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Às vezes, a melhor estratégia anticrise é contar o que a sua empresa faz de melhor. A Marcyn fez isso

Giovanna Riato - 25 jan 2018 Lia e Mauro Zaborowsky são da terceira geração da família à frente da Marcyn e contam como a empresa se reestruturou e renovou a comunicação — sem abrir mão de produzir no Brasil.
Lia e Mauro Zaborowsky são da terceira geração da família à frente da Marcyn e contam como a empresa se reestruturou e renovou a comunicação — sem abrir mão de produzir no Brasil.
Giovanna Riato - 25 jan 2018
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Os últimos dois anos foram difíceis para qualquer companhia no mercado brasileiro. O impacto foi ainda maior para aquelas do setor industrial, analógicas, que além de perder o cliente local com a retração econômica, penaram para manter a competitividade no mercado internacional. É este, exatamente, o caso da Marcyn, grupo nacional que produz moda íntima e praia das marcas Marcyn e Casa das Cuecas, além de fazer peças para Calvin Klein, Pucket, Rosa Chá, Lupo e uma série de outras marcas para exportação.

Como desafio adicional, o período não foi apenas de recuo da economia brasileira, mas de intensa transformação digital – um desafio e tanto para uma empresa industrial e familiar. Mauro Zaborowsky, 57, vice-presidente da companhia, fala do cenário:

“Criar e produzir localmente é um desafio grande porque é sempre mais fácil comprar importado. Precisamos desenhar estratégias o tempo todo”

Com jeito descontraído, o executivo diz gostar de cuidar dos negócios de perto, resolvendo a mais diversa gama de pepinos. Ele é a segunda geração à frente da empresa familiar, que foi comprada em 1983 por Luiz Zaborowsky, 87, o pai de Mauro. Na época, toda a estrutura ficava em uma casa no bairro do Jaçanã, em São Paulo: eram 18 funcionários e algumas máquinas.

Tanto Mauro quanto a esposa, Lia Zaborowsky, 57, foram convidados a se juntar ao negócio e fazer a coisa acontecer. Ele assumiu a área mais estratégica e a produção, enquanto ela deixou de lado a carreira de professora de matemática para se encontrar no desenvolvimento de produto. Ou seja, largou a sala de aula para fazer calcinha.

Mauro, Luiz e Marcos: as três gerações da família Zaborowsky no comando do Grupo Marcyn

Mauro, Luiz e Marcos: as três gerações da família Zaborowsky no comando do Grupo Marcyn.

“Meu pensamento lógico ajudou muito nesse processo. Pensar em produto é um longo caminho que inclui desenvolver matéria-prima, estilo e modelagem”, diz. Em toda a trajetória, conta ela, a preocupação sempre foi oferecer lingeries extremamente confortáveis, já que estas são as peças que ficam em contato com o corpo de quem veste o tempo todo. Lia aponta que o outro pilar da Marcyn é fazer underwear para corpos diversos, não para vestir apenas um padrão. “A consumidora já percebeu isso e procura a nossa marca justamente porque sabe que aqui vai encontrar o que precisa”, diz, destacando que a maior parte das vendas femininas é concentrada nos manequins 44 a 52. De certa forma, pode-se dizer que a Marcyn faz roupa para a uma mulher “empoderada” e em paz com o próprio corpo desde muito antes disso se tornar assunto dos departamentos de marketing dos varejistas.

UMA INDÚSTRIA BRASILEIRA EXPORTADORA

Devagar, ao longo dos quase 40 anos de história da empresa, a família construiu, ao seu modo, um respeitável império de roupa íntima. De um lado, estabeleceram parcerias para produzir peças para outras marcas e exportar para países como Argentina, Estados Unidos, Portugal e Japão – feito cada vez mais raro para indústria brasileiras. Pelas contas de Mauro, 5% do que é produzido localmente pela companhia atende à demanda de outros mercados. E fala de como é exportar não sendo chinês:

“Carregamos o custo-Brasil, então jamais vamos competir com a China. Temos que fazer produtos com valor agregado para marcas mais premium. Não dá para ser commodity”

Na outra ponta, o Grupo Marcyn firmou as marcas próprias no mercado local. No começo dos anos 2000 a empresa percebeu que poderia fidelizar a consumidora adulta se estivesse mais próxima das adolescentes. “Foi aí que nos tornamos a primeira marca licenciada para produzir produtos da Capricho (a então revista ícone para adolescentes no país)”, conta Mauro, citando a linha de lingerie que segue firme e forte até hoje (já a revista, sinal dos tempos, existe digitalmente apenas).

Produzir lingerie ainda é trabalho artesanal e a família Zaborowsky iria preferir fechar as portas da Marcyn a terceirizar este trabalho

A família Zaborowsky preferiria fechar as portas da Marcyn a importar: a produção é local, tradicional e quase artesanal.

Em pouco tempo, o pequeno sobradinho que abrigava a produção da marca no Jaçanã se transformou em uma fábrica na região da Pompeia, também na capital paulista. Outra unidade produtiva foi inaugurada em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, para complementar a operação. Com isso, a Marcyn alcançou capacidade para fazer 700 mil peças por mês de lingerie e 100 mil itens mensais da linha praia. É muita calcinha, sutiã, cueca e biquíni. “Sempre fomos uma indústria e, em um momento, percebemos que era preciso ganhar força no varejo para obter volume”, conta Mauro. Com esse desafio no horizonte, a marca abriu sua primeira (e até hoje única) loja própria, em 2012, no cruzamento da alameda Lorena com a rua Augusta, em São Paulo.

Ali, além de vender, a Marcyn experimentava produtos e estratégias que, depois, entrariam em prática nas revendas. É como se a unidade própria fosse um laboratório, onde até hoje são testadas as práticas espalhadas em seguida para os 3 000 revendedores. No meio digital, a companhia também passou a vender on-line em um e-commerce, hoje responsável por 20% do faturamento.

Na mesma época, o grupo decidiu ainda dar um passo para ampliar a oferta de produtos e comprou a Casa das Cuecas, na época com 14 lojas. “Era uma marca tradicional, com público fiel, porém desatualizada na época”, diz. Repaginada, a condução da nova frente foi para as mãos de Marcos Zaborowsky, 34, filho de Mauro e Lia, a terceira geração da família com presença no Grupo Marcyn.

E QUANDO AS FÓRMULAS ANTIGAS JÁ NÃO FUNCIONAM?

Tudo ia muito bem… até que a fórmula perdeu a eficácia com a mudança do contexto. A partir de 2014 as vendas começaram a encolher, conta Mauro. “Com o desemprego e a insegurança com a economia, as pessoas passaram a comprar underwear apenas para reposição. Os volumes caíram muito”, conta. Em paralelo, a tal da transformação digital acirrou a concorrência. A Marcyn viu brotar uma série de marcas de lingerie na internet, mais próximas das consumidoras, além das concorrentes tradicionais, que também faziam suas ofensivas. O caminho que encontraram para conter a as perdas foi buscar ajuda externa, de uma consultoria.

“Nunca vi uma situação tão difícil. Começamos a rever tudo, a enxugar todos os custos”, conta. No processo, o quadro de funcionários encolheu de 500 para 400 pessoas. “Tiramos gordura de todos os lados”, diz, citando como exemplo a implementação de processos mais eficientes e a troca da equipe de segurança por alarmes eficazes. Só tinha uma coisa que a família se recusava a abrir mão: a produção local. “Todo mundo está deixando de ser indústria para ser varejo e vender peças importadas de países como China e Bangladesh. Aqui a produção é parte da nossa filosofia. Se eu tiver que vender peças feitas por pessoas que são exploradas lá fora, que trabalham em troca de um prato de arroz, prefiro fechar as portas”, diz Mauro. Lia também defende o valor de fazer localmente:

“A lingerie é artesanal, é a mão da costureira. É tudo muito delicado e precisamos inserir tecnologia para valorizar os pontos fortes de mulheres de verdade, para dar segurança. Nada substitui esse processo de melhoria contínua dos produtos”

Se a produção local era inegociável, o caminho foi atacar em outra frente para impulsionar o negócio: o posicionamento de mercado. “Sou uma pessoa de fábrica. Sempre fizemos muito aqui dentro para atender a nossa cliente da melhor forma, para a mulher real se sentir bem do jeito que está, mas nunca nos preocupamos em contar isso”, diz Lia. Pois a missão foi justamente essa: contar para as clientes a inspiração e os valores que a Marcyn já carregava.

NOVA ESTRATÉGIA, MELHORES RESULTADOS

Em tempos de busca pela autoestima independentemente do tamanho da silhueta, a empresa desenhou um novo posicionamento. Saíram de cena as modelos profissionais e o material publicitário da marca passou a ser estrelado por mulheres reais, comuns. A empresa convidou cinco influenciadoras ligadas à auto-aceitação e à desconstrução de esteriótipos: Mayara Cardoso, Maraisa Fidelis, Nathalie Barros, Carla Paredes e Joanna Cannabrava. “Quando trabalhávamos com celebridades nas campanhas, eu ganhava destaque no ponto de venda, mas agora nós ficamos mais próximos das nossas consumidoras, geramos identificação”, diz Mauro. A troca, aparentemente, foi boa.

A nova estratégia estreou em dezembro do ano passado e, só nos primeiros primeiros sete dias, aumentou em 35% os resultados de vendas da loja própria, na alameda Lorena. “Colocamos manequins maiores e é interessante ver como as mulheres que passam na rua se identificam, sorriem”, conta Lia. O plano é manter as mulheres reais por perto de agora em diante, sem modelos ou manequins esquálidas nas campanhas.

A Marcyn sempre fez calcinha para a mulher real, mas só com a crise percebeu que precisava colocar isso nas campanhas. Deu certo.

A Marcyn sempre fez calcinha para a mulher real, mas só com a crise percebeu que precisava colocar isso nas campanhas. Deu certo.

Do faturamento total do grupo, 70% vem da marca Marcyn e 30% da linha da Casa das Cuecas e das produzidas para outras empresas. Com a melhora da economia e o esforço interno, Mauro encerrou 2017 com alta de 8% no faturamento depois de dois anos de quedas. O plano é fortalecer este crescimento em 2018 e avançar 10%. As ferramentas para impulsionar estes resultados já estão definidas. A primeira delas é ampliar a presença da Casa das Cuecas, que já é um negócio promissor, que cresce 25% ao ano. O plano é abrir cinco novas lojas, saltando para 23 pontos.

Já para a marca Marcyn, a empresa planeja uma mudança importante na estratégia: a adesão ao sistema de franquia. “Nesse período de crise muitas multimarcas fecharam as portas e perdemos o nosso alcance. Estamos selecionando franqueados para ter mais lojas da marca e garantir presença nas capitais”, diz Mauro. Ele não detalha números e metas, mas diz que o plano é encontrar pessoas e famílias que, assim como os Zaborowsky, tenham o empreendimento como projeto de vida, que não sejam meros investidores. Como aconteceu ali dentro, de pai para filho, a ideia é ensinar para os franqueados que algumas fórmulas para o sucesso nos negócios.

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