A Darkside Books nasceu há cinco anos na contramão do mercado editorial. Enquanto os números indicavam (e ainda indicam) retração, no momento em que editoras fechavam as portas ou optavam por fundir com gigantes do setor para ganhar sobrevida, os sócios Christiano Menezes e Chico de Assis, ambos com 38 anos, apostaram em um nicho usualmente desprezado: a literatura de terror e de fantasia.
A decisão de olhar com mais carinho para esse gênero foi quase uma necessidade. Christiano, que carrega o apelido de Chucky pela semelhança com o boneco maléfico da saga Brinquedo Assassino, prestou serviço como diretor de arte para grandes editoras como Companhia das Letras e Objetiva (esta antes da fusão com a própria Cia.) e conta que considerava toda a produção literária brasileira voltada ao tema ruim. Como fã, ele diz que não encontrava um material bem acabado.
“Via uma certa negligência com o produto. A impressão é que associavam a estética de Filme B com algo sem qualidade. E não é nada disso”
Em 2012, ele chamou o amigo de alcunha Tio Chico, que lembra o personagem da Família Adams, e lançaram no Dia das Bruxas, em 31 de outubro, a nova editora. Os apelidos por si só indicavam que estavam no caminho certo. Mas não eram só dois nerds à procura de identidade profissional. Eles queriam colocar nas estantes, nas telas, nas nuvens e seja lá mais onde for um produto de qualidade, com o cuidado de agradar em todos os detalhes os apreciadores do grotesco, do fantástico e do infame, conforme indica o manifesto da editora no site oficial.
O trabalho gráfico é o que chama a atenção logo de cara. Desde 2015 todos os livros são feitos apenas em capa dura – até então havia também a versão em brochura, com preço mais acessível. Na época, tinha fã que comprava as duas opções. Mas a decisão por manter apenas o modelo mais caro foi definido após perceber que a editora não precisava investir tanto em marketing para alavancar vendas. Com isso, poderia destinar mais dinheiro para dar excelência ao produto, sem impactar no preço final. Chico conta, sem revelar números, que eles conseguem ter uma margem parecida com a das outras editoras e oferecer um produto de alta qualidade. Ele diz que:
“Temos nosso público formado e que é fã, então não há necessidade de fazer grandes investimentos em material de divulgação”
O preço médio de uma publicação da Darkside custa 50 reais. O valor é semelhante ao de lançamento de grandes editoras. Mas como é que uma empresa nova, com pouco investimento – eles calculam entre 40 e 50 mil reais – consegue se sobressair em meio à gigantes do setor?
A ORDEM DOS FATORES ALTERA O RESULTADO
Houve uma conjunção de fatores para dar certo, segundo Christiano. E talvez o motivo mais determinante para a rápida aceitação foi, logo de cara, viralizar nas redes sociais. Há cinco anos, o Facebook começava a formar suas bolhas e a Darkside rapidamente entrou na dos aficionados por produções de terror e de fantasia. Hoje a página da editora tem cerca de 840 mil curtidas. Ele diz que o nicho que eles queriam atingir não havia sido percebido pelo mercado.
“Com as redes sociais a gente teve uma demanda muito rápida e surpreendente até. Sabíamos que havia público, mas a gente não sabia que havia tanta gente assim”
Para melhorar, os fãs desse gênero literário são colecionadores, fazem questão em ter o objeto físico, em tempos que o papel tem sido substituído pelo digital. Por isso, a Darkside conseguiu se firmar no mercado, enquanto outras editoras desistiram de produzir obras que demandassem um custo mais alto.
O caso mais emblemático de insucesso nesse mercado high end de editoras é o da Cosac Naify, referência por livros de arte e luxo e que fechou as portas em novembro de 2015. Ela possuía cerca de 1.600 títulos no catálogo, de clássicos como Tolstoi a monografias de artistas, passando por romancistas estrangeiros como Valter Hugo Mãe. O editor Charles Cosac, no entanto, não tinha retorno financeiro nas obras mais sofisticadas e, em vez de buscar alternativas, perder qualidade e mudar o rumo do negócio, optou por encerrar as atividades.
Na época, revelou em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo. “Somos uma editora cult, cujo os livros são destinados a professores acadêmicos e estudantes de arte, e não gostaria de ver nossa linha editorial desvirtuada.”
Por isso, fechou. A Cosac Naify estava dentro do balaio da crise que afeta de maneira geral todo o mercado editorial. De acordo com pesquisa divulgada em maio pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros, o setor faturou 5,3 bilhões de reais em 2016, redução de 5,3%, descontada a inflação, em relação ao ano anterior. Foram produzidos 427,2 milhões de exemplares (-4,4%) e vendidos 385,1 milhões (-1,1%). Somados os dois últimos anos, houve uma redução em termos reais de 17% do faturamento.
A Darkside justamente é uma das que não deixou esses números serem ainda piores. Desde 2012, a editora cresce entre 25% e 30% em relação ao ano anterior. Sempre sem metas pré-estabelecidas. Christiano avalia que a expectativa é acompanhar o público que conseguiu formar. “Nossa curadoria é de pegar na mão e andar junto com leitor e isso tem nos fortalecido. Essa relação de confiança faz com que, no mínimo, eles descubram novas possibilidades”, conta.
NÚMEROS GERAIS E PROJEÇÕES ANIMADORAS
Os livros da Darkside têm uma tiragem média de cinco a oito mil exemplares mas há exceções como “Star Wars: a trilogia”, de George Lucas, que passou dos 30 mil vendidos. E olha que ele não é o recordista da editora. Até agora, a publicação de principal sucesso não poderia ser outra do que “Medo Clássico”, o primeiro volume da obra de Edgar Allan Poe, o mestre dos mestres da literatura fantástica. O livro acabou de ter esgotada a quarta reimpressão de 15 mil exemplares. Ou seja, há pelo menos 60 mil pessoas lendo este clássico.
O ano de 2017 tem sido bom para a Darkside. Até agora foram comercializados cerca de 100 mil livros. No total, são 101 publicações no catálogo, divididas em quatro linhas editoriais: HQs Mangás, que traz o mundo da graphic novel, Darklove, que busca revelar escritoras do gênero terror, Crimescene, de crimes que aconteceram realmente, e Cinebook, que leva à loucura cinéfilos do pop cult, como dos filmes Tubarão, Sexta-Feira 13, O Exterminador do Futuro e Psicose.
Alguns deles estão em edição numerada como é o caso do primeiro lançamento da editora, Os Goonies, de James Kahn, que começou a ser vendido em 12/12/12. Desse início cabalístico até o final de 2017, a expectativa dos sócios é que a editora ultrapasse a marca de um milhão de livros vendidos.
Com tudo andando nos eixos, não há planos mirabolantes para os próximos anos. A ideia é seguir com o público que conquistaram, sem inventar moda. Christiano conta que nunca pensou em sair do contexto em que se inseriu para apostar em um escritor da moda e editar algo milionário como Cinquenta Tons de Cinza, Crepúsculo, ou um desses best-sellers de auto-ajuda. Não há caçadores de tendências entre os 14 funcionários que se dividem entre os escritórios do Rio de Janeiro, São Paulo e Blumenau.
Existe uma preocupação em ser verdadeiro com o público cativo. “No meio musical, tem aquela banda que surge e estoura, e tem o Iron Maiden, que tem seu público formado, possui uma consistência. Os caras têm certeza daquilo que querem, onde querem chegar. Existe um conceito bem estruturado. E é isso o que nos interessa”, conta Christiano.
Por não fazer apostas arriscadas e hoje atuar em diferentes frentes do gênero, a Darkside tem conseguido se manter firme no mercado. Porque se cai a venda nos livros dos cinéfilos, por exemplo, aparece uma graphic novel e equilibra as contas. E o fato de ter uma equipe enxuta, ajuda a ser mais dinâmico, e mudar a direção do barco.
“Inovar é sempre importante, mas não queremos dar o passo maior que a perna. Acho lindo ver que as feiras de editoras independentes crescem a cada ano e cada vez mais surgem materiais muito bons. A gente quer passar por isso e propor coisas que dialoguem com o novo”, diz Christiano. E assim caminha a Darkside.
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