Garcia, do Cidade para Pessoas, deve se lembrar disso). E, então, rediscutíamos tudo presencialmente, nos cafés e restaurantes que nos serviam de escritório. Ao mesmo tempo em que isso fervilhava, era difícil explicar para as pessoas o quê, afinal, eu andava fazendo da vida. Essa história de trabalhar em casa e não ter nada para mostrar era meio esquisita…
Até que o Draft entrou no ar no dia 29 de agosto, uma sexta-feira. Bonitão, com uma identidade visual acertada e que sozinha transmite o que Draft pretende ser: clean, atual, leve, bonito, agradável. Da segunda-feira seguinte, 1o de setembro de 2014 até hoje, passamos a publicar todos os dias pelo menos duas grandes histórias (que chamamos de features) sobre a Nova Economia, mostrando quem são os makers, os criativos, disruptivos, startupeiros, empreendedores sociais e life hackers que agora povoam não só a timeline do Draft mas também a minha — e a de cada vez mais gente.
Eu vinha de quase três anos trabalhando numa agência de comunicação corporativa, a Ideal, e tinha consciência de que iria experimentar uma função diferente. Alguns amigos perguntavam como era “voltar ao velho jornalismo”. Eu dizia que estava feliz, verdade, mas não respondia — porque a pergunta não procedia. Não havia (não há), um velho jornalismo para onde voltar, nem que eu quisesse. Era bem o contrário: eu estava vivendo uma nova forma de exercer a profissão de contar histórias. Que essas histórias se apresentem em formato digital é um fato e uma obrigação, não há nada de novo nisso.
A novidade foi ver como se cria um senso de comunidade em torno de uma proposta editorial
Numa das nossas reuniões pré-Draft, anotei uma lista intitulada “o que é pauta do Draft”: inovação disruptiva, transformação, mudança de modelo de negócio, iniciativa que se sustente financeiramente, revisitar o hype. Num outro canto da mesma página, instruções formadoras do jeito Draft de contar histórias: “dizer como a pessoa encontrou o modelo entre fazer o projeto e pagar as contas”, “instrumentalizar quem está lendo para fazer o que não achava possível”, “fazer com que o cara de fora enxergue o caminho do maker, deixar a construção daquilo visível”. Era o que tínhamos, o que queríamos, o que faríamos.
E assim, aos poucos, dia após dia, fomos colocando no ar cada uma das ideias que a nosso ver representavam o Draft. Elas começaram a ganhar vida própria e viajar por caminhos e timelines improváveis, e isso era ótimo. O site ia ganhando leitores (unique visitors, melhor dizendo) conforme nós mesmos e os personagens retratados fazíamos a distribuição amorosa do conteúdo em nossas redes pessoais. “Olha que legal.” Acredito que um post começando assim é e sempre será a melhor campanha de marketing que um produto editorial poderia ter. Tão simples, tão poderoso, tão valioso.
Quando o Draft já tinha uns dois meses de vida, algumas rotinas estavam estabelecidas. Minha home já tinha feito as pazes com o office que a havia invadido. Criei uma rotina própria, mas agora saudável e produtiva, de trabalho. O Pedro tinha deixado o time para ir atrás de seus projetos pessoais — algo que se tornaria uma triste-feliz rotina: gente boa que depois de escrever sobre empreender e hackear a própria vida sai do Draft porque vai fazer isso na prática (como reclamar?). No time fixo, Kaluan Bernardo era agora meu parceiro, responsável pelas pílulas diárias da Seleção Draft e, no início de 2015, também pela seção dedicada a novos negócios, Acelerados.
O time de colaboradores ia aumentando, com repórteres que eu já conhecia, outros que vieram de recomendações do Pedro, do Adriano. Gente muito boa, que pegava rápido o espírito do que queríamos contar no Draft. Renata Reps, Daniela Paiva, Mariana Castro, Isabela Mena, Aline Vieira, Camilla Ginesi, Gisela Blanco, Anna Haddad, Breno Castro Alves, Filipe Callil, Luisa Migueres (que hoje faz Seleção Draft e Acelerados, no lugar do Kaluan), Mel Meira e tantos outros. Tanta gente legal.
Mas mesmo com eles, era (e é até hoje) divertido e desafiador explicar por que determinada história vale como pauta para o Draft e por que outra, parecida, eventualmente não. É uma sintonia fina. Uma linha delicada separa, por exemplo, histórias de empreendedorismo das histórias de empreendedorismo criativo e disruptivo que buscamos contar. As últimas são a cara do Draft, as primeiras, por mais legais que sejam, não são. Mas se determinada história de empreendedorismo não-disruptivo tem um personagem que transformou maravilhosamente sua vida, fez um life hacking inspirador, aí ela é pauta.
Uma parte do meu trabalho é refinar diariamente, com toques precisos do Adriano, o que é e o que não é pauta para o Draft. Isso passa por conversar com os colaboradores e, também, com assessores de imprensa que cada vez mais nos procuram, nem todos exatamente a par das nossas particularidades.
Outra parte é propor o casamento mais bacana possível entre colaborador e história a ser contada. Aqui, o frila pode negar pauta, não tem grilo. Quero pessoas felizes dedicando seu tempo para o Draft, contando as histórias que estejam afim de contar. O mercado de jornalismo está derretendo, os cachês (aqui e em qualquer lugar) poderiam ser melhores. Então, vamos ser felizes o máximo que pudermos trabalhando? Quero.
Mas, enfim, cuidar da pauta e cuidar dos frilas é algo que editores fazem nos bastidores de veículos desde o século passado. Uma outra parte, a mais “tecnológica”, do meu trabalho é fazer com que as histórias do Draft tenham o mais longo ciclo de vida e relevância digital possível. Aí há a ciência de dados, que nos indica os melhores horários e formatos para (re)publicar o conteúdo nas redes sociais. Há os macetes de comprar mídia para fazer o conteúdo que já está indo bem voar mais um pouquinho (de nada, Zuckerberg). E há a possibilidade permanente, deliciosamente imprevisível, de que um post se torne viral e alcance, num susto, centenas de milhares de pessoas além da nossa média, fazendo com que toda uma mágica aconteça (Claudia Giudice, Tania Menai que o digam).
De todas as novidades que a tecnologia trouxe para o jornalismo, a mais legal, a mais valiosa, é a possibilidade de ver como as pessoas, individualmente, se tornam veículo dos conteúdos com o quais se identificam
Pessoas que curtem nosso trabalho a ponto de recomendá-lo em suas redes. Começa por quem escreve no Draft, passar por quem trabalha na comunicação das empresas retratadas e pelos próprios personagens das matérias.
Mas há mais gente aí, e isso é que vai delineando o senso de comunidade que buscamos: empreendedores, criativos, disruptivos, gente que sonha em um dia ser um maker também, gente que simplesmente gosta de acompanhar este universo. Que gosta de ler histórias de negócios que mudaram mercados, histórias de pessoas que mudaram suas vidas (histórias que estarão sempre por aqui, legitimando a comunidade ao redor do Draft). São essas pessoas que compartilham nossos conteúdos e dizem “olha que legal”. Legal demais. A gente morreria sem isso.
Agora que mais de um ano já se passou, as surpresas e conquistas lá do começo vão ficando para trás e isso nos dá a possibilidade de olhar, em perspectiva, para o que produzimos. O designer Crystian Cruz, o Coxa, transformou em infográfico os principais números do nosso primeiro ano de vida. Quase 3 milhões de pessoas diferentes entraram aqui. O número absoluto, por mais que nos encha de orgulho, ainda é pequeno se comparado ao alcance de portais e outros canais da internet. Mas saber que essas pessoas não só entraram, mas pararam, respiraram e permaneceram mais de 5 minutos de suas vidas lendo alguma coisa que os atraiu é muito gratificante.
E mais que isso: em média 40% dessas leituras terminaram com o leitor se engajando com o conteúdo, ou seja, compartilhando e recomendando o Draft para mais alguém. Isso nos faz acreditar que estamos trilhando um caminho interessante, de relevância, de coerência e de participação em algo maior — nascemos com a missão de narrar as histórias da Nova Economia brasileira, como cantava o nosso primeiro post, lá atrás — e que, ainda bem, não para de se transformar e de crescer. Vamos juntos?
Você já viu a empreendedora Diana Assennato, no Draft, falando sobre como foi viver do auge ao fechamento de uma startup premiada. Agora, nas comemorações do nosso primeiro ano, ela conta como sentiu o impacto de aparecer neste espaço.