Há 20 anos, imaginávamos que hoje teríamos robôs limpando nossas casas, fazendo nossa comida e pilotando nossos carros voadores. É fato que demos muitos passos rumo à automação da vida cotidiana mas, quase na mesma medida, também cresce o movimento de quem busca experiências mais autênticas e menos mediadas por máquinas. Em certa medida, esse movimento se reflete na trajetória de sucesso da Social Miner.
O trunfo da startup em seu lançamento, há dois anos, era usar robôs e inteligência artificial (a especialidade deles) para melhorar vendas via marketing digital. Mas, rapidamente, eles veriam que só isso não bastava: era preciso colocar gente na equação — e este desafio os levou a desenvolver o conceito de People Marketing. “É um conceito que usa inteligência artificial, perfil social e comunicação para automatizar campanhas de marketing digital com um alto grau de personalização”, diz Ricardo Rodrigues, 30, fundador e CEO da Social Miner.
Sabe quando você está pesquisando um livro no site da Amazon e aparece aquela mensagem de “quem comprou este produto também comprou aquele outro”? Isso é uma recomendação automática, feita por um robô que analisa o comportamento da maioria das pessoas que navegam por ali, sem levar em conta especificamente o seu perfil na hora de fazer a recomendação. A Social Miner vai além.
Por si só, esse tipo de recomendação automática revolucionou o mercado, e foi também ali que ele enxergou uma lacuna com potencial de trazer ainda mais mudanças. “Eu acreditava que era possível ir ainda mais além e proporcionar uma experiência mais personalizada e menos robótica de compra. Queria criar algo que fizesse o usuário perceber que aquilo tinha sido feito exclusivamente para ele”, conta Ricardo, repetindo o que se tornaria o propósito e a missão da Social Miner: desenvolver algoritmos mais personalizados e assim humanizar a relação entre empresas e consumidores no marketing digital.
O IMPULSO DE UMA DEMISSÃO NA HORA CERTA
A relação de Ricardo com a inteligência artificial vem desde seus primeiros anos na faculdade de Engenharia de Computação. “Eu era super nerd. Ia em todos os Congressos, participava de todas as competições de robôs e coisas do tipo”, conta. Em 2008, mudou-se de Campo Grande (MS) para São José dos Campos (SP) para fazer mestrado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Lá, continuou a trabalhar com projetos de inteligência e fez parte do curso na França, onde se aprofundou ainda mais no tema.
Em 2010, após terminar o mestrado, embarcou para mais um período em terras francesas. Dessa vez, o destino era Antibes, região conhecida como o Vale do Silício daquele país. Depois de passar seis meses envolvido em projetos de pesquisa de carros inteligentes, Ricardo decidiu que era a hora de voltar ao Brasil e entrar de vez no mercado de trabalho:
“Eu tinha uma vida boa lá fora, mas iria fazer a mesma coisa pelos próximos cinco anos. Também me incomodava ver que aquilo não tinha impacto na vida das pessoas”
Enquanto isso, no Brasil acontecia um boom das startups e foi nisso que Ricardo mirou na hora de programar sua volta ao país. Entre as empresas que se destacavam aos seus olhos estava o Peixe Urbano. “Entrei em contato com eles e acabei recebendo uma proposta para voltar pro Brasil e montar um time de inteligência lá dentro junto com outras duas pessoas”, conta.
Foi no Peixe Urbano que ele começou a se envolver com sistemas de recomendação. Com uma base de 20 milhões de emails cadastrados, a equipe de Ricardo como tinha meta entender quem eram estes consumidores para entregar a eles as melhores ofertas (ou seja, as que rendem mais cliques e compras).
Lá, também conheceu seu futuro sócio, o engenheiro Roger Mattos, que hoje é o CTO da Social Miner. Ambos trabalharam juntos num projeto do Peixe Urbano e, depois da boa experiência, resolveram começar a desenvolver uma ideia antiga de Ricardo. Como novo morador da capital paulista, ele sofria para acompanhar a vida cultural da metrópole. “Tem sempre um milhão de coisas acontecendo, mas ou você não fica sabendo a tempo ou não consegue decidir o que fazer, e depois se arrepende quando seu amigo posta uma foto do evento no Instagram”, diz.
O projeto se chamava Partyu e a ideia era mapear os eventos culturais de revistas, jornais, guias online e Facebook para, usando a inteligência artificial, ajudar as pessoas a descobrir os eventos que combinassem mais com seus gostos. Logo que começaram a trabalhar no projeto, Ricardo foi demitido do Peixe Urbano. Foi o estímulo que faltava para ele mergulhar de vez no empreendedorismo.
O primeiro cliente do Partyu foi o site Catraca Livre: o usuário se conectava via Facebook e através de uma interface podia filtrar e definir de uma forma mais simples quais eventos o interessavam. Embora a aceitação do público tenha sido boa, a dupla de engenheiros teve dificuldade para levantar dinheiro. As recusas o fizeram perceber que seu valor não estava na plataforma:
“A gente ia vender a plataforma, mas os investidores só queriam saber da tecnologia envolvida. Aí, caiu a ficha de que o nosso produto era outro”
A “sacada” levou Ricardo e Roger a começarem enfim a trabalhar no que seria a Social Miner, isso entre o final de 2012 e o início de 2013. Após serem selecionados para o projeto de aceleração da Startup Farm, Eduardo Migliano (um dos sócios da 99Jobs) entrou em contato com eles para saber mais sobre o produto que estavam desenvolvendo. “Ele me apresentou para o investidor dele e recebemos o aporte financeiro”, conta Ricardo, que não pode divulgar o valor do investimento-anjo. Assim, a Social Miner começou a funcionar oficialmente em abril de 2014, quando a dupla de sócios-fundadores começou a montar o time.
UM ROBÔ QUE NÃO VÊ SÓ O CONSUMO: ISSO É O PEOPLE MARKETING
O grande diferencial da Social Miner em relação às plataformas de recomendação que já existiam no mercado é não se limitar a entender o consumidor somente quando ele faz o cadastro no site de e-commerce. É isso que acontece quando você busca um livro na Amazon e aparecem indicações de livros do mesmo gênero ou do mesmo autor. Ricardo diz: “Isso é recomendação, mas não é personalização. Só está sendo analisado o comportamento da maioria das pessoas que fizeram a mesma busca que você, não o seu perfil especificamente”. E prossegue:
“Sempre entendemos que gosto é uma coisa que evolui e que os nossos algoritmos deveriam evoluir também”
Tendo isso em mente, o objetivo da startup era criar algo mais humanizado, que fosse capaz de entregar ao usuário uma experiência que o fizesse perceber que aquilo tinha sido feito exclusivamente para ele.
Em abril de 2015, portanto um ano depois do início da operação da Social Miner, em parceria com o portal E-commerce Brasil (que organiza um dos maiores eventos do setor no mundo), a Social Miner finalmente criou e nomeou um termo para explicar o que, exatamente, era seu serviço: People Marketing. No mesmo ano, atingiria o break-even.
“Não somos uma empresa de e-mail marketing, nem de recomendação, somos uma empresa de People Marketing, isto é, de um marketing centrado em pessoas. O foco não é a venda, mas sim o comprador”, afirma Ricardo.
Hoje, a Social Miner tem na cartela de clientes mais de 60 lojas, entre elas Submarino Viagens, CVC, Sephora, Passarela, Oppa, Gafisa, Hering e, veja só, até o Peixe Urbano.
COMO É A INTEGRAÇÃO QUE TENTA HUMANIZAR O MARKETING
Imagine que você está navegando em um e-commerce que contrata a Social Miner e resolve sair do site. Ao notar o movimento do cursor do mouse para fora da tela, o algoritmo percebe que você não iria realizar a compra naquele momento e oferece um benefício para você ficar em contato com a marca, que pode ser um cupom ou até mesmo acesso a dicas exclusivas. Também pode ser um pop-up (que não impede que você feche a página).
Quando o usuário decide fazer o login via Facebook, a plataforma obtém dados que tornam possível chamá-lo pelo nome e direcionar o conteúdo de acordo com sua cidade, sexo e faixa etária, por exemplo. A partir do momento do cadastro, o algoritmo da Social Miner começa a monitorar o perfil de navegação no site para entender o comportamento do usuário: que produtos já viu, se já fez alguma compra naquela loja etc.
Depois de coletar essas informações, é a hora de falar com o usuário, na hora certa. Ricardo fala desse cuidado: “Criamos mecanismos para usar essa inteligência e automaticamente escolher o melhor canal, o momento, o produto e a mensagem certa para impactar cada uma das pessoas”.
Esse contato pode ser uma notificação no Facebook, um e-mail, ou até uma notificação por push, direto no celular. O objetivo é aproximar o usuário de um produto que se encaixa no perfil de coisas que ele já procurou ou que outras pessoas com perfil parecido com o dele já procuraram.
Ricardo dá um exemplo real: “Tivemos o caso de uma loja de móveis que quando a pessoa saía da página de itens para jardins, aparecia a mensagem ‘conecte-se e aprenda a fazer um jardim vertical com pallets’. Isso quadruplicou a taxa de cadastros”.
A receita da Social Miner vem da cobrança de uma taxa sobre cada venda feita através das interações geradas pela plataforma. Há casos, diz Ricardo, em que isso representa 18% de todas as vendas da loja. “Mas, mais interessante que estas vendas imediatas, são as vendas geradas ao longo do tempo com uma base de pessoas engajadas, que voltam a comprar e chegam dobrar o ROI”, diz.
Segundo o CEO da Social Miner, de todas as pessoas que entram em um e-commerce, só 1,5% fecha a compra. E é justamente os outros 98,5% que a plataforma quer entender melhor. “Nunca acreditamos que quem vai embora do site não goste da marca ou não queira comprar”, diz ele. O desafio, então, é manter as pessoas conectadas com a marca, para que a plataforma tenha a chance de falar com elas, em um segundo momento, da maneira mais humanizada, relevante e inteligente possível. Em e-commerce, significa só oferecer produtos que interessam, na hora que interessa, e da melhor forma possível:
“Temos um pilar tecnológico muito forte, mas a comunicação é tão importante quanto o algoritmo”
Ricardo está satisfeito com sua escolha profissional. “Somos uma empresa jovem, com modelo validado e em fase de escala”, diz. Segundo ele, atualmente 30% da internet brasileira passa, todos os meses, por alguma página que usa plataforma da Social Miner. Com essa estratégia, ele espera faturar 4 milhões de reais este ano.
O engenheiro ainda se perde, de vez em quando, por São Paulo, mas já achou seu rumo nos negócios: “Já entendemos quem é nosso cliente, temos áreas bem desenhadas e estamos nos estruturando para crescer, contratando mais gente. E estamos começando a nos movimentar para conseguir clientes internacionais também”. Será que a Amazon vai contratá-los?
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