Um livro que está sempre na cabeceira de Max Petrucci, 48, CEO da agência Garage, é Bold, de Peter Diamandis, co-fundador da Singularity University, do Vale do Silício. Mas não é apenas essa a referência de Max ao ambiente de negócios disruptivos da Califórnia. Em uma longa conversa com o Draft, o empresário falou sobre ideias e princípios que regem seu trabalho e sua vida – que estão muito interligados –, com temas como sociedade em rede, ambiente digital, conexão entre marcas e pessoas, alimentação, yoga e meditação.
Max conta que foi um menino geek que gostava de física, química e matemática, com sonho de ser astronauta. O gosto pelos números o levou a cursar FGV e pensar em ser economista em bancos, mas acabou descobrindo que a propaganda é o que fazia sentido em sua vida. Ele iniciou a carreira no marketing de companhias tradicionais como Natura, Gillette e Johnson & Johnson, no Brasil e nos Estados Unidos. Em 1999, participou de uma iniciativa pioneira na internet do Brasil, como o responsável pelo marketing e novos negócios da startup Webmotors. Logo ele mergulharia mais fundo no universo digital, como diretor de marketing e novos negócios do MSN — que pode ser considerada uma das primeiras redes sociais do mundo e que, mesmo dentro de uma grande empresa como a Microsoft, funcionava nos moldes de uma startup.
Em 2006, fundou a Garage, uma agência com foco no digital e em ouvir o briefing da sociedade para então conectá-lo ao das marcas. Com a evolução dos tempos e o fim das barreiras on e offline, a agência passou a buscar o que agora é a ponte entre pessoas e marcas, pessoas e governos, pessoas e pessoas: os “propósitos”. “Em uma economia em rede, as pessoas estão aprendendo a viver a vida de um jeito mais efetivo, pleno, se livrando de intermediários. As empresas que vivem no modelo antigo, industrial, precisam correr. Nosso grau de consciência como indivíduo aumenta e, com essa consciência, começam a não existir intermediários. Será que precisa de uma rede corporativa de hotel? Ou será que não é melhor ter uma plataforma digital que facilita esta transição? A resposta é o Airbnb, o Uber etc.”
Foi com a base no conceito buscar a real razão para fazer algo que surgiram projetos como o “Nova Cara da Terceira Idade”, que busca chamar atenção para a causa dos maiores de 60 anos hoje em dia, abordar mudanças de percepção e de comportamento. O projeto começou com uma campanha para atualizar o pictograma atual que representa os idosos nas placas (em vez do velhinho de bengala, um corpo mais ereto ao lado do número 60+) mas evoluiu para outras atividades. Hoje, há encontros presenciais, produção de entrevistas com personalidades e ações em espaços públicos como na Paulista Aberta (nome que a principal avenida paulistana ganhou aos domingos, quando fica aberta para pedestres e fechada para carros). Uma comunidade no Facebook, que quebrou o paradigma de que os maiores de 60 não estão por lá, atualmente centraliza essas ações e tem mais de 100 mil curtidas.
Ainda a partir desse mindset, a Garage também desenvolveu a plataforma “Todo Cuidado Importa” para BB Seguros, que estimula o contato entre pessoas que querem alguma ajuda e os que dispostos atendê-las – e que gerou até oferecimento de hospedagem para refugiados sírios, além do projeto Horta na Caixa, com o objetivo de promover o cultivo de hortas residenciais e a formação de uma rede de produtores. Essa iniciativa prevê hortas maiores em rooftops, além da criação de conteúdo informativo constante para disseminar mensagens, como tutoriais e notícias sobre ambientalismo.
Segue o papo com Max Petrucci:
A Garage existe desde 2006, quando se posicionava como uma agência interativa e com foco na digitalização das marcas. O que mudou na missão da empresa desde então?
A Garage vai fazer dez anos em fevereiro e, desde aquela época, eu já acreditava intuitivamente na sociedade em rede. Foi algo que experimentei de perto quando fui responsável pelo lançamento do MSN Messenger, que surfou na onda das pessoas interligadas. Acompanhei cases incríveis na Coréia e na Índia: tinha uma velhinha que ia ao cybercafé para falar com o neto que estudava em Mumbai, e se dependesse do telefone, ela não conseguiria. Então, quando montei a Garage, eu já tinha uma experiência hiperligada às redes sociais. É algo que continua sendo a semente. Não digo a rede social especificamente, mas as relações entre as pessoas, que chamamos de caráter orgânico.
A Garage hoje se posiciona como uma agência que ajuda as marcas a encontrarem seu propósito e seu lugar na economia pós-industrial. Essa renovação acompanha as mudanças do mercado ou a sua visão de mundo?
Acho que é uma relação de causa e consequência, que passa pela questão de ser “a transformação que você quer para o mundo” – que não é uma utopia, mas sim, algo cabível e necessário.
Não montei a Garage para fazer site nem para fazer banner, que era algo que o mercado comprava a rodo
A Garage veio para fazer da filosofia da visão orgânica a semente do todo e da conexão entre marcas e pessoas. A partir daí, fizemos coisas como o primeiro festival Skol Beats, um trabalho super premiado. Continuamos evoluindo e gosto muito de um case que fizemos com base no propósito Shift happens.
Esse case foi sobre “A nova cara da terceira idade”, certo? Como surgiu a ideia?
Não é só uma campanha, que é algo mais pontual, mas realmente uma plataforma. Como tudo dentro de uma agência, nasceu do briefing de um cliente — um grande banco que precisava falar com o público de 60 anos. Passamos a investigar e a nos colocarmos no lugar dessas pessoas, e por isso eu digo que caracterizar uma agência como digital é um pouco traiçoeiro, por que saber entender um problema e ter um insight criativo transcende o digital. Respondemos incrivelmente bem à sociedade para só depois responder ao cliente. E dentro do que foi esse primeiro trabalho de como trabalhar uma causa, pintou outro projeto, agora com a Matéria Lab.
Você definiria esse projeto como mais uma causa da Garage?
Sim, é o projeto Horta na Caixa, uma parceria com a minha mulher, Carol (Carol Piccin), que é ambientalista. Eu já estava na onda de transformar minha alimentação, assim como a Carol. Queríamos fazer uma horta e pensamos que seria legal incentivar outras pessoas. O projeto tem um papel fundamental tanto na cadeia de consumo (que é o que faz a Matéria Lab) quanto na transformação pessoal e da sociedade (que é o que a Garage quer ajudar as marcas a fazerem). Mostra que você não precisa de um latifúndio, que pode fazer sua horta em uma caixinha. E ainda gera trocas, cria um ponto de conexão e de engajamento.
Qual seria a função de uma agência de publicidade nos dias de hoje?
Ser a guardiã do propósito da marca e da capacidade de gerar engajamento orgânico. Aí você pensa: “Mas agência não é aquela que compra um ‘buraquinho’ na novela da Globo”? A gente não tem nada contra — a não ser o fato de que, no mercado, ainda se põe 90% do dinheiro nisso. Acho que a mídia é extremamente relevante, mas ainda tem um papel de fim, não de meio, e está sendo feita em um modelo antigo, que é muito interruptivo e pouco contextual.
Você acha que é um desafio fazer as empresas enxergarem esse papel?
Sim, mas acho que aos poucos está começando a cair a ficha das marcas. Participo do prêmio Trip Transformadores, adoro o pessoal de lá. No primeiro em que fui, me emocionei ao ver aquelas pessoas fazendo tanta coisa legal.
Como você vê o futuro para o mercado publicitário em 10 anos?
Essa é uma boa pergunta para os caras da Singularity, que são futuristas e têm algoritmos sobre quanto tempo vai levar para cada tsunami em cada área da nossa vida. Compartilho da visão de que a inteligência artificial vai substituir uma grande porcentagem da produção de riqueza do mundo. Já está operando a mídia programática, que é uma forma de qualificar exponencialmente a audiência e fazer cruzamento de dados. Chega, por exemplo, a RedBull, querendo falar com jovens que andam de skate em São Paulo, e a plataforma torna isso possível. Isso muda radicalmente o modelo de remuneração das agências — que vão continuar agregando valor no entendimento da necessidade da marca, mas vão colocar nisso sua inteligência.
E como você tem preparado a Garage para esse cenário?
Do ponto de vista da conexão de pessoas e marcas, estamos nos preparando desde o dia em que nascemos. Em relação ao canal, foi uma evolução gradual. Acredito que 2016 vai ser o ano do mobile no Brasil.
O mercado publicitário, ainda mais o brasileiro, é muito pouco operativo, não segue a curiosidade e a experimentação. Mobile é algo que as empresas deveriam estar experimentando!
Tem que ter um tanto da energia como VP de marketing, algum braço direito ou um projeto piloto, para que aquilo sirva de aprendizado e, quando a onda ficar maior, não precisar correr até o carro e passar parafina na prancha. Na Garage, a forma como a gente traduziu isso foi com a associação com a IMS, há dois anos.
E como foi essa escolha pela IMS?
A IMS é muito parecida com a gente, com uma visão muito moderna de ecossistema publicitário. A verdade é que as startups do Vale do Silício são muito mais inspiradoras para a gente do que a maioria das agências que estão por aí, e a IMS foi a escolhida para ser o parceiro na América Latina de Waze, Foursquare, Crackle, Eletronic Arts, Twitter, LinkedIn, Spotify. Acho que o que fazem é disruptivo em relação ao esquema anunciante, veículo e agência.
Antes de se associar a IMS, a Garage foi do Grupo ABC, de Nizan Guanaes e Guga Valente. Como foi essa experiência?
Naquele momento, a Garage era muito precoce, nos associamos com menos de um ano de vida. Acabamos entrando como um corpo estranho, mais uma agência para competir e não um agente para ajudá-las a fazer algo diferente. Então, saí, considerei outras sociedades, mas optei pela IMS por compartilharmos a mesma visão de mundo.
Você é formado em Administração de Empresas e foi executivo de grandes corporações. Por que decidiu virar publicitário?
Sempre fui bom com números e entrei na FGV. Um dia, um amigo me chamou para um curso sobre a influência da propaganda nas pessoas e, quando chegamos lá, era uma sala de alunos hiperarrogantes, fazendo um monte de pergunta para um cara que logo disse: “Separei 40 minutos, vou falar o que preparei”. Era o Julio Ribeiro, da Talent, e eu fiquei pensando “Quero ser igual a ele”. Comecei a estudar psicologia e sociologia, no que foi a minha primeira grande transformação de olhar para o humano.
No fim da faculdade, fui trabalhar em empresa grande e rodar o mundo, mas quando vi muito de perto o corporativo, percebi que essa vida não era para mim
Atuar nessas empresas foi um jeito de aprender a fazer business para depois conseguir empreender. Quando voltei da Johnson & Johnson de Nova York, em 1999, tinha conhecido a internet e aqui no Brasil me juntei a um amigo na Webmotors. Entrei com tudo no negócio, foi demais, bem startup. Aí já era empreender com internet.
Você fala bastante sobre a questão de trabalhar com o orgânico. Esse seria o seu propósito como empresário?
Sem dúvida nenhuma. Sou mentor da Endeavor e investidor-anjo em algumas startups, em tudo o que eu participo tem um forte elemento de digital. Trabalho com uma empresa de óculos e as perguntas que faço são: de que forma a internet pode disruptar esse mercado? Qual o verdadeiro propósito da marca? Como impactar positivamente a vida de 1 bilhão de pessoas? É sempre assim o tipo de empresa em que presto atenção.
Falando sobre gestão: quais são as três dicas de administração que você daria a qualquer empresário que esteja à frente de negócios criativos?
Um negócio criativo é algo que precisa ter um elemento de paixão à flor da pele muito preponderante. Mas também tem que entender a teoria do U, do Otto Scharmer. Todos os períodos de transformação da humanidade são muito longos, passam por uma transição de 30 a 50 anos. Os modelos se desgastam e a gente vai se lascar até bater no fundo do poço, mas aí começa outro, até atingir o grau máximo de abundância.
Então, siga a tua paixão, porque essa é a semente de tudo, e junte com o contexto novo. Tire as pedras da mochila, porque a caminhada vai ser longa
Revise o seu padrão de consumo, fique mais autossustentável no sentido de plantar suas coisas, produzir sua energia e se locomover sozinho. Mais leve, será possível experimentar mais, para que, quando o novo modelo estiver desenvolvido, ganhar mais.
Qual é a principal virtude que você procura em um profissional para trabalhar com você?
Um mix correto entre ser sonhador e pragmático. Por que o sonhador é aquele que acredita, coloca a paixão, a fé, a vontade de fazer acontecer acima de qualquer restrição. Já o pragmático é aquele que tem experiência, autocontrole, enfim, as ferramentas para fazer a mudança acontecer. Acho que é como pensar nos lados direito e esquerdo do cérebro, como as energias ying e yang. Quanto mais equilíbrio, mais as coisas fluem.
E que defeito você considera imperdoável?
Já trabalhei em ambientes muito competitivos e hoje ainda vejo pessoas com foco nesse modelo. Mas eu acho um desperdício. Precisamos surfar a onda da colaboração não só pela questão ética, mas por que é o que dá mais resultado. Temos que ser menos tubarão e mais golfinho.
As grandes empresas estão perdendo seu poder de atrair e reter os melhores talentos da geração Y e dos Millennials. O que você faria se estivesse na direção dessas empresas?
O discurso fácil é dizer que as grandes empresas são caretas e ultrapassadas. Mas, acredito que uma pergunta maravilhosa de se fazer e que mereceria mais energia é como tirar proveito da sinergia e da colaboração entre a galera nova e a antiga. Por que o que acontece é que o diretor de uma multinacional, cobrado por resultados em curto prazo, não consegue colocar 5% da paixão para fazer coisas disruptivas, se desafiar e colaborar com um coletivo. Acho que cabe tanto a galerinha desafiar as grandes quanto elas perceberem que é necessário desenvolver as capacidades que os mais novos têm.
Como e onde você consome informação no dia a dia? Quais são suas leituras obrigatórias?
Tenho o hábito de ler livros e o avião é o lugar para isso – ou o fim de semana, quando fico mais relaxado. Tenho interesse por alimentação, espiritualidade, inovação. E no meu feed tem o Facebook e o Medium. Eu salvo os links que me interessam e durante a semana vou devorando e compartilhando com a equipe. Também faço um ou dois cursos online, menos técnicos, voltados para o HackLife – termo que eu passei a usar quando conheci o Renato Stefani. Para mim, esse é um conceito-chave para se transformar e se refazer como pessoa. E costumo seguir o Bill Harris, que tem um método em que o cérebro entra em uma onda meditativa mais profunda.
Onde você quer estar em dez anos?
Busco reforçar o compromisso com a minha transformação e, nesse processo, acho difícil dizer qual será daqui dez anos. Quero ter a liberdade de poder mudar de acordo com o que fizer sentido para mim.
O que você faria diferente se pudesse voltar dez anos?
Há dez anos, percebi que minha prioridade era empreender no ambiente digital, com uma cultura 100% inspirada no que conheci de perto no Vale do Silício. O que aprendi naquele momento foi o elemento do propósito e o que me inspirava era a cultura de break things, vai e disrupt. Lá também existia a filosofia you can make a billion dollars, mas logo ficou muito claro que a minha felicidade, que é absolutamente dependente da felicidade ao meu redor, é gerar impacto positivo, e não make a billion dollars. O Peter Diamandis, cofundador da Singularity University, diz que o novo bilionário não é aquele que ganha um bilhão de dólares, mas aquele que impacta um bilhão de pessoas positivamente. Não sei se essa consciência faria sentido dez anos atrás, mas fico pensando se, quanto antes eu tivesse percebido isso, mais eu poderia ter acelerado o processo.
O que você mudaria em sua própria rotina, se pudesse?
Não sei se mudaria, mas adoraria poder fazer 100% todos os dias. É algo que eu busco faz uns cinco anos: acordo às 6h, tomo água com sal do Himalaya e limão, faço meu café bulletproof (um café com ghee, criação do empresário de tecnologia Dave Asprey, do Vale do Silício), suco verde, me alongo, faço pranayama, medito, faço minha prece, vou para a academia, nado, volto e trabalho. Não chego cedo, mas não tenho hora para sair. E preciso de seis ou sete horas de sono, não sou como esses caras que não dormem.
Às vezes, mastigar dados com tecnologia não basta para conhecer o seu público. Julia Ades e Helena Dias estão à frente da Apoema, uma empresa de pesquisa low-tech que busca conexões nas entrelinhas e atende marcas como Nike e Natura.
Movida pelo lema “siga sua paixão”, Letícia Schwartz foi viver nos EUA e fez sucesso com livros sobre gastronomia. Até que se apaixonou pela educação e fundou uma consultoria que ajuda alunos a ingressar em faculdades americanas.
Faltam opções de lugares onde os brasileiros possam envelhecer com conforto, cuidado e companhia. Joyce Duarte Caseiro descobriu isso ao buscar uma casa de repouso para o avô e fundou a Terça da Serra, hoje uma rede com 150 unidades.