A história de Luiz Henrique da Cruz Ribeiro, o Ricky, tem uma urgência inescapável, já que ele sofre de uma doença degenerativa. Não sem alegria nós o encontramos, quase dois anos depois, firme e atuante em seu propósito.
Ricky é aquele tipo de pessoa para quem a metade do copo está sempre cheia. Aos 36, segue à frente do mais completo portal sobre mobilidade urbana do Brasil, o Mobilize Brasil, que acaba de completar cinco anos de operação. O portal foi lançado depois de uma grande mudança na sua vida: o diagnóstico de Esclerose Lateral Amiotrófica (conhecida pela sigla ELA), doença degenerativa progressiva cuja causa ainda intriga os cientistas, quando ele tinha 28 anos.
Conforme contou ao Draft lá em março de 2015, Ricky ficou triste apenas um dia de sua vida: quando soube da doença e leu tudo o que achou na internet sobre ela.
Três anos depois, em 2011, já sem os movimentos dos membros e sem a fala, o jovem paulistano, que durante toda a vida foi interessado em temas como sustentabilidade e mobilidade, decidiu combinar os diversos tratamentos da ELA aos quais vinha se dedicando ao projeto do portal. Deu mais que certo: o Mobilize Brasil hoje é uma referência em informação relevante sobre mobilidade urbana inclusive para governos, imprensa e ONGs.
Nesses cinco anos, conta Ricky – que falou conosco por e-mail, por meio de um computador com um sensor óptico, por meio do qual consegue digitar suas respostas – o Mobilize foi muito além do que ele imaginava na época do lançamento. “Produzimos e reunimos cerca de cinco mil conteúdos próprios sobre mobilidade urbana, incluindo artigos, reportagens, estatísticas, apresentações, vídeos e outros documentos, além da reprodução de material da mídia nacional e internacional. Também foram realizados estudos, campanhas, eventos, exposições e concursos”, conta. No que se refere à sua condição, a história do site também vem sendo desafiadora e surpreendente, como ele conta:
“O Mobilize Brasil é uma bonita história de sucesso. Mostra que valeu a pena ir atrás dos sonhos, mesmo quando os obstáculos iniciais poderiam parecer quase intransponíveis”
Ele prossegue: “Em 2011, eu não poderia imaginar como estaria minha condição depois de cinco anos, uma vez que a literatura médica indica uma expectativa de vida entre dois e cinco anos para pacientes de ELA”.
A doença de Ricky continua evoluindo, mas em ritmo lento e quase imperceptível. Ele segue uma rotina de tratamentos e terapias, tendo o apoio valioso de sua família e de seus amigos. Sua mãe, Cristina, segue coordenando a área administrativa e as campanhas do Mobilize, além do cuidado diário com a rotina do filho. Os amigos Renato Miralla, Guilherme Bueno e Nelson Avella continuam a seu lado como conselheiros do site, ajudando-no a tomar decisões importantes quanto ao conteúdo e a captação de recursos (por sinal, uma campanha de arrecadação de fundos está no ar).
CONQUISTAS ANTES IMPENSÁVEIS ACONTECERAM ESTE ANO
Essa rede de apoio ajudou Ricky a ir ainda mais longe e abraçar projetos paralelos ao Mobilize, agora em 2016. Recentemente, voltou a prestar serviço para a consultoria Ernst&Young, empresa para a qual ele já havia trabalhado, em 2007, depois de uma temporada em Barcelona, onde fez um mestrado em sustentabilidade na Universidad Politécnica de Cataluña e descobriu uma maneira nova de ver o mundo, as cidades e a questão da mobilidade.
À época, Ricky foi morar no Recife e atuava em projetos de consultoria e responsabilidade social. Foi quando os primeiros sintomas da ELA apareceram.
Ele conta que conciliar as atividades deste novo trabalho na EY com o do Mobilize tem sido um grande desafio, que pede uma dose extra de disciplina, equilíbrio e foco. E, também, sabedoria para determinar quanto de tempo dedicar a cada atividade, além de aproveitar os pontos em comum entre ambas, como ele conta:
“Antes eu me envolvia, em maior ou menor grau, em tudo que acontecia no Mobilize Brasil. Hoje isso já não é possível, mas sigo acompanhando e trabalhando no portal praticamente todos os dias”, ele conta. “Felizmente existe bastante sinergia entre as atividades, já que também trabalho com mobilidade e sustentabilidade na EY. Por exemplo, pesquisas que realizei durante o desenvolvimento do Guia de Mobilidade Corporativa também geraram informações e atualizações para o portal.”
OTIMISMO. ISSO AJUDA. PRATIQUE
De março de 2015, quando saiu a primeira reportagem sobre o Ricky e o Mobilize no Draft, para agora, a atuação do portal se expandiu e renovou. No ano passado, o foco do Mobilize foi a produção de reportagens próprias inéditas, missão para o qual o portal contratou dois jornalistas. Uma dessas, Quem tem direito à gratuidade no transporte? Como obter o benefício?, já ultrapassou 300 mil acessos — um recorde. A equipe do Mobilize também criou listas de documentários, curtas metragens e músicas infantis sobre mobilidade urbana, e realizou o concurso de fotografia #ClickMobilidade.
Neste ano os acessos ao portal continuaram subindo, mostrando que nunca se falou tanto em mobilidade urbana sustentável quanto agora. Em 2015, houve um aumento de 33% em relação ao ano anterior. A previsão é fechar 2016 com 20% a mais.
Entre as ações mais importantes concluídas este ano está o Guia de Mobilidade Corporativa, feito em parceria com a EY, foi criado para estimular as organizações a pensarem sobre o tema e também funciona como um manual para colocar em prática um plano de mobilidade corporativa.
A recessão econômica deste 2016 felizmente não trouxe tantos problemas ao Mobilize, e os que surgiram foram contornados com paciência, planejamento e um pouco de sorte.
Um exemplo foi a redução de equipe, que aconteceu devido à menor receita. Felizmente, o número de colaboradores voluntários, especialistas e blogueiros cresceu. Em 2015, à época da primeira matéria, o portal contava com seis blogs próprios. Agora são 10. Esse equilíbrio manteve o conteúdo e as ações do Mobilize funcionando à perfeição.
Outra boa notícia que o Ricky nos contou é que o portal renovou sua parceria com seus dois patrocinadores, o Itaú e a seguradora Alliance, ainda que com uma redução no valor total repassado. E as campanhas por doações de parceiros contribuintes continuam a todo vapor, ainda que neste ano tenham conquistado menos atenção que nos anteriores. “Temos a expectativa de obter em 2017 um nível de receita similar a este ano, apesar do difícil momento que o país atravessa”, conta ele.
Além dessa melhorada na receita, o Mobilize pretende reeditar a Campanha Calçadas do Brasil, que fez grande sucesso em 2012. A ideia agora é aplicar o conceito de caminhabilidade – a qualidade das calçadas para a caminhada diária dos cidadãos – e batalhar para melhorar as condições para pedestres e cadeirantes. A campanha será realizada em parceria com outras organizações e universidades.
Ricky continua otimista. Tão otimista quando há cinco anos, quando resolveu fazer algo em que acreditava e que pudesse ajudar tantas pessoas.
“Embora os desafios sejam gigantes e as dificuldades muitas, a mobilidade urbana sustentável tem apresentado avanços em São Paulo, no Brasil e em diversas cidades do mundo”
Ele está confiante com planos também na vida pessoal: enquanto a ELA se mantém estável, Ricky planeja: “Queria adquirir uma cadeira de rodas motorizada, para finalmente poder voltar a sair de casa e, quem sabe, circular novamente pela cidade”. E quem disse que ele não pode?
Bicicletas, scooters e motos elétricas já podem ser carregadas em tomadas comuns, têm mais tempo de autonomia, custam cerca de R$ 0,30 o quilômetro rodado, e aparecem cada vez mais nas ruas brasileiras.
De acordo com Itamar Marques, coordenador da Comissão de Mobilidade Urbana do CREA-RJ, ao liberar as catracas, as vias deixam de ser usadas pelos carros individuais, diminuindo as emissões de gases poluentes.
A insegurança, infelizmente, é companheira constante na vida de uma mulher. Saiba como Gabryella Corrêa transformou uma situação de assédio em impulso para empreender a Lady Driver, app que conecta passageiras e motoristas.