Entrar em um mercado já saturado e conseguir reinventar um formato batido. Estas são algumas vitórias que o KES – Knowledge Exchange Sessions teve em sua trajetória de pouco mais de um ano. Criado por Ricardo Al Makul, 41, em 2015, o negócio nasceu para competir no disputado filão de eventos corporativos. A proposta é debater inovação com base em criatividade, comportamento e tecnologia. Em pouco mais de um ano o KES já tem onze patrocinadores, entre eles Google, Adobe e Spotify.
Cerca de 2 mil pessoas já participaram dos eventos. O número pode parecer pequeno dentro do segmento, mas o diferencial do KES está no público atingido: a lista é repleta de CEOs e vice-presidentes, além de diretores que estão tocando grandes projetos, interessados em novos modelos de negócio, dados, internet das coisas, movimento maker e intraempreendedorismo. O foco está no conteúdo, não no networking. Ricardo fala desse apelo:
“Os negócios e a economia estão mudando muito rápido. Com isso, empresas de diversos setores estão se esforçando para entender o seu papel neste novo cenário”
Ainda assim, é um desafio e tanto conseguir levar novidade para um público já tão bem informado. O segredo para fazer executivos deixarem o smartphone de lado e largarem a caneta por um momento, ele diz, é levar palestrantes nada menos do que sensacionais. A estratégia é trazer gringos que são referência no assunto que quer abordar, os game changers, pessoas que protagonizam alguma transformação interessante em diversas áreas. Já passaram pelo KES David Rowan (editor-chefe da Wired), Amber MacArthur (da FastCompany), Jer Thorp (data artist) e John Newbigin (do Creative England).
A cada ano, uma nova temporada é lançada, com seis eventos em dois formatos. O Keynote reúne até 150 pessoas e as Sessions, 70 participantes. Os lugares e conceitos variam, com encontros que acontecem no Clubinho, espaço criado pelo paisagista Gilberto Elkis na Vila Madalena, na Casa de Francisca e na Balsa, no centro de São Paulo, entre outros. A ideia é, sempre, trazer algo bem diferente dos eventos corporativos tradicionais.
Nessa toada, em pouco mais de um ano de operação os patrocínios saltaram de três para onze empresas. Ricardo não fala de faturamento, mas diz que já chegaram ao break-even, com equilíbrio entre despesas e receitas. No fim de 2016 o negócio deverá dar lucro pela primeira vez.
UMA TRAJETÓRIA DE ACERTOS E TROPEÇOS
Ricardo diz que o KES consolida a sua história e as experiências que teve até aqui. Nascido em uma família de sírios, ele começou no negócio do avô, a loja de tapetes Casa Fortaleza, na Rua 25 de Março (comércio popular em São Paulo). Em seguida, levou o talento de família para conversar com todos os públicos para outro setor ao trabalhar em publicidade. Passou por grandes agencias, como DM9DDB e LewLara, onde tocou um núcleo de inovação começou a se dar conta da importância da informação e do conteúdo para os negócios.
Em 2007, ele decidiu empreender pela primeira vez. “Isso vem da minha família, então nunca tive medo.” Criou a agência Rede106, comprada depois pelo Grupo ABC e incorporada à DM9DDB:
“Criar e vender uma agência foi uma escola importante. Entendi o jogo e desenvolvi a capacidade de adaptação”
A próxima parada foi fundar o KES, que teve o primeiro evento em abril de 2015. Ele gosta de dizer que começou a pensar no empreendimento há 25 anos, quando começou a trabalhar, frequentar eventos, criar conteúdo e conectar pessoas. “Sempre amei viajar e ir a seminários, encontros, mas nunca vi um formato mais dinâmico, que promovesse essa troca que defendo”, conta.
Com a credibilidade que tinha no mercado, não foi tão complicado para Ricardo vender a ideia e atrair os primeiros patrocinadores. “Sabia que, de cara, tinha que lançar uma temporada inteira para dar peso, mesmo sem saber se conseguiria colocar a segunda edição de pé”, fala. Sem nunca ter promovido um evento que não fosse o próprio casamento, ele investiu cerca de 500 mil reais (do próprio bolso) no negócio para realizar o primeiro encontro. Uma aposta alta. Foi o mais caro de todos e a estratégia era começar de cima, com um evento capaz de surpreender.
PARA DAR CERTO, TEM QUE SER NA UNHA
O empreendimento, no entanto, não se concretizou sem dificuldades. No primeiro KES, Ricardo disparou 200 convites esperando um baita retorno, mas a 10 dias úteis do evento não tinha sequer uma confirmação. Foi aí que entendeu que, para fazer a coisa acontecer, teria que ser na unha. Foi ligando para cada convidado, explicou a proposta e, no fim, conseguiu levar 179 pessoas. “Muitas delas foram para me apoiar, sem saber muito bem o que encontrariam”, afirma.
Ele conta que o encontro foi incrível, mas que não conseguiu fazer dar certo justamente a parte da dinâmica para a troca de conhecimento, uma das principais promessas. “Eu não tinha estabelecido como isso aconteceria, como estimular as pessoas a participar, e acabou não rolando”, conta. Como tudo é aprendizado, na segunda edição as coisas já foram se ajustando e, mesmo com novos problemas, começou a ficar mais fácil contornar o que não saía conforme o planejado.
Trabalhar com eventos também é lidar com o imprevisível, como Ricardo acabou descobrindo ao longo do primeiro ano da KES. Teve palestrante que cancelou a participação 20 dias antes por ser chamado de repente para uma reunião na Casa Branca na mesma data. “OK, é um bom motivo”, diz ele, contando que conseguiu substituir o speaker por alguém do mesmo nível a tempo. Com palestrantes internacionais, o empreendedor também sentiu o efeito da alta alucinante do dólar, que saiu da casa dos 2 reais no começo de 2015 para 4 reais. Imagine, de repente, o custo do seu negócio quase dobrar?
“Costumo dizer que primeiro ano do negócio foi 80% de aprendizado e 20% de conhecimento que eu já tinha. Agora, no segundo ano, essa lógica se inverteu”, conta ele. Para acelerar o ciclo de aprendizado e solidificar o empreendimento, também ajudou trazer outras cabeças para pensar o negócio. Logo depois da segunda edição do KES, Carla Mayumi, 46, que já integra o comando da Box1824 e da TalkInc., e Maria Juliana Giraldo, 35, uma das fundadoras da The Mob, viraram sócias de Ricardo. Elas já eram curadoras e ficou claro que fazia sentido firmar uma sociedade.
EM BUSCA DA TROCA GENUÍNA
No formato KES, palestrantes estrelados vêm de longe para falar por 50 minutos — isso num evento de cinco horas. A ideia é acabar com o formato de monólogo do professor. “O mundo está bem mais horizontal. Não dá para trazer gente tão interessante e não ter uma troca com o público”, diz Ricardo. Dessa forma, a maior parte do tempo de um evento é dedicada às dinâmicas, que permitem que os participantes apresentem seus pontos de vista, questionem e exponham.
O esforço é grande para fazer dar certo o “Knowledge Exchange” do nome, ou seja, as dinâmicas para promover a troca de informações. Vale tudo: dividir a plateia em grupos para discutir e depois definir uma pergunta para o palestrante ou criar estações com monitores que explicam conceitos relacionados ao assunto do evento. “Já tivemos uma série de dinâmicas e com certeza inventaremos outras”, conta Ricardo. Há ainda a ferramenta mobile KES Tool. Na edição Smart Human, em que Kris Hammond tratou da interação homem-máquina e de inteligência artificial, o recurso foi usado para criar word clouds na tela com os sentimentos dos participantes em relação ao tema. A ideia é sempre aproveitar o grupo que está lá, que divide as mesmas dores na busca por inovação, para promover uma troca rica e, acima de tudo, genuína.
Para garantir isso, a lista de participantes recebe quase tanta atenção quanto a escolha do palestrante. Muitos ali são convidados, mas há também os integrantes do membership: que pagam assinatura anual (em torno de 15 mil reais) para ter acesso a todos os eventos da temporada. O valor dá acesso aos seis eventos do ano, com dois executivos por encontro. Ricardo diz que no KES não tem “fornecedor malhando os executivos para trocar cartão e enviar proposta comercial”, e que, por isso, a troca flui de maneira mais natural.
“Temos pessoas com questionamentos semelhantes, que estão lá com um propósito parecido. Somos super abertos e acreditamos na colaboração, mas temos que zelar para que as coisas permaneçam assim.” Abertos, pero no mucho, já que a lista de participantes acaba passando por uma espécie de curadoria. “Prefiro convidar alguém do que aceitar um membership que está fora do nosso foco”, diz Ricardo.
Ele entende que o ambiente é fator decisivo para que os executivos se abram, revelem os questionamentos e deixem a armadura de lado. Para fomentar este processo, ele foge de qualquer lugar que lembre os encontros corporativos tradicionais, como salas de conferência de hotéis, e se empenha em oferecer uma experiência disruptiva desde o início, incluindo cada detalhe: a comida é feita a cada vez por um chef diferente, a cenografia também muda todo evento, a caneta, o brinde, o sabonete do banheiro… nada passa despercebido. As noites de Sessions terminam ainda com shows de jazz ou blues.
A ANGÚSTIA DE TER QUE INOVAR
Ricardo acredita que oferecer conteúdo e informação para altos executivos tem grande potencial de impacto. “Afinal, são os caras que têm a caneta na mão.” Para ele, a transformação dos negócios e da comunicação deixa os líderes inquietos, já que eles sabem que precisam conduzir a empresa em uma mudança, mas nem sempre entendem como fazer isso:
“É uma situação difícil. As conversas são árduas. Não estamos falando de uma mudança de escritório, mas de indústria, sociedade, mobilidade e modelo de negócio”
Dado o primeiro passo, Ricardo não pretende parar aí. “Depois de começar focando nos líderes, estamos desenvolvendo novos serviços. Devemos ter um produto voltado ao treinamento para jovens com talento em potencial”, conta. O KES também prepara, para 2017, um mergulho mais intenso no mundo da inovação. Eles acabam de lançar o KES TREK, ou a divisão de “viagens de aprendizado”, para grupos pequenos de CEOs. A primeira, como se poderia prever, será uma incursão ao Vale do Silício, em fevereiro. Os convidados serão os líderes que frequentam hoje os eventos. A segunda deverá ser para Israel, nos mesmos moldes mas ainda sem data marcada.
As novidades se somam aos eventos in company que o KES promove desde o ano passado. Ricardo conta que já são quatro clientes para este produto. Um passo mais ambicioso também está no horizonte: a internacionalização. “Muita gente já me falou que este formato precisa chegar a outros países, mas precisamos consolidar antes.” Essa parte parece estar perto de ser superada e Ricardo já se dispõe a encarar o desafio. “É preciso dar um bom passo de cada vez”, diz, indicando que a inovação precisa de mais consistência do que de velocidade. Algo que vem da troca genuína.
A Covid-19 cancelou o PicniK, festival itinerante que há oito anos fomenta a cena criativa brasiliense, o que levou ao surgimento do Infinu, hub criado para abrigar pequenas marcas de moda, cultura e gastronomia “made in BsB”.
Gaúcha radicada em São Paulo, Márcia Fróes começou a organizar encontros em parques para ajudar os filhos a se adaptarem à nova cidade. O sucesso deu origem à empresa, que realizou 127 confraternizações em 2018.