Mitikazu Lisboa, fundador da Hive, define seu negócio como uma empresa de tecnologia a serviço do marketing. Hoje com 40 anos, Miti, como é chamado, começou sua carreira no setor de games. Na época em que ainda era funcionário, trabalhou na japonesa Capcom e fez parte da equipe que criou o Street Fighter 3, um ícone entre os amantes de videogame. Mas a vida de empregado durou pouco e ele logo alçou voo solo.
Desde que começou a empreender, sempre na área de jogos, já foi dono de uma rede de fliperama e trouxe títulos de fora para serem lançados no Brasil, como o famoso League of Legends, da empresa americana Riot Games. Nem tudo foi sucesso, claro. Miti acumula seis empresas no currículo, sendo que três ele vendeu e duas, quebrou. “Estou no saldo positivo”, brinca.
Em uma das empreitadas, ainda antes de fundar a Hive, Miti fechou o extinto Playcenter (um dos parques de diversão mais famosos da capital paulista) para que oito pessoas jogassem Counter Stryke (famoso game de tiro) ao vivo. Em 2007 a ideia era inovadora e soava como absurda para muita gente. “Ninguém acreditava que as pessoas iriam até um lugar para ver alguns jogadores disputando uma partida de videogame”, conta.
Mas a iniciativa deu certo. Com patrocínio da Samsung, o Playcenter lotou. “Meu skill é convencer as pessoas, é isso que sei que fazer”, diz ele. Uma habilidade muito necessária para quem está sempre tendo ideias antes dos outros:
“Em tudo o que faço eu tenho três anos de sofrimento, porque estou sempre à frente”
Com a Hive foi a mesma coisa. Em 2007, Miti abriu o negócio. Focada no desenvolvimento de games digitais, a empresa cresceu e foi reconhecida pela Associação Comercial, Industrial e Cultural de Games como a empresa com maior faturamento do setor no Brasil em 2011, em uma lista com 104 desenvolvedoras de jogos.
Nessa época, os “advergames” (como são chamados os jogos utilizados em ações de marketing) representavam parte relevante do faturamento, e foi quando Miti detectou uma nova oportunidade no mercado.
DOS GAMES AO MARKETING DIGITAL
“Percebi que o jogo é uma ferramenta de marketing muito boa e entendi que nosso know-how podia se expandir para além dos games, atendendo de forma ainda mais ampla os objetivos de marketing das grandes empresas”, conta Miti. “Ao falar para uma pessoa comprar alguma coisa, juntar pontos e trocar por um prêmio você está usando a mesma lógica do jogo. E essa visão nós temos, sabemos como fazer isso.”
Ao começar a expandir seu escopo de atuação e entrar mais a fundo nas necessidades dos departamentos de marketing de grandes companhias, a Hive detectou uma carência: tecnologias que atendessem as demandas da área de marketing. Ele fala de como o mercado tentou se adaptar:
“A gente vê agências de propaganda se virando para entender de marketing digital da noite para o dia. Elas se esforçam, mas não entendem de tecnologia a fundo”
Ele prossegue, citando um exemplo: “Elas apresentam algumas métricas, como ‘views’ (visualizações), que não servem para muita coisa. O que importa é retenção e engajamento, é isso que gera vendas”. Algo que, segundo ele, se consegue com uso de tecnologia – e não com insights criativos.
Foi aí que a Hive desenvolveu uma plataforma de business intelligence para analisar em profundidade os hábitos dos usuários, utilizando estratégias de gamificação, aquisição de dados, rastreamento digital e análise de interação com conteúdo digital. A partir daí, passou a apresentar soluções tecnológicas para alavancar a estratégia de marketing de grandes empresas. Usando big data e algoritmos de análise preditiva, a Hive promete entregar a comunicação de forma mais assertiva.
Um argumento de venda dado por Miti ajuda a mostrar isso na prática. Na visão dele, se uma agência de propaganda tradicional for oferecer um seguro viagem às pessoas que estão online, o que ela provavelmente fará? Vai mapear o perfil do cliente potencial (gênero, idade, localização, interesses) e, uma vez encontrado esse perfil, vai direcionar a campanha para ele. Na solução da Hive, uma análise de dados vai identificar quem realmente viaja com frequência e quem tem probabilidade de viajar em breve (de acordo com os hábitos online) para então direcionar os anúncios para esse público.
A Hive oferece diferentes pacotes de serviços aos seus clientes. Fazendo uso da tecnologia, algumas soluções apenas mapeiam o público-alvo da campanha e entregam o anúncio criado por uma agência de propaganda para essas pessoas. Já os pacotes completos envolvem até a criação das peças de propaganda. “A sacada criativa não é o ponto central para a venda ser mais assertiva”, diz Miti. “É a tecnologia, e aí está a disrupção que provocamos.”
De novo ele exemplifica com um caso real, em que criativos de duas agências discutiam como seria o botão do clique, do ponto de vista do design, levando em conta cor, tamanho da fonte etc. “Nós checamos qual era o botão que convertia mais. Talvez não seja o mais bonito, mas sabíamos em qual as pessoas mais clicavam, então temos que usar este.”
A Hive começou a usar a tecnologia para aumentar a eficiência das ações de marketing de grandes companhias em 2013. No começo, Miti sofreu para conseguir convencer os clientes sobre o seu ponto de vista. Ele fala a respeito, usando jargões do ecossistema das startups:
“As pessoas não aceitam a disrupção quando ela vem. Só querem usá-la quando o mercado já foi ‘disruptado’”
O desafio estava colocado. Como atravessá-lo? Uma das soluções encontradas pelo empreendedor foi levar as equipes de marketing das empresas para o escritório da Hive. Na sala de reunião, por algumas horas, ele mostra na prática o que está vendendo, e aí fica mais fácil convencer.
De qualquer forma, hoje, cinco anos depois de começar a implementar a mudança de foco da Hive, Miti diz que está mais fácil explicar as soluções e convencer os grandes players do mercado a comprá-las. No portfólio da empresa há nove clientes, todos de grande porte, como P&G, Itaú, Porto Seguro e BRMalls.
“Só não posso, ainda, pedir toda a verba de marketing dessas empresas porque não faço a mídia para TV, e elas ainda usam esse veículo”, diz. Confiante, ele acredita que a solução da Hive pode substituir o que hoje é oferecido pelas agências tradicionais de propaganda:
“A diferença é que usamos tecnologia em vez de criação”
Dois anos atrás, a Hive abriu um escritório na Califórnia, nos Estados Unidos, e conquistou um cliente de peso: o Twitter. Contando os funcionários que trabalham lá e aqueles alocados no escritório da Vila Olímpia, em São Paulo, há 42 colaboradores.
Este ano, a Hive deve faturar 9 milhões de reais, sendo que os games, que deram origem ao negócio, hoje representam apenas 10% da receita. Nos planos para o futuro próximo está sustentar a internacionalização, conquistando mais clientes nos Estados Unidos e colocando um pé na Europa. E segue o jogo.
Empresas são feitas por pessoas e às vezes também precisam “deitar no divã”. Depois de deixar a ONG feminista Think Olga e a startup Think Eva, Jules de Faria hoje toca o Estúdio Jules, que ajuda marcas a redescobrirem sua razão de ser.