por Hayim Makabee
Emigrei para Israel em 1992, aos 21 anos de idade, imediatamente depois de me formar em Informática pela UFRJ. Fiz mestrado em Ciências da Computação no Technion, em Haifa, e há mais de 20 anos trabalho na indústria de software israelense. Durante esse período, voltei muitas vezes de férias para o Brasil, e cheguei a trabalhar remotamente nos escritórios da Yahoo em São Paulo.
Penso muito sobre as diferenças entre Israel e o Brasil, e neste artigo gostaria de trazer uma visão comparativa entre a “startup nation” e o “país do futuro”. Começo trazendo alguns fatos representativos, que considero bem interessantes.
Cargos e aptidões de universitários aqui e aí
Dados disponíveis no LinkedIn permitem comparar a UFRJ com a Universidade de Tel-Aviv, mostrando os cargos e locais de trabalho dos profissionais formados nessas instituições. Vejamos. O maior empregador de profissionais da UFRJ é a Petrobras, uma estatal. Se destacam também três instituições de ensino: própria UFRJ, a UERJ e a FGV. Completando a lista estão Vale, uma ex-estatal, e a Rede Globo. Entre os cargos que ocupam, há uma concentração nas áreas de ensino, pesquisa e consultoria.
Por sua vez, os maiores empregadores de profissionais formados pela Universidade de Tel-Aviv são grandes empresas de high-tech: Intel, Amdocs, HP, Google e Microsoft. A exceção da lista é o exército israelense. Entre os cargos que ocupam, há uma concentração nas áreas de engenharia e tecnologias da informação. Mas o mais importante: Entrepreneurship – empreendedorismo!
Também é possível comparar as profissões e aptidões dos profissionais formados pela UFRJ e pela Universidade de Tel-Aviv. A maioria dos formados na UFRJ estudou na área de Humanas, incluindo Direito e Psicologia. Suas principais aptidões (informa o LinkedIn) são: Microsoft Office e inglês.
Dá a impressão que, no Brasil, Word e PowerPoint são ferramentas essenciais para a maioria dos profissionais. E que saber inglês ainda é um diferencial
Entre os profissionais formados pela Universidade de Tel-Aviv, por sua vez, há um maior balanço entre disciplinas Humanas e tecnológicas, com destaque para Ciências da Computação e Engenharia Eletrônica. Entre as aptidões mais frequentes: administração, gerência de produtos e gerência de projetos. E uma importante qualificação: Startups!
Esse dados, além de interessantes, são representativos, mas não vou analisá-los profundamente. Fica como material para a reflexão de quem se sentir assim impelido.
Quero agora contar um pouco da minha experiência pessoal. Quando me formei pela UFRJ em 1992, meus colegas estavam em busca de emprego. A maioria sonhava em trabalhar para grande empresas estatais, como a Companhia Vale do Rio Doce. Isso me intrigava. Perguntei a eles: “Mas por que vocês querem trabalhar em uma estatal?”. A resposta que recebi: “Estabilidade no emprego!”.
Fiquei chocado. Jovens de 21 anos, recém-formados e iniciando sua carreira profissional, preocupados com estabilidade no emprego!
Deixei meus amigos no Brasil e vim para Israel. Terminei meu mestrado no Technion em 1995, e desde então já trabalhei para nove empresas diferentes, a maioria startups. Em média trabalhei dois anos em cada empresa. Nesse período, também tentei duas vezes criar minha própria startup. Atualmente, sou o CEO da KashKlik, startup na área de Marketing de Influência. Minha vida profissional em Israel não foi nem um pouco monótona…
Hoje em dia, a maioria dos estudantes israelenses na área de Ciências da Computação sonham em ter sua própria startup. Mas o mais importante é que realmente boa parte deles, em algum momento, tentará montar sua própria empresa. E parte destes vai conseguir. Alguns vão ficar ricos, outros vão criar novas tecnologias. E o país inteiro vai se beneficiar com isso.
Onde começam as diferenças?
Já como estudantes nas universidades, as diferenças entre brasileiros e israelenses são muito significativas. Começam pela idade. Os brasileiros entram nas universidades imediatamente depois do segundo grau, e estudam dos 18 aos 21 anos. Os israelenses fazem três anos de serviço militar obrigatório e depois disso viajam ou trabalham por algum tempo. Assim, em geral estudam dos 22 aos 25 anos, quando já estão mais maduros e disciplinados com a experiência do exército.
As diferenças passam pelos custos. Muitos brasileiros esperam que seus pais ajudem ou paguem totalmente os custos de estudos universitários. Os israelenses, em geral, trabalham durante os estudos para poder pagar as mensalidades, evitando pedir ajuda aos pais.
Há ainda a questão da moradia. Enquanto os brasileiros continuam morando com os pais durante o período em que estão nas universidades, os israelenses não costumam voltar para a casa dos pais depois de terminar o exército, e alugam apartamentos com amigos estudantes.
O estudante brasileiro em geral faz o primeiro estágio nos últimos semestres, enquanto o israelense trabalha desde o início — e não necessariamente na profissão
A experiência militar também é importante, e pode incluir liderança de equipes para os que foram oficiais no exército.
Um dos objetivos do Projeto Draft é estimular o empreendedorismo no Brasil. Na minha opinião, para que isso aconteça, será preciso uma mudança cultural.
Os jovens brasileiros necessariamente terão que estar dispostos a correr mais riscos, buscando oportunidades de inovação onde não se tem nenhum retorno garantido
Não tenho dúvida que o profissional brasileiro tem a plena capacidade de realizar grandes empreendimentos. No Brasil não falta inteligência, imaginação nem criatividade. Talvez o que falte seja apenas a atitude.
Assim como a maioria dos brasileiros residentes no exterior, estou aqui de longe torcendo por um país melhor. Tenho certeza que o empreendedorismo será um ingrediente essencial pare se enfrentar os desafios sociais e econômicos do Brasil. Boa sorte!
Hayim Makabee, 46, é brasileiro e mudou-se para Israel há mais de 20 anos. Engenheiro, trabalhou em diversas empresas de tecnologia. Atualmente é CEO da KashKlik.