Se você der um Google com “folha de bananeira” encontrará duas referências logo de cara. A primeira, um reggae do cantor Armandinho, que usa a planta para discorrer sobre outras questões. A outra é a Folha da Bananeira, única empresa no mercado especializada em comercializar a parte menos nobre de uma das maiores ervas do mundo. Pois é, a bananeira não é uma árvore e sim uma erva gigante. Seu fruto todos conhecem, está na casa da maioria dos brasileiros e, segundo a ONU a banana é considerada alimento de primeira necessidade e está entre os cinco mais importantes para a população mundial. Sua folha, no entanto, perdeu prestígio com os avanços tecnológicos e ficou para escanteio desde que o papel alumínio se tornou popular nos supermercados mundo afora.
A vontade de retomar uma culinária ancestral e também mais saudável fez com que o casal Ênio, 53, e Gorete, 55, Rodrigues iniciassem uma jornada no empreendedorismo. Ambos largaram seus empregos para apostar em um negócio familiar que consiste em vender folhas de bananeira. Simples assim. Complexo assim. Da ideia inicial até efetivamente colocarem o produto nas prateleiras dos primeiros supermercados, o processo foi longo — e está longe de terminar.
Gorete sempre trabalhou com vendas e Ênio vivia do marketing. Aos domingos, um dos hobbies do casal era cozinhar. A especialidade da esposa era o peixe enrolado na folha da bananeira, tradição da família nascida em Santos (no litoral paulista) e que tinha o pai pescador. Cabia ao marido buscar a folha. Quando estavam na praia de Peruíbe a tarefa até que não era tão complicada. Mas na capital paulista, mais especificamente no bairro do Jaçanã, na zona Norte da cidade, virava uma aventura. “Lá ia ele pular muro, descer barranco. Fora que tirar a folha dá um trabalho terrível. Perdi a conta das camisetas que ele perdeu manchadas ou rasgadas”, lembra Gorete.
VOU EMPREENDER, MAS SEM PRESSA
Após uma dessas tentativas heróicas de colher a folha da bananeira, Ênio entregou a planta para a esposa e teve o estalo. “Falei para ela que isso venderia.” Era por volta de 2005. Sem muita pressa, passaram a pesquisar sobre o assunto. Notaram que, de fato, nenhum supermercado comercializava a folha. Depois foram pesquisar mais sobre o produto e fizeram inúmeras visitas à ESALQ, Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP, em Piracicaba. Ênio conta:
“Descobrimos que, ao contrário do papel alumínio, a folha de bananeira mantém as propriedades nutricionais dos alimentos, mantém a umidade e ainda dá um novo sabor. Fora o tanto que é bonita”
Passaram, então, a pesquisar restaurantes que usavam a folha para cozinhar, ao mesmo tempo que também iniciaram uma busca por produtores. Tudo de maneira caseira, ainda sem informações profissionais. A descoberta do atual agricultor veio graças ao Google e também a um leve toque do acaso. Pela internet, Ênio viu que havia uma concentração de lavouras de banana em Itanhaém e decidiu ir até o local. Lá, constatou que todos os produtores utilizavam agrotóxicos, o que era um problema, já que a folha é a primeira parte a ser atingida pelo pesticida e a que mais acumula o veneno.
Após visitar alguns lugares, todos com o mesmo impedimento, decidiu seguir sem direção em uma estrada de terra e encontrou o agricultor Petrúcio Sampaio, que plantava bananeiras no quintal de casa sem o uso de qualquer produto químico. A sorte de principiante, como costuma dizer Gorete, não parou por aí. Apaixonados pelo restaurante Tordesilhas, tomaram coragem para telefonar para a chef Mara Salles e perguntar se havia o interesse na compra da folha de bananeira — orgânica, é claro.
“Ela respondeu logo de cara: ‘foi Deus que te colocou no meu caminho’. Isso em 2011. Ela ia dar uma aula sobre invólucros naquela semana, precisava de 300 folhas e não sabia como conseguir. Foi nosso primeiro trabalho. Conseguimos fornecer, o evento foi um sucesso e nos deixou bastante animados”, conta Gorete.
Com o universo em sincronia, passaram a procurar outros restaurantes e a receptividade também foi boa. Havia chegado a hora de se dedicarem integralmente ao então hobby. Juntaram as economias, contaram com ajuda de familiares e amigos e criaram formalmente a empresa Folha da Bananeira, em 2011. A ideia era entrar também para o varejo.
QUANDO TUDO QUE VOCÊ TEM É O GOOGLE E A TENTATIVA E ERRO
E aí começaram a aparecer os primeiros problemas. Não havia verba suficiente para contratar especialistas para criar a marca, escolher a embalagem ideal e tampouco para definir o público específico. Ênio e Gorete passaram a se arriscar na base da tentativa e erro. Foram diversos testes até descobrirem que a melhor maneira de embalar o produto era enrolando-o, retirando o talo e dividindo cada folha em dois (cada embalagem traz uma folha, ou esses dois pedaços, enrolada). Também demorou até encontrarem o local certo para venda. Inicialmente, o casal acreditou que a Folha da Bananeira deveria estar nos sacolões, ao lado das peixarias. Ênio fala da abordagem em lugares de comércio popular:
“Ficamos três meses seguidos no Mercado do Peixe, no Porto de Santos, e não vendemos nada. A gente não entendia. O lugar parecia o mais adequado”
Aos poucos eles notaram que o público nesses locais ou não sabia como usar ou produto ou não estava disposto a pagar por uma… folha de bananeira. Optaram por mudar o alvo e foram em busca das classes A e B, em restaurantes que a chamam de “papilote de folha de bananeira”. Pode-se dizer que a gourmetização, neste caso, foi a tábua de salvação do negócio. Gorete fala dos novos clientes: “Geralmente são mais viajados, já experimentaram pratos desse tipo em restaurantes e têm uma preocupação maior com a saúde, com a sustentabilidade”.
Com a nova estratégia, a ida de porta em porta aos mercados de luxo da cidade de São Paulo funcionou. Era 2014 e eles passaram a vender os produtos com o preço unitário de 6 reais (hoje a embalagem custa 8 reais). “Vou lá com meu tablet, mostro algumas fotos, falamos dos benefícios e fechamos negócio. Tudo muito simples”, conta a empreendedora.
Atualmente a Folha da Bananeira pode ser encontrada em 18 pontos de vendas na capital paulista e, segundo Ênio e Gorete, a demanda não para de aumentar, tanto que o casal agora está procurando investidores para conseguir dar um salto na produção. A operação ainda é pequena e quase totalmente familiar. Eles têm apenas um funcionário, responsável por limpar e embalar o produto. Ênio, com o próprio carro, é o responsável pelo transporte e viaja semanalmente a Itanhaém para trazer em uma média de 300 folhas. Todas são comercializadas.
Cada supermercado (entre eles a Casa Santa Luzia, o St Marché, o Empório Santa Maria e a rede Zafari, todos em São Paulo) comercializa até 20 folhas por semana. Uma quantidade modesta, na visão de Ênio, se comparada às inúmeras receitas possíveis com o produto: peixe, mandioca, tapioca, cogumelos etc.
Falta, no entanto, estrutura para crescer. O casal lamenta não ter um caminhão refrigerado para transportar o produto da maneira ideal e reduzir custos. “Com um carro maior, faria duas viagens no mês, reduziria gastos, aumentaria a margem de lucro”, diz Ênio. A folha da bananeira tem o prazo de validade de 20 a 30 dias e uma margem de lucro que pode chegar a 50%, ele afirma.
Hoje a empresa tem um faturamento mensal que varia entre 6 mil e 8 mil reais. “É muito pouco do que a gente é capaz. Acho que dá para fazer isso vezes dez. Já estamos bem colocados, mas quando a Ana Maria Braga falar que vende folha no mercado eu não vou dar conta”, brinca Ênio. Gorete acredita que a divulgação da folha contribuirá também para o desenvolvimento de novos pratos e até novas maneiras de utilizá-la. “A gente lê muito que a folha tem propriedades terapêuticas. Ela é antiinflamatória, também é boa para o cabelo. Antigamente, forravam as camas de alguns sanatórios com folha, porque acalma. É boa para coceira. É necessário fazer mais pesquisa, claro, mas é um produto ainda muito pouco explorado”, diz ela.
Apesar de ser fácil de encontrar na natureza, especialmente no Brasil, o casal não teme o surgimento de um concorrente. “Quem acorda mais cedo bebe a água mais limpa”, diz Ênio. Por terem acumulado amplo conhecimento sobre o produto, eles têm sido convidados para dar palestras em faculdades, além da participação em feiras e festivais gastronômicos. Com o caminho livre e à procura de investidores, por enquanto, o único concorrente na internet é mesmo o reggae do Armandinho.
Cozinhar demanda foco e, quando em grupo, um trabalho afinado em equipe. A ex-MasterChef Izabela Dolabela, o marido e duas sócias estão à frente do it.kitchen, que adapta a dinâmica e as lições da cozinha para a vida corporativa.
Ligia Aquino era a paciente; Mayara Boaretto, a obstetriz e herbalista. Hoje, as duas são sócias à frente da Iamaní, que cria blends de chás orgânicos para ajudar na amamentação, na TPM e na menopausa (e a melhorar o sono e o metabolismo).
Ao recomeçar a vida no sítio de sua infância, Rodrigo Veraldi Ismael decidiu plantar frutas vermelhas. Hoje cultiva ainda outros ingredientes e absorve a produção no Entre Vilas, restaurante com menu sazonal e vinícola.