Continuamos a série que explica as principais palavras do vocabulário dos empreendedores da nova economia. São termos e expressões que você precisa saber: seja para conhecer as novas ferramentas que vão impulsionar seus negócios ou para te ajudar a falar a mesma língua de mentores e investidores. O verbete de hoje é…
SHAREWASHING
O que acham que é: Uma subdivisão da Economia Compartilhada.
O que realmente é: Sharewashing é a prática de travestir de compartilhamento um serviço que, na verdade, é um business, um comércio. Novo e controverso, o termo está diretamente ligado à Economia Compartilhada — o prefixo share (compartilhar, em inglês), vem exatamente daí. Já o sufixo não pode ser traduzido literalmente pois, neste contexto, washing tem a conotação de “mascarar, maquiar”. Isso significa, de acordo com essa lógica, ser inapropriado classificar como Sharing Economy serviços como o Airbnb e o Uber, os exemplos mais comumente apontados pelos críticos da conduta. No caso dos aplicativos de carona existe um termo ainda mais específico, Ridewashing. O artigo The Sharing Economy Isn’t About Sharing at All, publicado na Harvard Business Review em janeiro de 2015, diz que “quando o ‘compartilhamento’ é mediado pelo mercado —quando uma empresa é intermediária entre consumidores que não se conhecem — já não é mais um compartilhamento. Os consumidores estão pagando para ter acesso a bens ou serviços de outros”.
O exemplo dado pelo professor e gerente de projetos do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV-CENN), Renê José Rodrigues Fernandes, deixa clara a distinção entre compartilhar e comercializar. “Quando você faz uma viagem com os amigos, no final divide os custos. Se você compartilha uma viagem por meio de um site de caronas, é a mesma coisa, os custos são rateados. Mas se o motorista da viagem está fazendo isso com o objetivo de lucrar, por mais que esteja usando seu carro particular, não é compartilhamento”, afirma. Segundo Fernandes, algumas empresas que estão se posicionando como Economia Compartilhada, na verdade, estão comercializando produtos ou serviços debaixo dessa roupagem: “Qualquer empresa que seja intermediária de transações que visam lucro está praticando o Sharewashing”.
Para Caio Almendra, sócio do Templo Coworking e da Malha, plataforma de moda sustentável, colaborativa, local e independente, Economia Compartilhada é aquela na qual usam-se técnicas informacionais (como a internet) para o aproveitamento de potenciais dispersos e não-utilizados na sociedade. “Por conta disso, é mais barata, produz menos resíduos, é ecologicamente viável, e, por ser P2P, menos afoita em relação à exploração do trabalho. Já o Sharewashing camufla um produto de economia tradicional como um produto da economia compartilhada para atrair clientes ou escamotear relações de trabalho draconianas”, diz.
O motivo da controvérsia é financeiro: a chamada Economia Compartilhada cresce exponencialmente (segundo McKinsey & Company, há projeções de que o rendimento global do setor será de 335 bilhões de dólares em 2025) propulsionada por cada vez mais empresas aderindo ao modelo. “Muitas empresas com estrutura, funcionamento e produtos tradicionais, passaram a dar roupagem de Economia Compartilhada às suas marcas para fortalecer-se no mercado e fugir das legislações trabalhistas. E iniciativas verdadeiras de compartilhamento descobrem novos potenciais não utilizados do mercado, são cooptadas e substituídas por iniciativas de Sharewashing”, diz Almendra.
Quem inventou: Almendra diz que a discussão começou com o texto Sharewashing is the new Greenwashing, no site OpEd News, de Anthony Kalamar, que assina como “acadêmico independente e escritor de tecnologia e meio-ambiente”. “Kalamar é provavelmente um pseudônimo de algum trabalhador do mercado tecnológico. Ele escreveu que o Uber estaria acabando com os aplicativos de carona, sem ser, de fato, um aplicativo de carona.” Fernandes afirma que Sharewashing é um conceito semelhante e derivado do anterior Greenwashing: “Greenwashing, ou ‘maquiagem verde’, nada mais é do que, nas palavras do professor da FGV Edgar Barki, ‘mascarar uma realidade ou comunicar iniciativas obrigatórias por lei, como ações de sustentabilidade, para ganhar a confiança ou a simpatia dos consumidores sem fazer muito esforço'”.
Quando foi inventado: O texto de Kalamar foi publicado em maio de 2013. Já o termo Greenwashing foi cunhado em 1986, por Jay Westervelt, ambientalista de Nova York.
Para que serve: Como crítica, para que o consumidor tenha conhecimento do que se encaixa ou não no conceito de Economia Compartilhada e possa optar conscientemente. “Entender a questão Economia Compartilhada versus Sharewashing vai permitir que não sejamos vítimas fáceis da falsa publicidade do compartilhamento, já que compartilhar custos e ser sustentável tornou-se algo premente hoje em dia, pela escassez de recursos”, diz Fernandes. Como estratégia, serve, segundo Almendra, para a valorização e vantagem de marcas. “É um enredo falacioso de que a empresa ou produto participa da economia do compartilhamento. É comum a utilização de Sharewashing para precarizar relações de trabalho e fugir de legislações trabalhistas e de direitos dos trabalhadores”, diz.
Quem usa: “Uber, Airbnb, TaskRabbit, Sidecar, Lyft, entre muitas outras”, diz Almendra.
Efeitos colaterais: Almendra diz que, além da piora das relações de trabalho, um dos principais efeitos colaterais é a desvalorização do conceito de Economia Compartilhada, que passa a soar como charlatanismo. “Esse efeito ainda é muito discutido nos sites e fóruns especializados. Alguns, minoritários, acreditam que o Sharewashing, por mais que não auxilie a ampliação da prática de compartilhamento, ajuda a difundir mais intensamente os valores da economia do compartilhamento”, fala. Ainda segundo Almendra, começa a se formar um consenso de que a desvalorização do conceito de Economia Compartilhada torna o Sharewashing um inimigo e um grave problema para desenvolvimento deste tipo de arranjo. Fernandes afirma que mascarar geração de lucro atrás do compartilhamento pode causar uma falsa sensação de que estamos ajudando a sociedade a ser mais sustentável e mais justa: “Devemos denunciar essa prática”.
Quem é contra: “Em geral, entusiastas do potencial de transformação da economia do compartilhamento são os mais críticos ao Sharewashing. Alguns agentes da economia tradicional, como os taxistas, que têm dificuldade em concorrer com as empresas que se valem do Sharewashing para fugir da regulamentação jurídica, também criticam severamente a prática”, diz Almendra.
Para saber mais:
1) Leia, na Co.Exist, o texto Stop Saying Uber Is Part Of The Sharing Economy, cujo subtítulo é “O que está sendo compartilhado além do seu dinheiro?”. Também na Co.Exist leia More Customers, More Controversy: 2015 In Collaborative Consumption, texto que levanta ponto a ponto as questões (e problemáticas) entre economia compartilhada e Sharewashing.
2) Leia o artigo #WeWashing: When “Sharing” Is Renting and “Community” Is a Commodity, publicado no Huffington Post, que propõe usar o termo “wesharing” para diferenciar o verdadeiro compartilhamento do que chama de “renting economy”. E cita Confúcio.
3) Leia, na Vice, The Problems with ‘Sharing’, uma da primeiras publicações sobre Sharewashing (de janeiro de 2014) e crítica contumaz à prática de Sharewashing.
4) Leia, na Visual Thesaurus, Thanks for sharing?, texto que disseca o uso da palavra share passando, também, por Sharewashing.