Ele tem os atributos de um casual game (é simples e rápido de aprender), adotou os princípios de social game (nele se pode desafiar amigos, montar times e compartilhar placar nas redes sociais) e foi além, muito além. Hoje o Qranio é uma plataforma que une educação e prêmios e usa conceitos de gamificação para tornar o aprendizado mais leve e engajante. Com 1,2 milhão de usuários cadastrados, foi eleito o App do Ano em 2015 pelo Facebook Start e foi selecionado, em dezembro do ano passado, para o programa Launchpad Accelerator do Google.
Para quem nunca jogou, aqui vai uma tentativa de descrever como o Qranio pode ser divertido: há mais de 10 categorias para incentivar o aprendizado por meio de perguntas de múltipla escolha, entre elas uma específica para o Enem e outra sobre Star Wars. A plataforma te leva por perguntas tradicionais e depois te propõe uma mais amena para, ao mesmo tempo, desafiar e relaxar o cérebro. A cada resposta certa, você acumula a moeda virtual, o Qi$, que pode ser convertida em prêmios. Todos os dias, há uma pergunta especial que vale bem mais Qi$ que as demais. Além do uso gratuito, é possível fazer uma assinatura premium (três meses custam 14,99 reais, 12 meses 44,99 reais) para, assim, responder a perguntas mais difíceis e poder ganhar Neuros, os bônus que facilitam a missão de acumular pontos e trocar por prêmios (produtos ou serviços, de caixas de bombom a desconto em restaurantes com rodízio).
Nos seus três primeiros anos de existência, a empresa atingiu valuation de 20 milhões de reais e, segundo seu fundador e CEO, Samir Iásbeck, é a startup que mais recebeu investimentos no país. Samir, de 34 anos, conta que ele e seus sócios procuram utilizar esses recursos para evoluir, e não para sustentar a empresa: “Quando o dinheiro dos programas de aceleração acaba, precisamos continuar a pagar as contas. Por isso, sempre fomos muito preocupados em gerar vendas e faturamento”.
Conversando com ele, fica difícil de acreditar que quando começaram, os fundadores (todos mineiros) sequer sabiam o que era uma startup. Samir conta o que parece anedota, mas não é: em novembro de 2011, ele e os sócios Gian Menezes e Flávio Augusto estavam no Teatro Vivo, em São Paulo, com mais 30 empresas participando da imersão que selecionaria 10 projetos para receber investimentos da Telefónica. Na palestra de abertura, só se falava em startup, startup, startup. Samir cutucou Gian: “Vê aí que trem é esse de startup?”, o sócio pesquisou no smartphone e declarou: “Óia, a gente tem uma e nem sabia!”.
Os três empreendedores tinham saído de Juiz de Fora com o intuito de ganhar experiência: “Porque competir com todo esse povo de São Paulo não dá!”, disse Samir aos companheiros. Ele chegou ao evento, sondou aqui, sapeou dali e percebeu que estavam com boas chances. A primeira versão do Qranio (então, um quiz interativo) já estava no ar, enquanto os outros projetos concorrentes estavam em fase de PowerPoint. Apesar de um dos critérios de seleção ser o estágio de maturação, para decepção dos sócios, eles não foram selecionados.
Mais que a tristeza, Samir tinha medo de que Gian e Flávio desanimassem do negócio. Ele próprio um empreendedor serial, depois de dez empresas abertas e fechadas – entre elas um lava-jato, um salão de cabeleireiro, uma distribuidora de caipirinha, uma distribuidora de produto congelados, a software house eMiolo (atuante até hoje) – e muito dinheiro perdido, já estava acostumado.
Samir tem ascendência libanesa e se vê como um vendedor nato, “Dizem que é da raça, né?”, diz o responsável pela área comercial da empresa. Ele passou a infância em Bicas (MG) e diz que adorava inventar coisas novas, mas odiava ir à escola. Vendeu picolé na rua, montou uma boate na garagem da casa dos pais — com um sistema de iluminação feito por ele mesmo, com latas de óleo de soja. “Cobrava uma entrada simbólica dos meus amigos. O meu apego não era pelo dinheiro. Eu queria construir e fazer daquilo uma brincadeira!”, conta.
Após se formar em Administração, em 2004, ele sentiu na pele o problema da falta de foco. Na ânsia de fazer tudo dar certo, Samir saía de casa à meia noite para verificar se os vendedores dos múltiplos negócios que criara tinham tirado o melhor pedido possível. Sem ter vida própria e estressado, ele descobriu o que hoje se ouve muito no Vale do Silício:
“Se você diminui o diâmetro do feixe de luz e foca a energia numa coisa só, aquilo vai dar mais certo… ou vai dar errado mais rápido”
Ele se refere à cultura do fail fast, conceito que dita que, se for para falhar, que seja logo, para liberar energia para outra iniciativa. Com isso em mente, em 2008 Samir decidiu manter apenas a eMiolo. Dentro dela estava o seu projeto-xodó, o Qranio (a esta altura, o negócio dava mais prejuízo). A ideia da plataforma de perguntas e respostas da Qranio surgiu da implicância que ele tinha com a forma de aprendizado “enfiada goela abaixo”, como ele diz: “Entre 2003 e 2005 eu tive a ideia clara de como tornar o aprendizado mais divertido e lancei o quiz na internet”.
A iniciativa serviu para comprovar que as pessoas gostam do formato e, ao mesmo tempo, o fez perceber que seria preciso muita energia e dinheiro para aquela ideia seguir adiante e se transformar num negócio viável. Nessa altura Samir decidiu, então, continuar com sua fábrica de softwares até formar uma boa estrutura financeira para o Qranio.
UMA IDEIA SÓ VIRA UM BOM NEGÓCIO SE FOR LEVADA A SÉRIO
Ao final de 2010, Samir e a então noiva Thelma dos Santos Valverde (hoje eles são casados) concluíram que, para não acabar com o projeto, teriam de profissionalizá-lo. Passaram três meses estudando e montando um modelo de negócio freemium (gratuito, mas com a possibilidade de compras dentro do aplicativo) para o Qranio. A base era em social games e visava a nascente onda mobile. A ideia de Samir era prover conteúdo de qualidade e desafiador para pessoas que passavam horas à frente de smartphones e tablets. Foi neste momento que Samir chamou Gian, seu braço direito na parte técnica da eMiolo, e Flavio, recém-contratado game designer da mesma empresa, para serem co-fundadores da Qranio, à qual se dedicariam com exclusividade, formando o trio dos “qranios”.
Depois da decepção por não ter sido selecionado pela Telefónica em 2011 — e já sabendo que, afinal, ele tinha uma startup! —, Samir voltou a Juiz de Fora, vendeu o carro e contratou 15 pessoas para desenvolver as funcionalidades que ele realmente queria para a plataforma. Além do acesso gratuito, criou-se a possibilidade de uma assinatura premium para ser a fonte de receita e viabilizar os prêmios distribuídos.
Os sócios tinham apenas três meses de fôlego financeiro garantido, quando foram convidados pela Telefónica para participar de um novo concurso de startups, dessa vez na Campus Party de 2012. Com os brios ainda feridos, os qranios decidiram investir pesado na própria apresentação. Chamaram o ator e conhecido Gustavo Mendes, imitador de Dilma Roussef, para fazer uma esquete com Samir no palco do festival e o resultado foi estrondoso: o Qranio venceu outros 217 concorrentes com 98% dos votos populares.
O dinheiro só veio depois da avaliação de uma banca espanhola, em que estava Carlos Pessoa, diretor da Wayra Brasil, a aceleradora da Telefónica. A partir daí o Qranio encorpou e, em seguida, veio o investimento-anjo de Gui Affonso, que sozinho colocou 2,7 milhões de reais na empresa, o mais alto investimento-anjo feito no Brasil até agora.
ERA BOM, MAS NÃO DAVA DINHEIRO. O QUE FAZER?
A primeira versão do App para iPhone saiu em 2012. O modelo de plataforma B2C do Qranio arrebatou uma comunidade grande de usuários. Mas quando se tem um aplicativo gratuito muito bom, a conversão dele para o premium é muito baixa: “Esse modelo não pagava as contas e a gente precisava entregar mais para os investidores. Por isso, tivemos de procurar outras fontes de receita”, conta Samir.
Uma das formas era expandir e internacionalizar a operação. Nesse intuito, Samir aceitou o convite da Portugal Telecom para participar do programa de aceleração da operadora, chamado Blue Start, que abriria portas no mercado europeu. Paralelamente, voltou-se para a Ásia e foi tentar um contrato de Publisher com a China Mobile. “O adido comercial da embaixada brasileira me disse para ficar tranquilo porque, na China, para se fechar um negócio, demora-se 6 reuniões. Eu fechei em 30 minutos!”, conta Samir. Contudo, o timing foi infeliz. Logo depois, iniciou-se o imbróglio da Portugal Telecom com Rioforte, Oi e toda negociação foi suspensa. Isso levou os mineiros a adiarem também a entrada na China, já que o financiamento não sairia.
A grande virada se deu no final de 2014, quando a Pepsico solicitou o desenvolvimento de uma solução de Corporate Mobile Learning que tivesse o Qranio como base. Apesar de os qranios terem até ido a New Jersey (EUA) e assinado um contrato, o projeto também não saiu do papel. Por outro lado, no Brasil, o Bob’s sonhava ter treinamentos de RH em um formato mais divertido e efetivo: “A plataforma do Bob’s, onde os funcionários também ganham QI$, a moeda virtual do Qranio, é o primeiro programa de milhagem de conhecimento do mundo!”, diz o vendedor Samir.
Em meados de 2015, foi a vez do Bradesco adotar o mesmo tipo de recurso. O vice-presidente da empresa chegou a dizer que, internamente, essa plataforma de relacionamento com os colaboradores é o projeto de maior sucesso na organização. A universidade carioca Estácio de Sá é outro cliente B2B da Qranio — e seus alunos podem converter notas, frequência em sala de aula em QI$s, mandar a informação para o aplicativo e trocar por prêmios.
Samir afirma que essas soluções para clientes corporativos podem custar de 100 a 300 mil reais por plataforma (iOS e Android). “É importante, frisar que depende muito da demanda e do escopo passados pelo cliente”, diz ele, destacando que os projetos são diferentes porque seguem a demanda dos departamentos de RH dessas empresas. “Os modelos de contrato B2B com as grandes empresas são, hoje, o nosso principal canal de receitas”, diz o CEO.
Os qranios construíram um hub de soluções que torna o aprendizado algo divertido e, segundo Samir, que é útil duas vezes: “no aprendizado e com um bem físico que você pode ganhar ao acumular prêmios”. De olho nos grandes games do mercado, o Qranio estuda modelos de persuasão, os adapta e os coloca para gestar na plataforma-mãe-laboratório, com o objetivo de aperfeiçoar e melhorar os recursos e sua atratividade a cada duas semanas. Pergunta do dia: Quem segura esses mineiros?
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