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Todos juntos para comer mais saudável, comprar do produtor e mais barato: esta é a Junta Local

Carolina Bergier - 8 out 2015 Um dos locais onde acontece a feira da Junta Local é o Centro do Rio, na rua do Rosário.
Um dos locais onde acontece a feira da Junta Local é o Centro do Rio, na rua do Rosário.
Carolina Bergier - 8 out 2015
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“Não coma nada que sua avó não reconheceria como comida.” Afinal, um cubo embrulhado num papel, dentro de uma caixa, com gosto de legumes mas sem cara de legumes não é bem “comida”. Uma panela com legumes e água é. E ambos são reconhecidos como “caldo de legumes”. Essa é uma das recomendações de Michael Pollan, premiado jornalista americano que há 20 anos pesquisa comida e produção de alimentos. Em seu livro Em defesa da comida – Um manifesto ( Ed. Intrínseca), ele também sugere que evitemos comidas contendo ingredientes com nomes impronunciáveis, bem como produtos que não apodreçam ou que aleguem vantagens para sua saúde. A ideia é se alimentar com “comida de verdade” e não com conservantes, acidulantes e corantes.

Questionamentos sobre alimentação realmente saudável, criação de canais de comercialização e viabilização de pequenos empreendedores a novos mercados levaram à criação da Junta Local, uma comunidade que se reúne no Rio de Janeiro em torno da comida boa, justa e local que encurta a distância entre produtores e consumidores.

A ideia é oferecer plataformas físicas e virtuais para que produtores e consumidores se encontrem sem atravessadores nem taxas abusivas, fomentando um espaço de socialização e reflexão sobre os nossas escolhas na hora de comer, com ênfase na formação de uma rede de produtores e consumidores engajada na valorização da comida local e justa. Hoje, os encontros acontecem em feiras periódicas, em um e-commerce com entregas quinzenas e em prateleiras de pequenas lojas e mercados.

Os sócios da Junta, Thiago e: o negócio nasceu da indignação de ambos com a cadeia de distribuição de alimentos.

Os sócios Thiago Nasser, Henrique Moraes e Bruno Negrão: o negócio nasceu da vontade de tornar mais justa a cadeia de distribuição de alimentos produzidos localmente no Rio.

Tudo começou quando Thiago Nasser, 35, decidiu mudar o tema de sua tese de doutorado em Ciência Política aos 45 do segundo tempo. Ele conta que, já apaixonado pela cozinha, se sentiu chamado a estudar a comida como um movimento, entendendo as possibilidades de politização do discurso gastronômico. Nesse processo, se envolveu com iniciativas que trabalhavam com pequenos produtores e foi aí que conheceu o designer Henrique Moraes, 23, que trabalhava com importação de azeite. A afinidade entre os dois fez com que iniciassem alguns projetos, como jantares fechados e o Pira Pirão, ciclo de debates sobre formas alternativas de produção e consumo de alimentos, sempre seguido de experimentação na cozinha.

Quanto mais se envolviam com o tema, mais indignação brotava. “A cadeia alimentar tem sérios problemas. O produtor lá do interior não sabe como escoar sua produção e acaba dependendo dos atravessadores, que cobram alto para o consumidor final e repassam um valor pequeno para o produtor. Ou então os varejistas, com seu poder de barganha, fazem com que os produtores se tornem quase que escravos dos grandes supermercados, criando pouca resiliência pra quem produz”, diz Thiago. Além disso, ele prossegue, as técnicas de cultivo orgânico e agroflorestal são mais caras do que as de monocultura e as altas taxas inviabilizam a compra, contribuindo para que o Brasil, país de terra fértil que é, seja o que mais consome agrotóxicos no mundo.

A falta de reconhecimento ao produtor incomodava muito aos dois. “A gente queria uma maneira criativa de reconhecer e remunerar de forma direta e justa o produtor”, conta Thiago. A ideia inicial do negócio foi uma plataforma online de venda direta e visibilidade dos produtores:

“O produtor precisa estar focado em produzir. Estar na terra e na cozinha demanda muito. A gente queria ajudar com o comercial, marketing e vendas. Ele foca na produção e a gente na comunicação e logística”

A inspiração veio da CSA (Community Supported Agriculture), modelo econômico norte-americano que possibilita que os cidadãos tenham acesso direto a alimentos locais de qualidade e da Rede Ecológica, movimento social constituído de grupos de consumidores que realizam compras coletivas diretamente de pequenos produtores agroecológicos e orgânicos.

Hortaliças das redondezas: a maioria dos cerca de 200 produtores é do Rio de Janeiro.

Hortaliças das redondezas: a maioria dos cerca de 200 produtores é do Rio de Janeiro.

Os dois não entendiam de empreendedorismo, não tinham ideia de como viabilizar o negócio nem dinheiro pra começar. “Nessa época, o Bruno estava se aproximando de nós e tinha acabado de voltar de viagem encantado com os mercados de produtores locais”, lembram. Bruno Negrão, 28, é formado em comunicação social e um dos sócios da Comuna, um espaço multifuncional para diferentes ideias e projetos, onde funciona um restaurante e uma livraria independente e onde aconteciam os ciclos de debates, também no Rio. A sinergia estava dada e a Comuna poderia ser o local de distribuição. Mas como criar essa rede de produtores do zero?

A PRIMEIRA EDIÇÃO NÃO CUSTOU NADA NEM DEU LUCRO: ELES ACHARAM UM SUCESSO

“Comida é sensorial, não adianta ser virtual. A pessoa quer colocar o produto na boca, conversar com o produtor, experienciar antes de comprar virtualmente”, afirma Thiago. Sem ideia do que poderia acontecer quando o bloco estivesse na rua, ele e o sócio precisavam prototipar, ainda que o jargão empreendedor não fizesse parte de seu vocabulário. Chamaram então alguns produtores que já conheciam e fizeram um chamado no Facebook. A primeira feira aconteceu em agosto de 2014, com 17 produtores e a casa cheia em pleno sábado carioca de sol. Nenhum tostão foi gasto – as estruturas foram feitas com caixotes de feira, a comunicação foi toda online e nenhum produtor pagou nada pelo estande. Também, nenhum dinheiro foi recebido. Com o protótipo aprovado, podiam experimentar outras possibilidades.

De lá para cá, geleias, hortifruti, embutidos e massas — tudo produzido por empreendedores locais ou, no máximo, vindos de Minas Gerais ou São Paulo — já foram vendidos em 25 edições da feira itinerante, financiadas coletivamente pelos mais de 200 produtores, que participam em esquema de revezamento. A escalação de cada feira varia de acordo com o tamanho do espaço, a disponibilidade dos produtores e um critério de rodízio entre eles. Diversos modelos para a feira foram testados, entre eles centralizar o caixa e ficar com 20% do faturamento, mas este não funcionou: “Não fez sentido, estamos querendo justamente descentralizar ao máximo”, afirma Thiago.

Já aconteceram mais de 25 edições da feira. "As pessoas querem conversar, experienciar, antes de comprar", conta Thiago.

Já aconteceram 25 edições da feira organizada pela Junta Local. “As pessoas querem conversar com o produtor, experienciar, antes de comprar”, conta Thiago.

Hoje, funcionam com planilhas abertas para os produtores e uma sugestão de colaboração financeira para cada um deles, de acordo com o perfil de cada um, incluindo o fundo de sustentabilidade da feira. Cada um decide com quanto quer colaborar. “O cara que vende uma pimentinha não pode pagar o mesmo da cerveja artesanal. E todos eles sabem que pra feira continuar existindo eles precisam contribuir”, diz Thiago. Até hoje, a conta sempre fechou.

Além das feiras, que acontecem em média quinzenalmente e costumam lotar de pessoas interessantes e interessadas, há também a Sacola Virtual, que se aproxima do sonho inicial, um e-commerce com os produtos que já participaram da feira. A virtualização é, além de uma estratégia de ampliação, uma maneira de reduzir os custos fixos. Lá tem de hummus de grão de bico e beterraba a wafel de baunilha, passando por gnocchi de biomassa de banana verde, queijo de cabra e legumes. Basta escolher seus produtos e preencher alguns dados que os pedidos serão passados para os produtores e entregues no dia determinado na Comuna pela manhã, quando Bruno, Henrique, Thiago, Ana Carsalade (a única funcionária) e voluntários organizam as entregas, sacola por sacola, para que os consumidores possam passar por lá para fazer o pagamento e retirar os produtos.

“Os laços de confiança são forjados no calor da feira, os produtos são provados e degustados. A feira virtual entra para facilitar a vida de produtores na medida em que não precisam sempre estar presentes nem fazer entregas porta-a-porta”, diz um trecho do blog da Junta. A comissão para os organizadores é de 15% e número de pedidos quinzenais passam de 120, gerando um faturamento de cerca 10 mil reais mensais.

AOS POUCOS O NEGÓCIO SE EXPANDE

Recentemente começaram a empreender a Prateleira Local, espaços em parceria com pontos de venda fixos, como o Gaia Art & Café, no Leme. A cada 15 dias, cinco produtores são convidados para “ocupar” as prateleiras, praticando preços idênticos aos da Sacola Virtual e das feiras da Junta. A ideia surgiu em uma das assembleias, encontros com todos os produtores que acontecem no início de cada estação para fomentar a troca entre a comunidade e estimular a inteligência coletiva.

A seleção de produtores é criteriosa e passa pela análise de qualidade, sabor, diversidade na oferta da Junta e o quão os produtores estão realmente alinhados com a proposta de produção local, cadeias curtas e sustentabilidade.

Com pouco mais de um ano de Junta Local, a renda dos sócios ainda não vem exclusivamente da empresa, mas os movimentos futuros estão sendo desenhados também para cuidar disso, além de ganhar escala sem perder a humanidade. Thiago fala a respeito do que o motiva:

“O atual e nocivo modo de produção é baseado na escala e concentração de lucros: grandes plantações, grandes corporações, grandes redes varejistas. Isso precisa ser revertido. O sistema alimentar precisa ser relocalizado e repensado dentro de uma escala mais humana”

Para eles, só descentralizando será possível construir um sistema melhor em que o dinheiro vá para o lugar certo, para as pessoas que cuidam da terra e as pessoas que fazem a comida com propósito. “Além disso, se o objetivo é conhecer pessoalmente produtores, você não pode ter uma organização grande, impessoal e distante. Se o objetivo é fomentar uma cadeia alimentar curta e local faz mais sentido ter várias ‘Juntas’.”

A vontade é que aconteçam feiras simultâneas em outros lugares, produzidas por outras pessoas. Para isso, estão trabalhando na criação de um software que possa ser replicado sem perder a essência. Afinal, a Junta Local é mais que uma feira bacana, é um ponto de encontro de gente afim de comer bem e de forma consciente. Para eles, é preciso ajuntar!

DRAFT CARD

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  • Projeto: Junta Local
  • O que faz: "Ajunta" quem come e quem produz hortifruti, num e-commerce e em feiras físicas
  • Sócio(s): Thiago Nasser, Henrique Moraes e Bruno Negrão
  • Funcionários: 1
  • Sede: Rio de Janeiro
  • Início das atividades: 2014
  • Investimento inicial: NI
  • Faturamento: R$ 10.000 mensais
  • Contato: [email protected]
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