Estima-se que em 2050 o planeta terá 9,6 bilhões de habitantes – 2 bilhões a mais de bocas para alimentar do que hoje. A área cultivável, porém, será a mesma. Como equilibrar esta equação? A resposta é uma só: produzir mais e melhor com ajuda da tecnologia. É preciso aperfeiçoar os processos de produção alimentar, desenvolvendo produtos mais resistentes a pragas e mudanças climáticas, e melhorando suas qualidades nutricionais para assegurar a saúde da população.
Biotecnologia no dia a dia
A biotecnologia é fundamental na produção de vários alimentos do dia a dia. Substâncias essenciais para a produção de pães, queijos, iogurtes e bolos, por exemplo, são sintetizadas industrialmente com ajuda de bactérias, leveduras, fungos, algas ou até alguns tipos de vírus. Esse exército microscópico ajuda a fabricar alimentos mais saudáveis, seguros e acessíveis economicamente, por meio de processos industriais controláveis e de alta escalabilidade.
Registros da civilização babilônica já indicavam a utilização de leveduras na produção de pães e cerveja cerca de 4 500 anos antes de Cristo. Mas a evolução da biotecnologia trouxe outras aplicações, além da produção em si. “Os microrganismos hoje ajudam a fabricar substâncias para realçar sabor, agregar textura, cor e consistência, e até elevar a quantidade de vitaminas em alimentos”, diz Airton Vialta, pesquisador-doutor em microbiologia e conselheiro do Conselho de Informações sobre Biotecnologia (CIB).
Por exemplo, a biotecnologia é utilizada na produção de sucos e vinhos, com o objetivo de aumentar a produtividade na extração da polpa das frutas e melhorar a cor e o aroma. Na panificação, enzimas são usadas na preparação do pão, para que o processo de envelhecimento possa ser retardado, mantendo o pão “fresco” por mais tempo.
A biotecnologia, hoje, é capaz de criar alimentos ainda mais nutritivos e saudáveis.
Superalimentos: dos laboratórios para o campo, do campo para sua mesa
Imagine comer um prato de arroz e feijão que, além de todos os nutrientes esperados, ainda apresentam uma carga maior de ferro e zinco. Ou milho, batata-doce e mandioca enriquecidos com betacaroteno. A biofortificação é uma técnica que incrementa os alimentos com nutrientes cuja ausência está associada a doenças crônicas, como diabetes e doenças cardiovasculares.
“É possível introduzir ou aumentar teores de compostos bioativos, como flavonoides, polifenóis, licopeno e vitamina E, antioxidantes que previnem o envelhecimento e câncer, entre outros nutrientes”, diz a nutricionista Neuza Maria Brunoro Costa. “Esta é uma estratégia que oferece alimentos de melhor qualidade nutricional, capaz de aprimorar as condições de saúde da população.”
E não faltam exemplos no mercado. Nos Estados Unidos, a soja Vistive Gold representa um dos primeiros produtos biotecnológicos que permite ao agricultor levar benefícios nutricionais aos consumidores, ao mesmo tempo em que cultiva um tipo de soja de alto rendimento. Seu óleo, o Vistive® Gold, é ideal para frituras saudáveis: tem 85% menos gordura saturada do que o óleo de palma, 70% menos do que a gordura vegetal e 60% menos do que o óleo de soja convencional.
Agora, que tal um molho de salada feito com óleo de soja, mas que ofereça os benefícios do Ômega 3? Ou seja, um molho que faça bem ao coração sem possuir sabor de peixe, característico dos alimentos fonte de ácido graxos essenciais. Isso já é possível com a soja Ômega 3 com Ácido Estearidônico (SDA), também obtido por meio da biotecnologia.
Neusa conta que há pesquisas em andamento para desenvolver abóbora enriquecida com vitamina A. “Na Ásia, a carência de vitamina A é a maior causa de cegueira entre crianças. Boa parte da população do continente tem dificuldade de acesso a fontes vitamínicas, como frutas, legumes e verduras. Para reverter este quadro, nas Filipinas existe o arroz dourado, enriquecido com betacaroteno”, diz, lembrando que o arroz é o alimento base da população asiática.
Sementes mais resistentes. Ganha o agricultor, ganha o consumidor
Não basta criar alimentos altamente nutritivos: é importante que eles estejam acessíveis a todos. Só assim podemos garantir a saúde e saciedade da população. E é aí que entra o papel da biotecnologia na otimização da produtividade agrícola. Através da modificação genética, tem sido possível desenvolver sementes mais tolerantes ao uso de herbicidas e mais resistentes a pragas, doenças e mudanças climáticas.
“Sem as características agronômicas introduzidas geneticamente nas plantas, seria bem mais difícil para o agricultor brasileiro atingir altos índices de produtividade e evitar o avanço da agricultura sobre áreas de proteção ambiental”, diz Adriana Brondani, doutora em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e diretora-executiva do CIB. “É notável a diferença entre o número de tecnologias antes e depois do advento da lei.”
Ela se refere à chamada Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105/05). Desde a aprovação do marco regulatório, em 2005, o número de tecnologias geneticamente modificadas para diversas áreas no país aumentou exponencialmente. “De 2006 até o fim de 2014 foram aprovadas 61 tecnologias GM. Nesse período o país passou a contar com inovações para milho, feijão, combate à dengue e produção de biocombustíveis por meio de microrganismos”, diz Adriana.
Quanto mais tecnologia houver à disposição dos agricultores, mais alternativas eles terão para controlar pragas, realizar o manejo adequado e alcançar sucessivos ganhos de produtividade.