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Largar tudo. Ir pro mato. Vender orgânicos. Dá trabalho, mas pode funcionar… É o que acontece com a Leve Bem

Giovanna Riato - 7 mar 2016 Edu e Carol, da Leve Bem, fizeram o roteiro clássico de sair da cidade grande em busca de uma vida melhor. Acharam. E também muito trabalho por fazer.
Edu e Carol, da Leve Bem, fizeram o roteiro clássico de sair da cidade grande em busca de uma vida melhor. Acharam. E também muito trabalho por fazer.
Giovanna Riato - 7 mar 2016
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O delivery de produtos orgânicos Leve Bem, que entrega frutas, hortaliças e vegetais, entre outros produtos, na porta de clientes que vivem em alguns bairros da cidade de São Paulo, é um negócio de fôlego e de coragem. De fôlego por exigir comprometimento total dos empreendedores Carolina Brenoe Vieira, 31, e Eduardo Castagnaro, 34, parceiros no negócio e na vida.

Eles acordam de madrugada para cuidar das entregas, estão constantemente em contato com os fornecedores de legumes e frutas, comandam uma equipe e ainda ficam online o tempo todo para resolver qualquer pepino que os clientes possam ter. A coragem, bem, essa vem da iniciativa de deixar para trás uma vida urbana bem estruturada em São Paulo para viver no campo, em Vargem Grande — a 45 quilômetros da capital —, mergulhados no negócio que criaram em 2014.

A Leve Bem é o resultado da busca do casal por mais tranquilidade e satisfação. Em 2010, com apenas alguns meses de namoro, esse desejo fez os dois pedirem demissão de seus trabalhos para tirar um ano sabático. Ela, dentista por formação, atuava há algum tempo na área de administração. Ele, engenheiro eletrônico, estava em uma empresa de telecomunicações. Na época com 27 e 29 anos, venceram a insegurança e foram descobrir o que tem do outro lado do mundo, mais precisamente na Austrália. “Nós não éramos mais tão novinhos, então bateu aquele medo de como seria quando voltássemos ao Brasil, mas pensamos que vamos trabalhar até os 70 anos, tirar um de folga não faria tanta falta, né?”, diz Carolina.

A vida no exterior incluiu uma viagem de três meses pela Ásia que mexeu com o casal, como conta Eduardo, que anotava as inspirações da viagem em um caderninho:

“Vimos pessoas pobres mas fieis às suas crenças e valores. Começamos a questionar se precisávamos mesmo de toda a carga capitalista que carregávamos. Aquilo mudou os nossos valores e perspectivas”

Um ano depois, administrar a volta para o Brasil já era mudança demais e o desejo de criar uma vida nova ficou guardado no bolso, nas páginas do bloquinho de Edu. Eles alugaram um apartamento e foram viver juntos em São Paulo. Ambos se recolocaram profissionalmente e foram engolidos novamente pela rotina. “Em seis meses estávamos com os mesmos problemas, com as mesmas reclamações. Decidimos abrir o caderno e reler as ideias que tivemos na Austrália”, conta Carolina. Foi aí que ficou claro, afirmam eles, o desejo de deixar a vida na cidade para ter um negócio próprio, que garantisse mais flexibilidade e prazer — mas não necessariamente menos trabalho.

Ela queria algo relacionado com sustentabilidade, mas não tinha clareza sobre o quê. A primeira grande decisão da dupla foi se dedicar à pesquisa e à formulação do que seria o negócio. Carolina pediu demissão e, por 9 meses, ficou completamente focada no projeto. “Este foi o nosso primeiro investimento: a minha força de trabalho”, diz. Na época, entre 2012 e 2013, começava a crescer a demanda por alimentos orgânicos, mas a oferta ainda não respondia tão rápido. Pronto, estava ali a oportunidade: distribuir estes alimentos.

POUCA CONCORRÊNCIA, MUITOS ERROS

Com a ideia em mente, tudo ficou mais claro, mas não mais simples. Começaram a pesquisar alguns concorrentes. Eram poucos os deliverys do gênero e o serviço nem sempre dos melhores, segundo eles. Fizeram contato com produtores de alimentos orgânicos em feiras espalhadas pela cidade. Devagar encararam o desafio de entender o setor, conhecendo as pessoas e as regiões produtoras de alimentos. O plano era oferecer uma solução completa. “Não queríamos que o cliente precisasse complementar a compra da semana no mercado. Nosso objetivo é garantir uma boa variedade”, diz Carolina.

Carol e Eduardo gastaram cerca de 30 mil reais para dar início à operação da Leve Bem.

Carol e Eduardo gastaram cerca de 30 mil reais para dar início à operação da Leve Bem.

A projeto tomava forma e, no início de 2014 entrou no ar o site para testes. A esta altura, além do trabalho da Carolina, os dois calculam ter investido cerca de 30 mil reais, entre criar o endereço virtual, a logomarca e comprar o veículo para as entregas. O serviço começou atendendo aos amigos e anotando o feedback deles.

Logo, no entanto, o ensaio terminou e clientes “de verdade” começaram a aparecer. Enquanto Eduardo mantinha seu emprego, Carolina cuidava de tudo do apartamento do casal, em São Paulo. A logística era complicada e um quarto foi tomado pelas frutas, verduras e legumes frescos. Era ali que ela separava tudo e montava as caixas para os clientes, com alguma ajuda de Eduardo, que ainda mantinha a jornada dupla de trabalho.

Patinaram no começo para oferecer o que julgavam ser o melhor. “Percebi posso montar as caixas com o maior cuidado possível, mas não consigo garantir que vá chegar daquele jeito ao cliente. É sempre um aprendizado. Eu montava a cesta que achava perfeita e ainda corria o risco de a verdura chegar murcha para o cliente”, conta ela. Para evitar isso, Carolina começou a aperfeiçoar as caixas: só fechá-la na hora da entrega, fazer furinhos para ventilação e incluir papel de seda para absorver a água que pode escorrer dos alimentos. Nesta fase, a Leve Bem tinha um motorista para as entregas e Carolina tocava todo o resto da operação: do contato com os fornecedores ao atendimento ao cliente.

LARGAR TUDO PARA VENDER VERDURA

Poucos meses depois de a empresa sair do papel, as coisas começaram a ficar grandes demais para ela — e para o apartamento, em São Paulo, onde ainda viviam. “Foi naquele momento que a gente decidiu mergulhar de cabeça. O nosso contrato de aluguel estava para vencer, então decidimos não renovar”, diz Eduardo.

Em setembro de 2014 ele enfim estavam de mudança para Vargem Grande, uma das cidades do cinturão verde de São Paulo, eixo produtor de alimentos que abastecem a metrópole. Ali, ficariam mais perto dos produtores e se instalaram numa casa com edícula ao fundo, que virou o centro de montagem das caixas da Leve Bem. Eduardo fala dessa fase:

“Foi um desafio e tanto equilibrar as contas regulares com a variação das vendas e da renda, mas abrimos mão da praticidade em São Paulo para ter uma vida mais tranquila”

Com mais estrutura, estabeleceram a rotina do negócio. Os pedidos são feitos no site até domingo. Na segunda-feira o casal fecha as encomendas e recebe tudo colhido no dia pelo produtores. Escolhem, pesam e montam as caixas. Na manhã de terça-feira, as caixas são fechadas e entregues aos clientes. O pedido mínimo é de 50 reais, somado ao frete de 15 reais que cobre os custos da entrega. Assim como em um mercado físico, o lucro vem da margem inclusa no preço dos produtos.

Instalados em Vargem Grande, Carol e Eduardo têm espaço para montar as cestas de entrega da Leve Bem.

Instalados em Vargem Grande, Carol e Eduardo têm espaço para montar as cestas de entrega da Leve Bem.

Eles se empenharam para fugir do atendimento mecânico e levar o clima da feira livre para o ambiente digital. “Quando montamos uma caixa para entrega, selecionamos como se fosse para o nosso consumo. Não adianta apenas ser orgânico, tem de estar nas melhores condições”, diz Carolina, mostrando seu lado perfeccionista. Ela está sempre online para tirar eventuais dúvidas dos consumidores, vale e-mail, WhatsApp, Facebook… o cliente é quem manda. Quando a caixa é entregue, a Leve Bem avisa o consumidor por SMS, evitando que a encomenda fique esquecida na portaria. Mais tarde o cliente recebe um e-mail perguntando se o pedido atendeu as expectativas.

Se algo sai errado, Carolina e Eduardo dão um jeito de corrigir. “Se passa uma fruta ruim, por exemplo, podemos devolver o dinheiro do cliente. Se ele for nosso consumidor frequente, geramos um cupom de desconto no site”, conta ela. O mesmo acontece se, eventualmente, eles não tiverem para entregar o produto que o consumidor pediu no site, afinal, os orgânicos são mais sensíveis às variações climáticas e a outros imprevistos. Eduardo fala sobre a reação dos amigos à mudança de vida:

“Teve gente que ficou surpresa e me perguntou o motivo de eu largar tudo para vender verdura. Mas é muito mais do que isso”

Para ele, a tarefa mais importante é difundir a cultura dos alimentos orgânicos, do apoio à agricultura familiar e do apelo mais saudável deste estilo de vida. “Orgânicos são alimentos realmente preciosos, que exigem muita dedicação e trabalho dos produtores. Queremos que as pessoas saibam disso, que recebam os alimentos com uma boa apresentação, que valorizem essa qualidade”, complementa Carolina.

Dessa forma, a Leve Bem já integra a cultura da coletividade dos produtores da região. “Na agricultura orgânica ninguém faz nada sozinho. Cada um planta um tipo de coisa para que o consumidor tenha variedade. É sempre uma relação de ganha-ganha”, diz ela. A empresa também firmou parcerias que propagam o estilo de vida saudável. Uma delas é com o Colégio Internacional Ítalo Brasileiro, para quem fornecem semanalmente alimentos para 300 alunos. Há ainda alianças com empresas, como a Hubert e a Ernest Young, que recebem alimentos entregues pela Leve Bem em seus escritórios.

FÉRIAS? ESQUEÇA

Os empreendedores tiveram bons resultados em 2015. Encerraram o ano com cerca de 800 cliente cadastrados. Destes, cerca de 100 estão ativos e recebem cestas toda semana. A parte financeira também melhorou. “Descontados os custos do negócio, hoje alcançamos o mesmo patamar de renda que tínhamos em São Paulo com os dois trabalhando”, afirma Eduardo.

O porte que o negócio tomou fez o casal passar por nova mudança, em setembro último. Eles saíram da casa que dividiam com a Leve Bem para ganhar mais privacidade. O empreendimento também foi para outro espaço, com estrutura mais adequada.”Era difícil compartilhar o nosso espaço com o espaço da empresa, com gente entrando e saindo toda a hora”, conta Carolina. Do único motorista que trabalhava com eles no começo, a Leve Bem agora gera 11 empregos, entre os responsáveis pelas entregas, o pessoal que cuida da pesagem e montagem das caixas e uma especialista em marketing.

Com a alta demanda, no início deste ano eles passaram a oferecer mais um dia de entrega. Agora os clientes podem receber os alimentos na terça-feira e na quinta-feira. Assim, os consumidores assíduos conseguem manter a geladeira sempre abastecida de verduras, frutas e legumes frescos. Também é uma chance de atrair mais gente, ainda que não seja esse o principal objetivo, como diz Carol:

“Não queremos ser os maiores, mas fazer muito bem aquilo que nos dispusemos”

O casal reconhece que sair de São Paulo para ir morar “no meio do mato”, como fizeram, traz uma série de dificuldades. “Agora, precisamos pegar o carro para ir comprar um pão que seja”, diz Eduardo. Se a padaria agora fica a alguns quilômetros de casa, é necessário ter disposição ainda maior (pegar a estrada) sempre que eles quiserem vir visitar amigos e parentes em São Paulo. A vantagem, eles dizem, é conseguir fazer as refeições juntos, com calma, e encerrar o expediente da Leve Bem cedo o suficiente para aproveitar o fim do dia no campo. “Vejo meus amigos chegando tarde em casa, sem ter tempo para ficar com a família, e acho isso mais complicado do que tudo que enfrentamos aqui. Quando eu tiver um filho, vou poder passar bastante tempo com ele”, diz Carolina, adiantando os planos da família.

Eles continuam com ritmo forte de trabalho, mas dizem que passam longe do desgaste que enfrentavam quando estavam em outras empresas. “Vivemos agora do nosso suor. É tudo para o nosso projeto. É muito gratificante”, diz Eduardo. Carol admite que, sim, é um desafio administrar a proximidade entre o trabalho e o relacionamento, mas afirma que eles têm tido sucesso na tarefa, pois “sempre fomos um casal que gosta de passar muito tempo junto”. Eles contam que só sentem falta de tirar férias, já que adoram bater perna por aí, vendo de perto outras culturas, e desde que começaram a Leve Bem isso se tornou uma impossibilidade. “É passageiro, sabíamos que ficaríamos um tempo sem viajar. Logo vamos conseguir fazer isso de novo”, diz Carolina, com a segurança que quem está plantando o futuro que quer viver.

DRAFT CARD

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  • Projeto: Leve Bem
  • O que faz: Entrega alimentos orgânicos em algumas regiões de São Paulo
  • Sócio(s): Carolina Brenoe Vieira e Eduardo Castagnaro
  • Funcionários: 13 (incluindo os sócios)
  • Sede: Vargem Grande (SP)
  • Início das atividades: 2014
  • Investimento inicial: R$ 30.000
  • Faturamento: NI
  • Contato: (11) 98709-7448
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