Aos 14 anos, Fabrizio Serra construía sites para amigos e familiares enquanto tinha mil ideias de negócios. Quinze anos depois, ainda trabalha com web, mas em proporções bastante diferentes: é fundador de duas startups com modelo de clube de assinaturas, pioneiras no Brasil e que já causam impactos em seus mercados.
A primeira foi a ChefsClub, que dá descontos em restaurantes, lançada em 2011 e que hoje reúne 25 mil assinantes e 1 800 restaurantes em 21 cidades no Brasil – a internacionalização já é discutida. Em junho do ano passado, ele lançou a Moccato, que entrega cápsulas de cafés premium torrados e moídos em até sete dias para os assinantes. Esta empreitada já soma dois mil usuários. “Moccato e ChefsClub ainda têm muito a entregar. São empresas para 100, 200 mil assinantes”, diz Fabrizio.
Os descontos oferecidos pela ChefsClub, de 30% a 50%, só não valem para bebidas e sobremesas. O assinante pode usar o benefício todos os dias, quantas vezes quiser, e o desconto vale para todos da mesa. O modelo de negócio consiste em cobrar pela associação ao clube: 109,90 reais por seis meses, ou 159,90 por um ano.
Os restaurantes têm o custo do desconto e podem escolher os dias e horários em que oferecerão os benefícios. “O restaurante continua tendo margem em bebida e sobremesa, e em contrapartida a gente traz exposição e preenche a casa nos horários em que há mesa vazia”, afirma o Fabrizio. Hoje, a startup emprega 35 funcionários e é responsável por até 15% do movimento de alguns restaurantes cadastrados.
Na Moccato, os planos de assinatura vão de 51 a 139,50 reais por mês, dependendo do número de cápsulas incluídas. Há cinco blends diferentes de café, e o mix de cápsulas é escolhido pelo cliente, que pode alterar ou cancelar plano a qualquer momento. O negócio acabou de completar um ano e tem dez funcionários. Fundador de duas startups de sucesso em menos de cinco anos, Fabrizio é zero deslumbrado com o glamour que costuma rodear a atmosfera de empreendedorismo:
“Há uma cultura muito ruim sendo gerada em torno de empreendedores no Brasil. Cria-se uma ilusão péssima de que você vai abrir uma startup e ter sucesso em um ou dois anos”
Ele segue, dizendo que há muitos empreendedores que ficam o tempo todo postando foto em evento e palestras, mas cujas empresas não operam no positivo e ainda não se provaram. “Isso é ruim para o empreendedor e muito ruim para o investidor, que acaba investindo em um sonho que não existe. Isso tem que ser desmistificado e combatido com empreendedorismo sério.”
EMPREENDEDORISMO BRASILEIRO COM TEMPERO DINAMARQUÊS
Fabrizio nasceu no Peru, filho de mãe peruana e pai baiano. Veio para o Brasil com um ano e já morou em dez cidades por aqui. Também viveu um ano nos Estados Unidos (fazendo high school), seis meses na Itália (em intercâmbio acadêmico pela faculdade de Economia) e três anos na Dinamarca (para onde foi fazer mestrado em finanças e terminou estudando marketing e empreendedorismo).
Ele acredita que a vivência em diferentes culturas despertou seu olhar para oportunidades de negócio: “Ao ver coisas que existem em um lugar que não existem em outro, você deixa de tomar o mercado como uma verdade imutável e começa a vê-lo como um conjunto de serviços e produtos que são ofertados ali, mas que poderia ser diferente”.
Empreender não estava necessariamente nos planos de Fabrizio, que gostava de seu emprego na mesa de câmbio da cervejaria Carslberg, na Dinamarca. Mas, como espírito empreendedor não descansa, ele logo percebeu uma oportunidade ao testemunhar o início da MenuCard, empresa que inspirou o modelo de negócios da ChefsClub.
Não havia no Brasil nenhuma empresa com esta proposta. Ele apresentou a ideia aos dinamarqueses Daniel Holm e Morlen Jorgensein. Juntos, elaboraram o modelo de negócios, conseguiram 1,5 milhão de reais de investidores-anjo e, da Dinamarca mesmo, iniciaram as etapas de site e TI. Quando chegou o momento de apresentar a ideia a restaurantes e conseguir os primeiros associados, o brasileiro Guilherme Myssen se juntou ao trio e, em seguida, Fabrizio voltou ao Rio de Janeiro.
A estratégia era lançar a empresa no Rio, com cinco mil associados (que ganharam os cartões) e 100 restaurantes credenciados. Na prática, a ChefsClub começou a operar com pouco mais de 70 restaurantes.
“Foi muito difícil encontrar o discurso correto com os estabelecimentos, e essa base é nosso maior ativo”
Depois de quatro anos de atividades, Fabrizio destaca a cultura em inovação para que o formato continue com fôlego. Ele cita mudanças no aplicativo, como o acréscimo do histórico de restaurantes visitados, e estuda passar a fazer o pagamento e também as reservas pelo app, além de habilitar opiniões de assinantes sobre cada estabelecimento: “Nossa ideia é realmente agregar valor ao restaurante e deixar a experiência do usuário mais rica, para não ser só o desconto”.
O movimento nos restaurantes chamou a atenção de um fundo de investimentos, que em 2015 injetou 3 milhões de reais no negócio (houve mais uma rodada, em 2016, de valor não divulgado), cujo break even está previsto para 2018. O aporte veio com uma gestão profissional e Fabrizio, hoje, faz parte apenas do conselho da startup. Este apoio profissional na ChefsClub abriu caminho, tempo e foco para que ele pudesse criar mais uma empreitada.
COMO INICIAR UM NEGÓCIO EM MEIO À CRISE
Dono de uma máquina de expresso, Fabrizio notou que não havia no Brasil entrega recorrente de cápsulas de café – ao mesmo tempo em que as pessoas reclamavam de ter de ir à loja a cada vez que o estoque se esgotava. Também percebeu um novo público, formado pelo próprio hábito de consumir as cápsulas, que descobria e passava a apreciar diferentes notas de café. Estava formada a ideia do negócio, baseado em conveniência e produto de qualidade especial.
O ano era 2015 e o país já vivia um cenário de incerteza econômica. Mas, como um mercado emergente, o setor de cafés especiais vem crescendo 15% ao ano mesmo assim. Fabrizio fala a respeito: “Claro que a crise atinge todo mundo, mas este mercado de café premium está em expansão. Estamos vendo um interesse muito grande por parte dos clientes”.
Ele conseguiu reunir companheiros para a jornada: Ian Petersen, que tinha experiência no ramo de produtos especiais depois de liderar uma cervejaria artesanal; Gustavo Henrique Silva, que vinha de carreira executiva, mas buscava mais realização no trabalho; e Emerson Freitas, ex-dono de cafeteria e apaixonado pelo mundo do café. O capital inicial para a Moccato — de 1,5 milhão de reais — veio de Fabrizio, Gustavo e de investidores-anjo. Em junho de 2016, a startup recebeu um novo aporte, de valor não divulgado. O break even está previsto para o final de 2017.
A experiência da ChefsClub deixou lições valiosas de TI e marketing, e ajudou na estruturação societária e de conselho empresarial. Mas a Moccato trazia um fator desconhecido: a produção. Ele conta:
“Tivemos um grande problema durante meses, trocamos o fornecedor do plástico e a cápsula não abria. Isso tomou muito do nosso tempo e também muito dinheiro”
Para Fabrizio, este não é um momento ruim para empreender: “Acho, sim, que toda empresa deve nascer com um horizonte de pelo menos cinco anos para ficar razoavelmente madura e começar a entregar resultados. Até lá, de repente a crise já acabou”. Além disso, o olhar atento a oportunidades pode levar a mercados em expansão: “Há mercados muito bons no Brasil. O de produtos especiais, sobretudo na parte de gastronomia, está sendo bem acolhido em troca de produtos que viraram simplesmente commodities – a cerveja especial, a culinária diferenciada”.
Como principais desafios no início das empresas, ele cita a dificuldade de atingir o público certo (“Fazer um produto legal foi menos difícil do que chegar até esse cliente e explicar o que a gente está trazendo”) e de montar uma equipe competente sem capital para pagar altos salários (ele aposta no sistema de stock option, em que o funcionário tem uma participação na empresa e ganha lucros ao longo do tempo).
Para quem quer empreender, Fabrizio recomenda não ter custos fixos muito altos, mas não economizar em itens essenciais para conseguir testar o produto. “Se você economiza, por exemplo, numa identidade visual, numa apresentação, é muito difícil dizer que testou. Uma coisa é testar um produto bonito e outra coisa é testar um produto feio. A mesma coisa com a parte de tecnologia: fazer um site ‘mais ou menos’ e dizer que as pessoas não estão comprando no seu site. Não é um problema de produto, é um problema de tecnologia”.
E, por fim, ele fala da dedicação: “Nunca vi um negócio rodar e funcionar com pessoas part-time. Você tem que estar metido, mergulhado naquilo dos pés à cabeça para dar certo.” Afinal, entre erros e acertos, o mundo do empreendedorismo só oferece uma certeza: não existe almoço grátis.
Durante um curso nos EUA, Josef Rubin provou uma bebida vendida em farmácia para aumentar o foco. Ele e a esposa criaram a sua própria fórmula e fundaram o ZTX Labs, uma marca de suplemento líquido para turbinar as funções cognitivas.
O conhecimento da alta gastronomia na palma da sua mão: saiba como um empreendedor brasileiro radicado nos EUA criou o aplicativo CREME, que reúne receitas detalhadas em vídeos curtos produzidos por chefs do mundo inteiro.
Dá para viver de salada? A Olga Ri prova que sim. Saiba como a foodtech vem crescendo, conquistando aportes (inclusive do cineasta Fernando Meirelles) e quebrando paradigmas no mercado de comida por aplicativo.